Louca.
De uma lista longa de adjetivos que podem ser utilizados para descrever Nicole Santoro, esse, com certeza, está no topo. Caralho, não consigo deixar de pensar em como ela sempre consegue me surpreender. Para o bem ou para o mal, consegue.
A sorte é que sou rápido para aparar seu corpo mesmo segurando um buquê em uma mão e o maldito cartão em outra. Deixo os objetos no chão mesmo e seguro a mulher minúscula, apoiando as duas mãos nas suas costas e erguendo-a. Solto um xingamento baixo, porque os funcionários começam a cochichar entre si ao presenciarem a cena.
Querendo fugir das fofocas, levo Nicole até a minha sala e empurro a porta com o ombro para fechá-la. Coloco a mulher miúda deitada no sofá de couro marrom que tem no canto. Raramente o uso, porque não costumo relaxar muito no escritório, mas pelo menos vai ser útil agora.
Cruzo os braços em frente ao corpo, enquanto aguardo sua farsa se encerrar, parando para observar como a maluca é bonita pra caralho. Já tive minha cota de mulheres ao longo dos meus quarenta anos, mas confesso que não me lembro de ter conhecido alguém como ela. Não somente pela aparência estonteante, e sim pelo combo. Nicole é, sim, linda e gostosa com seus um metro e meio, mas não é só isso.
Não tenho tempo de pensar demais nas suas qualidades quando a vejo abrir um olho de leve, como se o truque fosse passar despercebido por mim. Tapo a boca para prender o riso, porque, caralho, como é insana. Ela solta um suspiro e me olha, piscando devagar, colocando a mão na cabeça.
— O que… O que aconteceu? — pergunta, fingindo uma falta de memória.
— Você deu um show, senhorita Santoro. Ainda bem que não escolheu a carreira de atriz como a sua amiga, porque você iria passar fome — provoco, sabendo como ela sempre cai nas minhas frases utilizadas para causar suas reações explosivas.
— Do que está falando? Eu… desmaiei?
Observo-a se sentar no sofá, os cabelos longos batendo nas costas mesmo presos em um rabo de cavalo que sempre usa para trabalhar. Fantasio por um tempo como seria a textura deles, como ficariam enrolados nos meus dedos enquanto eu os puxasse.
— Preciso ir para casa, senhor Salvatore. Não estou me sentindo muito bem. Acho que foi o estresse do dia. Eu deveria ganhar uns dias de folga, sabe? Tem me explorado muito nas últimas semanas. Ou melhor, nos últimos anos!
— Não é assim que exploro uma mulher, senhorita.
Os olhos castanho-esverdeados se arregalam de surpresa, mas não dou tempo para que ela reaja muito, apenas me afasto dela e volto para a minha cadeira, ignorando a vontade de passar o dedo pelos lábios cheios, que estão sempre prontos para soltarem a primeira acidez que ela pensa.
Aprendi algumas coisas sobre Nicole no decorrer dos anos, desde que começou a trabalhar para mim. Costumo ser uma pessoa bastante observadora, essa é uma qualidade importante para os negócios, mas com ela… Sei mais do que deveria saber sobre uma simples funcionária.
Sei como é resmungona e teimosa, principalmente quando envolve o meu nome. Ela nem tenta esconder mais quando me xinga sempre que digo ou faço algo que a desagrada. Se fosse qualquer outra funcionária, ela não estaria mais aqui, porque não minto quando digo que seu comportamento extrapola todos os limites profissionais quando diz respeito a mim.
Sei como sua vida amorosa é bastante movimentada e como ela não parece durar com nenhum deles. Prova disso são os milhares de presentes baratos que recebe e j**a fora.
Sei como ela ama suas amigas como se fossem da sua família e como seria capaz de matar e morrer por elas. Inclusive, Nicole passou um bom tempo traumatizada com o episódio de sequestro dela e das suas amigas, que aconteceu há mais de um ano. Mesmo que tenha tentado se fazer de forte, sei como ficou assustada. Dei alguns dias de folga para ela, mas nada conseguiu segurar a mulher furacão em casa por muito tempo.
— Por que está me olhando assim? Não vou desmaiar de novo — ela fala, olhando para mim, ainda sentada no sofá, bem tranquila.
— Eu sei que não. Seus desmaios são… convenientes.
Nicole solta um pigarro e limpa uma sujeira imaginária no ombro, tentando disfarçar. Como se eu fosse idiota para acreditar em um desmaio falso. Quantos anos tem para se utilizar de uma tentativa tão infantil de fugir das suas responsabilidades? Sei que tem vinte e cinco, mas na maioria dos dias, não age como uma pessoa dessa idade.
— Pode ir, senhorita Santoro. Não me faça mudar de ideia sobre te liberar mais cedo.
— Mais cedo? Meu horário é até as seis, e olha só! São seis horas!
Não vem com esse papo de chefe bonzinho que isso não cola comigo.
A miniatura de mulher se levanta, sem dificuldade nenhuma em se equilibrar nos saltos imensos que usa para compensar a baixa estatura. Ela bufa, resmunga algo que não consigo ouvir e sai da minha sala sem dizer mais nada. Solto a risada que estava prendendo e passo as mãos pelo meu rosto, tentando, mais uma vez, entender essa dinâmica que há entre nós.
Ela me odeia, e eu finjo odiá-la de volta.
Não a odeio. Não consigo.
Ok, talvez eu a odeie um pouco quando me pega em um péssimo dia, quando o estresse já está nas alturas e tenho que lidar com suas provocações. Mas não dura muito. Posso dizer que a odeio na dose certa. É até melhor assim, porque não sei o que seria de mim se isso não fosse dessa forma.
Provocações à parte, gosto de ter Nicole por perto. Ela é extremamente inteligente, eficiente e habilidosa. Tirando o fato de que é uma tentação do caralho ter que olhar todo dia para as pernas torneadas, expostas pelos vestidos e saias apertadas que usa, eu gosto. Prefiro quando usa os terninhos sociais coloridos, porque tornam minha vida um pouco mais fácil.
Tento tirar a baixinha da minha cabeça e foco no que faço melhor: trabalho. Trabalho por várias horas, como sempre perdendo o horário de ir embora. Quando saio da empresa, já passa das onze da noite. É impressionante como sempre parece ficar coisa para trás, não importa quanto tempo eu trabalhe. Às vezes, ainda chego em casa e respondo alguns e-mails que chegam durante a noite.Vou até a garagem e encontro meu motorista dormindo dentro do carro, apenas esperando. Bato na janela, e Lionel se ajeita, limpando a baba imaginária do canto da boca. Ele sai do carro e abre a porta de trás para mim, pedindo desculpas com um sorriso sem graça. Não o culpo.Enquanto o homem começa a dirigir em direção à minha casa, respondo algumas mensagens que recebi da minha mãe. Já sei que ela vai me encher de bronca pela demora, porque foi enviada de manhã, mas antes tarde do que nunca. Respondo ao meu irmão caçula também, que me chama mais uma vez para que eu saia com ele. Nunca aceito, nem sei porque Tyl
Furo a fila de pessoas reclamando, evitando que esbarrem em mim, e vejo o segurança me olhar desconfiado.— Para o final da fila, senhor!— Vim buscar meu irmão, ele está dando trabalho aí dentro — minto com facilidade, e ele coça a barba, pensativo. — Sou Valentin Salvatore e posso…— O dono da LDrinks? Por que não falou antes? Eu amo as suas bebidas, cara. Vamos, entre!Surpreso por um cara no meio do nada ter me reconhecido, eu sorrio em agradecimento e entro. Não é como se todo mundo no país me conhecesse por aí. A empresa só tem dez anos, é relativamente nova, tem sua fama, mas não sou famoso. Apareço vez ou outra em capas de revista e em divulgações da marca por aí, apesar de achar uma grande baboseira ter que usar a minha imagem como marketing.Xingo alto quando vejo que o lugar tem mais gente do que imaginei e me meto no meio dos corpos suados, buscando alguma área VIP, porque tenho certeza de que é nela que meu irmão está metido. Descubro que acertei no palpite quando o vejo
Henry se curva para falar alguma coisa no meu ouvido, mas eu me distraio com a visão de Valentin conversando com uma mulher monumental. Ela é da altura dele e está bem perto, falando algo no seu ouvido com um sorriso fácil. E caramba! Ele está sorrindo para ela! Nunca vi esse sorriso antes.Valentin Salvatore está em busca da sua caça, e não sei como me sinto em presenciar uma coisa tão íntima do meu chefe. Eu não deveria ter que ver isso, droga. Pelo visto, o que ele diz para a peituda ruiva a agrada demais porque ela faz questão de esfregar os peitões nele, que não a afasta.— Tudo bem por você? — Henry fala mais alto no meu ouvido, e eu volto à realidade, dando-me conta de que não escutei nadinha do que ele falou.— Desculpe, eu me distraí. — Com meu chefe flertando, completo em pensamento. — Vamos fazer o seguinte. Não estou no meu melhor momento agora, por que não me pega meu número e a gente combina algo depois?Ele não parece muito chateado com a ideia e não demora a tirar o ce
— Achei que estivesse no banheiro — diz, prendendo o riso, e se vira para meu chefe. — Olá, se lembra de mim? Sou Natasha.— Oi, Natasha. Claro que me lembro. Como está? — Ele é um poço de simpatia com minha amiga, conversando amenidades, e vejo como ela cai na lábia dele.Queria que tivesse que conviver com Valentin diariamente para ver se ia ficar sorrindo feito boba assim.— Amorzinho, eu preciso ir. Não queria acabar nossa noite mais cedo, mas Amanda está enjoadinha. Benjamin me ligou agora para dizer que ela não consegue dormir.— Tudo bem, Vamos. Será que não é bom levá-la ao médico?Esqueço-me de Valentin, ainda parado mais perto do que o necessário, preocupada com a minha pequenina. É um ser humano tão frágil que demorei a pegá-la no colo, com medo de quebrar. Sempre me preocupo com qualquer resfriado que ela pega.— Não se preocupe. Você pode ficar, se for o que quer… Está sóbria?— Estou, mas eu vou com você. Não tenho por que ficar aqui.Quando digo isso, olho direto para V
— Eu quero. Estou mesmo merecendo um aumento. Aquele homem me deve — brinco, e ele sacode a cabeça, sabendo que não vai conseguir tirar isso da minha cabeça.Já é algo que penso há um tempo, mas preciso me planejar para encaixar mais essa despesa na minha vida. Vou precisar abrir mão de alguma coisa, mas não ligo se isso significar deixar meu pai menos sobrecarregado.Quando tivemos o diagnóstico, foi um baque para todos nós, claro. Mamãe tinha alguns sintomas com frequência, que sempre justificava com o sedentarismo, com a preguiça que tinha de exercícios. Se ela subia poucos degraus de escada e ficava extremamente cansada, dizia que não estava acostumada. Se sentia formigamentos durante um dia inteiro nas pernas, era porque dormiu em uma posição ruim.Foi difícil convencê-la de que não era normal ter sintomas como esses por um período longo. A sorte foi que ela tem dois teimosos ao seu redor, e eu e papai não desistimos até levá-la ao médico.Após ser encaminhada para um neurologist
Há coisas na vida que eu gostaria de não me preocupar.Não me leve a mal, não sou uma má pessoa ou sem escrúpulos, mas sei reconhecer o limite das coisas. Sei que não é normal que eu esteja preocupado com minha secretária nesse nível. Fiquei desfocado nos últimos dias, pensando no que diabos aconteceu com ela para ter pedido essa folga com tanta urgência. Apesar de Nicole ter seus maus momentos, ela é uma ótima funcionária e nunca me deixou na mão antes.Foram dias insanos, em que percebi que ela é a pessoa que me traz de volta à realidade, a única capaz de me impedir de mergulhar no trabalho ao ponto de me esquecer de tudo. Prova disso é que perdi uma reunião importante. Não porque eu não sabia da existência, eu sabia, mas perdi a porra da noção da hora. Quando vi, já tinha se passado tempo demais.Nicole me mantém atento e me faz aterrissar quando minha mente se desliga por tempo demais para focar no que tenho que fazer.Espero muito que essa mulher volte hoje.Não que eu esteja olh
Os olhos, mais verdes do que castanhos agora, me encaram com pleno choque. Ela abre e fecha a boca, encarando os demais funcionários com vergonha.— Ela não é a sua secretária? O que teria para comentar? — Pierre pergunta, espantado com minha fala.— E o que tem a ver? Ela é a minha secretária, e eu quero saber o que ela tem para dizer a respeito da sua apresentação. Além disso, o currículo dela é tão bom quanto o seu, Bones. Na verdade, eu diria que até melhor. Sabia que ela já ocupou o mesmo cargo que o seu na nossa principal concorrente?Se antes Nicole estava chocada, agora sua expressão é impagável. Poucas vezes a vi tão sem fala quanto neste momento. Os olhos bonitos me encaram como se quisessem me matar, e eu gosto dessa reação. Posso lidar com ela me odiando por pegá-la de surpresa. Não posso lidar com a sua tristeza.O restante da equipe também está paralisado, estudando Nicole com mais atenção. Como se só agora tivessem notado que ela estava aqui. Pierre tenta conter a expre
Precisei recorrer à minha melhor amiga para não surtar mais ainda. Veja bem, minha vida não está fácil nos últimos tempos. Tenho várias coisas para me preocupar, para lidar, para enfrentar.A última semana foi uma verdadeira provação para a minha saúde mental, com todo o lance com a minha mãe e com as minhas finanças, então a última coisa que preciso é de Valentin Salvatore tentando acabar com o que resta da minha vida.— Sinto vontade de matar aquele homem, Nat! — exclamo para minha melhor amiga, enquanto vejo que a safada prende o riso ao invés de me apoiar no meu discurso de ódio. — Estou vendo esse sorrisinho aí, Natasha Forbs! Estou falando sério, como pode uma pessoa tentar te foder assim?— Oh, amorzinho… Não estou rindo de você. Não exatamente, mas é engraçada essa sua situação com seu chefe. Tem anos que reclama desse homem, mas teima em ficar lá.— Eu sei, eu sei! Não quero soluções para os meus problemas, só quero reclamar! Me deixa! — resmungo, tentando me distrair com a p