O som firme dos saltos ecoou pelo escritório antes mesmo que eu levantasse o olhar.
Charlotte entrou como uma tempestade, seu corpo rígido de tensão e os olhos faiscando determinação. Mas foi o pedaço de papel em sua mão que realmente fez meu estômago afundar.
Seu aviso prévio.
Senti Daniel se remexer na poltrona ao meu lado, claramente interessado no que aconteceria a seguir.
— Daniel. — Minha voz saiu firme, um comando direto. — Nos deixe a sós.
Ele ergueu as mãos em rendição, mas antes de sair, lançou um olhar divertido.
— Boa sorte, chefe. Você vai precisar.
A porta se fechou, e o silêncio pesado caiu entre nós. Charlotte cruzou os braços, segurando o papel com força.
— Eu vim oficializar minha demissão.
As palavras saíram sem hesitação, diretas, como se ela já tivesse ensaiado tudo antes de entrar.
Apertei os punhos sob a mesa, mantendo a expressão impassível.
— Você teve a noite toda para pensar e ainda quer ir embora?
Ela soltou uma risada sarcástica.
— Achei que ficaria feliz. Afinal, não foi você quem me disse para ir embora se não conseguisse lidar com seu temperamento?
O gosto amargo do arrependimento voltou com força.
Mas eu não podia deixar isso acontecer.
— Você está agindo por impulso — falei, minha voz controlada, mas firme.
Charlotte arqueou uma sobrancelha.
— Impulso? — Ela jogou o papel sobre a mesa. — Isso não é impulso, Maximilian. É a consequência das suas palavras.
Meu olhar caiu sobre o papel. Bastava minha assinatura para torná-lo oficial. Bastava um único gesto, e Charlotte sairia da minha vida.
Algo dentro de mim rejeitou essa ideia com tanta força que me levantei no mesmo instante.
— Eu não vou aceitar.
Ela piscou, surpresa. — O quê?
Apoiei as mãos na mesa, inclinando-me ligeiramente em sua direção.
— Você não vai se demitir.
Seu queixo se ergueu em desafio. — Ah, não? E o que exatamente vai me impedir?
Minha mandíbula travou. Charlotte nunca foi do tipo que cedia facilmente.
— Se quiser ir embora, vá. Mas não me venha dizer que isso é porque eu não reconheço seu trabalho. Você sabe tão bem quanto eu que não há ninguém mais competente para esse cargo.
Ela estreitou os olhos.
— Então você precisa de mim?
Engoli em seco. Eu precisava. Mas não apenas no sentido profissional.
Só que admitir isso era outra história.
— Preciso de alguém que não aja como uma criança mimada e fuja no primeiro sinal de conflito.
Seu olhar se inflamou no mesmo instante.
— Você é inacreditável! — Ela bufou, passando a mão pelos cabelos. — Eu deveria saber que você nunca mudaria.
Minha paciência estava no limite.
— E você deveria saber que eu não sou do tipo que aceita ser abandonado.
O silêncio entre nós ficou carregado. Por um momento, Charlotte pareceu hesitar, como se não esperasse aquelas palavras.
Mas então, sua expressão endureceu novamente.
— Tarde demais, Maximilian.
Charlotte soltou uma risada amarga, cruzando os braços como se tentasse se segurar. Mas eu via em seus olhos – aquele brilho intenso, a frustração fervendo sob a superfície.
— Você quer saber por que estou indo embora? — Sua voz não tremeu, mas havia uma emoção crua ali, algo que me fez prender a respiração. — Porque eu estou cansada, Maximilian. Cansada de você.
Aquelas palavras me acertaram com força, mas ela não parou.
— Cansada de me esforçar ao máximo para ser impecável no trabalho e, no final do dia, receber nada além do seu desdém. Cansada de ouvir você falar como se eu fosse descartável, como se meu trabalho não valesse nada.
Ela deu um passo à frente, o olhar cravado em mim.
— Você me j**a ordens, me trata como se eu fosse apenas mais uma peça no seu escritório, mas adivinha? Eu sou mais do que isso. Eu sou uma mulher que tem valor, que tem limites. E você os ultrapassou tantas vezes que eu nem sei como aguentei até agora.
Eu apertei os punhos, sentindo cada palavra dela como um golpe.
— Charlotte…
— Não, você vai me ouvir agora. — Sua voz ficou mais firme. — Porque eu escutei você tantas vezes, absorvi suas críticas, engoli minha frustração. Mas quer saber? Chega! Eu não vou mais implorar por respeito. Não vou ficar onde não sou valorizada.
Minha mandíbula travou. O peso do que ela dizia caía sobre mim como uma verdade brutal.
Charlotte não era só uma secretária eficiente.
Ela era Charlotte.
E eu tinha passado tempo demais fingindo que sua presença ao meu lado não significava algo.
Ela respirou fundo e balançou a cabeça, como se tentasse se recompor.
— Não estou pedindo que você me segure, Max. Só aceite.
Ela virou-se para pegar o papel sobre a mesa, mas algo dentro de mim despertou com uma intensidade que eu não reconhecia.
Não.
Eu não ia deixar isso acontecer.
Não quando finalmente enxergava o que realmente estava acontecendo.
Eu não precisava apenas da profissional impecável que organizava minha vida e minha empresa.
Eu precisava dela.
E se eu tinha passado todo esse tempo a empurrando para longe, agora era a minha vez de lutar.
Ela queria que eu aceitasse sua decisão?
Então eu teria que fazê-la mudar de ideia.
Charlotte ainda não sabia, mas a partir de agora, eu ia conquistá-la.
E dessa vez, não como seu chefe.
Dei a volta na mesa em dois passos firmes, meu corpo movido por algo instintivo, intenso. Antes que ela percebesse, minhas mãos estavam em sua cintura, puxando-a para mim com firmeza.
Ela ofegou, os olhos arregalados encontrando os meus.
— Maximilian— murmurou, surpresa.
Meus dedos apertaram sua cintura, sentindo seu calor através do tecido da blusa. Eu a mantive ali, perto o suficiente para que ela entendesse que eu não ia recuar.
— Você não vai embora — declarei, minha voz baixa, carregada de algo que nem eu sabia nomear.
Ela abriu a boca para protestar, mas eu inclinei o rosto, aproximando nossos lábios apenas o suficiente para sentir sua respiração quente se misturar com a minha.
— Eu não deixo que levem o que é meu, Charlotte.
Seus olhos brilharam com raiva, desafio… e algo mais. Algo que fez meu sangue ferver.
Ela podia lutar o quanto quisesse.
Mas essa guerra, eu estava decidido a ganhar
Charlotte se afastou de mim com um movimento brusco, sua respiração acelerada e os olhos faiscando.— Se eu for ficar, Maximilian, vai ter que ter mudanças.Cruzei os braços, analisando-a. Eu já esperava que ela não fosse simplesmente aceitar minha imposição, mas algo em sua postura me dizia que ela não estava apenas exigindo um pedido de desculpas.— Que tipo de mudanças? — questionei, mantendo minha voz calma.Ela ergueu o queixo, determinada.— Eu quero ser respeitada. Quero que meu trabalho seja reconhecido sem precisar provar mil vezes que sou competente. Quero que pare de me tratar como se eu fosse descartável.
Charlotte— Eu ainda não acredito que você vai me abandonar, Clara — dramatizei, levando a xícara de café aos lábios.Clara riu, revirando os olhos enquanto passava manteiga na torrada. — Você está falando como se eu estivesse me mudando para outro país. É literalmente a cinco quarteirões daqui.— E ainda assim, longe o suficiente para eu ter que lidar sozinha com minha própria vida. — Suspirei, fingindo desespero.— Talvez seja a hora, né? — Ela ergueu uma sobrancelha com um sorriso malicioso. — Além disso, quem sabe assim você finalmente leva um homem para casa sem medo de me traumatizar?Quase engasguei
CharlotteA pilha de papéis nos meus braços era ridiculamente grande, quase um insulto pessoal. Maximilian Steele tinha feito isso de propósito, eu sabia. Ele sabia. Documentos do mês passado? Sério? Era só mais uma das formas dele de testar minha paciência. Como se não bastasse lidar com sua presença intimidadora e aquele olhar frio que me fazia sentir como uma funcionária dispensável, agora eu também tinha que carregar peso extra logo de manhã.Eu atravessava o lobby da Steele Medical Supplies, a empresa de vendas para hospitais onde eu trabalhava há anos, tentando equilibrar os documentos e o copo de café sem derramar nada. O som dos saltos ecoava pelo chão de mármore e, quando cheguei ao elevador, não precisei olhar para saber que alguns olhares estavam sobre mim. Todos conheciam Maximilian Steele. E todos sabiam que, de alguma forma, ele tinha um prazer sádico em me sobrecarregar.— Precisa de ajuda? — uma voz masculina perguntou.Olhei de lado e vi Daniel Reed, o melhor amigo de
Suspirei pesadamente e, antes que percebesse, já estava planejando formas sutis — e não tão sutis assim — de me vingar. Nada muito grave. Só o suficiente para que ele sentisse o peso do inferno que eu chamava de "meu humor ruim". Talvez trocar o açúcar do café dele por sal. Ou… quem sabe… adicionar algumas gotas de laxante?A ideia me fez sorrir. Imaginar Maximilian Steele, o todo-poderoso CEO, correndo para o banheiro no meio de uma reunião importante? Ah, isso era quase poético.— Charlotte Grant, você é um gênio.Mas, infelizmente, minha moral (e minha vontade de continuar empregada) ainda eram um obstáculo. Então, minha vingança teria que esperar.Pelo menos por enquanto.Com minha pequena vingança mental me dando um alívio temporário, finalmente cheguei ao restaurante. Escolhi uma mesa perto da janela e pedi um prato que não apenas me enchesse, mas também compensasse o estresse matinal.Enquanto esperava a comida, aproveitei para checar meu celular. Nenhuma mensagem importante, e
A reunião começou de maneira tensa, como eu já imaginava. Richard Donovan entrou na sala com sua equipe, a postura arrogante de sempre, como se a qualquer momento ele fosse começar a dar ordens em vez de negociar. O homem exalava poder, mas também tinha algo de irritante que me fazia querer ignorá-lo a todo custo. Max estava no seu melhor comportamento corporativo, mas eu sabia que ele não gostava da forma como Donovan tratava as coisas, como se tudo fosse simples, como se ele estivesse no controle o tempo todo.Nos cumprimentamos, e a assistente de Donovan começou a falar sobre o plano de vendas. Eu estava prestando atenção, mas ao mesmo tempo me perguntava o que ele realmente queria, e o que Max achava que deveria ser feito para que isso fosse fechado da forma mais vantajosa possível. Claro, a resposta para isso eu já sabia. Maximilian não se contentava com qualquer coisa; ele precisava de detalhes, de uma análise minuciosa, de uma visão que fosse mais além do que só números e proje
Maximilian ficou em silêncio por um instante, os olhos fixos em mim como se estivesse tentando processar o que acabara de acontecer. A tensão no ar era palpável, e eu me senti estranha, como se algo tivesse mudado entre nós. Mas, ao invés de um gesto de agradecimento, ele se levantou abruptamente da cadeira, seus olhos agora mais intensos e carregados de raiva.— Você não tinha que ter feito isso, Charlotte! — A voz dele cortou o ar, fria e venenosa. — Não era da sua conta. Eu não precisei da sua ajuda. Você se meteu onde não devia e, pior, foi completamente desrespeitosa!Eu recuei um passo, surpresa com a ferocidade das palavras. Max avançou um passo em minha direção, e pude ver a raiva queimando em seu olhar. Ele estava visivelmente irritado, seus músculos tensos como se estivesse pronto para explodir a qualquer momento.— Você se acha no direito de intervir e falar por mim? Eu sou perfeitamente capaz de lidar com essa situação sozinho, Charlotte. Não precisava da sua interferência
MaxO despertador soou estridente ao lado da minha cabeça, mas eu já estava acordado. A noite tinha sido longa e inquieta, marcada por um turbilhão de pensamentos que se recusavam a me deixar em paz. Pisquei algumas vezes, tentando afastar a sensação incômoda no peito, mas ela continuava lá. Algo dentro de mim estava errado. Algo que eu não queria admitir.Passei a mão pelo rosto, soltando um suspiro pesado antes de finalmente me levantar. A luz matinal entrava timidamente pelas frestas das cortinas, projetando sombras suaves pelo quarto. Caminhei até o banheiro e encarei meu reflexo no espelho. Eu parecia cansado, os traços tensos, como se a noite sem dormir tivesse cobrado seu preço. Mas não era apenas o cansaço. Era outra coisa. Algo que eu não queria nomear.Charlotte.As imagens da noite