Alberto Vasconcellos
Entro em casa e, como sempre, sou recebido pelo silêncio pesado que habita este lugar. Antes, minha casa era um reflexo da minha posição: móveis importados, quadros de artistas renomados, tapetes persas. Agora, tudo perdeu o brilho. Parece um cenário prestes a desmoronar. Subo as escadas, sentindo a tensão no ar. Minhas filhas estão todas em casa. Posso ouvir as vozes delas no andar de cima. Natália e Bianca, as mais velhas, conversam animadamente sobre alguma besteira fútil. Lara, como sempre, está quieta. Abro a porta do escritório e me sirvo de uma dose de uísque antes de encará-las. Minha paciência anda curta, e eu sei que não vou gostar das reações que estão por vir. — Reúnam-se na sala — digo alto o suficiente para que todas me ouçam. Natália e Bianca descem primeiro, com ares de tédio. São exatamente o que a sociedade esperava que fossem: filhas mimadas de um empresário rico. Sempre tiveram tudo do bom e do melhor, e mesmo agora, com a falência batendo à porta, agem como se nada tivesse mudado. Lara demora mais um pouco. Quando finalmente aparece, seus olhos me encaram com aquela mistura de desafio e frieza que sempre me irritou. Cruzo os braços e vou direto ao ponto. — Façam as malas. Vamos viajar. Bianca arregala os olhos e solta um gritinho animado. — Sério? Para onde? — Dubai. O entusiasmo delas explode. — Meu Deus, pai! Isso é incrível! — Natália exclama. — Sempre quis conhecer Dubai! — Ai, meu Deus, a gente precisa comprar roupas novas! — Bianca já está no celular, provavelmente pesquisando sobre as marcas de luxo nos Emirados. Observo a cena sem nenhuma surpresa. O dinheiro pode estar acabando, mas elas ainda não entenderam o que isso significa. Então, minha atenção se volta para Lara. Diferente das irmãs, ela não parece animada. Na verdade, sua expressão se fecha ainda mais. — Eu não vou. Minha paciência se esgota num instante. — Como é que é? Ela cruza os braços e ergue o queixo. — Eu disse que não vou. Eu não quero ir para Dubai. — E desde quando você tem escolha? — Desde que eu decido sobre minha própria vida. A raiva ferve no meu sangue. Essa menina sempre foi um estorvo, e agora, no momento em que estou tentando salvar o que resta do meu império, ela resolve bancar a rebelde? — Você não vai me atrapalhar, Lara. Já me deu trabalho o suficiente. Ela não recua, e isso me irrita ainda mais. — E por que eu deveria ir? Qual é o motivo dessa viagem? — O motivo é que eu estou tentando reerguer essa família. Estou tentando garantir um futuro decente para vocês, e você deveria agradecer por isso. — Agradecer? — ela ri, sem humor. — Você nunca se importou com o meu futuro. Bianca e Natália trocam olhares e decidem se meter. — Para de drama, Lara — Natália revira os olhos. — É Dubai! Quem em sã consciência recusaria uma viagem dessas? — Você é tão esquisita — Bianca acrescenta, rindo com deboche. — A gente vai se hospedar em hotéis cinco estrelas, passear em carros de luxo, e você tá aí bancando a mártir. Lara suspira, visivelmente cansada. — Porque eu sei que essa viagem não é só turismo. Tem algo por trás disso. — Você tem razão — cruzo os braços. — Eu vou fechar um negócio importante lá. Um negócio que pode salvar a empresa. E se você não quiser ir, então pode começar a procurar um novo lugar para morar. Ela me encara, surpresa. — Como assim? — Exatamente o que você ouviu. Se essa empresa falir, não vai ter mais casa, não vai ter mais escola particular, não vai ter mais nada. Você acha que vai viver do quê? Ela não responde de imediato. Sei que peguei onde dói. Lara pode não ser fútil como as irmãs, mas também não tem para onde ir. — Isso não é justo — ela murmura. — A vida não é justa — respondo friamente. — Faça as malas. Ela fica ali, parada, parecendo querer gritar, mas sabe que não tem escolha. No fim, como sempre, eu ganho.Lara VasconcellosSempre soube que era diferente das minhas irmãs. Desde pequena, eu sentia isso. Enquanto Natália e Bianca eram o orgulho do meu pai, sempre ganhando presentes caros, viagens de luxo e tudo o que desejavam, eu era a sombra. A filha esquecida.Não sei exatamente quando percebi que meu lugar na família era esse. Talvez tenha sido nos aniversários, quando minhas irmãs recebiam joias caras e vestidos importados, e eu ganhava um "parabéns" dito às pressas. Ou talvez tenha sido nos natais, quando elas desembrulhavam presentes luxuosos enquanto eu, muitas vezes, sequer era lembrada.A verdade é que, por mais que eu tentasse, nunca fui suficiente para ele.E o pior de tudo? Eu nunca soube o que fiz para merecer esse tratamento.Até entender.Minha mãe morreu no meu parto.Ela morreu para que eu vivesse, e isso me transformou na inimiga do meu pai desde o momento em que nasci.Eu não lembro dela. Não sei se seu cabelo era liso ou cacheado, se sua risada era alta ou suave, se
Lara VasconcellosAs horas seguintes foram uma correria. Eu não queria estar ali, e nada fazia sentido para mim, mas de alguma forma eu me vi arrumando a mala, colocando roupas no mínimo desconfortáveis, e me preparando para embarcar em um avião para um lugar tão distante quanto Dubai. Meu pai nunca teve consideração por mim, e agora ele estava me forçando a ir com ele para que eu fosse parte de algo que nem ao menos entendia. Tudo o que eu sabia era que a empresa dele estava à beira da falência, e ele via essa viagem como a última chance de salvar tudo o que ele havia construído.Eu ainda não entendia como tudo tinha virado um turbilhão tão rápido. A ideia de viajar com meu pai e minhas irmãs para o outro lado do mundo, onde ele teria que negociar com um sheik árabe para salvar a nossa vida de luxo, me parecia uma piada cruel. Mas as palavras de meu pai ainda ecoavam na minha cabeça. Eu não tinha escolha.Arrumei minha mala com a cara fechada, o peso de todas as minhas frustrações s
Khaled Rashid Eu sou Khaled Rashid. Aos 26 anos, sou um dos homens mais poderosos de Dubai e do mundo. Um magnata que controla vastas fortunas e negócios que se estendem por todo o globo. Sou Sheik e dono de uma das famílias mais influentes dos Emirados Árabes Unidos. O que eu digo, se torna lei. O que eu quero, eu tenho. Nada e ninguém pode me impedir de conquistar o que desejo, e sou implacável nesse objetivo. Já estive casado duas vezes. Ambas as mulheres falharam em entender a verdadeira natureza do meu controle. Elas não conseguiram seguir as regras. A desobediência é algo que eu simplesmente não tolero. O preço foi alto, mas cada uma delas pagou com a vida. Quando você é como eu, ninguém pode desafiar o poder. As duas morreram por não se submeterem, e para mim, isso não significou nada além de uma necessidade de reafirmar minha autoridade. Eu não sou um homem de sentimentos. Não creio no amor, mas em algo muito mais forte: o poder sobre os outros. Sempre que vejo algo ou algu
Alberto AlmeidaEu entrei no hotel sem hesitação, apenas com o peso da responsabilidade nos ombros. Minhas mãos não suavam, meu coração não vacilava. Eu já havia tomado minha decisão. O que vinha a seguir era apenas uma consequência lógica. Elas estavam ali, esperando por mim, e não me importava se aceitariam ou não. Eu nunca precisei da aprovação de Lara para nada, e não seria agora que isso mudaria.Minhas filhas sempre tiveram seus papéis muito bem definidos na minha vida. Natália e Bianca eram exemplos de filhas. Entendiam seu lugar, compreendiam as regras do jogo, sabiam o que era importante. Lara... Lara era um erro. Um fardo. Uma lembrança viva da maior perda que eu sofri. Desde que nasceu, tirou de mim o que eu mais amava. Como eu poderia olhá-la e ver algo diferente disso? Nunca consegui, nunca tentei. Agora, finalmente, ela serviria para algo.Fitei as três quando entrei na sala. Natália sentada com postura impecável, Bianca de pé, com os braços cruzados e olhar inquisitivo
Lara O relógio marcava três da madrugada. O hotel estava silencioso, e o medo pulsava no meu peito. Cada passo meu era calculado, cada respiração era controlada. Eu não podia errar. Se me pegassem agora, eu nunca mais teria outra chance. Passei pelo corredor do hotel, o coração batendo tão forte que parecia ecoar nas paredes. Minhas mãos tremiam enquanto eu segurava firme a alça da mochila, onde coloquei o pouco que consegui pegar às pressas. Um casaco, um pouco de dinheiro que tinha escondido, o passaporte que roubei do escritório do meu pai. Nada mais importava. Eu precisava sair dali. Quando cheguei ao saguão, meu corpo ficou tenso. O recepcionista estava de cabeça baixa, mexendo no celular. Segurei a respiração e passei rápido. Minhas pernas doíam de tanta tensão, mas não parei até sentir o vento quente da madrugada tocar meu rosto. Eu estava na rua. Sozinha. Dubai à noite era uma cidade vibrante, mas eu não via luzes ou beleza. Apenas medo. Andei rápido pelas ruas, sem rumo.
Khaled Desde o começo, eu não confiei totalmente em Alberto. Um homem que vende a própria filha sem hesitar não merece confiança. Então, fiz o que sempre faço: garanti que teria o controle da situação. Coloquei um dos meus homens para vigiar aquela família. E foi uma decisão sábia. Ela tentou fugir. Lara, tão ingênua, acreditou que poderia simplesmente sair pelas ruas de Dubai sem ser notada, sem ser pega. Se não fosse por mim, ela estaria morta ou pior. Não importa o quanto ela me odeie agora—eu a salvei. Enquanto a observava, sentada no sofá da minha sala, os olhos vermelhos de chorar, eu não conseguia evitar o pensamento que me veio à mente. Ela era linda. Mesmo no meio da sua raiva, do seu desespero, sua beleza era quase hipnotizante. Os cabelos bagunçados caíam sobre o rosto delicado, os lábios trêmulos, o peito subindo e descendo rápido por conta da respiração acelerada. Ela era minha.
Alberto Estava sentado na poltrona do hotel, apreciando um copo de uísque quando a porta do quarto foi aberta com brutalidade. Meu coração disparou por um momento, mas logo percebi que se tratava de um dos homens de Khaled. O olhar dele estava sério, e eu soube que não eram boas notícias. — O que houve? — perguntei, pousando o copo na mesa de vidro ao meu lado. O homem me olhou sem nenhuma pressa, como se estivesse se deliciando com o que ia dizer. — Lara tentou fugir. Minha expressão se fechou no mesmo instante. — O quê? — Mas não se preocupe, Sr. Alberto. Meu chefe já cuidou da situação. Levantei-me bruscamente, meu sangue ferveu de raiva. — Onde ela está? — Na residência de Khaled, onde permanecerá até o casamento. Minhas mãos se fecharam em punhos. Lara sempre foi um estorvo, mas dessa vez, ela passou dos limites. Eu lhe dei uma chance de ser útil para a família, e ela a desperdiçou como a ingrata que sempre foi. Antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, minhas outras
AlbertoDesde que recebi a notícia de que Lara estava na casa de Khaled, não consegui dormir direito. Parte de mim ainda não acreditava que minha própria filha teve a audácia de tentar fugir. Eu sempre soube que ela era ingrata, sempre soube que ela carregava um ressentimento infantil dentro dela, mas tentar arruinar um casamento como esse? Tentar prejudicar a própria família? Isso ultrapassava qualquer limite.Eu não podia permitir que ela continuasse com essa rebeldia. Se Khaled perdesse a paciência, tudo o que construíria desmoronaria.Na manhã seguinte, me arrumei e fui pessoalmente até a residência de Khaled. O caminho foi longo, e quanto mais me aproximava da propriedade luxuosa, mais a raiva se acumulava dentro de mim.Ao chegar, fui recebido por empregados educados, mas distantes. Não demorou para que uma mulher vestida de forma tradicional se aproximasse, com um olhar respeitoso, mas sem pressa alguma.— Senhor Alberto, em que posso ajudá-lo?— Vim falar com minha filha — re