Charlotte
A pilha de papéis nos meus braços era ridiculamente grande, quase um insulto pessoal. Maximilian Steele tinha feito isso de propósito, eu sabia. Ele sabia. Documentos do mês passado? Sério? Era só mais uma das formas dele de testar minha paciência. Como se não bastasse lidar com sua presença intimidadora e aquele olhar frio que me fazia sentir como uma funcionária dispensável, agora eu também tinha que carregar peso extra logo de manhã.
Eu atravessava o lobby da Steele Medical Supplies, a empresa de vendas para hospitais onde eu trabalhava há anos, tentando equilibrar os documentos e o copo de café sem derramar nada. O som dos saltos ecoava pelo chão de mármore e, quando cheguei ao elevador, não precisei olhar para saber que alguns olhares estavam sobre mim. Todos conheciam Maximilian Steele. E todos sabiam que, de alguma forma, ele tinha um prazer sádico em me sobrecarregar.
— Precisa de ajuda? — uma voz masculina perguntou.
Olhei de lado e vi Daniel Reed, o melhor amigo de Max e um dos poucos que pareciam realmente humanos naquele andar.
— Eu estou bem, obrigada — respondi, mesmo que minha expressão dissesse o contrário.
— Aposto que Steele te jogou mais uma missão suicida. — Ele sorriu de canto, abrindo caminho para mim no elevador.
— Ele acha que sou a Mulher-Maravilha. — Revirei os olhos, ajeitando os papéis.
— Ou só quer chamar sua atenção. — Daniel piscou e eu bufei.
— Esse homem não quer minha atenção. Ele quer minha alma.
Daniel apenas riu enquanto as portas do elevador se fechavam.
Quando cheguei à minha mesa, já sabia que Max estava de mau humor. Ele não precisava gritar ou bater portas para demonstrar isso. O ar ao redor dele simplesmente ficava mais pesado, como se o ambiente inteiro absorvesse sua frustração.
— Grant. — Sua voz soou fria e firme assim que passei pela porta do seu escritório.
Ele nem levantou os olhos do computador.
— Sr. Steele — respondi, mantendo a profissionalidade.
Coloquei os documentos sobre sua mesa e cruzei os braços, esperando alguma nova ordem absurda. Ele finalmente ergueu os olhos, e aqueles olhos cinzentos me analisaram com a mesma intensidade de sempre.
— Por que esses documentos ainda não foram revisados?
Pisquei, surpresa.
— São relatórios do mês passado, senhor. Achei que fossem irrelevantes neste momento.
Seu maxilar se contraiu e ele se recostou na cadeira, tamborilando os dedos na mesa.
— Se fossem irrelevantes, eu não teria mandado você analisá-los, teria?
Segurei a vontade de rolar os olhos. Eu sabia jogar esse jogo.
— Vou revisar agora mesmo. — Virei nos calcanhares, pronta para sair.
— Charlotte. — Sua voz me fez parar. — Espero que saiba a diferença entre ser eficiente e ser teimosa.
Eu me virei lentamente e dei meu melhor sorriso profissional.
— Espero que saiba a diferença entre ser exigente e ser irritante, senhor.
Saí antes que ele pudesse responder.
O resto da manhã passou como um borrão de planilhas, análises de contratos e tentação de não jogar meu café quente em Maximilian. Eu não sabia por que ainda estava nesse emprego, mas algo dentro de mim me impedia de sair. Talvez fosse o desafio. Talvez fosse a satisfação de ver o homem mais poderoso que eu conhecia se irritando com minhas respostas afiadas.
Ou talvez fosse o fato de que, apesar de tudo, alguma parte de mim gostasse daquele jogo perigoso.
Não, eu não ia admitir isso.
Pouco antes do almoço, Clara, minha melhor amiga me mandou uma mensagem:
Clara: Já deu um soco na cara dele hoje ou está esperando um motivo maior?
Ri baixinho e respondi:
Eu: Ainda não, mas está na minha lista de prioridades.
Levantei os olhos do celular e vi que Max estava me observando da porta do escritório. Sua expressão era ilegível, mas seus olhos tinham aquele brilho desafiador que sempre me deixava alerta.
— Algo errado, Sr. Steele?
Ele inclinou a cabeça ligeiramente.
— Você está sorrindo. Isso é preocupante.
Cruzei os braços.
— Talvez eu esteja gostando da minha vida fora dessas quatro paredes, eu definitivamente prefiro ela.
Ele deu um pequeno sorriso, mas não era exatamente amigável. Depois de anos, nossa relação já não é a mais equilibrada em palavras e mesmo eu sendo a maior petulante esse homem não me demite.
— Não se acostume muito. — E com isso, ele voltou para o escritório.
Meu coração bateu mais rápido.
Definitivamente perigoso.
Suspirei e voltei minha atenção para Clara.
Eu: Preciso voltar ao trabalho antes que ele me demita de verdade.
Clara: Tenta não matá-lo antes do almoço.
Eu: Prometo tentar.
Minutos depois, peguei a papelada revisada e caminhei até o escritório de Maximilian. Bati na porta e entrei sem esperar resposta, como ele gostava.
— Aqui está tudo revisado, Sr. Steele. Agora vou sair para almoçar se o senhor não for precisar de mais nada! — Coloquei os documentos sobre sua mesa e me preparei para sair.
Ele pegou a pilha sem nem olhar direito, folheou por alguns segundos e, sem aviso, jogou tudo no lixo ao lado da mesa.
Meus olhos se arregalaram.
— Você acabou de… — Minha voz falhou por um segundo. — Você está brincando comigo?
Ele me encarou com um olhar impassível.
— Considere isso um teste. Você passou. Pode ir almoçar.
Fiquei tão furiosa que precisei respirar fundo para não gritar. Cerrei os punhos e me obriguei a sair do escritório sem uma palavra. Mas uma coisa era certa: a guerra entre nós estava oficialmente declarada.
A caminho do restaurante, eu xingava Maximilian mentalmente com todos os palavrões possíveis. Aquele homem era insuportável, arrogante, um completo psicopata corporativo. "Teste", ele disse. Se aquilo era um teste, então ele só podia estar avaliando minha capacidade de não cometer homicídio dentro do ambiente de trabalho.
— Idiota pretensioso… Meu Deus, como pode existir alguém tão cruel e panaca assim no mundo? — murmurei, chutando uma pedrinha no caminho.
Se eu não estivesse tão faminta, provavelmente teria voltado lá para derrubar aquela m*****a cadeira de couro em que ele tanto gostava de se recostar. Mas não. Ele não valia meu tempo. Ainda assim, algo me dizia que eu ainda não tinha visto o pior dele.
Suspirei pesadamente e, antes que percebesse, já estava planejando formas sutis — e não tão sutis assim — de me vingar. Nada muito grave. Só o suficiente para que ele sentisse o peso do inferno que eu chamava de "meu humor ruim". Talvez trocar o açúcar do café dele por sal. Ou… quem sabe… adicionar algumas gotas de laxante?A ideia me fez sorrir. Imaginar Maximilian Steele, o todo-poderoso CEO, correndo para o banheiro no meio de uma reunião importante? Ah, isso era quase poético.— Charlotte Grant, você é um gênio.Mas, infelizmente, minha moral (e minha vontade de continuar empregada) ainda eram um obstáculo. Então, minha vingança teria que esperar.Pelo menos por enquanto.Com minha pequena vingança mental me dando um alívio temporário, finalmente cheguei ao restaurante. Escolhi uma mesa perto da janela e pedi um prato que não apenas me enchesse, mas também compensasse o estresse matinal.Enquanto esperava a comida, aproveitei para checar meu celular. Nenhuma mensagem importante, e
A reunião começou de maneira tensa, como eu já imaginava. Richard Donovan entrou na sala com sua equipe, a postura arrogante de sempre, como se a qualquer momento ele fosse começar a dar ordens em vez de negociar. O homem exalava poder, mas também tinha algo de irritante que me fazia querer ignorá-lo a todo custo. Max estava no seu melhor comportamento corporativo, mas eu sabia que ele não gostava da forma como Donovan tratava as coisas, como se tudo fosse simples, como se ele estivesse no controle o tempo todo.Nos cumprimentamos, e a assistente de Donovan começou a falar sobre o plano de vendas. Eu estava prestando atenção, mas ao mesmo tempo me perguntava o que ele realmente queria, e o que Max achava que deveria ser feito para que isso fosse fechado da forma mais vantajosa possível. Claro, a resposta para isso eu já sabia. Maximilian não se contentava com qualquer coisa; ele precisava de detalhes, de uma análise minuciosa, de uma visão que fosse mais além do que só números e proje
Maximilian ficou em silêncio por um instante, os olhos fixos em mim como se estivesse tentando processar o que acabara de acontecer. A tensão no ar era palpável, e eu me senti estranha, como se algo tivesse mudado entre nós. Mas, ao invés de um gesto de agradecimento, ele se levantou abruptamente da cadeira, seus olhos agora mais intensos e carregados de raiva.— Você não tinha que ter feito isso, Charlotte! — A voz dele cortou o ar, fria e venenosa. — Não era da sua conta. Eu não precisei da sua ajuda. Você se meteu onde não devia e, pior, foi completamente desrespeitosa!Eu recuei um passo, surpresa com a ferocidade das palavras. Max avançou um passo em minha direção, e pude ver a raiva queimando em seu olhar. Ele estava visivelmente irritado, seus músculos tensos como se estivesse pronto para explodir a qualquer momento.— Você se acha no direito de intervir e falar por mim? Eu sou perfeitamente capaz de lidar com essa situação sozinho, Charlotte. Não precisava da sua interferência
MaxO despertador soou estridente ao lado da minha cabeça, mas eu já estava acordado. A noite tinha sido longa e inquieta, marcada por um turbilhão de pensamentos que se recusavam a me deixar em paz. Pisquei algumas vezes, tentando afastar a sensação incômoda no peito, mas ela continuava lá. Algo dentro de mim estava errado. Algo que eu não queria admitir.Passei a mão pelo rosto, soltando um suspiro pesado antes de finalmente me levantar. A luz matinal entrava timidamente pelas frestas das cortinas, projetando sombras suaves pelo quarto. Caminhei até o banheiro e encarei meu reflexo no espelho. Eu parecia cansado, os traços tensos, como se a noite sem dormir tivesse cobrado seu preço. Mas não era apenas o cansaço. Era outra coisa. Algo que eu não queria nomear.Charlotte.As imagens da noite
O som firme dos saltos ecoou pelo escritório antes mesmo que eu levantasse o olhar.Charlotte entrou como uma tempestade, seu corpo rígido de tensão e os olhos faiscando determinação. Mas foi o pedaço de papel em sua mão que realmente fez meu estômago afundar.Seu aviso prévio.Senti Daniel se remexer na poltrona ao meu lado, claramente interessado no que aconteceria a seguir.— Daniel. — Minha voz saiu firme, um comando direto. — Nos deixe a sós.Ele ergueu as mãos em rendição, mas antes de sair, lançou um olhar divertido.— Boa sorte, chefe. Você vai pre
Charlotte se afastou de mim com um movimento brusco, sua respiração acelerada e os olhos faiscando.— Se eu for ficar, Maximilian, vai ter que ter mudanças.Cruzei os braços, analisando-a. Eu já esperava que ela não fosse simplesmente aceitar minha imposição, mas algo em sua postura me dizia que ela não estava apenas exigindo um pedido de desculpas.— Que tipo de mudanças? — questionei, mantendo minha voz calma.Ela ergueu o queixo, determinada.— Eu quero ser respeitada. Quero que meu trabalho seja reconhecido sem precisar provar mil vezes que sou competente. Quero que pare de me tratar como se eu fosse descartável.
Charlotte— Eu ainda não acredito que você vai me abandonar, Clara — dramatizei, levando a xícara de café aos lábios.Clara riu, revirando os olhos enquanto passava manteiga na torrada. — Você está falando como se eu estivesse me mudando para outro país. É literalmente a cinco quarteirões daqui.— E ainda assim, longe o suficiente para eu ter que lidar sozinha com minha própria vida. — Suspirei, fingindo desespero.— Talvez seja a hora, né? — Ela ergueu uma sobrancelha com um sorriso malicioso. — Além disso, quem sabe assim você finalmente leva um homem para casa sem medo de me traumatizar?Quase engasguei