RAVI
Depois de meter com uma das dançarinas, joguei um maço de notas amassadas na cama, sem nem olhar pra ela. — Some daqui. — rosnei, acendendo um cigarro enquanto a vadia se vestia às pressas, sem coragem de me encarar. Ela saiu tropeçando nos próprios saltos. Sozinho no apartamento, ainda nu, recostei na poltrona, soltando a fumaça devagar. Mas em vez de relaxar, a lembrança dela voltou com força. A Pantera. Não era o corpo da mulher que tinha acabado de foder que latejava na minha mente. Era ela. A desgraçada da máscara, dos olhos de fogo, que teve a audácia de me rejeitar. Que me deu um tapa na cara como se eu fosse um qualquer. Mordi o filtro do cigarro com raiva. Isso não ia ficar assim. Essa vadia ainda vai rastejar até minha cama. Nem que seja chorando. Acordei no dia seguinte com a cabeça estourando, gosto amargo na boca e um vazio ainda mais irritante dentro do peito. Tomei banho, vesti a primeira roupa que vi e dirigi até a empresa como um demônio de ressaca. Minha secretária tentou me abordar no corredor, mas passei reto, nem olhei. Eu não queria conversa. Eu queria sangue. Joguei a pasta em cima da mesa, me joguei na cadeira, fechei os olhos, respirando fundo. Mas a batida na porta não me deixou em paz. — Que porra é essa? — gritei, sem paciência. — Relaxa, irmão. — disse Donatello, entrando. — Só vim ver se você ainda tá vivo. Levantei a cabeça, fulminando ele com o olhar. — Ontem meu irmão me arrastou pra Little Club. Conheci uma dançarina que... — cerrei os punhos. — …que me rejeitou na frente de todo mundo. Donatello soltou uma gargalhada seca. — A boate é tua, Ravi. E ainda assim tomou um fora? Que fase! — Vai se foder, Donatello. Não tô caindo de amores. Mas ela ainda vai se ajoelhar pra mim, anota o que tô dizendo. O sorriso debochado dele só me deu mais raiva. Eu apaguei o cigarro, esmagando-o na mesa de vidro. Essa mulher não sabia com quem tinha mexido. JADE Sai da boate quase correndo, com o coração batendo feito um tambor nas costelas. Peguei um táxi na primeira esquina, ainda sentindo o cheiro dele na pele. Aquela presença... aquele cheiro de cigarro e perigo... Aquela mão forte me segurando... Fechei os olhos com força. "Não, Jade. Não pensa nisso." O táxi parou em frente à minha casa humilde. O motorista lançou um olhar desconfiado, mas só sorri cansada. — Obrigada, moço. Boa noite. Entrei e mal fechei a porta, já ouvi a voz da minha mãe. — Que cara é essa, Jade? Tire logo essa roupa imunda! Ela estava na cozinha, pálida, magra, parecendo menor do que era. Suspirei fundo, indo até ela, tentando não chorar. — Calma, mãezinha... já tô indo. Mas antes, deixa eu te dar um beijo. Ela se afastou de leve, franzindo o rosto de desgosto. — Não quero cheiro dessa boate em mim. Meu peito apertou. Ela nunca aceitou meu trabalho. E eu também não aceitava, mas era o que me restava. Ninguém queria contratar uma menina sem diploma, com irmão pequeno e mãe doente. Só sabiam me oferecer cama em troca de "emprego". Diogo foi o único que me deixou escolher: dançar de máscara. Sem sexo. Sem toques. Era humilhante? Sim. Mas era a única maneira de bancar o tratamento da minha mãe. Meu irmão, Joaquim, apareceu todo animado, me salvando do silêncio pesado. — Jade! Tava te esperando! — E aí, pirralho? — sorri, puxando ele pra um abraço. — Como foi na escola? — Vou passar direto esse ano, tenho certeza! — Orgulho da mana! — baguncei o cabelo dele. Minha mãe nos chamou para jantar, a voz fraca. Levei Joaquim até a cozinha, mas quando vi o rosto dela, o sangue me gelou. Ela estava branca como papel. — Mãe! — corri pra segurá-la, antes que ela caísse. — Foi só a pressão... — murmurou, tentando disfarçar. — Eu te levo pro hospital, agora. — Não, Jade. Já gastamos demais. Senta, vamos jantar. Engoli o choro, obedecendo. Enquanto comíamos, ela perguntou: — E a boate? Alguma novidade? — Tudo tranquilo. — menti, forçando um sorriso. Não tinha coragem de dizer que naquela noite eu tinha provocado o homem errado. E que minha vida podia ter mudado para sempre. RAVI — Donatello — falei, ainda sentindo o gosto metálico da raiva na boca. — Mandei meu irmão encontrar a Pantera, mas aquele fraco não vai fazer porra nenhuma. Agora é com você. — Manda o nome e eu resolvo. — Se fosse fácil assim... — dei uma risada seca. — Não sei nem o nome da desgraçada. Só sei que chamam ela de Pantera. Usa máscara. Olhos de gata. — Certo. Vou atrás dela. — Vai até a boate. Fala com Diogo. Quero o dossiê completo dela. De onde veio, onde mora, quem indicou, até o tipo de sangue se puder. Donatello assentiu, mas eu ainda não tinha acabado. — E mais uma coisa — continuei. — Pede pra Cassandra chamar os filhos da puta que me devem pela carga enviada mês passado. Se não pagarem hoje, vão se arrepender de terem nascido. — Você não precisa do dinheiro, Ravi. — Eu não deixo dívida aberta, Donatello. Não com gente que acha que pode me passar a perna. Me levantei, jogando a cadeira pra trás. — E avisa o Diogo: a boate fecha hoje. Reunião particular. Quero só uma dançarina lá dentro. — A Pantera? — ele perguntou, já sabendo a resposta. — É. Donatello hesitou. — Ravi... Se ela ouvir ou ver demais, pode dar merda. Você sabe que essas reuniões são perigosas. Sempre tem droga, arma, dinheiro sujo rolando. — Problema dela. Ela me desafiou. Hoje ela vai descobrir quem é que manda naquela porra toda. Vai aprender que não se brinca com Ravi Moretti. Sorri, sentindo o sangue quente borbulhar nas veias. Hoje seria a primeira lição dela. A primeira... de muitas. CAPÍTULO: A NOITE QUE NÃO ERA MINHAO dia amanheceu arrastado, e cada parte do meu corpo protestava contra os movimentos forçados da noite anterior.A dança, os saltos, os olhares sujos... tudo pesava como se eu carregasse o mundo nas costas.Estiquei o corpo devagar, sentindo dores que não deveriam existir em alguém da minha idade.Suspirei, olhando para o teto e pensando: "Espero que aquele arrogante não apareça hoje."Hoje era sábado. A boate Little Club nunca fechava, nem em feriado, muito menos em fim de semana.Mas para mim, isso era uma dádiva amarga: mais movimento, mais gorjetas, mais dinheiro para pagar o tratamento da minha mãe.**Depois de uma ducha rápida, arrumei-me com pressa e fui para a cozinha.Minha mãe, Dona Flávia, já estava sentada à mesa, com um sorriso que não disfarçava o cansaço.— Bom dia, meu amor. — ela disse, com a voz suave. — Achei que você fosse dormir até mais tarde hoje.— Hoje eu quero ficar com vocês. — falei, servindo café para nós duas. — E o Jo
CAPÍTULO — DONO DA NOITERAVIO dia tinha sido um inferno.Reuniões intermináveis, problemas para apagar, falsos aliados tentando sorrir pelas costas.Quando finalmente terminei, só queria tomar um banho e lembrar quem eu era de verdade.Em casa, tirei a gravata com um puxão irritado, deixei a camisa cair no chão e entrei debaixo da ducha gelada.A água escorrendo no corpo era como gasolina em fogo.Eu precisava extravasar.Vestido com uma calça preta justa e camisa dobrada até os cotovelos, peguei a chave do carro e saí, deixando para trás o homem que todos conheciam.Naquela noite, eu seria apenas Ravi — o predador.**Cheguei ao Little Club pouco antes da meia-noite.As luzes externas piscavam em vermelho, como um convite para o pecado.No estacionamento, encontrei Diogo já me esperando, tenso como sempre quando lidava comigo.— Senhor Ravi, como o senhor ordenou, só deixamos a Pantera aqui dentro.Assenti com a cabeça, frio.— Faça ela subir no palco. Apague todas as luzes.Assim
JADEO medo era como uma segunda pele.Cada célula do meu corpo gritava para correr, fugir daquele ambiente carregado e perigoso.Mas meus pés permaneceram firmes no palco.Dançar era o que eu sabia fazer.Era o que pagava os remédios da minha mãe.Era o que garantia o futuro do Joaquim.Então eu dancei.Dancei mesmo com o medo cravado nos ossos.Dancei para o homem que agora eu sabia ser o verdadeiro dono da boate... e da minha liberdade.Ravi Trajano Telles.Meus olhos se prendiam nele, e nos homens brutais que o acompanhavam, tentando me lembrar que eu estava apenas cumprindo meu trabalho.Mas os olhares deles...Eram predadores famintos.Quando Ravi me chamou para descer e buscar bebidas para eles, senti o chão fugir dos meus pés.Caminhei até a mesa com as pernas bambas.Um deles riu, descarado:— Quanto você cobra pra passar a noite comigo, princesa?O nojo subiu até a garganta.Engoli em seco, sem responder.Desejei desaparecer.Mas Ravi, com aquela calma cruel, apenas ordenou:
CAPÍTULO — ENTRE O MEDO E A ESPERANÇAJADETomei a decisão naquela mesma noite: não.Não me submeteria ao Ravi.Não aceitaria ser a propriedade particular de um homem arrogante, que achava que dinheiro comprava tudo — até dignidade.Eu não era moeda de troca.Arrastei meu corpo cansado para casa, tentando afastar as imagens dele da minha cabeça: o olhar de posse, o sorriso cruel, a ameaça velada em cada palavra.Mas era difícil.Muito difícil.**Assim que entrei, o silêncio da casa me acolheu.Minha mãe já dormia.Meu irmão também.Tirei a máscara com cuidado, sentindo como se estivesse arrancando também a fachada de força que precisei usar durante toda a noite.Me joguei no sofá.Fiquei ali, olhando para o teto, tentando entender onde minha vida tinha se perdido.Quando foi que meus sonhos viraram sobrevivência?**A porta da escada rangeu.Olhei para o lado e vi Joaquim, com o rosto inchado de sono, caminhando até mim.Sentou-se ao meu lado, esfregando os olhos.— O que está fazend
CAPÍTULO — QUANDO O MUNDO DESABAJADEDeixei o consultório da Dra. Valéria com o coração em pedaços.Meus passos eram lentos, pesados.A rua à minha frente parecia longa demais, como se o caminho de volta para casa fosse outro fardo que eu teria que carregar.Caminhei sem pressa, deixando o vento bater no meu rosto, tentando clarear a cabeça.Como seguir em frente depois daquela notícia?Como carregar a culpa de saber que, enquanto eu dançava para desconhecidos, minha mãe lutava sozinha contra uma doença mortal?**Quando cheguei em casa, encontrei os dois sentados à mesa.Minha mãe sorria ao ver Joaquim devorando o café da manhã.Senti um aperto no peito.Ela ainda tentava manter a fachada de normalidade, mesmo que tudo estivesse desmoronando por dentro.**— Fiquei preocupada, filha. Não te vi no quarto. Onde você foi tão cedo? — perguntou ela, enquanto arrumava a mesa.— Tive que resolver umas pendências. — respondi, tentando soar casual.— Você parece estranha, Jade. Está tudo bem
CAPÍTULO — QUANDO A DOR TEM ROSTOJADEDemitida.A palavra não parava de ecoar na minha cabeça.Cada sílaba parecia um golpe de marreta.**Meu corpo tremia.O chão debaixo dos meus pés parecia prestes a abrir, e eu, sem forças, só conseguia olhar para Diogo como se ele tivesse puxado o gatilho.**Ele me segurou pelos braços quando viu que eu ia cair.— Jade, senta. — murmurou, tentando me arrastar para dentro da boate.Eu não resisti.Não porque queria.Mas porque não tinha energia nem para lutar.**Sentei em uma cadeira qualquer.Uma boneca vazia, quebrada, esquecida.**Minha mão tremia ao puxar a máscara do meu rosto.Ela caiu no chão, insignificante.Assim como eu me sentia.**— Você tá bem? — Diogo perguntou, hesitante.**A risada que saiu da minha boca foi horrível.Um som quebrado, dolorido, que nem parecia humano.**— Bem? — repeti, sarcástica.— Eu fui chutada como lixo!Você realmente acha que alguém fica bem depois de ser tratada como um objeto descartável?**Diogo s
CAPÍTULO — O DONO DA CENARAVIDeixei a boate na noite anterior carregando um misto de irritação e desejo preso na garganta.Fui direto para o meu apartamento.Sem perder tempo, chamei uma das garotas que costumavam me satisfazer.**Enquanto eu a fodia sem misericórdia, minha mente viajava.O rosto que surgia nos meus pensamentos não era dela.Era o da dançarina mascarada.A Pantera.A mulher que ousou me dizer não.**A fúria queimava dentro de mim.Nunca aceitei rejeição.E não seria agora.**Enquanto o corpo suado da garota arqueava sob o meu, tomei uma decisão definitiva:ou ela seria minha, ou seria nada.**Quando terminei, enfiei algumas notas na mão dela e mandei que se vestisse e saísse.A presença dela me enojava.**Fui para o banheiro, tomei uma ducha fria, vesti apenas uma cueca e desabei na cama.O sono me venceu rápido, mas a imagem dela — os olhos por trás da máscara — não me deixaram em paz nem nos sonhos.**[...]Acordei atrasado.Me arrastei da cama, fiz a higien
JADECom a bolsa apertada contra o peito, dei alguns passos apressados para longe daquela sala.Meu coração batia como um tambor ensandecido.Meu orgulho sangrava.As palavras cruéis de Ravi martelavam dentro da minha cabeça como martelos de ferro.Cada insulto, cada desprezo, cada humilhação...**Eu poderia simplesmente ir embora.Deixar que ele acreditasse que havia vencido.Mas algo dentro de mim — algo bruto, queimando como fogo — me impediu.**Meus pés travaram.Minha respiração ficou pesada.Me virei de volta.**Sem pensar duas vezes, empurrei a porta com força.O estrondo ecoou pela sala, fazendo Ravi erguer o olhar, surpreso.**Caminhei até ele, decidida, o ódio queimando em cada passo.Não ia sair dali derrotada.Não dessa vez.**Parei em frente à sua mesa.Segurei o olhar dele.Fria.Firme.Sem medo.**— Você está me deixando confusa, Ravi. — disparei, a voz firme como aço. — Fez de tudo para me demitir. Agora que estou aqui, você diz que não me quer como sua dançarina