Nunca me considerei um homem ciumento. Nunca, mesmo. Sempre me orgulhei de um controle sereno sobre minhas emoções, de uma razão calculada que sempre venceu os impulsos. Mas agora, ao ver Alexander se aproximar de Aria, algo estremece e se desfaz dentro de mim. Meu sangue ferve em ondas espessas, uma ira latente e feroz que eu mal reconheço. Esse sentimento, como um veneno amargo, inunda minha mente e me paralisa.Além da provocação velada de minha esposa, igual quem joga combustível numa chama que arde, mas neste instante, ela é apenas uma sombra distante. Minha mente se ocupa exclusivamente com Aria… e com Alexander. Nosso casamento, nesse momento, está sentenciado e o que me resta fazer é de fato anular nossa união. Mas não é nisso que a minha mente quer focar agora.A expressão serena no rosto dele, enquanto ele se aproxima de Aria, o tom descontraído em sua voz, tudo isso acende em mim um desejo irracional de interromper o que quer que ele esteja tentando fazer. Cada passo que do
Chego em casa com o cansaço gritando em meu corpo. Sinto o sangue quente escorrendo do ombro, um filete viscoso que desliza até a metade do meu braço, manchando o tecido já desgastado da minha roupa. O cheiro metálico mistura-se com o ar abafado da sala, onde as luzes estão acesas, lançando uma claridade quase sufocante que preenche cada canto. Tomo fôlego e torço para que apenas minha mãe esteja acordada, e não as crianças. A última coisa que preciso agora são os olhares assustados e questionadores deles.Assim que dou um passo para dentro, sinto o chão girar sob meus pés. Cambaleio, as pernas fracas quase me traem, e meu corpo pende como se estivesse prestes a se entregar ao peso da exaustão. O sangue escorrendo parece cada vez mais espesso, e minhas pálpebras lutam para se manter abertas, desejando se fechar contra a luz.Minha mãe surge da cozinha num sobressalto, o grito de susto dela reverbera pela sala e quase me faz encolher de tanto cansaço e fragilidade. Os ecos dos gritos qu
No dia seguinte, mesmo com o corpo dolorido, consigo disfarçar para os meus filhos e os deixo arrumados para irem à escola. Meu ombro ainda arde, uma lembrança do que aconteceu na noite anterior, mas mantenho a postura ereta e disfarço o melhor que posso para não preocupar os meus filhos.No portão da escola, me ajoelho para dar um último abraço neles, e é então que Elowen, com sua vozinha tímida, quebra o silêncio. Ela olha para mim com um brilho de esperança nos olhos, o dedinho pequeno traçando o contorno da pulseira colorida em seu pulso, uma daquelas que ela me deu de presente, com miçangas infantis e desenhos de pequenos corações.“Mamãe, o nosso presente protegeu você ontem, não é? Você conseguiu voltar para casa!” Elowen diz, com uma inocência e certeza que me fazem prender a respiração. A pergunta dela soa quase como um feitiço de proteção, algo tão doce que sinto o calor tomar conta do meu peito, derretendo qualquer traço de dor.Surpresa, deixo o cansaço escapar por um momen
“Você tem dez minutos, nada mais…” eu declaro assim que Alexander se senta no sofá e eu na poltrona. Mantenho uma distância segura, porque não quero me permitir ficar tão perto dele igual fiquei com Caelum.Com Caelum a moralidade vence, ele é o rei e é casado. Mas com Alexander? Qualquer toque, qualquer centímetro do corpo dele perto do meu, eu sei que não resistirei. Sei que se meus lábios tocarem novamente nos dele, eu serei rendida para sempre ao amor que pensei ter acorrentado.Alexander, então me conta a verdade. Ele é um duque, um espião, o primo de Caelum. Explica suas ausências, descreve os caminhos que percorreu nos últimos cinco anos, cada palavra impregnada de um pesar que me atinge como ondas gélidas.“Eu nunca quis enganar você, Aria. Não fiz por diversão ou por crueldade, mas por amor…” Alexander declara e meu coração salta algumas batidas descompassadas. “Eu fui imaturo, sei disso. Só que, se meus pais soubessem de você. Se eles descobrissem que eu estava apaixonado per
Vou cantarolando suavemente, uma melodia carregada de satisfação que ecoa pelo salão enquanto deslizo em direção à minha biblioteca privada. Estou sozinha agora, sem ninguém para moderar meus gestos, minha expressão ou mesmo a minha alegria mal disfarçada pelo destino finalmente traçado de Aria. Morta. Uma palavra que se desenha em minha mente com a doçura de uma conquista. Tantos mortos em minha festa de aniversário, um número expressivo, alguns nobres estrangeiros e membros da guarda, e aqueles humanos fracos e insignificantes. Apenas corpos a mais. A eles, minha indiferença é total. Afinal, a fragilidade dos humanos sempre os torna peças descartáveis, mas hoje em especial, há algo mais que desejo celebrar.O caminho até a minha biblioteca está quase deserto, apenas uns poucos guardas permanecem vigilantes, mas a maioria dos soldados lycan foram dispensados para tratar feridas e contusões. A festa tornou-se um pandemônio deslumbrante e caótico, mas há ordem no meio de toda a destruiç
Me sento na poltrona da ponta, sentindo o peso do couro frio e maciço contra o meu corpo, e do outro lado, Seraphina se acomoda na outra, com um semblante que carrega mais do que apenas um olhar de desconfiança. Um a um, o grupo de conselheiros nos saúdam, inclinando-se num gesto de reverência que parece durar segundos demais, como se hesitasse entre a lealdade e o temor.Observo cada um dos conselheiros, notando os olhares cautelosos que se entrelaçam antes de pousarem em nós. É o tipo de olhar que transmite cautela e incerteza — talvez até receio de falar sobre o assunto que está prestes a ser discutido, mas não de maneira franca. Então, finalmente, rompo o silêncio.“Me digam, caros senhores e senhoras,” começo, deixando minha voz ressoar no ambiente como um trovão abafado, “quais são os descontentamentos de vocês em relação ao aniversário de minha esposa, a rainha de vocês?” O tom de sarcasmo que emprego é afiado como uma lâmina, e percebo o desconforto se espalhar pelo salão como
Estou de pé na varanda de meu escritório, fitando o horizonte escuro e sereno, enquanto a brisa fria corta o ar e traz consigo o perfume dos pinheiros que cercam o castelo. O céu, pintado com tons profundos de azul e cinza, antecipa uma noite sem estrelas, espelhando a inquietação que brota em meu peito. As sombras das árvores balançam lentamente lá fora. Ele parece tão marcado quanto eu, os hematomas em seu rosto são lembranças da transformação que fomos obrigados a ter. Sua presença faz a lembrança da nossa discussão na festa de Seraphina se intensificar em minha mente. Eu me vejo de volta naquele instante, sentindo a explosão de ciúmes tomar conta de mim como uma fera incontrolável, meu sangue fervendo, meus instintos animais superando qualquer traço de razão.É então que ouço passos firmes ecoando pelo corredor e o ranger da porta ao ser aberta. Alexander entra no escritório com a expressão carregada, seu olhar focado e o andar seguro.Entretanto, eu nem sei se Aria está bem, se e
“O que você pretende fazer agora, Aria?” Minha mãe questiona assim que deixamos as crianças na escola.A rua ao nosso redor está tomada por sons de passos apressados, vozes e risos de desconhecidos, misturando-se ao barulho dos carros e às bicicletas que passam ligeiras pelas ciclovias. O sol já está alto, o ar é morno e pegajoso, impregnado com o cheiro de asfalto aquecido. As fachadas das casas e comércios lançam sombras contra a calçada, formando um caminho irregular de luz e escuridão que seguimos com passos hesitantes.Meu coração parece carregado, como se cada passo que dou fosse um peso que arrasto, e o comentário de minha mãe não ajuda a aliviar essa sensação. Ela me encara, e percebo seu olhar esperançoso, quase exigente, esperando por uma resposta que talvez eu não tenha. Já se passaram duas semanas desde o ataque no castelo. Aquele lugar, por mais majestoso que pareça por fora, com suas torres imponentes, seus jardins meticulosamente cuidados e salões adornados com peças de