Althea estava sozinha no interior da floresta. O frio cortava sua pele como lâminas invisíveis, e cada passo sobre a neve acumulada exigia cautela.
Acima dela, a Lua de Sangue brilhava intensa, derramando suas lágrimas escarlates, como se lamentasse o destino da jovem. O silêncio da noite foi interrompido pelo som de patas esmagando a neve e o uivo que fez seu coração bater descompassado.
Eles estavam ali.
Os lobos se aproximavam.
O ataque foi rápido demais para que ela reagisse. Uma sombra se lançou contra ela, um corpo ágil e feroz, pronto para arrancar sua garganta.
Então, eu não passo de uma ameaça? Apenas uma caça?
Por instinto, Thea ergueu o braço, e o bracelete brilhou na escuridão. Os dentes da loba encontraram a prata encantada, e o contato fez a carne da criatura queimar. Um rosnado de dor ecoou, e sangue respingou na neve.
Foi então que Althea o sentiu.
Uma presença avassaladora.
O ar ao seu redor se tornou mais pesado, carregado com uma eletricidade latente. Seu corpo reconheceu antes mesmo que seus olhos o encontrassem.
Ele.
Entre as sombras das árvores, surgiu a figura imponente do lobo negro. Seus olhos dourados estavam fixos nela, queimando com um misto de fascínio e hesitação. Ele parecia avaliá-la, tentando decidir o que fazer.
O cheiro do sangue da loba ferida—sua fiel companheira—chegou até ele, mas o perfume da mulher amaldiçoada era ainda mais forte. Uma essência que o chamava como um feitiço irresistível.
Os pés de Althea se moveram involuntariamente.
O Alfa também avançou, até que estivessem frente a frente.
Por um instante, o mundo deixou de existir.
Eles se encararam, e algo indescritível aconteceu. Imagens invadiram suas mentes. Viam-se juntos, não como inimigos, mas como companheiros. Viam um futuro que jamais haviam ousado imaginar. E, então, viram…
Uma menina nos braços do Alfa.
O choque do que estavam testemunhando os paralisou, como se o próprio tempo tivesse suspendido a respiração.
Foi quando a loba atacou.
Um borrão de fúria e sangue.
O corpo do imenso Rhaeven se moveu antes que ele pudesse pensar. O instinto falou mais alto. Ele girou, rosnando, e suas presas encontraram a carne da loba traidora antes que ela pudesse alcançar Althea.
Um estalo horrível, um grito de dor.
Quando ele despertou do torpor, sentiu o gosto do sangue quente em sua boca.
E o silêncio mortal da floresta.
Seus olhos dourados se arregalaram ao ver o corpo no chão, imóvel, tingindo a neve de escarlate.
— Rhae… — A voz de Nia ecoou em sua mente.
O Alfa cambaleou, afastando-se um passo. Ele olhou para sua matilha—para os olhos arregalados de seus irmãos—e então para Althea, ainda confusa diante da cena.
Seus punhos cerraram.
Seus olhos se tornaram pura ira.
— Isso… é culpa sua! — sua voz soou como um trovão. — Bruxa!
Althea deu um passo para trás.
Ele a estava culpando? Ele havia matado alguém do seu próprio bando… por ela?
A loba ferida estremeceu, seu corpo começando a se transformar. Diante de todos, Nia voltou à sua forma humana, revelando uma mulher de longos cabelos escuros, pele tão pálida quanto a lua. A ferida aberta em seu abdome pulsava, sua respiração enfraquecia.
Ela tossiu sangue.
— Rhae… Você prometeu… Você prometeu que a mataria.
Lágrimas se misturavam ao vermelho nos lábios dela.
— Nia… — O Alfa caiu de joelhos ao lado dela, segurando seu corpo com cuidado, como se, por algum milagre, pudesse mantê-la ali. — Não me deixe…
Os olhos da mulher já perdiam o brilho.
— Você a escolheu… — sussurrou, sua voz se desfazendo no vento. — E eu o amaldiçoo, meu rei. Por ter derramado o sangue da sua própria alcateia… você será banido.
O uivo dos lobos rasgou o céu, ecoando em tristeza e revolta.
Rhaeven sentiu o peso do olhar de cada um deles. A acusação. A dor. A traição.
Ele se levantou lentamente, ainda segurando o corpo de Nia. Seus olhos encontraram os de Althea, e ele viu algo ali—um brilho indecifrável, algo que o fazia se lembrar da visão que tiveram.
Mas naquele momento, nada importava.
O ódio transbordou de seu peito.
Ele soltou o corpo da loba e avançou.
— Você trouxe a ruína para mim, amaldiçoada. Agora, verá o que significa carregar essa maldição!
E então, Rhaeven — voltando a se transformar em lobo — atacou.
Althea não teve escolha.O Alfa avançou como um vendaval de fúria e sombras, seus olhos dourados ardendo em pura ira.Os demais lobos uivavam para a Lua de Sangue, como se clamassem por um veredicto divino, mas nenhum ousou interferir. A decisão estava selada no próprio destino.Thea mal teve tempo de erguer sua lâmina antes que Rhaeven colidisse contra ela. O impacto a lançou para trás, seus pés arrastando-se pela neve. Ela conseguiu firmar-se, ofegante, mas ele não lhe deu trégua.Outro ataque. Mais rápido. Mais brutal.Dessa vez, Althea desviou no último segundo, girando o corpo com a agilidade de uma caçadora treinada. Sua espada riscou o ar e encontrou o ombro do Alfa, abrindo um corte superficial.O cheiro de sangue preencheu o espaço entre eles.Rhaeven rosnou, mas não recuou.Pelo contrário.A ferida apenas atiçou seu instinto predatório.Ele avançou outra vez, e Thea mal viu quando ele derrubou sua espada com um golpe preciso. A lâmina caiu na neve, e no instante seguinte, o
O impacto foi brutal, como um trovão quebrando o silêncio de uma noite de tempestade.O corpo de Althea afundou no colchão macio quando Rhaeven a lançou sobre a imensa cama de peles no centro de seus aposentos.O quarto do Alfa era espaçoso e imponente, com paredes de pedra escura adornadas por armas ancestrais e tapeçarias que contavam histórias de conquistas sangrentas. Tochas presas em suportes de ferro fundido lançavam sombras dançantes pelos cantos.Seu coração batia selvagem como um pássaro aprisionado contra as grades de sua caixa torácica, cada fibra de seu ser pulsando com o instinto primordial de lutar, de resistir.Antes que pudesse se mover, o Alfa estava sob
Althea encarava os olhos dourados que a mantinham prisioneira não apenas fisicamente, mas de uma forma que não conseguia explicar. Algo primitivo e antigo pulsava entre eles, uma conexão que desafiava a lógica e o ódio que deveriam sentir.— Prefiro morrer do que pertencer a você — ela repetiu, sua voz carregada de determinação.Rhaeven se afastou. Ele circulou a cama como um predador avaliando sua presa, seus olhos nunca abandonando os dela.— A morte seria um fim muito simples para a mulher que trouxe a ruína para mim.Althea se sentou na cama, ajeitando suas vestes rasgadas pela batalha e observando cada passo dele. Ela sentiu a ausência do bracelete em seu pulso como um membro fantasma. Sem sua proteção, estava verdadeiramente vulnerável.— Eu não te obriguei a matar sua própria loba — ela retrucou. — Você fez sua escolha.O rosto de Rhaeven endureceu, músculos se contraindo sob sua pele bronzeada. A menção de Nia abriu uma ferida crua demais.— Não ouse falar dela! — Sua voz trov
"Mamãe!" gritava o pequeno, enquanto as sombras se fechavam ao seu redor. "Mamãe, onde você está?"Althea tentava alcançá-lo. Seus braços se estendiam, seus pés corriam, mas a distância apenas aumentava. Quanto mais se esforçava, mais longe a criança parecia.E então, surgiu a figura.Um homem enorme, de ombros largos e cabelos negros como a noite sem estrelas. Suas mãos fortes ergueram o menino do chão, salvando-o das sombras que quase a devoravam.Rhaeven.Qu
O conforto de sua presença era inegável. O ritmo constante de sua respiração, o calor de seu corpo, a segurança paradoxal que ele proporcionava... tudo conspirava para derrubar suas defesas.— Por que? — Ela perguntou finalmente, sua voz quase sumindo na escuridão. — Por que você se importa com o que eu vi?Rhaeven ficou em silêncio por tanto tempo que ela pensou que ele não responderia. Quando finalmente falou, sua voz estava carregada de uma emoção que ela não conseguia nomear.— Porque também a vi. A criança. Não apenas na visão que compartilhamos, mas em meus próprios sonhos. — Ele hesitou, como se as próximas palavras fossem difíceis de pronunciar. — E ele me chamava de pai.Althea sentiu seu coração falhar uma batida.—
Os primeiros raios de sol infiltravam-se pelas frestas das cortinas pesadas quando Althea despertou. Por um momento, permaneceu imóvel, tentando discernir se a noite anterior havia sido apenas mais um sonho profético ou realidade. O calor que ainda sentia na pele e o aroma de pinho e terra que impregnava os lençóis responderam sua pergunta silenciosa.Virando-se lentamente, encontrou o lado da cama vazio. Rhaeven havia partido, mas sua presença persistia no quarto como uma sombra palpável. Althea tocou seus próprios lábios, ainda sensíveis dos beijos trocados, e um arrepio percorreu seu corpo ao recordar a intensidade do encontro."O que eu fiz?" murmurou para si mesma, sentando-se na cama e abraçando os joelhos contra o peito.Havia se entregado
Rhaeven observava a alcateia se reunir no Grande Salão, seu rosto uma máscara impassível que ocultava a tempestade interior. Sentado em seu trono de madeira antiga entalhada com símbolos lobos, ele parecia a própria imagem da autoridade.Mas por dentro, estava despedaçado.A noite com Althea havia mudado algo fundamental nele. Não era apenas desejo — embora isso estivesse presente, ardendo sob sua pele como uma febre — mas algo mais profundo, mais perturbador. Uma conexão que desafiava tudo que ele acreditava sobre seu destino como Alfa, sobre a profecia, sobre a mulher de cabelos brancos que deveria trazer destruição.— Os Anciãos estão prontos, meu senhor. — A voz de Thorn, seu Beta e conselheiro mais pr&oac
Murmúrios de ultraje percorreram a multidão, mas foram novamente silenciados pelo olhar severo de Rhaeven.— Continue. — Ele ordenou, sua voz mais suave do que pretendia.— Mas agora... — Althea hesitou, algo vulnerável passando por seus olhos. — Agora não tenho mais certeza. As visões que compartilhei com Rhaeven... elas sugerem um destino diferente.Foi a vez de Elara se manifestar, aproximando-se com a graça fluida que caracterizava a vidente.— Que visões são essas? — Ela perguntou, sua curiosidade claramente despertada.Rhaeven sentiu-se tenso. Estava prestes a interromper, a proteger aquele segredo íntimo que haviam