Estavam na cozinha, sentados nas banquetas altas comendo o resto de pizza gelada que tinha sobrado do outro dia. Ivan ficou surpreso de acordar e ver Vinícius ainda ali: o marido costumava ficar bem bravo quando insistia pra transar estando bêbado, e naquelas condições em que estavam...
— Você está muito longe. — Quebrou o silêncio, finalmente.
— Estou bem aqui. — Vinícius continuava clicando no celular, comendo a borda do seu pedaço, a praticamente um braço de distância dele. Um braço, ou um pouco menos, já que não precisou se esticar muito pra alcançar sua cintura e o puxar pro seu colo num laço. — Ei! — Ele reclamou, de boca cheia. — Eu disse que estava bem.
— Então, como está se sentindo antes dessa "estréia inédita"?— Nervoso, eu acho.— Como acha que vão reagir? Digo, você é um dançarino bem renomado, as pessoas vão ficar surpresas de te ver cantando também!— Espero que seja uma boa surpresa.— Tenho certeza de que vai! Aliás, você está trabalhando nesse álbum faz... Um ano e meio?— Dois anos.— Com o produtor Yuri a cargo, certo?— Sim! Yuri é um gênio da música, não poderia estar tend
— Os cabelos dele ficaram cinza... — Comentou com o médico certo dia, acariciando os cabelos do marido, deitado estático ali ao seu lado.— É normal. — Respondeu. — O corpo está economizando o máximo que pode de proteínas pra usar na recuperação, por isso a falta de pigmento nos fios.— Então ele está se recuperando bem?— Está, e de forma impressionante.— Então aquilo dele não poder voltar a dançar...— Bom, isso eu acredito que seja inevitável.Inevitável. Aquela palavra vinha atormentando V
— Hmmm... — Ivan acordou com o sininho irritante do despertador. — Mh... — Com os olhos ainda apertados ele se ergueu e engatinhou na cama até alcançar o seu celular na estante do abajur e tocar em desligar. — Uah... — Bocejou... — Uoh! — ...e ia se esticar, mas um braço compridos enlaçou sua cintura e o puxou de volta pra cama.— Mmhh...— Bom dia, Vini.— Bom dia, não. — O apertou nos braços, esfregando a franja ruiva no seu rosto. — Tá de noite ainda...— Não tá. — Riu. — Já são... Mh! — Vinícius beijou sua boca, de repente, sem mais nem menos. — Mh... — S
Ivan acordou numa bala com uma baita dor de cabeça, a visão completamente embaçada e o som chegando nos ouvidos como uma transmissão de rádio mal sincronizada; sua garganta queimando de tão seca.— Senhor Ivan. — o médico pegou no seu rosto delicadamente, puxando de leve a pele abaixo do seu olho com o polegar e apontando uma luz ali, confirmando que os movimentos do globo ocular indicavam pensamento consciente. — Como está se sentindo?— Arm... — abriu a boca; os lábios secos. — Confuso? — Piscou os olhos, os sentidos voltando à precisão lentamente.— Normal. — o médico lhe sorriu, pondo o estetoscópio nos ouvidos. — Você pode me dizer seu primeiro nome?— Ivan... — respondeu, sentindo o toque gelado do estetoscópio no peito, por baixo da camisa do hospital.— Quantos anos você tem?— Am... Dezoito.— E o que o senhor faz da vida?— É... Eu faço faculdade de música e dança... Primeir
Sete anos...Aquilo era menos como se esquecer e mais como viajar no tempo, pra sete anos no futuro; pelo menos, foi o que se passou pela sua cabeça quando entrou no enorme apartamento que era teoricamente dele e de Vinícius.— Uah... — Deu uma volta de trezentos e sessenta graus no centro da sala: tinha um enorme tapete felpudo, redondo e azul claro, entre um sofá grande, com o estofado verde escuro, uma poltrona, da mesma cor, e a estante de tevê, enorme, encostada à parede. Tão arrumadinho... Pelo visto ele e Vinícius se deram bem até demais dividindo o quarto da moradia universitária pra resolverem continuar morando juntos; se bem que lá era tudo sempre uma grande bagunça, especialmente as coisas do roommate.— Você está bem? — Vinícius veio do corredor da entrada, já sem o pullover e pondo a chave sobre a mesinha de apoio no canto da sala entre o sofá e a poltrona, onde ficava também um enorme abajur, o dispersor azul, combinando com o tapete.&
O garoto de cabelos castanhos estava iluminado sob uma fraca luz púrpura que escondia o forte rubor das suas bochechas e o vermelho dos seus lábios inchados, mas a expressão no seu rosto deixava óbvio o quanto ele estava excitado.O garoto era Vinícius; nem aquele Vinícius ainda com cara de adolescente, com os cabelos caramelo claro bagunçados, nem aquele Vinícius sexy model de cabelos vermelho sangue perfeitamente lisos e penteados, mas algo entre aqueles dois, uma transição, um Vinícius bem boyfriend material com os cabelos castanho escuros cheios e estilosamente cortados.— Ivan!...Aquele gemido o deixou quente, e ele apertou Vinícius nos braços e lhe beijou os lábios de um jeito que ele jamais imaginara ser capaz: era tímido demais para aquilo.— Ivan.Agora seu nome foi chamado numa voz mais grave, mais grossa, mais séria e preocupada, mas no mesmo timbre; era a mesma voz.— Ivan.Abriu os olhos. O homem d
— Ivan, você é gay, não é?— E se eu for, qual o problema? — Ivan já respondeu na agressividade, um pouco cansado de aturar heteros puxando aquele assunto consigo, ainda mais justo o hetero pelo qual tinha a droga de um crush irremediável.— Calma, não quis te agredir, nossa! — o roommate pôs as mãos abertas pro alto, em rendição — Só estava curioso sobre umas coisas e talvez você me ajudasse, sabe, não sei, só pra confirmar...— Fala logo onde você quer chegar, Vinícius. — Bufou, irritado; Vinícius sempre começava a se enrolar quando queria alguma coisa. — Eu tenho mais o que fazer.— Ai, nossa, por que tá assim comigo? — o leãozinho fez um biquinho, um tanto convincente, por sinal, mas Ivan não quis demonstrar compaixão, cruzando os braços sobre o peito e o esperando desembuchar — Eu só estava querendo tirar a dúvida, sabe, com alguém que curte... — ele coçou os cabelos da nuca, certamente os deixando mais desalinhados do que sempre estavam — ...pra s
Foi quando viu seu marido na cama do hospital, machucado e inconsciente, que Vinícius sentiu a imponência no seu mais puro estado pela primeira vez. Não adiantaria pensar no que poderia ter feito pra evitar, e com Ivan ali, acidentado, já não podia fazer nada pra ajudar.Só podia esperar. Sentar-se lá, na cadeira ao lado da cabeceira e esperar, ouvindo os bipes longamente espaçados dos aparelhos enquanto olhava pro rosto gélido do marido, pedindo aos sussurros para que ele acordasse.E ainda estava esperando, porque foi Ivan de sete anos atrás que despertou primeiro, antes do marido; o que não esperava era se ver, agora, com vinte e cinco anos, tão, mas tão encantado com aquele Ivan, seu roommate pelo qual, na época, ele não estava assim tã