Eu estava no meu quarto, organizando as últimas peças de roupa na mala, quando ouvi uma batida suave na porta. Meu pai entrou devagar, com o semblante carregado de preocupação, como se estivesse ponderando cada palavra que diria.— Atena, você já decidiu como vai fazer essa viagem? — ele perguntou, sem rodeios, com os braços cruzados e a expressão séria. — Pensei que já tínhamos conversado sobre isso. O mais seguro seria você ir de avião.Suspirei, sabendo que ele não aprovaria a minha escolha, mas decidida a não mudar de ideia.— Pai, eu já te disse, vou de carro. — Respondi, tentando manter a calma, embora soubesse que isso só o deixaria mais preocupado. — Quero fazer o mesmo trajeto que Artemis fez... o último trajeto dela.Meu pai respirou fundo, balançando a cabeça com uma mistura de frustração e tristeza. Era difícil para ele entender o motivo que me levava a querer reviver essa jornada. Também não sabia exatamente por que, mas algo dentro de mim sentia que era o certo a fazer.
Depois de horas na estrada, fizemos algumas paradas rápidas para descansar e esticar as pernas. Toda vez que saíamos do carro, algumas pessoas me olhavam com curiosidade e, inevitavelmente, alguém se aproximava para me perguntar algo que me desconcertava profundamente:— Artemis? Você voltou?Não sabia como reagir de imediato. Mesmo após tudo, as pessoas ainda me confundiam com minha irmã. Por mais que fosse doloroso, eu entendia o motivo. Nossos traços eram quase idênticos, e Artemis tinha um espírito tão vibrante que parecia impossível acreditar que ela realmente se fora.Isaac, ao meu lado, sempre me observava com cautela nessas situações, pronto para intervir se necessário. Mas ele sabia que eu precisava enfrentar esses momentos. Que precisava lidar com o fantasma da minha irmã de maneira própria.— Não, sou a irmã dela, Atena. — Respondia com um sorriso educado, por mais que a dor estivesse sempre ali, em cada confusão.Agora, finalmente, estávamos ali, na casa onde Artemis viveu
Ainda estava sentada na beira da cama, o caderno de Artemis ao meu lado e a carta apertada nas minhas mãos trêmulas. Meu coração não desacelerava desde que li aquelas palavras. "Lukke Rock." O nome ecoava na minha mente como um trovão distante, me atordoando. Eu tentava processar a ideia, mas era quase impossível. O pai de Ellah era um homem que praticamente o mundo inteiro conhecia. Como Artemis pôde esconder isso de mim? E, acima de tudo, quando ela ficou com ele?Estava completamente perdida nesses pensamentos quando ouvi passos lentos subindo as escadas. Isaac. Ele esteve comigo o tempo todo, me apoiando desde que Artemis se foi, e agora, mais do que nunca, eu precisava dele. Mas o que eu diria? Como explicar essa reviravolta sem parecer que eu mesma estava sonhando?A porta do quarto rangeu ao ser aberta, e Isaac entrou em silêncio, me observando de longe por alguns instantes. Ele era tão bom em ler meus sentimentos, talvez até melhor do que eu mesma. Seu olhar cauteloso percorre
Isaac e eu passamos a maior parte do dia limpando a antiga casa de Artemis. Foi doloroso, mais do que eu podia imaginar. Cada objeto que encontrávamos carregava uma lembrança, uma risada ou até mesmo uma discussão boba que já tínhamos esquecido. No final, decidimos distribuir os móveis e as coisas que Artemis não levaria consigo entre os vizinhos. Eles a adoravam. Sabiam que ela estava sempre disposta a ajudar, e, quando contamos sobre seu falecimento, vi lágrimas brotarem em seus olhos. Era como se cada um deles tivesse perdido uma parte de si também.— Ela era boa demais para este mundo — disse uma das vizinhas, enxugando as lágrimas com o dorso da mão.— Sim, era — concordei, sentindo meu coração apertar.Os vizinhos, um a um, nos ofereceram condolências. Era claro o quanto Artemis havia tocado suas vidas. Eu sempre soube que ela era especial, mas ver o impacto que teve em tantas pessoas era ao mesmo tempo bonito e devastador. Depois de horas, finalmente guardamos tudo o que sobrou
Isaac parou o carro à beira da estrada, do nada, e virou-se para mim com um sorriso presunçoso.— Sua vez, Atena. — Ele entregou as chaves sem esperar por uma resposta.— Sério? Você quer que eu dirija agora? — perguntei, surpresa. Não que eu me importasse, mas Isaac geralmente não largava o volante por nada.— Claro. Acha que só eu vou me divertir? Além disso, você está tensa. Dirigir vai te distrair um pouco. — Ele deu de ombros, me provocando com aquele sorriso que dizia: "você sabe que eu estou certo."Revirei os olhos, mas peguei as chaves. Era melhor do que ficar discutindo, e talvez ele estivesse certo. Assim que me acomodei no banco do motorista e ajustei os espelhos, o carro ganhou vida sob minhas mãos. Senti o vento entrando pelas janelas, trazendo uma brisa refrescante, e o rádio voltou a tocar uma música qualquer. Mas não era isso que ocupava minha mente.Enquanto dirigia pela estrada vazia, meus pensamentos começaram a flutuar, e algo inesperado aconteceu. Olhei para o m
Lukke Rock Estava sentado no sofá do hotel, encarando a vista de São Paulo através da janela, uma mistura de prédios cinzentos e o céu alaranjado pelo final de tarde. O cigarro pendia nos meus lábios, liberando pequenas espirais de fumaça que dançavam no ar. Na outra mão, uma dose de tequila. O líquido desceu queimando pela garganta enquanto eu pensava no que diabos estava fazendo com a minha vida. " quase 30 anos, porra", pensei. Antes que pudesse me afundar mais nesse devaneio, a porta do quarto se abriu com um estrondo. Era Stella, sempre abrupta, acompanhada de Arthur, como de costume. Ela não perdeu tempo, marchou até mim, pegou o cigarro da minha boca e o apagou sem cerimônia no cinzeiro. — Isso é uma porcaria, Lukke! Já falei que você devia parar com essa merda — disse ela, o olhar furioso, mas preocupado. Revirei os olhos, como sempre. Já estava acostumado a esse teatrinho dela. — Boa tarde pra você também, Stella — murmurei, tomando outro gole da tequila enquanto ela
Atena GodoyA adrenalina ainda pulsava em minhas veias quando estacionei o carro em frente ao hotel. O som do motor ainda ressoava nos meus ouvidos, mas eu me sentia satisfeita. Estacionar foi quase tão emocionante quanto a própria viagem. Ao meu lado, Isaac suspirou aliviado, lançando-me um olhar cansado.— Você dirige como uma louca, Atena — reclamou, mas havia um tom divertido em sua voz. — Não sei como não fomos parados pela polícia.Eu ri alto, abrindo a porta do carro e sentindo o ar fresco de São Paulo. O cheiro de concreto e fumaça de escapamento me atingiu, mas havia algo reconfortante em estar de volta à cidade grande. Estiquei os braços, sentindo meus músculos relaxarem após horas dirigindo.— Ei, chegamos rápido, não foi? — retruquei, fechando a porta com um sorriso orgulhoso. — Além disso, você sabe que sou uma ótima motorista.Isaac soltou uma risada curta e também saiu do carro, se espreguiçando.— Não disse que você é ruim, só que precisa relaxar um pouco. Vamos acabar
Lukke RockEu estava no meu quarto, tentando escrever uma música, mas nada saía. O resultado eram apenas rabiscos e folhas amassadas espalhadas pelo chão, o que me deixava completamente frustrado.— Mas que caralho! — soltei um palavrão e, irritado, joguei meu caderno na cama com força.— Se você está jogando o seu caderno favorito assim, é porque as coisas não estão indo nada bem — Arthur entrou no quarto, pegou uma bola de papel do chão e, depois de ler, arqueou a sobrancelha. — "No Fio da Navalha"?— Sim, estou pensando em fazer dessa a minha nova música de sucesso. O que acha? — perguntei, enquanto ele me encarava com aquela expressão analítica.— A maior parte dos seus fãs são mulheres. Você acha que elas vão curtir uma música com essa pegada? — questionou ele, e eu dei de ombros.— Acho que qualquer coisa que eu cantar, elas vão apoiar — respondi, confiante.Arthur me olhou, claramente não convencido. Sentou-se ao meu lado e começamos a conversar sobre tudo e nada ao mesmo tempo