— Joel? — minha voz saiu baixa e cautelosa. — O que você está fazendo aqui?
Ele entrou no quarto com um passo decidido, ignorando o olhar apreensivo da enfermeira que estava ali para monitorar Ellah. A tensão no ar era palpável.
— Atena, eu preciso saber… — Joel começou, sua voz rouca e carregada de emoção. — É verdade o que disseram? Artemis faleceu? E Ellah, como está?
Fechei os olhos por um momento, tentando controlar a onda de frustração que surgia dentro de mim. Artemis não havia sido clara sobre o pai de Ellah, mas ela sempre deixou claro que não era Joel. Ele nunca aceitou o término do relacionamento com Artemis e sempre teve dificuldades em aceitar a realidade.
— Infelizmente sim — digo, respirando fundo. — Minha sobrinha está lutando por sua vida.
— Me conta a verdade! Ellah é minha filha, não é? Agora que Artemis não está mais aqui, você pode me contar.
Chamei Joel para tomar um café no hospital e ele me seguiu. Fizemos os nossos pedidos e ele me encarou com expectativa.
— Joel, sei o quanto você gostava da minha irmã, não sei o motivo de vocês terem terminado, mas Ellah não é a sua filha.
A expressão dele se desfez.
— Você tem certeza? — Ele me perguntou e assenti.
— Sim, Joel. Absoluta!
— Então quem é o pai da Ellah? — A forma como ele me encarava me deixava desconfortável.
— Não sei, como eu te disse, a minha irmã não me revelou, mas deixou bem claro que não era você.
— Isso não faz sentido! — Joel é insistente.
— Artemis teve seus motivos — respondi, tentando ser o mais firme possível. — Não podemos mudar o passado, Joel. O que precisamos agora é focar em Ellah e em sua recuperação.
Joel continuou me encarando, seu olhar estava fixo e perturbado. O desconforto aumentava dentro de mim à medida que o silêncio se arrastava. Eu sentia uma pressão crescente em meu peito, uma mistura de tristeza e frustração.
— O que você está fazendo? — Perguntei quando vejo ele se aproximando de mim.
— Eu sinto muito se estou sendo insistente — disse Joel, finalmente quebrando o silêncio. — Às vezes, eu me esqueço que Artemis tinha uma irmã gêmea. Eu só... eu só estou tentando entender.
— Entendo que seja difícil — respondi, tentando suavizar meu tom.
Joel respirou fundo, passando a mão pelo rosto com um gesto cansado.
— Desculpe se eu causei algum desconforto, Atena. Não era minha intenção. — Sua voz estava mais suave agora, cheia de arrependimento.
— Tudo bem — digo tentando ser compreensiva.
Joel assentiu, parecendo um pouco mais calmo. Ele se levantou e, antes de sair, olhou para mim com um olhar de agradecimento misturado com dor.
— Vou deixar você em paz. Se precisar de algo, estarei por aqui.
— Obrigada, Joel — respondi.
— Meus sentimentos, sei como Artemis e você eram unidas e como deve ser difícil não tê-la por perto.
Ele se afastou, e eu fiquei sozinha no café do hospital, com pensamentos conflitantes se misturando na minha mente. Voltei para o quarto de Ellah, onde a calma da sala me envolveu novamente.
Quando entrei no quarto, olhei para a pequena, que ainda estava dormindo. Sentei-me ao seu lado, segurando sua mão com ternura, e fiz uma promessa silenciosa.
— Vou fazer tudo o que estiver ao meu alcance para te proteger e te cuidar, Ellah — murmurei, sentindo uma onda de determinação. — Sua mãe fez tudo o que podia para garantir que você tivesse um futuro, e eu vou honrar isso.
Dois dias se passaram, mas a dor ainda era insuportável. Cada hora que passava parecia uma eternidade, e a realidade do que havia acontecido ainda se recusava a se fixar completamente na minha mente. Artemis, minha irmã, minha companheira de vida, havia partido. Eu não sabia como seguir em frente, mas tinha que ser forte por Ellah, minha sobrinha, e por meu pai, Seu Apolônio. Minha sobrinha ainda não está bem, e eu não queria trazê-la para o sepultamento, mas meu pai disse que era importante que ela se despedisse da mãe.
O velório chegou como uma tempestade, devastador e inevitável. Mal havia dormido na noite anterior, e meus olhos estavam inchados e cansados de tanto chorar. Não sabia se era possível derramar mais lágrimas, mas ainda assim, elas continuavam caindo.
Ao chegar à pequena capela onde o velório aconteceria, uma sensação pesada de desespero tomou conta de mim. O espaço era simples, adornado apenas com algumas flores brancas e velas tremeluzentes. No centro da sala, estava o caixão de Artemis, rodeado por uma aura de tristeza e reverência. Olhei para o rosto dela pela última vez, tão sereno e em paz, como se estivesse apenas dormindo. Mas o vazio em seu peito, a ausência de vida, me atingiu como um soco. Eu me ajoelhei ao lado do caixão, sussurrando palavras de despedida que só eu podia ouvir.
— Oh, Artemis… — murmurei, minha voz embargada. — Por que você se foi tão cedo? Quem vai me dar conselhos idiotas agora, quem vai brigar comigo só porque eu trabalho demais? Quem vai me ligar a noite para me contar como foi o dia e planejar uma viagem que nunca vamos fazer? Como vou viver sem você?
As palavras se misturaram com as lágrimas, e tudo que eu conseguia sentir era um vazio profundo. Mas então, um som suave quebrou minha concentração. Era Ellah, minha sobrinha, soluçando baixinho ao meu lado. Ela olhava para o caixão com olhos grandes e cheios de medo, confusão e tristeza.
— Tia Atena… — começou ela, a voz fraca. — Por que a mamãe morreu? Por que ela teve que me deixar?
O peso daquelas perguntas, o desespero na voz de Ellah, quase me despedaçou ali mesmo. Como eu poderia responder? Como explicar a uma criança de seis anos que o mundo pode ser cruel, que a vida pode ser injusta e cruel?
Me ajoelhei ao lado de Ellah, envolvendo-a em meus braços. Senti seu corpo pequeno e frágil se aninhar contra o meu, como se estivesse buscando conforto no único lugar onde poderia encontrar alguma segurança.— Ellah… — comecei, minha voz trêmula, tentando manter a calma por ela. — Sua mãe era uma luz, uma estrela brilhante que iluminava a vida de todos ao seu redor. Às vezes, as estrelas têm que voltar para o céu, para brilharem lá em cima, nos protegendo de um lugar melhor.Ela me olhou com aqueles olhos grandes, cheios de lágrimas, mas não disse nada. Eu sabia que minhas palavras não eram suficientes, que nenhum consolo poderia preencher o vazio que Artemis havia deixado. Mas era tudo o que eu podia oferecer.Naquele momento, senti uma mão forte e calejada em meu ombro. Virei-me e vi meu pai, Seu Apolônio, com os olhos vermelhos e inchados de tanto chorar. Ele estava devastado, mais do que eu jamais o tinha visto. Artemis e eu éramos o orgulho do nosso pai, mesmo com nossas diferen
Lukke Rock Me encontrava no meu apartamento em São Paulo, relaxando depois de um longo dia. Ao meu lado, uma modelo aspirante, nem me lembrava o nome dela, mas parecia interessada em uma conversa fútil sobre sua ascensão meteórica no mundo da moda. Claro, eu tinha ouvido essa história antes. Só que minha atenção já estava mais na próxima bebida do que na presença dela. Antes que a noite tomasse qualquer direção, a campainha do meu apartamento tocou, interrompendo nossa "agradável" conversa. Quem seria a essa hora?— Lukke, vai atender ou não? — perguntou a modelo, ajeitando o decote com um sorriso esperto.Revirei os olhos e levantei. Ao abrir a porta, lá estava ela: Stella. Ela sempre sabia quando aparecer. — Ah, Stella! — falei com um sorriso presunçoso. — Não sabia que você viria aqui. — Desde quando tenho que te avisar, Lukke? — Ela entrou sem ser convidada, como sempre fazia, ignorando a minha provocação. — Vim para garantir que você esteja pronto para a entrevista de amanhã.
Atena GodoyA luz do sol atravessava a janela da cozinha, trazendo um brilho suave à mesa, onde eu estava sentada com uma xícara de café quente nas mãos. Alguns dias haviam se passado desde o velório de Artemis, minha irmã mais nova, e a dor ainda parecia presente em cada canto da casa. A ausência dela era quase insuportável. O silêncio, que antes eu considerava reconfortante, agora era um lembrete constante de que ela não voltaria mais. Meu pai estava comigo, como sempre, tentando fazer com que eu não me perdesse nesse luto devastador.Ele se aproximou, puxando uma cadeira à mesa, e me encarou de forma cuidadosa, como se escolhesse as palavras antes de falar.— Está pronta para isso, Atena? — ele perguntou com sua voz grave, sempre tão segura, mesmo nos momentos mais difíceis.Sabia exatamente a que ele se referia. O trabalho, as responsabilidades que eu tinha colocado em pausa para lidar com a morte da minha irmã. Todos esperavam que eu retornasse logo. Minha vida profissional não p
Assim que coloquei o pé no saguão da empresa, senti o peso de estar de volta. Os rostos conhecidos me cumprimentavam com olhares discretos, sussurros de "meus pêsames" ecoando entre os corredores. Todos sabiam o que tinha acontecido, e mesmo que não fosse algo falado em voz alta, a tragédia ainda pairava no ar como uma nuvem densa.Passei pelos funcionários com a cabeça erguida, forçando um sorriso de quem estava pronta para retomar o controle. Mas a verdade era que eu estava longe de estar pronta. Cada passo em direção à minha sala era uma lembrança da minha nova realidade, sem minha irmã para compartilhar as vitórias e derrotas diárias. Ainda assim, aqui estava eu, fingindo que tudo estava bem. Talvez, se eu fingisse o suficiente, acabaria acreditando.Quando me aproximei do meu escritório, Isaac, apareceu à minha frente, o rosto carregado de preocupação. Ele parecia me observar com aquele jeito protetor de sempre, cruzando os braços diante do peito como se estivesse pronto para me
Eu estava no meu quarto, organizando as últimas peças de roupa na mala, quando ouvi uma batida suave na porta. Meu pai entrou devagar, com o semblante carregado de preocupação, como se estivesse ponderando cada palavra que diria.— Atena, você já decidiu como vai fazer essa viagem? — ele perguntou, sem rodeios, com os braços cruzados e a expressão séria. — Pensei que já tínhamos conversado sobre isso. O mais seguro seria você ir de avião.Suspirei, sabendo que ele não aprovaria a minha escolha, mas decidida a não mudar de ideia.— Pai, eu já te disse, vou de carro. — Respondi, tentando manter a calma, embora soubesse que isso só o deixaria mais preocupado. — Quero fazer o mesmo trajeto que Artemis fez... o último trajeto dela.Meu pai respirou fundo, balançando a cabeça com uma mistura de frustração e tristeza. Era difícil para ele entender o motivo que me levava a querer reviver essa jornada. Também não sabia exatamente por que, mas algo dentro de mim sentia que era o certo a fazer.
Depois de horas na estrada, fizemos algumas paradas rápidas para descansar e esticar as pernas. Toda vez que saíamos do carro, algumas pessoas me olhavam com curiosidade e, inevitavelmente, alguém se aproximava para me perguntar algo que me desconcertava profundamente:— Artemis? Você voltou?Não sabia como reagir de imediato. Mesmo após tudo, as pessoas ainda me confundiam com minha irmã. Por mais que fosse doloroso, eu entendia o motivo. Nossos traços eram quase idênticos, e Artemis tinha um espírito tão vibrante que parecia impossível acreditar que ela realmente se fora.Isaac, ao meu lado, sempre me observava com cautela nessas situações, pronto para intervir se necessário. Mas ele sabia que eu precisava enfrentar esses momentos. Que precisava lidar com o fantasma da minha irmã de maneira própria.— Não, sou a irmã dela, Atena. — Respondia com um sorriso educado, por mais que a dor estivesse sempre ali, em cada confusão.Agora, finalmente, estávamos ali, na casa onde Artemis viveu
Ainda estava sentada na beira da cama, o caderno de Artemis ao meu lado e a carta apertada nas minhas mãos trêmulas. Meu coração não desacelerava desde que li aquelas palavras. "Lukke Rock." O nome ecoava na minha mente como um trovão distante, me atordoando. Eu tentava processar a ideia, mas era quase impossível. O pai de Ellah era um homem que praticamente o mundo inteiro conhecia. Como Artemis pôde esconder isso de mim? E, acima de tudo, quando ela ficou com ele?Estava completamente perdida nesses pensamentos quando ouvi passos lentos subindo as escadas. Isaac. Ele esteve comigo o tempo todo, me apoiando desde que Artemis se foi, e agora, mais do que nunca, eu precisava dele. Mas o que eu diria? Como explicar essa reviravolta sem parecer que eu mesma estava sonhando?A porta do quarto rangeu ao ser aberta, e Isaac entrou em silêncio, me observando de longe por alguns instantes. Ele era tão bom em ler meus sentimentos, talvez até melhor do que eu mesma. Seu olhar cauteloso percorre
Isaac e eu passamos a maior parte do dia limpando a antiga casa de Artemis. Foi doloroso, mais do que eu podia imaginar. Cada objeto que encontrávamos carregava uma lembrança, uma risada ou até mesmo uma discussão boba que já tínhamos esquecido. No final, decidimos distribuir os móveis e as coisas que Artemis não levaria consigo entre os vizinhos. Eles a adoravam. Sabiam que ela estava sempre disposta a ajudar, e, quando contamos sobre seu falecimento, vi lágrimas brotarem em seus olhos. Era como se cada um deles tivesse perdido uma parte de si também.— Ela era boa demais para este mundo — disse uma das vizinhas, enxugando as lágrimas com o dorso da mão.— Sim, era — concordei, sentindo meu coração apertar.Os vizinhos, um a um, nos ofereceram condolências. Era claro o quanto Artemis havia tocado suas vidas. Eu sempre soube que ela era especial, mas ver o impacto que teve em tantas pessoas era ao mesmo tempo bonito e devastador. Depois de horas, finalmente guardamos tudo o que sobrou