Lukke Rock
Acordei com um peso familiar ao meu lado, mas foi o riso abafado que realmente me tirou do sono. Abri os olhos, piscando contra a luz fraca que entrava pelas cortinas do quarto do hotel. Ao meu lado, duas mulheres estavam aninhadas nos lençóis, seus rostos brilhando com sorrisos maliciosos.
— Bom dia, meninas — murmurei, minha voz rouca de sono, mas carregada daquela confiança insolente que me acompanhava em todas as manhãs como essa.
Elas riram, seus corpos se movendo sob os lençóis como cobras preguiçosas. Uma delas, a loira, traçou uma linha no meu peito com as unhas, enquanto a outra, morena de olhos penetrantes, sussurrava algo que não consegui entender, mas que fez meu sorriso se alargar.
— Prontas para mais uma rodada? — perguntei, arqueando uma sobrancelha. Meu sorriso aumentou ainda mais quando ambas responderam com um entusiasmado “sim”.
Antes que pudéssemos nos mover, porém, a porta do quarto foi aberta com um estrondo, e a figura severa de Stella, minha assessora, apareceu na entrada. Seus olhos dispararam raios na minha direção antes mesmo de notar as mulheres ao meu lado. Ela cruzou os braços, sua expressão mais dura do que uma pedra.
— Lucas! — Sua voz cortou o ar como uma faca afiada. — O que diabos você pensa que está fazendo?
As garotas congelaram, seu entusiasmo murchando instantaneamente. Stella se aproximou da cama com passos decididos, o som dos saltos batendo contra o chão de mármore. Eu mal tive tempo de processar o que estava acontecendo antes que ela agarrasse os lençóis e os puxasse, jogando-os para longe de nós três.
— Ei, Stella! — protestei, tentando puxar o cobertor de volta. — Estávamos no meio de uma coisa importante aqui.
— Importante? — ela bufou, mandando as garotas saírem do quarto com um gesto impaciente da mão. — Saíam daqui, agora! — As duas mulheres saltaram da cama, pegando suas roupas espalhadas pelo chão, murmurando desculpas antes de desaparecerem pela porta.
— Ah, qual é, Stella! — falei, rindo enquanto me jogava de volta no travesseiro, observando-a arrumar a bagunça. — Eu estava apenas vivendo a vida.
— Vivendo a vida? — Ela virou-se para mim, mãos nos quadris. — Lucas, o que você acha que está fazendo? Isso não é viver a vida, é um caminho direto para o desastre! Você não sabe nem de onde essas garotas vieram, quem são, se têm alguma doença!
Revirei os olhos e dei de ombros.
— Relaxa, Stella. Eu sempre me protejo direitinho. Você sabe disso.
Ela soltou um suspiro exasperado e revirou os olhos dramaticamente.
— Um dia, essa sua despreocupação vai te meter em uma encrenca da qual eu não vou poder te tirar.
Nesse momento, Arthur, o marido de Stella e também meu assessor, entrou no quarto. Ele parou, piscando para a cena que se desenrolava diante dele. O olhar dele percorreu a bagunça no chão, o lençol jogado no canto, as garrafas vazias e a minha expressão despreocupada.
— Ah, merda… — Ele passou a mão pelo cabelo e suspirou. — Vou chamar a camareira.
Antes que ele pudesse sair, Stella o agarrou pelo braço, seus olhos fervendo de irritação.
— E você, Arthur? Não deveria ter tomado conta desse idiota ontem à noite?
Arthur levantou as mãos em defesa, um sorriso torto surgindo em seus lábios.
— Hei, eu não sou babá de homem barbado. Ele é responsável pelas próprias ações.
— Responsável? — Stella quase riu, mas não havia humor na expressão dela. — Desde quando você viu Lucas ser responsável por qualquer coisa?
Os dois começaram a discutir, com Stella falando sobre profissionalismo e reputação enquanto Arthur replicava que ele não poderia controlar tudo o que eu fazia. Enquanto eles trocavam farpas, eu apenas me encostei na cabeceira da cama, observando como se fosse um espetáculo montado exclusivamente para mim, acendi um cigarro e os encarei.
— Gente, calma… — tentei intervir, mas a única resposta que recebi foi um “Cala a boca!” em uníssono dos dois.
Levantei as mãos em rendição, lutando para esconder o sorriso que ameaçava se formar. Era sempre a mesma coisa com esses dois. Stella, preocupada com minha imagem e reputação, e Arthur, tentando manter o equilíbrio entre me apoiar e não ser responsabilizado por minhas ações. E eu? Bem, eu só estava tentando viver a minha vida do jeito que eu queria, sem me importar muito com o que os outros pensavam.
Finalmente, Stella parou de discutir com Arthur e voltou sua atenção para mim. Ela se aproximou da cama, seu olhar furioso suavizando um pouco.
— Lucas, você é um grande astro do rock, com milhões de fãs ao redor do mundo. As pessoas te admiram, te seguem… Elas querem ser como você. Mas isso — ela gesticulou para o quarto — não é o exemplo que você deveria dar.
Suspirei, rolando os olhos.
— Stella, eu sei que você quer o melhor para mim. Mas, honestamente, eu só estou tentando me divertir. Não há nada de errado em aproveitar a vida.
— Aproveitar a vida? — Ela franziu a testa, cruzando os braços novamente. — Viver a vida não significa se destruir no processo. E pare de fumar, esta merda mata além de detonar a voz. — Ela arrancou o cigarro da minha mão e apagou.
Arthur, que estava assistindo em silêncio depois da briga, deu um passo à frente.
— Stella, ele tem razão em parte. Ele tem o direito de viver como quiser. Mas, Lucas — ele olhou diretamente para mim — precisa ser mais cuidadoso. Tem muita gente te observando. Uma bobagem sua pode custar caro, tanto para você quanto para nós.
— Por que vocês não conseguem me chamar de Lukke? — perguntei, rindo.
— Porque a porra do seu nome é Lucas, e Lukke é apenas um personagem. Lucas, nós três nos conhecemos desde novos. Você era um cara bacana que só queria que sua banda de garagem desse certo. Em que momento você viu que fazer essas merdas te fariam bem? — Ela perguntou, apontando para a bagunça de camisinhas, garrafas e lençóis amassados.
Olhei para ambos, sentindo a seriedade da situação começar a se infiltrar. Eles tinham um ponto, e mesmo que eu odiasse admitir, Stella e Arthur sempre estavam ao meu lado, me ajudando a manter tudo nos trilhos. Mesmo quando eu desviava.
— Tá, tá bom — suspirei, erguendo as mãos em um gesto de rendição. — Eu entendi. Vou pegar leve… por hoje.
Stella soltou um suspiro aliviado e se aproximou de mim, apertando meu ombro.
— Só queremos o melhor para você, Lucas. Queremos que você continue brilhando, mas com segurança. — Arthur assentiu, um sorriso cansado nos lábios.
— E talvez tentar evitar outro incidente como o de hoje de manhã.
— Prometo que vou tentar — respondi com um sorriso despreocupado.
— Arthur, faça alguma coisa útil, chame a camareira e lhe dê um agradinho generoso para que isso aqui não pare nos tabloides. — Stella encarou o marido e saiu em seguida.
— Stella é minha amiga, mas cara, como você aguenta ser casado com ela? — Perguntei a Arthur. Ele vivia apanhando dela quando éramos crianças e, no final, se casou com ela.
— Stella tem seus momentos, mas em relação a você ela está certa. Se cuida, Lucas, daqui a pouco vai aparecer uma doida dizendo que tem um filho com você, e aí vai ser um prato cheio para os tabloides. Você lembra daquele B.O. na Alemanha, não lembra? — Ele perguntou, e eu assenti. — Então Stella passou três dias praticamente sem dormir resolvendo aquela merda. Por favor, se arrume, pois vou chamar a camareira para resolver essa bagunça aqui.
Arthur tocou meu ombro e sorriu antes de sair. Por mais que eu quisesse viver a vida do meu jeito, sabia que, no fundo, eles estavam certos. Eu precisava ter um pouco mais de responsabilidade… mas isso não significava que eu ia parar de me divertir. Eu era Lukke Rock, afinal de contas. E diversão fazia parte do pacote.
Ainda sorrindo, deixei minha cabeça cair de volta no travesseiro. Havia shows a serem feitos, fãs a serem encantados e, claro, muita vida a ser vivida. E eu estava pronto para tudo isso.
Atena GodoyNo dia seguinte, acordei com uma sensação de leveza que há tempos não sentia. O café estava na mesa quando Artemis entrou na cozinha com Ellah no colo, ambas ainda com cara de sono.— Bom dia, meu raio de lua! — Artemis beijou minha testa.— Bom dia, Artemis. — Sorri para ela. — Bom dia, Ellah!— Bom dia, titia. — Minha sobrinha sorriu.Enquanto tomávamos café, Artemis começou a falar sobre os planos para o dia.— Atena, por que não tira um dia de folga e sai com a gente? Eu sei que você tem trabalho, mas seria ótimo passarmos um tempo juntas, já que amanhã eu volto para casa.Suspirei, sabendo que ela estava certa, mas também consciente das minhas responsabilidades no trabalho.— Eu adoraria, Artemis, mas hoje não posso. Minha agenda está cheia. Vou tentar sair mais cedo para nos encontrarmos, tudo bem?— Tudo bem, então vou preparar uma coisinha para comermos mais tarde.— Ok. Tenho que ir, até mais tarde meninas. — Beijei a testa da minha sobrinha que riu.— Bom trabalh
Na manhã seguinte, acordei com o rosto inchado de tanto chorar. A dor da perda de Artemis ainda estava fresca, e meu primeiro pensamento foi para Ellah. Tomei um banho rápido, tentando limpar as marcas da noite, e fui diretamente ao hospital. Isaac estava me esperando na entrada.— Alguma novidade? — perguntei ansiosamente.— A noite foi estável. Eles ainda estão monitorando-a de perto, mas não houve piora.Assenti e segui diretamente para a UTI, determinada a ficar ao lado da minha sobrinha. A cada passo que dava, meu coração apertava mais, na esperança de que a situação estivesse melhorando.Enquanto estava na UTI, observando a respiração lenta e constante de Ellah, meu celular vibrou no bolso da calça. Olhei para o identificador de chamadas e vi o nome do meu pai. Meu coração apertou, e senti uma mistura de alívio e tristeza ao atender.— Pai… — minha voz saiu fraca, carregada de emoção.— Atena, minha filha… — ele começou, sua voz firme, mas cheia de preocupação. — Como você está?
— Joel? — minha voz saiu baixa e cautelosa. — O que você está fazendo aqui?Ele entrou no quarto com um passo decidido, ignorando o olhar apreensivo da enfermeira que estava ali para monitorar Ellah. A tensão no ar era palpável.— Atena, eu preciso saber… — Joel começou, sua voz rouca e carregada de emoção. — É verdade o que disseram? Artemis faleceu? E Ellah, como está?Fechei os olhos por um momento, tentando controlar a onda de frustração que surgia dentro de mim. Artemis não havia sido clara sobre o pai de Ellah, mas ela sempre deixou claro que não era Joel. Ele nunca aceitou o término do relacionamento com Artemis e sempre teve dificuldades em aceitar a realidade.— Infelizmente sim — digo, respirando fundo. — Minha sobrinha está lutando por sua vida.— Me conta a verdade! Ellah é minha filha, não é? Agora que Artemis não está mais aqui, você pode me contar.Chamei Joel para tomar um café no hospital e ele me seguiu. Fizemos os nossos pedidos e ele me encarou com expectativa.— J
Me ajoelhei ao lado de Ellah, envolvendo-a em meus braços. Senti seu corpo pequeno e frágil se aninhar contra o meu, como se estivesse buscando conforto no único lugar onde poderia encontrar alguma segurança.— Ellah… — comecei, minha voz trêmula, tentando manter a calma por ela. — Sua mãe era uma luz, uma estrela brilhante que iluminava a vida de todos ao seu redor. Às vezes, as estrelas têm que voltar para o céu, para brilharem lá em cima, nos protegendo de um lugar melhor.Ela me olhou com aqueles olhos grandes, cheios de lágrimas, mas não disse nada. Eu sabia que minhas palavras não eram suficientes, que nenhum consolo poderia preencher o vazio que Artemis havia deixado. Mas era tudo o que eu podia oferecer.Naquele momento, senti uma mão forte e calejada em meu ombro. Virei-me e vi meu pai, Seu Apolônio, com os olhos vermelhos e inchados de tanto chorar. Ele estava devastado, mais do que eu jamais o tinha visto. Artemis e eu éramos o orgulho do nosso pai, mesmo com nossas diferen
Lukke Rock Me encontrava no meu apartamento em São Paulo, relaxando depois de um longo dia. Ao meu lado, uma modelo aspirante, nem me lembrava o nome dela, mas parecia interessada em uma conversa fútil sobre sua ascensão meteórica no mundo da moda. Claro, eu tinha ouvido essa história antes. Só que minha atenção já estava mais na próxima bebida do que na presença dela. Antes que a noite tomasse qualquer direção, a campainha do meu apartamento tocou, interrompendo nossa "agradável" conversa. Quem seria a essa hora?— Lukke, vai atender ou não? — perguntou a modelo, ajeitando o decote com um sorriso esperto.Revirei os olhos e levantei. Ao abrir a porta, lá estava ela: Stella. Ela sempre sabia quando aparecer. — Ah, Stella! — falei com um sorriso presunçoso. — Não sabia que você viria aqui. — Desde quando tenho que te avisar, Lukke? — Ela entrou sem ser convidada, como sempre fazia, ignorando a minha provocação. — Vim para garantir que você esteja pronto para a entrevista de amanhã.
Atena GodoyA luz do sol atravessava a janela da cozinha, trazendo um brilho suave à mesa, onde eu estava sentada com uma xícara de café quente nas mãos. Alguns dias haviam se passado desde o velório de Artemis, minha irmã mais nova, e a dor ainda parecia presente em cada canto da casa. A ausência dela era quase insuportável. O silêncio, que antes eu considerava reconfortante, agora era um lembrete constante de que ela não voltaria mais. Meu pai estava comigo, como sempre, tentando fazer com que eu não me perdesse nesse luto devastador.Ele se aproximou, puxando uma cadeira à mesa, e me encarou de forma cuidadosa, como se escolhesse as palavras antes de falar.— Está pronta para isso, Atena? — ele perguntou com sua voz grave, sempre tão segura, mesmo nos momentos mais difíceis.Sabia exatamente a que ele se referia. O trabalho, as responsabilidades que eu tinha colocado em pausa para lidar com a morte da minha irmã. Todos esperavam que eu retornasse logo. Minha vida profissional não p
Assim que coloquei o pé no saguão da empresa, senti o peso de estar de volta. Os rostos conhecidos me cumprimentavam com olhares discretos, sussurros de "meus pêsames" ecoando entre os corredores. Todos sabiam o que tinha acontecido, e mesmo que não fosse algo falado em voz alta, a tragédia ainda pairava no ar como uma nuvem densa.Passei pelos funcionários com a cabeça erguida, forçando um sorriso de quem estava pronta para retomar o controle. Mas a verdade era que eu estava longe de estar pronta. Cada passo em direção à minha sala era uma lembrança da minha nova realidade, sem minha irmã para compartilhar as vitórias e derrotas diárias. Ainda assim, aqui estava eu, fingindo que tudo estava bem. Talvez, se eu fingisse o suficiente, acabaria acreditando.Quando me aproximei do meu escritório, Isaac, apareceu à minha frente, o rosto carregado de preocupação. Ele parecia me observar com aquele jeito protetor de sempre, cruzando os braços diante do peito como se estivesse pronto para me
Eu estava no meu quarto, organizando as últimas peças de roupa na mala, quando ouvi uma batida suave na porta. Meu pai entrou devagar, com o semblante carregado de preocupação, como se estivesse ponderando cada palavra que diria.— Atena, você já decidiu como vai fazer essa viagem? — ele perguntou, sem rodeios, com os braços cruzados e a expressão séria. — Pensei que já tínhamos conversado sobre isso. O mais seguro seria você ir de avião.Suspirei, sabendo que ele não aprovaria a minha escolha, mas decidida a não mudar de ideia.— Pai, eu já te disse, vou de carro. — Respondi, tentando manter a calma, embora soubesse que isso só o deixaria mais preocupado. — Quero fazer o mesmo trajeto que Artemis fez... o último trajeto dela.Meu pai respirou fundo, balançando a cabeça com uma mistura de frustração e tristeza. Era difícil para ele entender o motivo que me levava a querer reviver essa jornada. Também não sabia exatamente por que, mas algo dentro de mim sentia que era o certo a fazer.