Esta reunião não era como eu queria terminar o meu dia de trabalho. Eu olhei com enfado o Controller e para o meu pessoal administrativo. Isso estava se estendendo demais. Essa era a quinta reunião que eu participava hoje. Eu me sentia dentro de um purgatório enfurnado naquele escritório.
Um trabalhador forçado.
Comecei a rabiscar meu bloco de notas escutando Roger Willians me falando de uma melhor maneira de potencializar nossos lucros. Uma dor lancinante na cabeça me fez fechar os olhos por um momento e passei a mão neles.
Enxaqueca agora, não!
Se já não bastassem meu dia a dia corrido e a pressão que eu estava recebendo de meus pais para me casar novamente por causa da esterilidade de Jamile, enfrentá-la agora com questionamentos, era sair do purgatório e entrar no inferno.
Minha cabeça ainda latejava quando a reunião terminou. Olhei meu relógio, nove horas da noite. Fui até o bar da minha sala, agora silenciosa e enchi um copo de água e coloquei na boca um remédio para dor.
O fato de me casar novamente era uma necessidade. Filho único, dono de um grande patrimônio, eu precisava de um herdeiro. Isso estava me afligido há anos, muito mais a Jamile. Mas agora eu tinha que lidar com outro problema, Jamile não se conformava com o fato de eu ter que me casar novamente.
Arrependimento tardio!
Hoje mesmo, mandei um ramalhete de flores para ela, junto com uma joia. Esperava chegar em casa e encontrá-la mansinha, sem aquele costumeiro mau humor. Ultimamente não falávamos de outra coisa que não fosse meu segundo casamento.
Minha família ficou de escolher a minha noiva. Ela precisava ter todos os requisitos para estar ao meu lado. Saudável, educada, mansa, gentil, sincera e bonita.
Não sei se isso faria da minha vida um inferno. Administrar uma mulher, já não era tarefa fácil.
E agora, duas?
Eu constantemente era pressionado pelos meus pais para resolver esse nó na minha vida, então, eu não tinha muita saída. Mesmo porque, eu mesmo queria um filho que tivesse meu sangue. Queria fazer dele meu braço direito no mundo dos negócios.
Trabalhar tanto para que? Se não tinha para quem deixar minha herança?
Esses deviam ser meus pensamentos para me comprometer com esse novo casamento. Isso me animaria mais a lutar pelo patrimônio da família.
Meu lema sempre fora: "Tudo pelos negócios! ”
Sentei-me atrás da minha grande mesa de tampo de pedra das cores creme e dourado, cercado por pastas de relatórios e meus dois monitores.
Sempre fui muito organizado, mesmo louco para chegar em casa, tomar um banho e cair na cama, arrumei minha mesa, e algumas coisas guardei na gaveta.
Jamile tinha que estar dormindo quando eu chegasse! Por isso resolvi dar um tempo. Me inclinei na cadeira e passei os olhos por todo o meu escritório. Ele era espaçoso, com uma mesa de conferência para oito pessoas, carrinho de servir café mais adiante e um sofá perto de uma janela com vista para o Hyde Park.
Tudo isso além dessa enorme escrivaninha de pedra de granito, onde eu conduzia reuniões, entretinha clientes e assinava acordos multimilionários. Esse era o meu domínio. Desde os meus quinze anos eu trabalhei ao lado de meu pai, hoje aposentado.
Meu pai me passou esse grande legado, conduzir com braço de ferro os negócios da família. Nunca fui um playboy de vida mansa. Minha vida sempre foi muito dura. Da escola para o trabalho, do trabalho para casa. Um sobrevivente, um homem endurecido pelas batalhas do dia a dia. Treinado para colocar dever e disciplina acima de todas as outras virtudes.
Tenho uma vida social muito intensa, por causa dos negócios. Muito mais do que eu gostaria.
Minha primeira experiência com uma mulher foi aos dezoito anos. A partir desse dia, eu perdi a inibição e passei a sair com um par delas, sem amarras e sem compromissos.
Nada de jantares românticos, nada de dormir juntos, café da manhã na cama, flores no dia dos namorados, nada de amor eterno. Totalmente contra nossos costumes, por isso eu fora muito discreto em minhas saídas.
Meu pai no começo fez vistas grossas, mas quando completei a idade de vinte e cinco anos, ele deu um basta nessa situação e puxou as rédeas da minha vida.
Com o semblante sério me levantei e olhei através da janela que ia do chão ao teto com o horizonte de Londres. Uma linda vista da cidade iluminada. O céu negro estava cheio de estrelas, uma grande lua cheia amarela entre elas.
Meus pensamentos me levaram a conversa que tive com ele nesse dia:
— Chega uma hora em que um homem precisa criar juízo e se casar com uma moça que não tenha esses costumes mundanos.
—Pai, eu sinto que é muito cedo para me casar.
Meu pai suspirou.
—O casamento não é um cárcere, eu acredito que somará muito à sua felicidade.
Eu o fitei sério, sem entender que tipo de felicidade teria um homem preso a uma mulher só, sendo que ele poderia ter muitas em sua cama?
Gostava da minha liberdade e apreciava o sexo.
— Lamento papai, mas não concordo que eu esteja preparado para me casar.
O meu pai ignorou minhas palavras.
— Vivemos em um mundo moderno, mas sem o conformismo com ele. Você deve se comportar como nossos antepassados e se casar com uma jovem para produzir um filho, um herdeiro. — Meu pai disse em tom frio, como se tratasse de negócios. — Não veja como um sacrifício. Escolheremos uma moça para você do nosso povo, com todos os requisitos necessários para que ela te faça feliz.
— Pai. Não sei.
—O que tem contra o casamento? — Perguntou meu pai, tentando me entender.
—Não me sinto pronto. —Eu disse seco. — Não tenho nada contra a instituição do casamento. Mas creio que seria muito prematuro eu me casar agora.
— Reflita sobre o que eu lhe disse — pediu meu pai. — E não pense que não sei de seus casos com essas europeias. Não vou descansar até que se case. Falaremos sobre isso novamente.
Conclusão da história, eu me casei com Jamile. Um casamento arranjado para ter um herdeiro que nunca veio.
Eu aprumei meus ombros e ergui a cabeça.
Jamile era realmente bonita, fora escolhida a dedo por meu pai. Passou pelos exames pré-nupciais, mas que não garantiram a sua fertilidade.
Para Jamile o casamento fora um negócio muito vantajoso. Ela ganhava joias, roupas e qualquer merda que ela quisesse e isso a deixava feliz.
Adorava desfilar comigo nos jantares beneficentes, exibindo sua roupa de grife, suas joias.
Ela me amava sem todas as regalias?
Não acredito!
Não tínhamos afinidades, a única afinidade que tínhamos era o meu dinheiro e o prazer de gastá-lo.
Nunca enxerguei nela a vontade de ter filhos. Ela estava muito feliz com a vida que levava. Um dia, ela me disse que a desvantagem de ter um filho, era que ele estragaria sua silhueta, que ela ficaria com estrias, barriga e os seios caídos. Eu não fiquei surpreso com seu comentário.
Combinava bem com ela.
O desejo de engravidar só começou quando ela se sentiu pressionada pela minha família e ela passou a ser alvo de perguntas e críticas. Jamile não aguentava mais passar por tratamentos para engravidar, quando ela começou a engordar, com a aplicação de hormônios estimulantes, desistiu. Eu não via aonde ela estava engordando. Às vezes eu me perguntava se ela mentia para mim que estava fazendo o tratamento.
Sempre tive envolvido por um forte senso de justiça, mesmo porque nos meus costumes a primeira mulher tinha que concordar em eu ter uma segunda esposa.
Depois de uma conversa e nossos recursos esgotados, ela concordou. Assinamos um acordo com seu consentimento. Só que agora ela me infernizava com um arrependimento tardio.
Eu não podia mais voltar atrás, meu pai tinha selado um acordo com o tio da moça. Ela fora prometida para mim. A palavra de um homem árabe era tida como por escrito.
Meu pai não voltaria atrás.
Zafir Youseef XarifEla estava tagarelando enquanto eu dirigia para casa. Os quilômetros passavam lentamente, embora eu apertasse fundo o acelerador. Eu permaneci em silêncio enquanto Jamile comentava da festa que acabamos de sair, de final de ano, que dei para meu Staff. Ela então se irritou quandome perguntou algo e eu não lhe dei uma resposta.Eu estava lento, cansado, compareci a essa festa movido pela obrigação. Jamile furiosa virou o rosto para a janela. Recusei-me a deixá-la me afetar pelo seu temperamento.Ela não enxergava que eu andava um caco?Que eu mais queria era dormir?Eu andava ultimamente esgotado. Ela não via minhas olheiras? Como eu estava mais magro?Meu Deus,minha mente estava entretida em outros assuntos. Daqui a dois dias era meu casamento. Amanhã cedo eu viajar
KhadijaO suor frio escorreu na minha testa. Minhas pernas tremiam tanto que eu tive medo que elas não me sustentariam quando eu me levantasse daquele sofá. Titia estava ao meu lado, segurando a minha mão. O contrato estava sendo lido agora em uma sala cheias de testemunhas. Ela traduzia, mas eu não conseguia ouvir nada, pois tudo no meu corpo parecia doer, as lágrimas borravam minha visão e minhas costas estavam tensas.Cansada e desgastada era assim que me eu me sentia. Exausta. Nadando contra a maré, mas precisava seguir em frente. Respirei fundo! Penso enxugando as lágrimas. A maquiagem era à prova d'água, acho que estava mais para à prova de noiva amargurada.Eu era um descendente árabe que no máximo que eu falava e entendia da língua eram algumas expressões. Minha mãe inglesa teve uma grande influência sobre m
KhadijaCaminhei me sentindo dentro de um ritual de abate, onde o cordeiro seria sacrificado, no caso "eu".Meu destino?Unir-me a um homem que nunca vi na vida.Eu não o conheço.Estremeci pensando nisso. Minhas pernas quase falharam na breve caminhada até a porta em formato de arco, que foi logo aberta por uma das mulheres. Eu caminhei até ela como uma condenada, meus pés pesados como se estivessem presos em correntes, carregando duas bolas de chumbo.No momento que pisei na sala, eu o avistei. Ele era alto. Os cabelos grossos como carvão. Passei meus olhos pela sua calça social preta que envolvia suas pernas e acentuava sua estreita cintura. A camisa branca não era apertada, mas realçava seu corpo. O casaco preto e a gravata preta completavam o visual e emanava poder e sexo. Ele estava de perfil,
KhadijaO jardim estava banhado de sol naquele fim de tarde. Sereno, verde e dourado. Me afastei da janela e sentei na minha cama.Uma coisa eu tinha que reconhecer, nosso povo era muito amistoso. As mulheres, mesmo que não falassem minha língua, não sabiam o que fazer para eu me sentir feliz e confortável.Titia nem se deu ao trabalho de ficar comigo, estava aproveitando as despesas pagas pelo meu noivo, agora marido, e batendo perna na Medina.A porta se abriu e minha tia entrou no meu quarto, sorriu quando me viu. Tirando o lenço preto que usava na cabeça suspirou:—Allah! Aqui é tudo tão lindo. Essa casa, então, maravilhosa.—Gostei muito da tia de Zafir. Uma pessoa simples e prestativa. Tem uma casa tão grande e nem parece dona dela.Zilá se aproximou de mim com uma sacola na mão.—E dele? Vo
ZafirKhadija se afastou de mim e se enfiou no banheiro com algumas roupas nas mãos. Eu tirei a minha também e só coloquei uma calça de pijama. Logo minha mente me avisou para ter cautela, por isso coloquei também uma camiseta, cobrindo completamente meu corpo.Caminhei até a janela e pela vidraça pude ver a lua cheia. Uma coisa eu tinha, paciência. Casado há três anos com Jamile, eu adquiri convivendo com ela. Ouvi muitas palavras atravessadas em seus dias de mau humor por causa da maldita TPM, suas negativas ferozes quando eu a convidava a um jantar de negócios. Ela só queria sair para festas da alta sociedade. Minhas reuniões, ela não se interessava. Dizia que só haveria “conversas chatas".Eu sabia que meu casamento era um fracasso total, mas eu me acomodei e ela nunca cometeu um grave delito para que eu pudesse repudi&a
KhadijaDizem que ninguém se esquece da primeira vez que pisa em Paris. Eu seria uma delas....Encanto, espanto, surpresa, deslumbramento, alegria e prazer. Tudo isso ao lado de um homem maravilhoso....Às dez horas da noite descemos no Aeroporto Charles de Gaulle. Fomos até área de desembarque e pegamos nossas malas; uma minha, só com poucas roupas. Duas grandes de Zafir.Quando nos viramos, um senhor de meia idade, se aproximou dele.— Seigneur. Avez-vous fait un bon voyage?— Oui, merci. Charles. C'est ma femme, Kajira.Eu fitei a cena confusa. Quem era esse senhor?—Bienvenue, mademoiselle. —Ele se inclinou para mim.Eu sorri. Quando ele pegou nosso carrinho e se dirigiu para a saída, Zafir colocou sua mão na minha cintura.—Quem é esse senhor? Por que ele está levando nossas malas? —Eu
ZafirEu me inclinei e beijei suavemente ao longo de sua mandíbula e logo abaixo da orelha.Ela cheirava tão bem, um perfume doce, como jasmim e rosas. Tão diferente... khara! (Merda!) Não quero pensar em Jamile agora.Voltei a beijar-lhe suavementea concha de sua orelha.—Eu não vou pressioná-la para qualquer coisa. —Sussurrei em seu ouvido, sentindo como ela estava nervosa. Então eu a encarei com as pupilas dilatadas de desejo. Torcendo para ela se entregar de coração e alma. —Não quero que faça amor comigo por obrigação ou gratidão.Ela me olhava afogueada, sua respiração agitada soprando em meu rosto.—Não, eu te desejo. Eu quero isso.Eu sorri de satisfação, retornei com beijos leves por todo seu pescoço antes de chegar a sua boca. Be
KhadijaAqui em Paris, gula não é pecado nem algo imperdoável. Aliás, era um rito indispensável que nos leva ao paraíso.Saímos para almoçar fora. Fomos na Brasserie Balzar (49 Rue des Ecoles 75005. Os mâitres e garçons foram muito atenciosos e alegres, prontos a sugerir o prato do dia. O cardápio foi maravilhoso a experiência de comeraile de raie française façon grenobloise, pommes vapeur,que eraarraia com muita manteiga e alcaparras acompanhada com batatas cozidas. Delicioso, como um manjar dos deuses. Eu sei que muito tinha a ver com o lugar que estávamos, segundo Zafir, era o prato predileto do Johnny Depp.Aqui em Paris, os turistas compravam desenfreadamente. Os franceses olhavam tudo com certo desdém para as imensas sacolas que todos carregavam. E eu e Zafir éramos um desses