Helida
A escuridão começa a se desfazer, minha mente registrando os sons confusos a minha volta.
— Não há motivo para alarde, Ethan, você está fazendo uma tempestade na porra do copo d’água! — Escuto uma voz ao longe, ela está brigando com Ethan, não gosto da ideia de alguém brigando com ele.
Não sei quanto tempo estive desacordada, mas não queria voltar a realidade, porém, nem mesmo a inconsciência me impede de ouvir as vozes, gritos na verdade, e mãos, mais de um par delas me tocando, fazendo com que meu corpo retraia na hora.
— Sinta a pulsação dela está normalizando, ela vai ficar bem! — Fala uma voz feminina de forma brusca.
— Lim, meu amor, acorda, vamos linda, por favor? Eu te amo! Acorde e poderei explicar tudo! — Uma onda de alívio e
Bom Sossego, cinco anos e meio antesHelida— Acho que deveria considerar a proposta! — Falo enquanto giro o volante para desviar de uma caminhonete que invade a contramão.— Sério, Helida? Quer falar sobre isso na nossa última noite de folga, sabendo que amanhã voltamos à rotina maluca de estudos e estágios? —Pela minha visão periférica, o vejo olhar pela janela e observar os pingos de chuva baterem no vidro e deslizarem.— Caio, não estou querendo estragar nossa lua de mel atrasada, de forma alguma, mas fala sério! Um estágio muito bem remunerado no Hospital das Clínicas em São Paulo, com o melhor amigo do seu pai como chefe do setor ortopédico, e deixa que lá vem a melhor parte, ele é somente a maior referência em cirurgias ortopédicas reparatórias e de alto r
Helida— É na casa ao lado, você não percebeu, mas temos um novo vizinho. — Seu olhar vai para todas as partes, menos para os meus.— Tem alguém morando na casa dos Albuquerque? Isso é estranho. — E uma coisa que não me é muito fácil de aceitar.— Estranho, por que? — Será que não é óbvio?— Filha, é natural que uma casa tão bonita seja vendida, alugada ou o que quer que seja.— Mãe, essa casa não deveria ser passada para outra pessoa, o Caio a construiu para nós dois, era para estarmos juntos agora tomando café da manhã na cozinha, rindo um com o outro...— Chega, Helida! Pare de se torturar! Não se lembra que você assinou um documento abrindo mão de qualquer herança, a casa estava inclusa e os pais dele podem faze
Helida— Nossa, Helida, agora mais do que nunca reafirmo a sua indicação ao prêmio pediatra do ano! Pensei que não fosse parar de chegar criança doente, meu Deus, parece que todos resolveram se resfriar!— É assim mesmo, Gia, garanto que nenhum deles pediu para ficar doente, quando o tempo muda, as viroses também dão o ar da graça, pare de reclamar, já acabamos por hoje!— Por hoje, né? Aposto que na segunda teremos o dobro dessas lindas criaturinhas catarrentas por aqui!É impossível não dar um risinho disfarçado, mesmo que não a deixe perceber.— Que tal uma bebida, para relaxar? Depois uma saidinha para uma dança entre amigas? — Mais uma pergunta esperada numa sexta à noite— Não, obrigada, estou muito cansada, louca para cair na cama. —
HelidaDistraio-me com a forma fluida que ele corre, com fones de ouvidos, parecendo concentrado no que está ouvindo e não dando a mínima para a baba que escorre das bocas do bando de mulheres que o cercam, ainda o olhando seguir em nossa direção, quando acontece o inevitável, eu caio estatelada no chão.— Aí, mas que droga! — Isso sempre acontece quando esqueço de olhar onde meus pés estão pisando, descoordenada como sou, nunca deveria esquecer de prestar atenção neles, nem por um segundo. Meu problema de coordenação motora não é de hoje.— Helida, você está bem!? — Clara grita estridente, atraindo a atenção de todos em um raio de meio quilometro pelo menos, que param para olhar em minha direção. Quero um buraco para me enterrar depois desse alarde desnecess&aacut
HelidaIgnorando completamente a orientação de Ethan, saí logo cedo para o trabalho. Meu psicológico se recusando veementemente a seguir algo que ele tenha me dito.Por algum motivo, passar a noite em claro lembrando a forma intensa com que seus olhos me fitaram na manhã anterior, fez crescer um tipo de antipatia a ele e ouvir a voz de Frejat cantando Segredos hoje cedo quando acordei, em nada ajudou a melhorar essa aversão.Sorrio pensando que, bem que essa música é linda e me fez ponderar, por que um cara tão bonito e atraente como ele – sim estou afirmando que o acho atraente – procura um amor, quando basta apenas um estalar de dedos e boa parte das mulheres da cidade se jogariam aos seus pés?— Bom dia, Gianna! — Passo por ela indo direto para minha sala, não dormi muito bem durante a noite, além da dor terr&ia
EthanAndo de um lado ao outro do meu consultório, a última paciente, ou poderia dizer, a última curiosa, saiu há quase uma hora, desde então, as palavras da minha, por ironia do destino, vizinha duas vezes, martelam a minha cabeça.Tudo bem que agora sei o motivo da sua antipatia, ainda assim, não explica todo o seu mau humor quando estou perto, se bem que, não a vi perto de outras pessoas para ter uma opinião formada.Talvez o correto fosse observá-la um pouco mais, no entanto, estaria invadindo sua privacidade. Desperto dos meus devaneios com a batida abafada na porta, que não seja outra maluca com uma dor fictícia em uma região constrangedora, não sei se terei humor para mais uma! — Pode entrar
HelidaMeu pai fala de um jeito que eu quase acredito que seja fácil.— Precisa voltar àquela casa, já se passaram quase seis anos, tem que voltar lá e se livrar das lembranças, deixá-las no lugar a que pertencem, o passado. Fazendo jus a tudo de bom que viveram juntos, não deixando, por exemplo, a tristeza por sua perda, ser a lembrança mais forte que tem do Caio.— Eu, naquela casa? Não posso, talvez em um futuro bem, mas bem distante, inda não estou pronta para isso. Ainda mais com aquele metido morando lá. —Meu pai muda sua expressão, para o olhar que diz: você-esta-encrencada-mocinha.— Que bom que tocou no assunto, não gostei nada de saber que destratou o pobre rapaz, você precisa pedir desculpas ao Ethan e isso é coisa para ontem, Lim!— Como é, que é? &md
HelidaA forma como eles me olham, me deixa um pouco desconfortável, como se eles acabassem de presenciar um milagre aguardado há tempos, talvez seja mesmo o caso.— Hã, obrigada, filha. É maravilhoso tê-la no jantar! — Ela limpa a garganta antes de responder.“Por que será essa cara de espanto? Eu costumo elogiar sua comida, não elogio?”Pelo jeito não.Faço uma nota mental de elogiar mais a comida da minha mãe, porque é realmente uma delícia.Uma batida na porta me traz de volta dos meus devaneios.Levanto os olhos em direção a entrada da frente e me, pergunto quem pode ser, pois, sim, as pessoas da cidade são fofoqueiras, porém, evitam visitas inadequadas.— Aposto que é o Ethan! — Minha mãe responde minha pergunta silenciosa.Pelo modo c