A Mentira
A Mentira
Por: Losa
UM

LORE

Hoje meu dia foi como todos os outros. A única diferença é que a noite irei para o evento da empresa com os meus pais. Aqueles que todos os empresários e sócios passam horas dando palestras. Confesso que odeio ter que comparecer, pois não suporto ficar sentada apenas ouvindo eles tagarelarem. Costumo fugir toda vez, dizendo que preciso ir ao banheiro, mas, na verdade, corro para o jardim. O cheiro das flores é de acalmar qualquer pessoa, e por isso, prefiro ficar por ali, porque o cheiro me acalma.

Costumo chamar minhas amigas, na esperança que elas não me deixem passar por essa tortura sozinha, mas elas recusam todas às vezes. A Ariel costuma ir devido à família. O seu pai é um dos sócios da empresa. A Loren e a Sydney não gostam, pelo simples fato de não terem paciência. De tanto me ouvirem reclamar do quanto esses eventos são irritantes, as duas não têm nenhum interesse ou vontade. A Anne me prometeu que iria um dia, e desde então, ando cobrando isso dela, mas a morena sempre inventa uma desculpa esfarrapada.

Estamos no terceiro ano do ensino médio. Estudamos juntas desde o fundamental, e esse é um dos fatores de virarmos melhores amigas. A Anne namora o Shawn Carter. Eles se conheceram no primeiro ano, e depois de muitos encontros, começaram a namorar, e estão juntos há três anos. A Ariel não namora. Ela escolheu se formar primeiro e deixar relacionamentos para depois, pois segundo ela, namoro é uma distração para os estudos, mesmo a Anne dizendo que ela estava errada, e que era só saber separar o namoro dos deveres.

A Loren e a Sydney também não namoram, mas sempre se envolvem com os garotos por aí. E para ser mais exata, eles são amigos do Shawn, e admito que o vesgo tem amigos bonitos. Eu também não namoro, porém ultimamente estou próxima do meu amigo Connor. Ele tem agido estranho, parece querer algo a mais do que só amizade, e confesso que talvez eu esteja aberta às possibilidades.

Connor é uma pessoa maravilhosa que sempre esteve ao meu lado nos piores momentos da minha vida. Quando meus pais estavam em crise no casamento, ele estava ao meu lado me ajudando a superar, minhas amigas também é lógico, mas ele foi o que mais ficou presente. Nos conhecemos em uma reunião de negócios da empresa, nossos pais iriam fechar um contrato, e minha mãe me pediu para que eu fosse, e por coincidência o Connor também acabou indo, e foi aí que eu o conheci.

Meu pai é o CEO da empresa Orlando's, a qual é o motivo do evento de hoje. Todas as sextas-feiras, a empresa organiza esse evento, o que para mim é um saco. Minha mãe é a advogada dele, e sempre estar a par de tudo, ou seja, o casal perfeito. Já eu, sou a filha que não liga muito para nada. Claro que sou grata por tudo que eles fizeram e ainda fazem por mim, mas realmente, não dou a mínima para esses eventos chatos.

Já estava quase na hora de irmos. Mesmo meu pai sendo o dono e não podendo se atrasar, ele ousava fazer isso, porque como ele mesmo diz “Ele que manda em tudo.”

Então o velho faz o que bem entender.

Eu estava encarando o enorme closet em minha frente, e me repreendi por ter inúmeras roupas novas que nunca foram usadas. Que exagero comprar algo tão caro para acabar não usando depois. Coloquei um vestido da cor vinho em cima da cama, e voltei para o closet, procurando um salto baixo e simples. Me olhei no espelho sorrindo ao ver meu corpo no vestido. Ele batia nas minhas coxas e valorizava muito a minha cintura. Deixei meu cabelo solto, com os cachos naturais que eu tanto amava. Coloquei o salto baixo preto, o qual tinha uma fita linda. Fiz um laço. Por último, coloquei um colar dourado no meu pescoço, e passei perfume.

Passei lápis de olho preto e esfumei o mesmo, deixando borradinho e antes de sair, também passei um brilho labial em nos lábios e desci. Meus pais já estavam prontos. O motorista do Benjamin estava tirando o carro da garagem, e minha mãe arrumando sua bolsa. Ela estava linda. Vestia um vestido longo preto, o qual era colado em seu corpo e valorizava muito as suas curvas. Seu cabelo estava preso em um coque arrumado. A mais velha olhou para mim e sorriu de lado, fazendo um gesto pedindo para que eu me aproximasse e saíssemos de casa. Entramos no veículo e o Thomas deu partida.

— Você está linda! — disse meu pai, me olhando e sorrindo genuíno

— Obrigada, pai! — agradeci assentindo

— Sei que você não gosta de ir nesses eventos chatos... — comentou e dei de ombros. Ele sempre soube, mas não cansa de deixar explícito que preciso ir.

— Tanto faz! — mexi no cabelo e peguei meu celular

Abri o grupo das minhas amigas, começando ler as mensagens, rolando os olhos e rindo em seguida ao ler o que a Loren havia mandado.

“Boa sorte, Lore! Só você mesmo tem paciência para aguentar esses velhos falando e falando sobre negócios e contratos. :P”

Ignorei e descansei as costas no banco do carro, esperando chegar na empresa. Encarei meus pais que estavam conversando. Os dois falavam sobre uma nova família que iria ser sócia também. Os Evan's. Eu já ouvi falar deles. O filho do casal estuda na mesma sala que eu, e inclusive é um dos amigos do Shawn.

Saí do carro com os meus pais, e ajeitei meu vestido que ficou um pouco amassado. Entramos no enorme prédio luxuoso, e por mais que a noite seja uma chatice, admito que a arrumação sempre é impecável. Sentamos em uma das mesas principais que ficava bem no meio com o nome do meu pai no centro dela. De tanto comparecer nesses eventos, não sinto mais vergonha em passar no meio de todas essas pessoas que sempre nos encaram todas às vezes. Corri os olhos pela sala lotada com mesas cheias, e logo voltei a olhar para frente quando meu pai subiu no palco e deu início.

Após Benjamin passar exatamente trinta e cinco minutos tagarelando sobre as palestras que logo começaria, agora era a vez de outro homem falar. Ele começou agradecendo ao dono da empresa, e logo disse sobre os seus projetos, os quais o CEO ficou bastante intrigado, que o fez até conversou com a minha mãe sobre.

O homem passou uma hora falando sobre suas ideias, e a minha bunda já estava começando a ficar dormente. Quando o velho desceu do palco e cumprimentou meu pai, levantei, e antes que eu pudesse dizer precisar ir ao banheiro, outro homem mais novo se aproximou ao lado da sua esposa e falou com o meu pai.

— Sou o Ralph! E essa é a minha esposa... — disse o homem apertando a mão do meu pai, e olhou para mim.

— Como ela é linda, Benjamin! — falou a mulher elegante em nossa frente. — Eu me chamo Kate. — sorriu. — Fico feliz em conhecê-la! — me olhou.

— Muito prazer! Me chamo Lore! — sorri gentilmente, e olhei para minha mãe. — E muito obrigada, você também está muito linda.

— Você acha? Eu tava com muita dúvida na escolha da roupa. — sorriu simpática. — Já gostei de você! Acho que seremos boas amigas...

— Senhorita Lore, é um prazer finalmente conhecê-la! — disse o homem com cabelos grisalhos. Sorri assentindo.

Senti as mãos da Carla alisarem minhas costas, e olhei para ela. A mais velha piscou para mim, me puxando delicadamente para sentar com eles.

— O que achou da ideia do Chris? — perguntou meu pai enquanto pegava uma taça do vinho branco. — Achei intrigante! E você?

— Sim! Foi bastante intrigante, mas faltou alguma coisa. — respondeu Ralph. — Ele não estava seguro no que falava, então não seria bom para a empresa contratar um homem que não é firme no que diz.

— Você é mesmo bom! — disse Benjamin. — Foi uma ótima ideia ter contrato você. — sorriu. — Só ouvi comentários positivos. Bem-vindo a Empresa Orlando's, Ralph! — sorriu.

— Sei realizar um bom trabalho... — riu. — Muito obrigado! Não vejo a hora de começar. — os olhares e os sorrisos deles eram estranhos.

Ralph e o meu pai continuavam conversando sobre os próximos caras que falavam sobre suas propostas, e às vezes falavam sobre a empresa. Minha mãe e Kate falavam sobre seus trabalhos, mas também comentavam sobre seus maridos, me fazendo ficar muito mais entediada.

Saudades da Ariel aqui comigo.

— Lore, querida, me fale um pouco sobre você... — disse a mulher ao lado da minha mãe

— Ah... — enruguei a testa. — Não tenho muito o que falar de mim. — sorri sem jeito.

— Ah, claro que você tem. — negou. — Todas nós temos! — insistiu.

— Tudo bem... — eu disse. — Tenho dezessete anos, e farei dezoito em alguns meses. — parei quando vi seu olhar me repreendendo.

— Adorei saber que ficará de maior em alguns meses, mas me diz como você é na escola. — disse. — Garanto ser a número um.

— Ah, sim...—- ri sem graça. — Não sou! Estou em terceiro lugar no ranking de melhores notas. — respondi. — Sou esforçada! Minhas notas são boas, e eu me orgulho delas. Mas, mesmo assim, não sou a número um. Outro aluno que é número um, seu nome é Ruel. — olhei para ela. — E como os seus sobrenomes são iguais, presumo que você seja a mãe dele.

— Sim! Eu sou! — sorriu. — Fico feliz em saber que você estuda na sala dele. Isso significa que você poderia me dizer como ele é no colégio. — disse entusiasmada.

— Bom, não sei se eu deveria falar... — ri. — Mas ele é bem esforçado também. — falei. “Esforçado”? Eu nunca vi ele pegando em algum livro da biblioteca. — Admito que fiquei um pouco surpresa quando o vi sendo o número um, mas não chocada. — fiquei chocada sim.

— Sério? Ele sempre diz que não gosta de estudar no colégio, porque lá é muito barulhento. — negou com a cabeça. Fui pega na mentira? — Mas, talvez ele tenha mudado de ideia. Ruel passa o dia inteiro no quarto estudando, e às vezes jogando também... — continuou. — Mas agora me diz, do jeito que é linda, você deve matar os garotos de lá.

Pressionei os lábios e neguei.

— Talvez! Na verdade, eu não sei. — disse. — Não costumo prestar muita atenção neles. — ri sem graça

— Ah, entendi. Então você é muito focada mesmo nos estudos, hein? — me olhou, e assenti. — O que vai fazer quando concluir? — perguntou

— Eu ainda não pensei nisso! São muitas coisas que ainda não parei para escolher. — pressionei os lábios outra vez.

— Isso é normal! Aconteceu comigo também... — minha mãe riu se intrometendo na conversa. — Mas, depois percebi que advocacia era para mim. — sorriu. — Com certeza você vai perceber qual profissão combinará com você e te fazer bem.

Sorri em reposta, e continuei de lábios pressionados.

— Preciso ir ao banheiro! — sussurrei para a mais velha ao meu lado, que assentiu, e então, peguei meu celular

Me distanciei da nossa mesa, e passei pelas outras que ficavam atrás. Retribui alguns sorrisos das pessoas que sorriam para mim. Dobrei o corredor, e andei até a área externa, onde ficava o cantinho que eu tanto adorava.

Pisei no jardim esverdeado, e assim que avistei o banco de concreto, o qual costumo ficar quando venho aqui, me sentei. Apoiei minhas mãos no mesmo e puxei o ar, sentindo o cheiro das flores. Isso era a única coisa boa desse lugar. Sentar aqui e ver o céu estrelado, sentindo as flores, era maravilhoso.

Franzi o cenho quando senti um cheiro de nicotina. Tinha alguém fumando por aqui. Encarei todos os cantos do jardim e não vi ninguém. Levantei devagar e andei em direção a um caminho, o qual estava ao lado de uma parede de folhas verdes. Minha pele estava arrepiada por causa do frio. Passei as mãos em meus braços para aliviar minha pele arrepiada. Um pouco distante tinha um garoto de costas para mim. Ele estava sentado, e seu cabelo era bastante conhecido por mim. Me aproximei devagar e silenciosamente da pessoa que estava sentada.

— Ruel? Você já voltou!? — perguntou, me fazendo pular de susto, e reconhecer a voz.

— Shawn? — eu disse com a testa franzida, e o rapaz olhou para trás, me encarando

— Lore? Oi! — levantou meio desajeitado.

— Você aqui? Estou meio que surpresa... — me aproximei rindo.

Ele não tinha nenhum cigarro na mão. Então de onde veio o cheiro forte? Estou feliz por ser o Shawn. E se fosse um homem que eu não conhecia?

— Estou com Ruel! — explicou. — Ele me pediu para vir com ele, então... — disse.

— Ah, tudo bem! — assenti fazendo um gesto com as mãos, dizendo que não era necessário ele se explicar para mim.

Alisei meus braços de novo. Hoje está fazendo mais frio do que as outras vezes que vim. Estou arrependida por não ter trazido um casaco de frio.

— Eu só vim porque senti um cheiro forte de cigarro... — comentei. — Você estava fumando? — perguntei encarando seu rosto

— Não! Não era eu. — falou negando e olhando para baixo. — Você sabe que fumo, mas dessa vez, não era eu. — riu, e assenti enquanto ria com ele

— Entendi. — estalei a língua.

Ficamos em silêncio por um momento, enquanto um olhava para cara do outro. Estava um pouco constrangedor, mas por quê? Eu e o Shawn somos amigos há um bom tempo.

— Você tem visto o Connor? — perguntei quebrando o gelo.

— Sim! Vi ele pela tarde. — respondeu enquanto assentia. 

O Connor não foi para a escola hoje. O loiro me disse estar doente. Pegou uma gripe porque estávamos sentados no banco da minha casa conversando. O tempo fechou, e a chuva começou a cair. Falei que ele poderia ficar doente, mas o garoto não se preocupou. 

Agora me sinto culpada.

— Passei na casa dele para pegar uma coisa. — explicou. — Por que não senta? — perguntou. — Eu não trouxe casaco, mas se estivesse aqui, eu daria para você. — me olhou. — Você está tremendo! — apontou para o meu braço.

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