03

MAYSUN

Acordo em um sobressalto ao ouvir os gritos da minha mãe. Ainda meia sonolenta, me levanto, indo em direção ao som da sua voz. A cada passo dado, começo a sentir um calafrio percorrer todo o meu corpo, uma sensação ruim paira sobre mim, ao me aproximar do local de onde sua voz está vindo. Vejo a porta do quarto do meu irmão aberta, em passos largos adentro o ambiente, e no momento que meus olhos ficam fixos na imagem a minha frente, sinto o meu coração bater em um ritmo frenético. Minha garganta se fecha ao ver o meu irmão totalmente imóvel no chão, enquanto meus pais tentam desesperadamente reanimá-lo sem obter nenhuma reposta. Vejo meu pai pegá-lo em seus braços, indo em direção à porta. Atordoada por não saber o que de fato está acontecendo, começo a ir na mesma direção em que eles vão. Minha mãe logo abre a porta de entrada, e antes que minhas pernas se movessem para deixar o cômodo, sua voz ecoa no ambiente.

— May, preciso que você fique aqui e termine de organizar as roupas. — Mesmo não gostando da ideia de ficar sozinha em casa, sem saber o que meu irmão têm, me lembro que precisamos entregar as roupas ainda hoje, pois amanhã vence o aluguel e o dono jamais deixará passar um dia após o prazo.

Após dizer aos meus pais que cuidaria de tudo, caminho até a porta e fico os observando até o momento que eles somem do meu campo de visão. Com os pensamentos voltados no que minha mãe pediu para fazer, fecho a porta e em seguida começo a organizar todas as roupas. O medo e angustia estão me consumindo por dentro.

Acabo por perder a noção do tempo transcorrido. Além de cuidar das roupas, limpo toda a casa e preparo a comida. Deixo a cozinha e adentro a sala, caminhando até a janela. O vento frio passa em volta do meu corpo, tenho uma sensação como se algo está me perseguindo, me vigiando. Olho para a vista além da janela, mas nenhum sinal dos meus pais. Assim que dou o primeiro passo, ouço uma batida dirigida a porta. Atordoada, caminho em direção a mesma e ao abri-lá, meus olhos se negam a acreditar na imagem a minha frente.

Meus olhos permanece fixos no homem parado em frente a minha casa, meuIs pulmões estão apertados, tanto que não consigo se quer inalar o ar corretamente. Meu pulso está batendo tão forte que vejo uma sombra negra a minha frente, e assim que sua voz se faz presente no ambiente, o medo cru e agudo arranha o meu peito ao ouvir suas palavras.

— Maysum Wehbe, era você mesma que eu estava procurando.

*******!!!!!!!!!****!!

Com os olhos fixos na imagem a minha frente, várias perguntas se fazem presentes em minha mente, mas a que mais me deixa inquieta, é: como esse homem sabe o meu nome e por qual motivo está em minha casa? Por mais que eu tente, não consigo me mexer e nem desviar os meus olhos da figura imponente que está com seu olhar cravado em mim e em meu corpo. O silêncio predomina o ambiente, assim como as imagens dele com o chicote nas mãos passam como flashes a minha frente. Os gritos daquele homem sendo torturado ecoa em minha cabeça, e ao lembrar do sorriso de satisfação que esse desconhecido tinha em seus lábios por estar desferindo dor a alguém, faz todo o meu corpo estremecer. Sou tirada de meu devaneio ao ouvir sua voz potente ecoando no cômodo novamente.

— Como não desejo passar o resto do dia parado em frente a sua porta, é melhor irmos direto ao que interessa. — Ele profere suas palavras já adentrando o ambiente e se acomodando no móvel. Quem esse idiota pensa que é? Para tirar minhas dúvidas, resolvo lhe questionar.

— Quem você pensa que é para ir entrando na casa de alguém sem ao menos ser convidado?

O desconhecido, que antes estava sentado, se levanta, e com o ar de superioridade visível através da sua expressão, se manifesta.

— Kadar Maktoum.

Ao ouvir as palavras que saem por entre seus lábios, meu coração começa a bater em um ritmo frenético. Um nó se forma na minha garganta. Sinto o ar me faltar e um tremor percorre por todo o meu corpo. Mesmo vivendo afastada do centro de Dubai, sempre ouço rumores sobre o homem a minha frente. Sei que é o herdeiro de Mohammed bin Rashid Al Maktoum e todos os chamam de o príncipe do deserto, um homem que controla com mãos de ferro tudo à sua volta. Diante dos fatos, agora entendo o porquê da sua expressão prazerosa enquanto torturava o infeliz. Volto a realidade quando suas palavras se fazem mais uma vez presentes no ambiente.

— Sei que seus pais não estão em casa, o que é lamentável, pois assim terminaríamos essa conversa o mais rápido ao ouvirem a minha proposta. Porém, como não gosto de rodeios, irei direto ao ponto. Maysun Wehbe, você tem o prazer entre tantas outras em ser escolhida para me servir em meu harém.

Era como se ao ouvir suas palavras, eu tivesse entrado no piloto automático. O jeito como ele as proferiu se referindo a mim, como se eu fosse um objeto ou privilegiada por ser escolhida para atender seus caprichos, é absurdo. Aquilo fica ecoando em minha mente, e quando levanto o olhar e vejo um sorriso cínico estampado em sua face, mesmo atordoada com os últimos acontecimentos, tomo uma decição. Não vou deixar que ele venha até a minha casa como se tivesse o direto em decidir a minha vida.

— Por qual motivo você cogitou que meus pais aceitariam alguma proposta dessa natureza vinda de você?

Novamente aquela expressão de quem é dono do mundo está estampada em sua face, assim como o esboço de um sorriso. Antes dos seus lábios se abrirem totalmente, ele levanta a mão e começa a mover um dos dedos em forma de círculo à medida que fala.

— Olhe em volta o lugar que vive. Além de ser um lugar nada agradável, que já demostra qual a real situação de vocês, tenho conhecimento que não são proprietários desta casa, assim, como além de você e o seus pais, tambem tem um irmão pequeno que mora nessa residencia. Com a proposta que tenho a oferecer, todos podem sair ganhando, e você além de me servir, dará a sua família uma qualidade de vida melhor, e quem sabe, não se tornem os donos desse lugar. Pórem, tudo irá depender da sua decição.

A minha vida e a da minha familia virou uma rotina árdua no sol escaldante em função de lavar as roupas das nossas clientes, e assim não passarmos por dificuldade. Desde os meus oito anos, em que ao ver o quanto a minha mãe acordava cedo para ir buscar as roupas e ao chegar em casa passava horas debaixo do sol para lavar as mesmas, que resolvi que iria ajuda-la. Meu pai, embora não esteja com um trabalho fixo, sempre arruma algo para fazer e trazer a comida para dentro de casa. Vivemos de forma simples e humilde, sem regalias e esbanjamento, mas jamais aceitaremos algo dessa natureza. Não que a minha vontade não seja um dia proporcionar a eles uma vida melhor, mas eu, Maysun Wehbe, não nasci para ser uma fantoche nas mãos de ninguém, e tão pouco um objeto nas mãos desse homem a minha frente. Nunca sou de ter sentimentos ruins por ninguém, mas Kadar Maktoum despertou em mim algo que não quiz sentir até hoje. Raiva e despresso. Antes de ter qualquer reação, resolvo dar um bastar na situação um tanto inusitada.

— Quero que saia neste exato momento da minha casa. Você pode ser um sheik, ou até mesmo o príncipe do deserto, mas lembre-se que embora sejamos de uma classe inferior a sua, temos algumas leis que já foram decretadas em Dubai, e nesse vilarejo aqui, a sua autonomia não tem valor algum. Posso ser pobre, viver como você disse, “dentro de um ambiente não agradável”, mas em meio a tudo isso, meus pais me deram a chance de estudar e sei muito bem que embora viva em lugar que nós mulheres ainda somos vistas por vocês homens como inferiores, você vai precisar do consentimento dos meus pais para ter seus desejos sórdidos concretizados. E saiba que isso jamais irá acontecer. — Levanto a mão e faço o mesmo gesto que ele fez minutos atrás, só que aponto meu dedo em direção a porta. Olho na sua direção e seus olhos estam vermelhos como brasa, o ódio está visível através deles. O homem a minha frente dá alguns passos, e ao chegar próximo a porta, dá um giro de leve nos carcanhares e se vira na minha direção. Novamente a sua voz se faz presente, e para meu total desespero, a sua expressão que antes era de alguém que está com raiva por ouvir minhas palavras, agora dá lugar a um largo sorriso.

— Sempre gostei de desafios. Nunca precisei ter nada a força, e você irá até mim por livre e espontânea vontade.

Antes que eu me manifeste, ele caminha em direção a rua, sem olhar para trás. Me aproximo da porta e só então percebo vários carros pretos parados na frente da minha casa, que em seguida entram em movimento. Fecho a porta e as últimas palavras proferidas por ele começaram a martelar a minha cabeça. Esse homem realmente é um demônio do deserto, porém suas palavras jamais irão se concretizar.

Leia este capítulo gratuitamente no aplicativo >

Capítulos relacionados

Último capítulo