SEIS

LORE

O vento que entrava pela janela do carro, fazia meu corpo se arrepiar. Estava frio e a chuva começou a cair minutos atrás. Fraca, na verdade, mas com certeza já engrossaria em segundos. O motorista dirigia tranquilamente. Minha mãe estava ao meu lado, e meu pai no banco da frente. Estávamos indo para o funeral de Edgar. Um homem que trabalhava com meu pai na empresa. Ele sofreu um infarto.

Quando acordei e desci para cozinha, onde pretendia comer alguma coisa. Vi Carla com um semblante triste. Eu estava arrumada, pois iria até a casa da Ariel para estudarmos, porém, desisti quando a mulher deu a notícia. Eu não conhecia Edgar, mas já o vi algumas vezes nos eventos e na empresa. Meu pai estava arrasado. O homem tinha uma muita consideração pelo Edgar. O falecido era praticamente como se fosse da família para ele.

Quando o carro parou, descemos e entramos no cemitério. A chuva começou a engrossar, e por sorte, lembrei de pegar o guarda-chuva. Quando nos aproximamos da família Miles. Meus pais abraçaram a viúva e uma garota, então fiz o mesmo, dando um sorriso reconfortante para a sua filha de nove anos, que chorava abraçada a sua mãe. Isso me fez chorar ao ver seu sofrimento, qual nunca me imagino passando.

A esposa do Edgar, Catarina, caminhou até a lápide do marido e colocou sua mão no peito. Ela suspirou fundo e fechou os olhos, no intuito de começar um discurso. Sua voz era sofrida, e lenta, cheia de dor e saudade. Suas palavras foram breves, mas dolorosamente lindas.

Meu pai desviou sua atenção para algo atrás de nós, e para matar minha curiosidade, virei a minha cabeça. O mais velho caminhou até a família que acabara de chegar, cumprimentando-os, e assim que eles se aproximaram, nos cumprimentaram também.

— Lamentável! — disse Ralph. — Que Deus conforte o coração da família, e guarde o falecido em um bom lugar! — acrescentou suspirando. — Eu nem tive a chance de conhecê-lo... — suspirou mais uma vez. — É realmente uma pena! — olhou triste para o chão abaixo dos seus pés. Ele parecia decepcionado.

Kate, sua esposa, se aproximou de Catarina, e abraçou a mulher. Levou sua mão até o ombro da viúva, e alisou o local enquanto conversavam.

O que me deixou curiosa foi o fato do Ruel não vir com os pais. Sei que ele não conhecia o Edgar, mas como sua família trabalhará com a empresa, seria legal se ele também viesse e prestasse apoio. Mas bom... isso era opcional.

Me ajeitei ao lado do meu pai, e voltei a olhar para o pessoal que estavam discursando. Agora eram os amigos. Segurei forte meu guarda-chuva, e também meu celular com a outra mão. O frio estava ficando pior. Eu estava com um vestido preto. Era um pouco justo no corpo e batia no meio das minhas coxas. Também um casaco escuro por cima, o qual passava um pouco do tecido do vestido. A bota preta que eu usava tinha um pequeno salto nós pés. Meu cabelo estava solto.

— Lore... Esse é o seu nome, certo!? — Ralph perguntou sorrindo, e assenti ao virar para ele. — O Ruel foi no banheiro, mas já faz um bom tempo... — murmurou. — Você poderia chamá-lo? — pediu, e pressionei os lábios, hesitante.

Meu pai olhou para o homem ao nosso lado com seu olhar era sério e o maxilar trincado. Logo olhou para mim com um sorriso pequeno, e assentiu, como se estivesse permitindo.

— Claro! Posso sim. — falei. Curvei um traço com os lábios e dei as costas.

Caminhei para onde ficava o banheiro. A grama e as gotas de chuvas molhavam as minhas botas. Acabei tropeçando em uma pedra, o que me fez revirar os olhos e xingar baixinho. Como não tinha nenhuma placa ou aviso, dizendo se era masculino ou feminino, entrei sem demora, logo vendo o loiro alto de costas para mim.

Ele mexia algo em sua frente. Seus braços se movimentavam rápidos. Notei um cartão sujo com um pó branco nele. Ruel guardou o mesmo no bolso, e abaixou sua cabeça, fazendo um barulho que me presumir que o loiro estava inalando o pozinho. Mas, após fungar seu nariz de novo e jogar sua cabeça para trás, tive certeza. Ele estava sorrindo.

Logo o garoto inclinou seu corpo para trás e mexeu no nariz. Quando o mesmo se virou, seus olhos arregalaram quando me pegou parada olhando para ele. Fiquei sem reação. Cocei a garganta enquanto tentava disfarçar olhando para baixo.

— Costuma entrar sem avisar? — perguntou. Ele parecia irritado. Sua voz era séria e firme.

— Poderia ser outra pessoa. Até mesmo o seu pai. — respondi. — Ele que me mandou vir te chamar. — molhei os lábios, enquanto fechava o guarda-chuva.

Ruel riu sem humor, e assentiu como se tivesse pensado em algo. Lavou o rosto na torneira da pia branca e logo voltou a me olhar, me encarando sem interesse.

— Você não viu nada, está bem!? — disse.

— Eu não vi você se drogando... — ri sem humor. O loiro negou em reprovação. — Não. Eu não vi nada! — eu disse, firme.

Ficamos em silêncio enquanto ele lavava as mãos. Por mais que o banheiro seja público, fiquei impressionada por estar limpo e cheiroso. Mas, ainda assim, acho que ninguém deveria fazer esse tipo de coisa aqui.

Minha atenção estava nele e nos movimentos que suas mãos realizavam. Encarei os machucados que tinham nelas. Os gomos estavam avermelhados. Pareciam ralados. Olhei para o seu rosto, mas o loiro estava encarando a água que saía da torneira brilhosa, a qual parecia ser de metal.

— Você está bem?... — perguntei.

— Sim! — deu de ombros.

Ruel estava cansado e aflito, como se estivesse decepcionado e frustrado. E por mais que eu não quisesse forçar a barra para fazer com que ele talvez desabafasse ou conversasse, eu queria que ele ficasse bem.

— O que acha de sair daqui!? — sorri esperançosa. O garoto me olhou após fechar a torneira, e ajeitou sua postura.

Ele vestia uma calça escura, e uma camisa preta de gola alta. Um sobretudo por cima, da mesma cor. Ele usava um sapato social, o que me fez franzi a testa, pois eu nunca tinha o visto usando algo assim, mas admito que caiu bem nele.

Ruel esfregou o nariz mais uma vez, e assentiu devagar. Acho que ele estava começando a ficar drogado, o que me lembrou de ontem na festa, quando o vi após ter discutido com o Connor. O loiro ficou chapado depois de um baseado e meio, o qual ele dividia com o Nate. Ficamos conversando durante a noite inteira, enquanto eu bebia alguma bebida qualquer.

Acabei descobrindo que ele não gostava muito de comida apimentada, já eu não ligava, pois não como diariamente, então para mim, tanto faz. Também descobri que ele ouvia muito de Chase Atlantic, e assumo que as músicas deles são boas.

Saímos do banheiro sem dizer uma palavra. Para quebrar o clima, avisei que iria comunicar aos nossos pais que iríamos sair. Pedi para que ele fosse pro carro, para os seus não o verem naquele estado.

Me aproximei depressa assim que avistei Kate e minha mãe conversando sobre alguma coisa. Ralph e meu pai estavam distantes. Os dois tinham expressões sérias e pareciam estar sussurrando. Benjamin olhou para mim e sorriu exagerado.

— Mãe, eu vou dar uma volta com o Ruel, okay? — eu disse. — Prometo voltar antes do jantar. — avisei, e dei uma olhadinha na tela do meu telefone. Eram três da tarde.

Minha mãe assentiu, e Kate sorriu para mim. Acenei como despedida, e sai do cemitério, onde procurei Ruel, e me aproximei ao vê-lo escorado em seu carro. Seus olhos estavam estreitos, e o chaveiro onde tinha a chave do automóvel e outras três, balançava em seu dedo indicador.

— Eu dirijo! — disse pegando as chaves.

— Sonha! — ele disse e tentou pegar de volta da minha mão. A chuva havia cessado.

— Você não está em condições, e digamos que eu não quero morrer cedo... — falei. — E é isso que irá acontecer, caso você dirigir! — pisquei.

Ruel riu e deu de ombros. Pelo menos, arranquei seu primeiro sorriso do dia, eu acho. Entramos no carro e comecei a dirigir. Meu pai me ensinou quando eu tinha dezesseis. Ele disse que assim que eu fizesse dezoito, me daria um, e eu tiraria a minha carteira de habilitação.

Sua cabeça balançava ao som da música que o mesmo colocou, e como nenhuma surpresa, era do Chase Atlantic. O nome era Swim. Acabei rindo dos seus lábios se mexendo enquanto ele cantarolava a melodia.

Ruel não aparentava ser o que as pessoas falavam. Comigo não, pelo menos. Ele era legal, sua companhia era agradável, e para a minha surpresa, era divertido e fazia algumas piadas, que, na verdade, para mim eram péssimas.

Ele me olhou confuso ao perceber o lugar em que parei o seu carro e levantou suas sobrancelhas. Sua boca estava aberta, e dei de ombros.

— Sério? — murmurou. — Aqui? — perguntou sem ânimo, e desci do carro.

— Você parece estar de mau-humor, então acho que uma partida de boliche melhorará isso... — eu disse abrindo a porta para que ele saísse.

Sorri quando o alto saiu do seu e então entramos no Boliche Ball. Era um lugar onde tinha várias pistas de boliche e inúmeras pessoas passavam a maioria do tempo aqui, jogando.

Ruel sentou em uma cadeira. Sua expressão era péssima, então me aproximei dele e sentei em sua frente.

— Pode pelo menos tentar se divertir hoje!? — perguntei baixo. — Não sei o que você está passando, mas quero que você tente esquecer um pouco, e jogue boliche comigo. — pedi, e pressionei os lábios ao perceber como a última frase havia soado egoísta.

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