Ele era negro como a noite, com linhas prateadas esculpidas em sua superfície, formando runas que pareciam dançar suavemente, pulsando com a mesma energia do feixe. Tinha pelo menos vinte metros de altura, cravado no chão como uma lança divina. – Parece a Bifrost… – murmurei, mais para mim mesma do que para os outros. Mas era diferente. A Bifrost era a ponte das divindades, um elo entre mundos. Aquilo parecia uma chave. Uma fenda. Um aviso Minha primeira reação foi me aproximar, quase em transe. Mas a mão de meu pai me deteve no ombro. – Espere – disse ele, com a voz baixa, mas firme. Ele desceu lentamente até o chão, os pés tocando a grama queimada ao redor do obelisco. Uma fumaça branca e tênue ainda se erguia das bordas da cratera onde a estrutura se fixara. As runas prateadas piscaram uma última vez… e se apagaram. Então algo aconteceu. Uma figura surgiu de dentro da névoa, emergindo do lado oposto do obelisco. Era uma mulher. Ou, ao menos, parecia ser. Seus ca
Assim que Selyra desapareceu, tudo ao seu redor se desfez como névoa ao vento. O obelisco, as luzes, os vestígios de sua presença — tudo sumiu, como se jamais tivesse existido. Por um breve instante, pensei que pudesse ter sido apenas uma miragem. Mas o colar frio em minha mão dizia o contrário. — Esdras! — bradou Altair com urgência, já assumindo o comando da situação — Sim, senhor! — respondeu ele, de prontidão. — Você e Uric ficarão de guarda aqui. O restante do esquadrão, espalhem-se pela floresta. Fiquem atentos a qualquer sinal anômalo. Não é o nosso ambiente natural, então redobrem o cuidado — disse ele, a voz firme como aço. —Kaelara, você vem comigo. — Sim, senhor… — respondi, mesmo desejando permanecer. Algo dentro de mim queria continuar ali, tentar entender o que havia presenciado. Mas desobedecer meu pai não era uma opção. Erguemo-nos aos céus, cortando o vento com rapidez em direção à cidade. A Torre dos Magos logo surgiu no horizonte, imponente e antiga, com s
Heits, capital do poderoso reino de mesmo nome, erguia-se com imponência sobre sete colinas de pedra branca, como se os deuses a tivessem moldado com as próprias mãos. A cidade era um monumento à ordem, à tradição e à autoridade. Suas torres estreitas e altas rasgavam o céu como lanças de mármore, refletindo o brilho do sol nascente. As ruas, pavimentadas com paralelepípedos limpos e bem alinhados, conduziam a praças repletas de estátuas de antigos reis e heróis. Jardins suspensos adornavam os edifícios de pedra, criando um contraste harmonioso entre o vigor arquitetônico e a delicadeza das flores. No alto da colina central, como uma coroa, repousava o palácio real: um colosso de colunas brancas, cúpulas douradas e varandas abertas ao vento. Era ali que reinava Lucius Castas de Heits II — um homem de presença imponente, cabelos escuros levemente grisalhos nas têmporas, olhos como aço temperado e uma voz que comandava tanto respeito quanto temor. Conhecido por sua firmeza, lucidez e h
Drantis, a lendária cidade dos draconatos, ergue-se orgulhosa nas profundezas das Montanhas de Fulgor, um dos locais mais imponentes e misteriosos do continente. Durante séculos, essa cidade subterrânea foi um bastião de força, sabedoria e tradição. Com suas enormes paredes esculpidas diretamente nas rochas vulcânicas e suas estruturas grandiosas adornadas com metais raros e pedras preciosas, Drantis refletia a magnificência e o orgulho de seu povo, os draconatos. Suas escamas, de uma variedade de cores que iam do verde profundo ao dourado cintilante, faziam com que os próprios pilares e telhados da cidade parecessem vivos, vibrando com energia e força. Drantis, imersa nas profundezas da terra, nunca se preocupou com o mundo exterior. Sua sociedade, que sempre fora resiliente e forte, prosperava com a certeza de que seu domínio sobre as cavernas e montanhas era inabalável. O governante de Drantis, Fergus Melius Drentis, era um draconato respeitado não apenas por sua força física, mas
Melaria, a joia élfica do continente, não era apenas uma cidade — era um organismo vivo que pulsava em sincronia com a própria essência da floresta de Lóthien. Oculta sob as copas entrelaçadas de árvores milenares e guardada por uma névoa encantada que apenas os de coração puro conseguiam atravessar, Melaria florescia em uma simbiose perfeita entre natureza e magia. Seus caminhos serpenteavam entre raízes espiraladas e flores luminescentes, e as moradas élficas, construídas nas próprias árvores vivas, pareciam crescer junto com o povo que as habitava. As pontes suspensas, feitas de galhos flexíveis e enfeitiçados, conectavam os espaços da cidade com leveza e graciosidade, como se a própria floresta as houvesse moldado com intenção. Era uma cidade silenciosa, mas não vazia — o tipo de silêncio preenchido por música sutil do vento entre as folhas, pelo farfalhar das asas de fadas e pelos cantos dos druidas em harmonia com a terra. Os elfos de Melaria eram guardiões do equilíbrio natura
Acordou sobressaltada. O despertador piscava inutilmente no criado-mudo, mudo como sua própria voz, quando percebeu que já passava das oito. O coração acelerou como se fosse sair do peito, e o primeiro pensamento foi uma enxurrada de palavrões abafados. O tempo estava contra ela.Pulou da cama, vestiu a primeira roupa que encontrou no cabide — uma camisa amassada e uma saia que não combinava com nada — e desceu as escadas do prédio tropeçando nos próprios sapatos. O céu estava fechado, carregado de nuvens densas como chumbo. Nem teve tempo de pegar o guarda-chuva. Quando colocou os pés na calçada, a tempestade caiu com uma fúria quase pessoal.As gotas batiam no rosto como pequenos tapas. O ônibus atrasou, o trânsito estava um caos e, a cada minuto, seu estômago reclamava pela ausência de café da manhã. Chegou à empresa encharcada dos cabelos às meias, sentindo a roupa colada ao corpo, a maquiagem derretida e os olhares curiosos dos colegas de trabalho que disfarçavam mal os sorrisos
A escuridão foi se afastando aos poucos, dissolvendo-se em ondas suaves de calor e luz tênue. Marina sentiu-se flutuar num espaço sem forma, como se estivesse sendo embalada por braços invisíveis. Não havia dor. Nem memória. Apenas um estranho vazio sendo preenchido por sensações novas: o toque de algo macio, um som agudo como o assobio do vento… e depois, o som mais intenso que já ouvira: o próprio choro. Era o seu primeiro respiro. Era o início. O mundo explodiu ao seu redor em cores suaves e sons abafados. As pálpebras minúsculas se abriram com esforço, revelando olhos ainda úmidos, perdidos em um brilho difuso. Tudo parecia tremular, como se o mundo estivesse sendo visto através de uma fina camada d’água. A claridade machucava, mas logo se tornava familiar. Sentia o corpo pequeno, frágil e molhado, os pulmões lutando por ar, as mãos se movendo involuntariamente. Foi quando sentiu algo a envolvendo com firmeza, mas também com carinho. Um par de mãos fortes, porém delicadas, a
Três anos haviam se passado desde o dia em que abri os olhos neste novo mundo — um mundo de céu aberto, ventos cantantes e criaturas magníficas de asas resplandecentes. Já não era uma recém-nascida confusa envolta em mantos e cantos estranhos. Agora, com três anos, eu havia me adaptado à vida entre as harpias. Aprender a falar a língua delas foi um desafio no começo. Suas palavras tinham sons sibilantes, agudos e notas guturais que pareciam imitar o próprio vento. Mas, como tudo que uma criança determinada deseja entender, aos poucos, cada som se tornava familiar, cada sílaba era domada com o tempo e a repetição. Muitas noites, eu adormecia com a boca ensaiando palavras novas, e nas manhãs seguintes, corria para testá-las com minha mãe. O nome dela era Jenevive Norton. Só de ouvi-lo, meu peito se aquecia. Jenevive era tudo o que eu admirava: forte como as raízes que sustentavam as plataformas da nossa cidade, e doce como o néctar das flores que pendiam dos galhos mais altos. Ela me