Numa ampla suíte da cobertura do hotel Mercure Villa Romanazzi Carducci Bari, uma mulher jovem se remexeu na cama. A cabeça de Luísa latejava enquanto massageava as têmporas e lutava para abrir os olhos. Com esforço, abriu as pálpebras e, ao virar a cabeça, estreitou os olhos para enxergar o homem sentado na poltrona. Assustada, ergueu o torso e puxou o lençol para cobrir o corpo.
“Cadê a minha roupa?” pensou, engolindo em seco ao fitar Paolo novamente. Ele usava apenas uma calça de moletom com o cós abaixo da cintura. “O que foi que eu fiz?” Forçando a memória, ela tentou recordar o que ocorreu no bar após a última música que tocou, mas sua mente estava fragmentada.
O homem a observava com uma postura fria, sem qualquer emoção aparente.
Paolo se levantou, revelando um físico impecável, com ombros largos e o abdômen trincado por músculos. Quando chegou mais perto, ela sentiu o cheiro da fragrância ambarada. A proximidade fazia o seu coração bater mais forte.
— Como cheguei aqui? — A voz de Luísa saiu trêmula quando indagou.
— Eu te trouxe para esta suíte. Você estava bêbada demais para andar por aí sozinha.
Tentando entender a situação, ela olhou ao redor, procurando uma saída. Quando tentou sair da cama, ele foi mais rápido. Paolo avançou e segurou o lençol, segurando-a na cama.
— Sabe o que é gratidão? — As palavras saíram num tom rouco e insinuante. — Existem vários modos de agradecer...
Sem desviar o olhar, ele apoiou as mãos ao lado de seu rosto. O perfume provocante e a intensidade nos olhos dele pareciam hipnotizá-la. Sentia-se dividida entre a atração e a indignação.
— Não devia ter vindo para cá, senhor! — Murmurou, empurrando-o após apoiar a mão no peitoral do capo.
Paolo ainda tinha esperança de que ela se recordasse, mas Luísa continuava a tratá-lo como um estranho.
— Claro que podemos — retrucou, tocando de leve o seu lábio inferior;
— Não! Tenho um filho.
— Você me contou ontem… — Os lábios carnudos percorriam por seu rosto.
— Sou casada e fiel ao meu marido. — Luísa enfatizou. — Eu estava bêbada e não devia ter passado a noite com o senhor.
A reação dele foi imediata. Com uma expressão sombria, Paolo se afastou, saltou da cama e atravessou o quarto para pegar algo na cômoda. Retornou com um papel na mão.
— O que é isso? — perguntou, intrigada.
— Um contrato — explicou. — A partir de hoje, você vai trabalhar para mim. Vou te ajudar a promover o seu trabalho e fazer de você uma pianista conhecida pelo mundo.
— Não, eu não posso. Preciso cuidar da casa, do meu marido e do meu filho. — Luísa estava habituada às tarefas inculcadas em seu cotidiano.
— Prefere continuar cuidando de um marido que trai você! — Paolo disparou, revoltado.
— Como o senhor sabe?
— A cidade inteira sabe que sua meia-irmã é amante do seu marido.
Aquilo era mais humilhante do que imaginava. Luísa puxou o lençol, cobrindo o rosto.
— Assine o contrato e eu vou te dar tudo o que você quiser.
— Não, não vou ser sua pianista. — Recusou-se com veemência. — O senhor viu que eu estava bêbada e me trouxe para cá só para se aproveitar de mim.
Na verdade, Luísa havia vomitado na própria roupa enquanto ele a levava para o hotel na noite anterior. Paolo a despiu e ajudou a tomar um banho antes de colocá-la na cama. Ele chegou a acariciar a pele macia do rosto de Luísa enquanto se lembrava da garota assustada com quem ele fez amor há cinco anos. Embora a lembrança o excitasse, ele a cobriu e afastou-se para não ficar tentado.
O silêncio durou mais do que o esperado. Ultrajada, Luísa se arrastou para fora da cama até pôr os pés no chão. Ela enrolou o lençol branco em volta do corpo enquanto ele continuava calado, observando-a.
— Não vou desistir de você!
— Juro que vou fazer uma denúncia na polícia se o senhor continuar me seguindo. — Ousadamente, ela projetou o queixo.
— Nunca mais me ameace outra vez! Tu capisci? — As pontas dos dedos do homem furioso afundaram nas suas bochecha quando ele segurou o seu rosto com apenas uma mão. — Vá embora! — Soltou o seu rosto e saiu de perto. — Não quero te ver aqui quando eu voltar. — Gritou ele.
As pisadas duras de Paolo ecoaram pelo quarto até que Luísa escutou a porta batendo com força. Sem ter o que vestir, ela pegou um sobretudo masculino longo, que estava pendurado em um dos ganchos no hall de entrada próximo à saída. O tecido era grande o suficiente para cobrir seu corpo. Com pressa, ela saiu antes que ele retornasse.
Na calçada de frente para o hotel, ela fez sinal para o táxi e deu o endereço da casa de sua sogra para o motorista. A sua mente não parava de pensar naquele homem alto e de ombros largos…
“Preciso esquecer ele” fez a exigência para si em pensamentos durante o trajeto pelo coração pulsante da cidade de Bari. Quase dez minutos depois, ela desceu do táxi.
— Hei, pague a corrida. — O motorista com traços do oriente médio exigiu.
— Espere um minuto, eu já volto.
Quando chegou à casa da sogra, Luísa pediu o valor da corrida emprestado. A idosa franziu o cenho enrugado ao pegar o valor que escondia embaixo de uma estatueta na estante e, então, deu para a Luísa.
— Quero esse dinheiro de volta na próxima semana. — Advertiu a nora quando entregou a quantia com desconfiança.
— Vou devolver, senhora Larusso — Tentando disfarçar o embaraço, Luísa perguntou. — Onde está o Enzo?
— Marcos passou aqui ontem e levou ele para casa. — Após ouvir a sogra dizer isso, Luísa saiu correndo.
— Hei, pague a corrida, caloteira! — Gritou o homem que dirigiu até alcançar a passageira fujona.
Bufando, Luísa parou e deu o dinheiro para o homem. Ela estava tão nervosa que nem mesmo pegou o troco. Logo, ela retomou o seu caminho. O peso no bolso direito do casaco tornou-se mais perceptível a cada passo. Quando chegou à casa, cruzou a porta e pegou o filho no colo assim que o viu.
— Mamãe, pensei que tinha ido embora! — O garotinho disse chorando.
— Estou aqui, meu anjo. Nunca vou te deixar.
O olhar tenebroso de Marcos pairou sobre a esposa quando ele apareceu na sala.
— Onde passou a noite? — Desconfiado, ele inquiriu ao notar o sobretudo masculino que ela usava.
— Não te interessa, Marcos — rebateu sem dar espaços para mais perguntas.
Com cuidado, ela colocou o menino sobre o sofá e, então, tornou a encarar o marido.
— Passou a noite com o seu amante?
— Você não tem direito de me cobrar nada depois do que fez. — Luísa continuou sustentando o olhar dele quando declarou.
— Ora, sua rameira! — Ele avançou e desferiu um murro com o punho cerrado.
Sentindo-se um pouco tonta, Luísa se desequilibrou e caiu no sofá. Ela ainda estava desnorteada quando sentiu os dedos dele emaranhado em seus cabelos.
— Com quem você passou a noite? — Gotas de salivas saíam da boca enquanto ele a interrogava.
— Você não pode fazer isso com a mamãe. — O pequeno Enzo correu e mordeu o braço de Marcos. — Solte a minha mamãe.
Compelido pela raiva que fervilhava em seu sangue, ele lançou o menino no outro lado da sala. Enzo sentou e colocou a mãozinha na cabeça, chorando.
— Nunca mais você vai me desrespeitar. — Foi na direção do garotinho assustado.
Ao sentir o metal que estava pesando no bolso, Luísa sacou a arma e apontou para o marido. Colocando-se na frente, ela protegeu o menino como uma leoa defende sua cria.
— Afaste-se do meu filho. — Luísa ordenou, sem saber se aquele treco estava carregado.
Marcos titubeou por um instante, mas logo avançou para desarmá-la. Durante a luta, um disparo ecoou pela sala e, então, ele cambaleou, tocando no ferimento causado por Luísa.
Inerte, Luísa olhava para o líquido vermelho que escorria em suas mãos.Um misto de horror e incredulidade a consumia enquanto seu coração pulsava em um ritmo desenfreado. A visão do sangue parecia distorcer o tempo, e pensamentos confusos atropelavam-se em sua mente: “Oh, Deus, o que foi que eu fiz?” Seus dedos tremiam, incapazes de conter o choque que dominava seu corpo. Atordoada, não acreditava que tinha sido capaz de usar aquilo. Tremendo, Luísa colocou a pistola sobre a mesinha de centro, enquanto Marcos gemia de dor no outro sofá. Seus movimentos eram hesitantes, a respiração descompassada denunciava o estado de choque.— Vocês estão bem? — Uma vizinha gritou do outro lado da porta. — Não sei o que está acontecendo, mas eu já chamei a polícia!Sem experiência, Luísa permanecia estática, incapaz de processar a gravidade do momento. Seus pensamentos giravam em um redemoinho de confusão e medo: “O que devo fazer agora?” O som dos gritos parecia distante, abafado pelo pulsar intens
Ao entardecer, uma policial chamou pelo nome de Luísa, ordenando que ela se juntasse às outras detentas. O grupo foi conduzido para a sala de visitas, um espaço simples, mas funcional, com mesas alinhadas em fileiras. Luísa caminhou hesitante, os olhos varrendo o ambiente em busca de quem poderia estar ali para vê-la.— Vá logo! — disse a policial, empurrando-a pelas costas para apressá-la.Seus ombros estavam tensos, e ela apertava as mãos, tentando conter a ansiedade que lhe apertava o peito. Ainda assim, reuniu forças e continuou andando, com o olhar fixo no chão. Quando finalmente ergueu o olhar, encontrou Fiorella sentada à sua frente. O sorriso arrogante que curvava os lábios da mulher acendeu uma raiva intensa em Luísa. — Olá, irmãzinha! — proferiu Fiorella, a voz transbordando sarcasmo enquanto se inclinava para frente com o olhar desafiador.Luísa semicerrou os olhos, cruzando os braços como se tentasse conter a revolta que subia pelo peito.— O que você faz aqui, Fiorella?
Quando Paolo ameaçou sair do carro, Luísa recuou rapidamente. Seu tamanho reduzido fazia com que o sobretudo dele parecesse um vestido em seu corpo franzino. Ele jamais imaginou que um dia gostaria de ver uma mulher usando sua roupa daquela maneira.— Você quer voltar para a prisão? — indagou em tom seco, quase brusco.A ameaça velada a fez parar imediatamente, os ombros tensos e o olhar hesitante denunciavam sua relutância. Respirou fundo, como se tentasse reunir coragem, mas permaneceu imóvel, o medo evidente em sua postura retraída. A experiência de uma noite na cadeia aparentemente não havia sido tão suportável quanto ela talvez tivesse previsto.— Entre logo! — ordenou entre dentes, esforçando-se para conter a raiva e não deixar que seu estresse explodisse sobre ela.Sem replicar, ela se acomodou na poltrona. Moveu-se um pouco para o lado, criando mais espaço entre os dois, e suspirou profundamente, exausta. Manteve o olhar fixo no chão.Ele observou o rosto amedrontado dela e, e
— Claro que vou! — Don Morano finalmente quebrou o gelo do silêncio.Enquanto o motorista conduzia o carro pelas avenidas movimentadas, Paolo continuou olhando para ela.— Não! — Luísa respondeu prontamente, quase em um sobressalto. — Só quero te lembrar de que você está me devendo.— O quê?— Paguei a sua fiança, Luísa… — Ele salientou. — Você foi presa por porte ilegal de arma e por tentativa de assassinato. Esqueceu?Ao se dar conta, ela apertou os lábios. Enquanto isso, os olhos dele examinavam cada detalhe das marcas deixadas pela violência de seu marido. — Você pode trabalhar para mim… — Paolo deixou escapar. — E eu posso dar uma lição no maledetto que te agrediu.Meia aturdida, Luísa começou a alisar as articulações dos dedos de forma metódica, como se isso pudesse acalmá-la. — Não será necessário, senhor. — A sua voz estava incrivelmente serena quando o rejeitou. — Vou arrumar o dinheiro para lhe pagar. Prometo.A tranquilidade dela o desarmou momentaneamente. Ele se pergun
Durante a noite, o sono foi constantemente interrompido pela preocupação de que algo pudesse ser roubado. A cada ruído vindo da rua ou das paredes finas do abrigo improvisado, Luísa se sobressaltava, temendo que alguém pudesse invadir seu espaço.Enquanto o cansaço físico a puxava para a inconsciência, sua mente se recusava a descansar. Pensava no filho, nas decisões que a levaram até aquele momento, e em como conseguiria reverter sua situação. Cada pensamento era uma âncora que a mantinha acordada. Ela mal conseguia pensar em outra coisa senão no filho.Na manhã seguinte, Luísa despertou antes do sol. O seu coração inquieto continuava pulsando em ritmo acelerado. Ela se levantou da cama improvisada, calçou os sapatos desgastados e apanhou a bolsa que continha seus poucos pertences. Do lado de fora, ergueu os olhos ao céu e viu as nuvens cinzentas encobrindo o horizonte. O ar estava denso e frio, prenunciando um temporal. A escola de Enzo ficava a algumas quadras dali, por ruas estrei
Luísa permaneceu deitada no chão frio, observando os pequenos feixes de luz que atravessavam as frestas da cama. Finalmente, os passos se afastaram, diminuindo gradualmente até desaparecerem no corredor. Por um momento, Luísa sentiu o coração ainda pulsar descompassado, como se aguardasse um som inesperado que pudesse desfazer sua precária sensação de segurança. Sua mente se enchia de perguntas: O que Fiorella estava fazendo no quarto de seu filho? E por que ela estava falando com o tio do senhor Morano? Inspirou profundamente, tentando acalmar o tremor em suas mãos enquanto reunia coragem para sair do esconderijo. Luísa aguardou mais alguns segundos, contando mentalmente para se certificar de que Fiorella não voltaria. Com extremo cuidado, rastejou para fora debaixo da cama. Seus joelhos doíam, mas ignorou o desconforto enquanto se levantava devagar. Abriu a janela com movimentos deliberados, evitando qualquer ruído, saltou para a parte de trás da casa, aterrissando com um leve impa
Luísa sentiu as pernas bambearem, mas manteve a compostura diante de Don Morano. Os seus olhos piscavam rápido enquanto absorviam a imponência daquele homem. Algo na expressão dele parecia familiar, mas ela não conseguia identificar o motivo. — Desculpe, senhor Morano! — Não suporto atrasos… — Don Morano reclamou com veemência. — Vou ligar para sua supervisora e… — Por favor, não faça isso, senhor. Hoje é o meu primeiro dia e eu preciso desse trabalho. Paolo a observou com intensidade e, depois de um momento de silêncio, ele deu um passo para o lado, permitindo sua entrada. Luísa passou por ele, sentindo o olhar cravado em suas costas. — Prefere fazer faxina a tocar piano? — Ele a julgava com o olhar enquanto inquiria. — É um trabalho justo, senhor Morano! — Se aceitasse a minha proposta, eu… — Já disse que não quero — deu a resposta antes que ele acabasse de falar. Don Paolo caminhou até a porta do escritório e girou a chave, trancando-a com um estalo seco. Ele voltou a ol
O sabor da boca de Luísa era suave, com um toque refrescante de menta, e sua pele exalava um perfume delicado que envolvia o mafioso por completo. Seus lábios se entreabriram lentamente, permitindo que as línguas se encontrassem em um gesto de entrega. Paolo afastou-se ligeiramente, suavizando os beijos, enquanto a barba roçava com ternura na base do seu pescoço. Ele a soltou com relutância, permanecendo ao seu lado, ainda sentindo o calor que envolvia os seus corpos dentro daquele escritório. — O senhor não devia ter feito isso. — Chateada, ela replicou. — Vim aqui para fazer a faxina. — Foi só um beijo! — Ele retrucou. — É melhor eu sair daqui… — Luísa tentou passar por ele, mas Don Morano era bem mais forte. — Quer ser demitida no seu primeiro dia no trabalho? — Ele ressaltou num tom ameaçador. — Não, senhor! — Ainda estava atordoada com o beijo roubado quando sussurrou a resposta. Paolo ajeitou a gravata e endireitou os ombros. Teve um breve vislumbre de seu rosto e de seu