POV: AIRYS
Pisquei algumas vezes quando ele se moveu rápido, me puxando para cima sem aviso.
Seus braços fortes envolveram minhas pernas, me tirando do chão sem esforço. Meu corpo ficou colado ao dele, minha cabeça próxima ao seu tórax. O calor que ele emanava contrastava com o frio ao redor.
— Eu posso andar. — Resmunguei, mesmo gostando do calor que sua pele irradiava.
— Sangrará mais. — Daimon respondeu, indiferente.
Fiz uma careta.
— Isso não pareceu te preocupar antes, quando estava me caçando. — Empurrei seu ombro, tentando me soltar. — Me deixe descer.
Ele ignorou minha tentativa de resistência.
— Seu sangue tem um cheiro doce. Atrairá predadores. — Seu olhar encontrou o me dê forma intensa.
— Além do predador que já me carrega? — Levantei o queixo, desafiando-o. — Não sabia que o Alfa Supremo era irônico.
Ele riu baixo, um som grave, sem humor.
— Para uma presa, você fala demais. — O tom veio carregado de irritação.
Daimon parou em frente ao carro e me lançou um olhar frio.
— Agora entendo por que a venderam.
Abri a boca para responder, mas as palavras morreram antes de saírem. Um aperto incômodo cresceu no meu peito.
O que eu esperava?
Fui vendida como mercadoria.
E entre ser entregue a uma fera ou a um bordel, talvez essa fosse a opção menos pior.
Se esse era o destino traçado pela Deusa, então ela definitivamente estava fazendo um péssimo trabalho.
Assim que a porta se abriu, fui empurrada para dentro. Antes que pudesse reagir, Daimon socou a porta do carro com força, amassando o metal antes de entrar pelo outro lado.
Franzi o cenho, me virando para ele. Seu olhar intenso encontrou o meu de canto, analisando minha reação.
— Se saltar do veículo mais uma vez, não será apenas caçada. — Sua voz saiu rouca, misturada com um tom mais profundo.
Um arrepio subiu pela minha espinha.
Um de seus olhos estava vermelho sangue, o outro mantinha o tom terroso. Sua fera estava parcialmente no controle.
Meu corpo ficou tenso. Eu estava encurralada dentro do carro, presa com um monstro instável.
— Fenrir estava avaliando você… — Ele inclinou alguns centímetros, predatório.
Minhas costas se pressionaram contra a porta, meus dedos apertando o estofado.
— Fenrir? — Hesitei.
Daimon umedeceu os lábios.
— Você não passou no primeiro teste. — Sua pupila dilatou, fundindo os dois tons em um só. — Não gostamos de desperdiçar nosso tempo, humana.
Engoli seco e assenti em silêncio, sem ter ideia do que dizer.
— Se teme a morte... Talvez tenha sido um erro tê-la comprado. — Um rosnado baixo acompanhou suas palavras, impaciente.
Ele se virou para a estrada, os dedos apertando o volante.
Seus músculos estavam rígidos, os nós dos dedos brancos de força. As garras estavam expostas, compridas demais para sua forma humana.
A energia assassina que emanava dele era sufocante.
Eu não me mexi.
A respiração dele era profunda, controlada. Mas tudo nele parecia prestes a explodir.
Eu nunca tinha sentido algo assim antes.
— Eu não pedi por isso… — Sussurrei, torcendo as mãos no colo em um gesto nervoso.
No retrovisor, vi Daimon me observar. Seu olhar era intenso, avaliador.
— Por que me comprou, Alfa?
Ele não respondeu. Apenas tirou a mão do câmbio e a pousou sobre as minhas, impedindo meus dedos inquietos de continuarem o movimento.
Minha respiração travou.
Seus dedos eram ásperos, firmes, grandes o suficiente para cobrir completamente os meus. Havia cortes recentes e marcas nos nós dos dedos, como se tivesse socado algo recentemente.
Levantei os olhos devagar e encontrei os dele. Ele já estava me observando.
— Você está gelada. — Comentou sem emoção, ligando o aquecedor do carro.
O motor roncou quando ele acelerou, ignorando a tempestade que castigava a estrada.
Tentei puxar minha mão, mas Daimon não soltou.
Franzi o cenho. Esse homem era estranho. Incomum.
— Por que foi vendida? — Sua voz veio de repente, firme.
Ele virou meu pulso para cima, pressionando dois dedos sobre minha pele, sentindo minha pulsação.
— Você ouviu o que meu ex-marido disse. — Minha voz soou amarga. — Fui acusada de traição.
A lembrança fez meu estômago revirar. A humilhação, as mentiras… tudo voltou à tona.
— E qual é a sua verdade? — Daimon perguntou sem desviar os olhos da estrada.
Mas seus dedos continuaram ali. Sentindo cada batida acelerada do meu coração.
Eu engoli em seco.
— A verdade é uma só! — Fechei a mão com força e puxei de volta, desviando o olhar para a janela. — Me acusaram de traição. Disseram que passei a noite com outro homem, em um quarto próximo ao bar onde eu bebia.
— E traiu? — A mudança em sua postura foi sutil, mas perceptível. — Você se lembra do que aconteceu?
Por que ele estava tão interessado nisso?
Era mais um teste?
Respirei fundo.
— Tudo que me lembro é de ter encontrado meu marido na cama com a minha irmã. Na minha casa. — A raiva subiu pelo meu peito, queimando. — Ameacei que contaria ao conselho lupino sobre a traição. Queria uma audiência com... você.
Olhei de canto, tentando captar alguma reação, mas Daimon não se virou. Ainda assim, percebi que suas narinas se dilatavam de tempos em tempos.
Ele estava farejando algo.
Mentiras? Ou tentava captar minhas emoções?
— Depois, fui ao bar. Queria afogar tudo na tequila. — Fechei os olhos por um instante, buscando os fragmentos de memória. — Me lembro de ouvir Malik dizendo que eu precisava descansar… e Eloy sorria ao fundo.
Minhas mãos apertaram meu próprio colo.
— Meu corpo pesava. Minha mente pulsava. Eu não tinha bebido tanto para me sentir assim.
A ansiedade tomou conta, ofeguei algumas vezes incrédula por tudo.
Então, Daimon rosnou. O som reverberou pelo espaço fechado, vibrando dentro de mim.
— Te drogaram.
Não foi uma pergunta. Foi uma certeza.
— Sim. — Meus olhos lacrimejaram. — Depois disto, lembro apenas de um quarto e uma presença imponente... Havia aquele olhar, aqueles olhos predatórios fixos em mim, tão tristes... Tão famintos, tão...
Me virei para Daimon que parou o carro me fitou com intensidade, olhos terrosos cintilando vermelho sangue.
Aquele olhar. Aquela intensidade.
Ele se inclinou para frente próximo demais, agarrando meu queixo:
— Tão o quê?
— Perdido... — as palavras saíram baixas e sem força.
Daimon me estudou por um longo momento. Seus olhos analisavam cada detalhe do meu rosto. Sua respiração mudou, ficando mais pesada.
— Você sabe quem era o homem do quarto? — Seus dentes se mostraram por um instante quando ele rosnou, e as garras tilintaram contra o volante. — Por que te enviaram para ele?
Revirei as lembranças, tentando juntar peças que não se encaixavam. Nada.
Por que ele queria tanto essa resposta?
Era algum inimigo do Alfa Supremo?
— E-eu... — Sibilei buscando alguma resposta. — Não.
Daimon me agarrou pela nuca e me puxou para frente, colando nossas testas.
Minha pele queimava.
Coloquei as mãos contra seu peito em um reflexo instintivo, tentando empurrá-lo, mas ele era sólido, implacável. Não cedia.
— Você deseja vingança, humana? — Ressoou imponente, sua pergunta me pegou desprevenida.
— Eu não... — Vacilei e notei um singelo sorriso se formando no canto de sua boca.
— Um dia, terá que decidir se será a presa… ou a caçadora, Airys Monveil!
Daimon saiu do carro sem dizer nada, me deixando sozinha com a confusão em minha mente.
Ele sabia quem eu era?
Antes que eu pudesse processar, ouvi um ruído metálico. A porta ao meu lado foi arrancada sem esforço.
Engoli em seco e saí do carro, sentindo o ar gélido envolver minha pele.
Diante de mim, um grande portão se erguia. As gravuras entalhadas na superfície eram símbolos antigos, a escrita dos Lycans.
Meus olhos se fixaram neles. Algo parecia errado.
As palavras mudavam. As letras se realinhavam, como se estivessem sendo traduzidas diante dos meus olhos.
Antes que pudesse ler, uma rajada de vento forte rodopiou ao meu corpo, arrepiando minha pele. Minha respiração ficou presa na garganta quando um sussurro, baixo e etéreo, ecoou junto ao vento:
“A escolhida.”
POV: DAIMON“Você ouviu?” Fenrir rosnou dentro de mim, sua voz grave e fria ressoando na minha mente.Assenti levemente, analisando a pequena criatura à minha frente. Ela tremia, encolhida contra o frio, tentando se aquecer com as próprias mãos. Presa. Frágil. Pequena demais para estar aqui.— Por que ela? — Questionei Fenrir, observando a humana se aproximar das gravuras entalhadas na pedra. Apenas receptáculos do grande lobo ancestral conseguiam lê-las. Mas Airys… ela parecia entender algo.Seus dedos deslizaram pelas inscrições. Notei quando seus olhos se fecharam por um instante, a respiração ficando mais pesada. Um segundo depois, ela recuou bruscamente, como se tivesse visto um fantasma. Seu cheiro mudou. O medo de sempre ainda estava ali, mas agora misturado a algo diferente. Algo mais profundo.“Temendo mais do que nós.” Fenrir estalou a língua, impaciente. Ele estava perto demais da superfície.— Há algo nela. — Tombei a cabeça de lado, tocando sua costas a empurrando para fr
POV: AIRYSMe via em meio à escuridão. Próximo à grande janela, uma silhueta imponente chamava minha atenção. Ombros largos, pele nua iluminada pela pouca luz. Ele virava lentamente com um copo entre os dedos, fixando em mim.Olhos terrosos que cintilavam em um vermelho intenso. Predatórios. Avaliando. Caçando.Meu peito subia e descia rápido, como se algo dentro de mim soubesse que eu precisava correr. Mas meus pés não se moviam. Algo nele me chamava, me atraía. No instante seguinte, ele desapareceu.Um arrepio subiu por minha espinha quando senti o calor de sua respiração contra minha nuca.— Fuja enquanto ainda há tempo. — A voz grave e rouca vibrava contra meus cabelos, provocando um estremecimento involuntário em meu corpo.Não respondi. Apenas me virei, lentamente, encarando o homem à minha frente. A tensão entre nós se expandia. Minha mão subiu, hesitante, tocando sua pele quente. Meus dedos deslizaram por seu peito firme, sentindo cada contorno, cada músculo que se enrijecia s
POV: AIRYS— Designada? — Indaguei confusa, tentando compreender o significado. — O que isto quer dizer?Daimon não respondeu. Seu olhar permaneceu fixo na mulher de olhos celestes, como se a conversa não me envolvesse. Um frio percorreu minha espinha.O que eu estava fazendo ali?— Inicie o teste. — Daimon ordenou, sua voz grave ecoando no salão.— Que teste? — Minha voz se elevou, tentando quebrar a barreira de silêncio. — O que vão fazer comigo?!Ninguém respondeu.Antes que pudesse reagir, algo me atingiu. Meu corpo perdeu a firmeza, minha visão turvou. O ar foi arrancado dos meus pulmões, e o chão desapareceu sob meus pés. O salão sumiu. O tempo deixou de existir.Minha cabeça girava quando me vi em um lugar desconhecido.A névoa espessa cobria o chão, rastejando ao redor como se tivesse vida própria. O cheiro úmido da terra invadiu minhas narinas. Meu corpo arrepiou inteiro, a sensação de perigo se tornando insuportável.“É perigoso ficarmos aqui.” Uma voz sussurrou ao meu redor
POV: AIRYS— O que foi aquilo?! — Gritei, recuperando o fôlego enquanto socava o chão. Meu corpo tremia, não sabia se era pelo medo ou pela raiva. Me levantei bruscamente, os olhos varrendo o ambiente. — O que vocês fizeram comigo? Onde eu estava?!As mulheres se entreolharam, mas nenhuma respondeu. Seus olhares recaíram sobre Daimon, que permanecia impassível, como se minha fúria não fosse nada além de um incômodo menor.— Você! — Avancei em sua direção, o sangue fervendo em minhas veias. Daimon não se moveu. Mantinha as mãos nos bolsos, a postura relaxada, mas seu olhar seguia cada um dos meus passos. Como se já soubesse exatamente o que eu faria.Levantei o dedo, apontando para ele.— Acha que pode me caçar, me jogar naquele inferno com uma fera e brincar comigo?!Seus olhos desceram lentamente para meu dedo erguido. Seu cenho franziu levemente e uma sobrancelha arqueou, a expressão carregada de um aviso silencioso.— Eu não vou ser sua presa! — Continuei sentindo a adrenalina alim
POV: AIRYSA voz do beta rompeu o silêncio, e eu me virei para ele.— O Alfa me alertou que você estava analisando cada caminho por onde passava. A mansão foi construída para ser impenetrável.Eles haviam percebido minhas intenções.— Estão tentando evitar que alguém entre... ou saia? — Me aproximei do seu lado.— Você é astuta. — Symon comentou enquanto dobrava um corredor estreito, escolhendo um caminho diferente. Franzi o cenho, confusa com a mudança de rota.— A segunda opção é a mais adequada. — Ele continuou, sem me olhar. — Deve saber das histórias sobre o novo Lycan Supremo.Engoli em seco.— Sei que sua fera é instável. Na noite do Solstício Sombrio, Daimon foi consumido por seu lobo, Fenrir. Ele perdeu o controle, tomado pela sede de sangue e guerra... e isso levou à morte de seu próprio irmão. — Minha voz vacilou ao lembrar da história que o antigo Alfa da minha alcateia, o pai de Malik, contava com tanto temor. — É isso que estão tentando conter?Symon permaneceu em silênc
POV: AIRYSMeu corpo estava tenso. Controlei a respiração, tentando não demonstrar o medo que sempre surgia quando ele se aproximava. Se Daimon quisesse me matar, bastaria um único movimento. Eu não teria chance.— Vai manter o mistério ou pretende me contar por que ainda estou viva? — Arqueei uma sobrancelha, em um desafio perigoso.Inclinei-me para frente, reunindo uma coragem que eu fingia ter. Meus dedos deslizaram lentamente por sua camisa, ousados demais para alguém na minha posição.Daimon permaneceu imóvel, observando cada movimento, seus olhos terrosos me analisando com atenção afiada.Minhas mãos pararam nos botões abertos de sua camisa. O tecido se afastou levemente quando toquei sua pele quente, revelando as tatuagens marcadas em traços profundos.— Os quatro pilares do equilíbrio lupino… — murmurei, reconhecendo as inscrições e símbolos.Passei os dedos pelas marcas, sentindo a textura da tinta e da pele sob eles.— O que mais suas tatuagens contam, Rei Alfa?Daimon não r
POV: AYRIS— Eu não entendo. — Sussurrei contra o seu rosto, respirando de forma lenta e irregular. Meu coração martelava no peito, minha pele formigava com sua proximidade sufocante. — Você quer que eu lute para me livrar de você?Daimon soltou um riso baixo, rouco, carregado de um sarcasmo que fez meu estômago se contrair. Sua mão deslizou para os meus cabelos, os dedos afundando com uma possessividade que me fez estremecer.— Pequena humana, você não é tão fraca quanto pensa. — Sua voz era grave, cada palavra carregada de uma certeza assustadora.Minha respiração vacilou quando seus dedos se moveram em minha nuca, massageando suavemente, um contraste perigoso com a brutalidade que exalava. Um arrepio subiu por minha espinha, meu corpo reagindo contra minha vontade. Daimon percebeu. Seus olhos predatórios brilharam, e antes que pudesse me afastar, ele tirou a mão, deixando-a suspensa ao lado do meu rosto, como se testasse meus limites.— O que você sabe sobre sua linhagem?Minha men
POV: AIRYSMinhas pernas vacilaram.Uma única lágrima escorreu pelo canto do meu olho antes que eu pudesse evitar. O aperto no peito veio forte, esmagador. Meus lábios estremeceram.Fiquei em silêncio, sem coragem de encará-lo.“Como ele sabe?”“Como consegue sentir isso?”Desde que minha mãe morreu ou melhor, foi assassinada, nunca me senti verdadeiramente amada. Sempre fui um erro. Sempre fui... apenas a humana.Engoli a dor respirando fundo, tentando me recompor.— Eu já terminei minha refeição, Alfa. Posso me recolher? — Era tudo o que conseguia dizer.Daimon deslizou o polegar por minha bochecha, limpando a trilha úmida da lágrima. Seu toque era quente, áspero e impiedoso.— Me olhe. — Sua voz saiu baixa predatória e fria, seguida por uma autoridade que não permitia questionamentos.Relutei, mas fiz o que ele ordenou, abaixando levemente a cabeça até que nossos olhares se alinhassem.— A dor nos torna mais fortes. — Seu tom era direto, impassível. — Pegue o que sente e sobreviva.