Capítulo2

Simone bateu a porta do carro se sentindo aborrecida. Estava investigando uma queixa sobre sumiço de gatos! Só a designaram para um caso tão bobo porque era mulher, e pior, recém-formada da academia de polícia. Ela ansiava por uma oportunidade de trabalhar em equipe numa grande operação, do tipo que se vê em filmes. Ao invés disso tinha que submeter-se — e agradecia a seu super-protetor primo Marcelo por isso — a verificar queixas de velhinhas solitárias que viviam rodeadas de felinos.

Francamente!

Quem pode sentir falta de um gato quando existem tantos desses por aí, deixando sua sujeira fedorenta em todos os canteiros de plantas da cidade?

Simone não conseguia compreender!

Mas a culpa de estar naquela missão sem graça e sem sentido era de Marcelo, quanto a isso não havia dúvidas.

Tudo bem que Marcelo trabalhava na delegacia há muito mais tempo que ela, e tinha conquistado uma posição privilegiada por lá, mas ele precisava mesmo juntar-se ao delegado para decidir sempre o que Simone estava apta ou não a poder fazer? Que coisa chata! 

Bateu na porta da casa onde morava a senhora queixosa:

— Bom dia, dona Adelaide. Eu sou a policial Simone. A senhora prestou uma queixa sobre o sumiço de um gato.

— Ah, até que enfim alguém apareceu! Eu coloco ração todos os dias para os gatos aqui fora e eles sempre vem correndo comer tudo. Só que há mais ou menos uma semana, tem vindo cada vez menos gatos para se alimentar. Hoje só vieram dois. Sumiram vários deles!

— Os gatos não são seus?

— Ah, não, minha filha. Eles moram na rua.

— Os gatos da rua não têm vindo comer?

— Não. Eles estão sumindo.

Simone esforçava-se para não ser indelicada com aquela mulher idosa.

— A senhora não acha que esses bichos, já que moram na rua, podem simplesmente estar passeando em algum outro lugar?

— Com certeza que não estão! Os gatos se apegam a lugares, pode perguntar a qualquer pessoa que conheça bichanos. — A mulher aproximou-se da policial, e falou em tom de confidência: — Acho que tem a ver com o novo vizinho.

Para pontuar seu comentário, a senhora apontou com o queixo para a casa do outro lado da rua.

Simone olhou para a casa apontada pela senhora, logo ali bem em frente.

— Ele se mudou para cá faz menos de um mês. Um dia me viu alimentando os animais e pediu que eu não fizesse mais isso.

— Ele foi agressivo com a senhora?

— Oh, não, ele foi muito educado — continuou a idosa, em voz baixa. — É um tipo grandão, bem aparentado, desses que pode mesmo impressionar a gente. Mas é muito sério, e seu olhar... Bem, é tão severo que dá um pouco de medo. Bem, eu entendi que ele estava me dando uma ordem, na verdade, e não fazendo um pedido.

— A senhora entendeu?

─ Pelo tom da vez dele, sim.

─ Hum... E ele não gosta de gatos? — Simone tentou disfarçar seu tédio.

— Acho que não são exatamente os gatos que o incomodam. Ele disse que as fezes no seu quintal eram um horror, e que recebia muita gente em sua casa e precisava todo dia limpar a sujeira do lado de fora. Ora, o que tem demais limpar o quintal todo dia? Eu sempre limpo o meu.

Imagino que a senhora não tem muito mais do que isso para fazer — pensou Simone.

— Então ele acha que a sujeira dos bichos pode incomodar as visitas que recebe?

— Oh, acho que não são exatamente visitas. Acho que são clientes. Ele é um cigano, ou algo assim, seu nome é Dimitri.

Simone olhou para a outra casa novamente. Uma casa muito grande e bonita. Devia ser um cigano rico, então, o tal Dimitri.

Dona Adelaide continuou:

— É claro que não parei de alimentar os gatos, ora. Os clientes dele não me incomodam, por que meus gatos o incomodariam?

A policial teve ímpetos de perguntar se algum cliente do senhor Dimitri já havia feito cocô na porta de dona Adelaide, mas se conteve.

— Depois de algum tempo os gatinhos começaram a desaparecer — replicou a senhora. — Diga-me, não é preciso ter algum tipo de autorização para ler mãos ou fazer adivinhação?

— Ah, eu não sei nada sobre isso. Imagino que se não há uma plaquinha na porta vendendo serviços, então ele não precisa de nenhuma autorização. Mas isso não é comigo, dona Adelaide. A senhora viu algum gato morto na rua?

— Não, nenhum. E nem pedaços de carne envenenada, antes que pergunte. Mas, por favor, fale com ele. ─ A mulher apontou outra vez para a casa vizinha.

— Ah, está bem. Mas eu devo dizer-lhe, dona Adelaide, que limpar as fezes de um gato que não é seu, incomoda e muito. Seus vizinhos têm razão de reclamar. Sugiro que a senhora ligue para alguma associação protetora para que retirem esses animais daqui antes que a vizinhança dê queixa contra a senhora.

— Ora, que absurdo!

— Dona Adelaide, arrume um cachorrinho ou um gato que seja seu de fato. Será melhor companheiro e alimentá-lo sairá mais econômico que alimentar uma população de gatos vadios. ─ Simone deu o conselho, mesmo que não houvesse sido pedido. E para aplacar a irritação de dona Adelaide, retrucou: ─ De qualquer forma, só para tranquilizá-la, conversarei com seu vizinho.

— Obrigada — respondeu a idosa, secamente.

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