MAYSUN
Acordo em um sobressalto ao ouvir os gritos da minha mãe. Ainda meia sonolenta, me levanto, indo em direção ao som da sua voz. A cada passo dado, começo a sentir um calafrio percorrer todo o meu corpo, uma sensação ruim paira sobre mim, ao me aproximar do local de onde sua voz está vindo. Vejo a porta do quarto do meu irmão aberta, em passos largos adentro o ambiente, e no momento que meus olhos ficam fixos na imagem a minha frente, sinto o meu coração bater em um ritmo frenético. Minha garganta se fecha ao ver o meu irmão totalmente imóvel no chão, enquanto meus pais tentam desesperadamente reanimá-lo sem obter nenhuma reposta. Vejo meu pai pegá-lo em seus braços, indo em direção à porta. Atordoada por não saber o que de fato está acontecendo, começo a ir na mesma direção em que eles vão. Minha mãe logo abre a porta de entrada, e antes que minhas pernas se movessem para deixar o cômodo, sua voz ecoa no ambiente.— May, preciso que você fique aqui e termine de organizar as roupas. — Mesmo não gostando da ideia de ficar sozinha em casa, sem saber o que meu irmão têm, me lembro que precisamos entregar as roupas ainda hoje, pois amanhã vence o aluguel e o dono jamais deixará passar um dia após o prazo.Após dizer aos meus pais que cuidaria de tudo, caminho até a porta e fico os observando até o momento que eles somem do meu campo de visão. Com os pensamentos voltados no que minha mãe pediu para fazer, fecho a porta e em seguida começo a organizar todas as roupas. O medo e angustia estão me consumindo por dentro.Acabo por perder a noção do tempo transcorrido. Além de cuidar das roupas, limpo toda a casa e preparo a comida. Deixo a cozinha e adentro a sala, caminhando até a janela. O vento frio passa em volta do meu corpo, tenho uma sensação como se algo está me perseguindo, me vigiando. Olho para a vista além da janela, mas nenhum sinal dos meus pais. Assim que dou o primeiro passo, ouço uma batida dirigida a porta. Atordoada, caminho em direção a mesma e ao abri-lá, meus olhos se negam a acreditar na imagem a minha frente.Meus olhos permanece fixos no homem parado em frente a minha casa, meuIs pulmões estão apertados, tanto que não consigo se quer inalar o ar corretamente. Meu pulso está batendo tão forte que vejo uma sombra negra a minha frente, e assim que sua voz se faz presente no ambiente, o medo cru e agudo arranha o meu peito ao ouvir suas palavras.— Maysum Wehbe, era você mesma que eu estava procurando.*******!!!!!!!!!****!!Com os olhos fixos na imagem a minha frente, várias perguntas se fazem presentes em minha mente, mas a que mais me deixa inquieta, é: como esse homem sabe o meu nome e por qual motivo está em minha casa? Por mais que eu tente, não consigo me mexer e nem desviar os meus olhos da figura imponente que está com seu olhar cravado em mim e em meu corpo. O silêncio predomina o ambiente, assim como as imagens dele com o chicote nas mãos passam como flashes a minha frente. Os gritos daquele homem sendo torturado ecoa em minha cabeça, e ao lembrar do sorriso de satisfação que esse desconhecido tinha em seus lábios por estar desferindo dor a alguém, faz todo o meu corpo estremecer. Sou tirada de meu devaneio ao ouvir sua voz potente ecoando no cômodo novamente.— Como não desejo passar o resto do dia parado em frente a sua porta, é melhor irmos direto ao que interessa. — Ele profere suas palavras já adentrando o ambiente e se acomodando no móvel. Quem esse idiota pensa que é? Para tirar minhas dúvidas, resolvo lhe questionar.— Quem você pensa que é para ir entrando na casa de alguém sem ao menos ser convidado?O desconhecido, que antes estava sentado, se levanta, e com o ar de superioridade visível através da sua expressão, se manifesta.— Kadar Maktoum.Ao ouvir as palavras que saem por entre seus lábios, meu coração começa a bater em um ritmo frenético. Um nó se forma na minha garganta. Sinto o ar me faltar e um tremor percorre por todo o meu corpo. Mesmo vivendo afastada do centro de Dubai, sempre ouço rumores sobre o homem a minha frente. Sei que é o herdeiro de Mohammed bin Rashid Al Maktoum e todos os chamam de o príncipe do deserto, um homem que controla com mãos de ferro tudo à sua volta. Diante dos fatos, agora entendo o porquê da sua expressão prazerosa enquanto torturava o infeliz. Volto a realidade quando suas palavras se fazem mais uma vez presentes no ambiente.— Sei que seus pais não estão em casa, o que é lamentável, pois assim terminaríamos essa conversa o mais rápido ao ouvirem a minha proposta. Porém, como não gosto de rodeios, irei direto ao ponto. Maysun Wehbe, você tem o prazer entre tantas outras em ser escolhida para me servir em meu harém.Era como se ao ouvir suas palavras, eu tivesse entrado no piloto automático. O jeito como ele as proferiu se referindo a mim, como se eu fosse um objeto ou privilegiada por ser escolhida para atender seus caprichos, é absurdo. Aquilo fica ecoando em minha mente, e quando levanto o olhar e vejo um sorriso cínico estampado em sua face, mesmo atordoada com os últimos acontecimentos, tomo uma decição. Não vou deixar que ele venha até a minha casa como se tivesse o direto em decidir a minha vida.— Por qual motivo você cogitou que meus pais aceitariam alguma proposta dessa natureza vinda de você?Novamente aquela expressão de quem é dono do mundo está estampada em sua face, assim como o esboço de um sorriso. Antes dos seus lábios se abrirem totalmente, ele levanta a mão e começa a mover um dos dedos em forma de círculo à medida que fala.— Olhe em volta o lugar que vive. Além de ser um lugar nada agradável, que já demostra qual a real situação de vocês, tenho conhecimento que não são proprietários desta casa, assim, como além de você e o seus pais, tambem tem um irmão pequeno que mora nessa residencia. Com a proposta que tenho a oferecer, todos podem sair ganhando, e você além de me servir, dará a sua família uma qualidade de vida melhor, e quem sabe, não se tornem os donos desse lugar. Pórem, tudo irá depender da sua decição.A minha vida e a da minha familia virou uma rotina árdua no sol escaldante em função de lavar as roupas das nossas clientes, e assim não passarmos por dificuldade. Desde os meus oito anos, em que ao ver o quanto a minha mãe acordava cedo para ir buscar as roupas e ao chegar em casa passava horas debaixo do sol para lavar as mesmas, que resolvi que iria ajuda-la. Meu pai, embora não esteja com um trabalho fixo, sempre arruma algo para fazer e trazer a comida para dentro de casa. Vivemos de forma simples e humilde, sem regalias e esbanjamento, mas jamais aceitaremos algo dessa natureza. Não que a minha vontade não seja um dia proporcionar a eles uma vida melhor, mas eu, Maysun Wehbe, não nasci para ser uma fantoche nas mãos de ninguém, e tão pouco um objeto nas mãos desse homem a minha frente. Nunca sou de ter sentimentos ruins por ninguém, mas Kadar Maktoum despertou em mim algo que não quiz sentir até hoje. Raiva e despresso. Antes de ter qualquer reação, resolvo dar um bastar na situação um tanto inusitada.— Quero que saia neste exato momento da minha casa. Você pode ser um sheik, ou até mesmo o príncipe do deserto, mas lembre-se que embora sejamos de uma classe inferior a sua, temos algumas leis que já foram decretadas em Dubai, e nesse vilarejo aqui, a sua autonomia não tem valor algum. Posso ser pobre, viver como você disse, “dentro de um ambiente não agradável”, mas em meio a tudo isso, meus pais me deram a chance de estudar e sei muito bem que embora viva em lugar que nós mulheres ainda somos vistas por vocês homens como inferiores, você vai precisar do consentimento dos meus pais para ter seus desejos sórdidos concretizados. E saiba que isso jamais irá acontecer. — Levanto a mão e faço o mesmo gesto que ele fez minutos atrás, só que aponto meu dedo em direção a porta. Olho na sua direção e seus olhos estam vermelhos como brasa, o ódio está visível através deles. O homem a minha frente dá alguns passos, e ao chegar próximo a porta, dá um giro de leve nos carcanhares e se vira na minha direção. Novamente a sua voz se faz presente, e para meu total desespero, a sua expressão que antes era de alguém que está com raiva por ouvir minhas palavras, agora dá lugar a um largo sorriso.— Sempre gostei de desafios. Nunca precisei ter nada a força, e você irá até mim por livre e espontânea vontade.Antes que eu me manifeste, ele caminha em direção a rua, sem olhar para trás. Me aproximo da porta e só então percebo vários carros pretos parados na frente da minha casa, que em seguida entram em movimento. Fecho a porta e as últimas palavras proferidas por ele começaram a martelar a minha cabeça. Esse homem realmente é um demônio do deserto, porém suas palavras jamais irão se concretizar.KADARAssim que chego na casa de Maysun, meus homens que estão vigiando o lugar me informam que os pais dela sairam as pressas com um menino desacordado. Trato de ligar imediatamente para Jamil, dando ordens para que ele descubra o que o garoto tem, e após encerrar a ligação, deixo o automóvel e em passos largos me aproximo da entrada da pequena residência a minha frente. Analiso minuciosamente a casa e não me agrada em nada vir a um lugar que pela aparência, já se dá para ver a pobreza com que vivem. Próximo a porta, dou uma batida na mesma e segundos depois, ela é aberta por aquela que vem ocupando os meus pensamentos.A beleza diante dos meus olhos é estonteante, embora esteja vestida com trapos, os mesmo não foram capazes de ofuscar tamanha beleza. Me divirto ao ver a reação da mulher a minha frente que esá petrificada. Resolvo quebrar o silêncio no ambiente, e como odeio fazer rodeios, vou direto ao que interessa e nem espero um convite, já adentro o cômodo. Para minha total su
MAYSUMAcordo atordoada com meu pai me chamando e dizendo que irá até o hospital para assim mamãe poder descansar um pouco em casa. Depois que ele sai, tomo um banho e trato de fazer um café bem reforçado para ela tomar assim que chegar, certamente estará com fome. Cerca de uma hora depois enfim minha rainha está em casa. Alguns minutos depois de sua chegada e enquanto conversavámos, ouço uma batida na porta, minha mãe logo adentra a sala saindo da cozinha, sabendo que só pode ser o senhor Ebraim que veio pegar o dinheiro do aluguel. Caminho na sua frente e abro a porta, olhando para o homem que está parado com uma expressão diferente no seu rosto, acho um tanto estranho pois sempre está de cara fechada, como se tivesse de mal com a vida, mas não com... pesar. Saio dos meus devaneios quando ouço a voz da minha mãe.— Maysun, peça ao senhor Ebraim que entre, onde está sua educação?— Me desculpe senhor Ebraim, pode entrar.Enquanto o homem adentra o centro do cômodo, dona Fátima caminh
MAYSUM Ficamos nos encarando sem desviar o olhar um do outro, só se ouvindo o som das nossas próprias respirações, porém o silêncio é quebrado quando a porta atrás de mim é aberta e a senhora que encontrei minutos antes na recepção entrega o envelope que tinha em sua mão para ele e, em seguida, deixa o ambiente na mesma velocidade que adentrou.— Sente-se. — Diz apontando para a cadeira em frente a sua mesa, assim que se acomoda em sua poltrona. Sem delongas resolvo me sentar, quero acabar logo com tudo isso e sair desse lugar que parece me sufocar igualmente ao elevador. Ele abre o envelope tirando um montante de papéis, logo estende na minha direção, falando:— Nesse contrato então todas as cláusulas que você terá que seguir, assim como todos os benefícios que sua família irá receber assim que ele for assinado.Olho perplexa hora para os papéis e hora para Kadar que tem um ar de satisfação visível na sua expressão. Percebendo minha reação, sua voz novamente se faz presente:—
KADARAlém dos homens que estam vigiando a casa dos Wehbe, o próprio Jamil ficou fazendo o monitoramento no hospital. Depois das palavras que ouvi quando estive na residência de Maysun, que nunca aceitaria minha proposta, coloquei em ação o que já tinha cogitado desde o momento que li no dossiê a situação deles em relação a casa onde vivem. Depois de efetuar a compra da residência, avisei ao antigo proprietário que precisava com urgência que o imóvel fosse desocupado.Quando fui informado que o estado de saúde do pequeno Wehbe tinha piorado, sabia que sua irmã não teria outra alternativa a não ser me procurar, e tudo aconteceu mais rápido do que eu esperava. Através dos homens que estavam e estão vigiando cada passo dela, soube antes mesmo dela chegar até a empresa que enfim aquela atrevida iria engolir cada palavra que me foi dito e aceitar tudo que eu tinha a propor. Para melhorar ainda mais o meu dia, soube que novamente seu irmão passou mal, onde a única alternativa era fazer imed
MAYSUNEla estende o vestido que até agora não havia percebido estar em suas mãos e pede para que eu vá até o banheiro me trocar, que em seguida ela irá arrumar o meu cabelo e fazer uma maquiagem descente e apresentavel. Mesmo contra a minha vontade, acabo fazendo o que ela manda. Não posso deixar que descubra toda a verdade. Entro no pequeno cômodo e olho para o vestido, ficando encantada com a riqueza de detalhes e mais ainda pela cor. Depois de vestida deixo o banheiro indo até ela, que já começa a arrumar os meus cabelos rapidamente. Lágrimas surgem no canto de seus olhos quando finalmente estou pronta.— Você está linda. Uma verdadeira princesa.Desvio meu olhar para o espelho, e eu mesma não acredito no que vejo. Modestia parte, estou muito bonita. Fico me olhando na frente ao espelho até ouvimos o som de alguém batendo na porta, abro a porta pensando ser o demonio que será meu marido, mas no lugar está uma senhora por volta dos 50 anos. De algum modo fico decepcionada, mas feli
MAYSUNCom os olhos fixos na mesa e ainda parada no mesmo lugar, Kadar fala em meu ouvido:— Vamos, você sentará ao meu lado.Em passos vacilantes caminho até o lugar indicado por ele, me acomodo ficando de cabeça baixa olhando para os objetos a minha frente. A senhora Maktoum pede que a comida seja servida, a sensação que tenho é de que todos estão me observando, levanto a cabeça tento a confirmação das minhas suspeitas. A mulher, por nome Haifa, que é prima de Kadar se pronuncia:— Deve ser difícil para alguém de uma classe inferior como você, que nunca viu uma mesa como esta, saber quais os utensílios deve usar. Primo, antes do seu casamento, você deveria contratar alguma professora para Maysun ter aulas de etiqueta já que será uma Maktoum. — Minha garganta se fecha no mesmo instante. Há sarcasmo em cada palavra proferida por Haifa, e antes que eu possa dar a resposta que merece, Kadar se pronuncia:— Talvez esse seja o motivo pelo qual ainda continua solteira, prima, por não sabe
MAYSUNQuatro dias se passaram desde o anúncio do meu casamento a família Maktoum. Sim, exatos quatro dias! Hoje começa o primeiro dos três dias que unirá a minha vida para sempre com a de Kadar. Durante esses quatro dias que se passaram, além da minha apresentação ao conselho do clã que ao saberem da notícia que Maktoum escolheu finalmente uma candidata a esposa, não fizeram objeção ao prazo para realização do casamento, o que me deu a entender que diante da fama do prepotente, arrogante e demônio que todos chamam de príncipe do deserto, os conselheiros estavam incrédulos e com medo dele mudar de ideia se caso eles não aceitassem a data tão próxima, quando, na verdade, teríamos que esperar três meses para realizar a união.Burak teve alta ontem e já se encontra em casa. A princípio mamãe estava muito nervosa assim que o médico informou que ele já podia voltar para casa, meu pai não entendendo sua reação a questionou, e ela contou sobre a venda da casa e que o proprietário nos tinha d
Terceiro dia do casamento....MAYSUNAssim que surgem os primeiros raios de sol, mesmo lutando contra uma vontade enorme de ficar na cama sem fazer absolutamente nada, me levanto. Tomo meu banho e já arrumada, saio do meu quarto indo fazer o desjejum. Assim que terminamos, minha mãe avisa que já está quase na hora de írmos para o palácio, e que devo me preparar para irmos. Duas horas se passam e o veículo que nos levará chega, partimos novamente para o palácio, e no percurso as lembranças dos dois dias anteriores invadem a minha mente. Ainda lembro da expressão de Kadar quando ele estendeu a caneta na minha direção e me afastei, a expressão na sua face me fez vibrar por dentro e no fundo eu queria sorrir, mesmo tendo plena certeza que levaria tudo adiante. Foi bom ver que o senhor arrogante que se acha o dono do mundo naquele momento estava sem reação por não saber o que de fato aconteceria. Me virei na direção dos meus pais que estavam emocionados com um giro nos calcanhares, voltei