Capítulo 3 - Aria

Cinco Anos Depois…

O salão está abarrotado de meses redondas espalhadas pelo cômodo amplo e bem iluminado. A decoração me enche os olhos e eu me pergunto se algum dia terei dinheiro para fazer algum evento desse nível de magnitude.

Eu equilíbrio a bandeja com as taças de champanhe enquanto passo por entre as mesas oferecendo as bebidas. As pessoas sentadas, toda bem vestidas e elegantes, me ignoram como sempre fazem quando não querem nada sendo oferecido. Tão soberbas e esnobes que me faz ficar irritada. Respiro fundo e continuo passando por cada mesa, alguns aceitam e outros simplesmente continuam me ignorando.

O som da festa preenche o ambiente com o falatório dos convidados. A pista de dança comporta apenas adultos dançando e alguns adolescentes com coragem para dançar de forma engraçada. Mantenho minha atenção em cada detalhe que há no salão, notando também minhas colegas garçonetes servindo os canapés e outros pratos.

Volto para a cozinha que destoa com a elegância do salão. O local está um pequeno caos, pratos sendo montados, cozinheiros gritando um com o outro, louças sendo lavadas e bandejas sendo levadas e deixadas.

A cacofonia me causa arrepios e até uma dor de cabeça. Sinto minha lombar começar a fisgar de dor e isso me deixa mais lenta para continuar levando as bandejas pelo salão. Quando resolvo parar por alguns minutos apenas para descansar meus braços e pés, meu chefe logo surge.

“Aria, eu estou te pagando para ficar parada, por acaso?” ele indaga com impaciência, cruzando os braços na frente do físico corpulento dele.

“Não, senhor. Apenas precisava de um pouco de folego antes de voltar lá, perdão.” Respondo constrangida.

Meu chefe, um homem beirando aos cinquenta e cinco anos, de rosto sempre vermelho e calvo, me encara com desaprovação e eu logo volto a pegar a bandeja cheia de taças novas de champanhe e parto de volta para dentro do salão.

Cinco horas depois, ao fim da festa, ainda preciso recolher todos os pratos e talheres deixados pelos convidados. Minha colega, Nicole, aparece ao meu lado com a bacia cheia de pratos sujos para lavar.

“Menina, você vai estar de folga no próximo final de semana, não vai?” Nicole pergunta animada e eu confirmo com a cabeça. “Você quer fazer bico? Eu consigo uma vaga para trabalhar como garçonete em um evento, o pagamento é o triplo do daqui.”

Meus olhos se arregalam com a proposta milagrosa. Eu precisava de mais dinheiro, sempre precisaria de mais dinheiro. Não por ganância ou para gastar com coisas desnecessárias, mas sim devido a Elowen e Thorne. Meus lindos anjinhos.

“A resposta é mil vezes sim, Nicole! Isso será uma benção, graças a Deus! Muito obrigada!” respondo com alívio no peito.

Nos últimos dias eu estava preocupada em como ia conseguir pagar as contas mais importante. Com o imprevisto surgindo a todo momento, eu estava com um valor baixo na minha reserva de emergência.

“Perfeito garota, durante a semana eu te envio o endereço!” Nicole explica com rapidez. Logo a gente volta a limpeza do salão e eu sinto uma alegria percorre todo o meu corpo, sentindo que essa nova oportunidade de trabalho, vai trazer muito mais do que dinheiro para mim.

Chego em casa no início da madrugada, percebo que a luz da cozinha está acesa. Tento entrar sem fazer muito barulho para não acordar os gêmeos, meus filhos.

Vou em direção à cozinha e encontro a minha mãe sentada na mesa de jantar com uma taça de vinho preenchido na metade.

“Oi, mãe…” eu a cumprimento com a voz baixa. Lyra, minha mãe, levanta os olhos da tela do celular e sinto a frieza e o desdém em seu rosto.

“Isso são horas de chegar, Aria? Eu não sou babá dos seus filhos, perdi a noite do cassino com as minhas amigas por sua culpa,” minha mãe pragueja com irritação.

“Desculpa, hoje tive que ficar com o time que faz a limpeza. Isso me dá horas extras e assim, mais dinheiro,” explico com cansaço na voz.

“Você não iria precisar trabalhar tanto e me fazer de babá dos seus filhos, se tivesse ficado com o pai deles,” Lyra responde contrariada e eu suspiro cansada.

Minha vontade é dizer que eu não faço ideia de quem é o pai de Elowen e de Thorne. Que bebi demais horas após ter me deitado com Alexander e fui parar na cama de outro homem. O deus grego que agora, nem minhas lembranças conseguem trazer a minha mente os seus traços.

“Mãe, Alexander não quer saber de mim… na realidade, eu não falo com ele faz anos, okay? Ele sumiu do mapa antes mesmo de eu saber sobre a gravidez,” respondo, repetindo sempre o mesmo.

Lyra me olha com a expressão de desapontada e balança a cabeça em lamento pela minha situação.

“Você tinha um futuro tão promissor com ele, Aria. Ia ser uma esposa tão maravilhosa. Agora olha para você, vinte cinco anos, sem estudos. Sendo capacho dos outros. Não foi para isso que eu te criei, Aria, com certeza não foi,” mamãe declara com a voz carregada de lamento.

“Eu sei, mãe, eu sei. Vou para cama, tá bom? Boa noite.”

Antes de ir para o meu próprio quarto, eu passo no quarto dos gêmeos. Abro a porta devagar e observo pela luz do abajur infantil o rosto dos meus dois anjinhos pacifico enquanto dormem. As palavras acusatórias de minha mãe rodopiam em minha mente enquanto me aproximo da cama do meu filho Thorne e dou um beijo em sua testa.

Eu não sei como a minha vida poderia ser se eu não tivesse engravidado aos vinte anos, sem saber exatamente quem é o pai. Mas sei que tenho dois filhos maravilhosos, que alegram todos os meus dias quando acordam. Vou até a cama da minha filha Elowen e também dou um beijo na testa dela.

Com passos ligeiros e silenciosos, eu me arrasto para o meu quarto, sentindo o cansaço dominar todo o meu corpo. Assim que me ajeito para dormir, meu coração se aperta com a lembrança de Alexander, mesmo após cinco anos, a presença do meu ex-namorado ainda me assombra como um fantasma.

“Você não me disse que o evento era no castelo do rei, Nicole!” comento chocada, minha visão do imponente castelo é surpreendente.

Os vidrais pintados ganham vida com os últimos raios de sol antes da chegada da noite. Eu nunca cheguei perto do bairro dos nobres, sempre imaginei como poderia ser lá dentro. Cheio de beleza e magia, algo surpreendente.

“Mesmo com os frequentes ataques dos Wolfspawn Renegades contra a capital, alegando a ilegitimidade do rei e a falta de herdeiros, a família real resolveu comemorar o aniversário de casamento deles. Caelum e Seraphina estão fazendo cinco anos de casados!” Nicole responde animada, ela está no volante, dirigindo com cuidado pela rua privativa até o portão de entrada.

Observo o cenário da entrada, um amplo jardim decorado com rosas-brancas e vermelhas, com arbustos moldados com figuras de lobos enormes e outras criaturas magnificas. Sinto o meu coração acelerar a cada quilômetro que vamos nos aproximando do castelo.

“Imagina a bolada de grana que vamos receber essa noite, Aria. Eu já consigo sentir o dinheiro caindo na minha conta. E quem sabe eu não encontre o meu futuro marido aqui essa noite?” Nicole comente, sua voz carregada de expectativas. Abro um sorriso para ela e balanço a cabeça com incredulidade.

Nobres e plebeus não se misturam, principalmente humanas com lycan’s ou feiticeiros. Para eles, somos incompletos, a escória e apenas a mão de obra que continua fazendo esse país girar.

“Não sei se é uma boa ideia se envolver com algum nobre lycan, Nicole. Com os ataques que tem ocorrido ultimamente, ser humana agora não é tão ruim,” comento risonha e Nicole ri.

“Mas ser pobre é péssimo, eu não quero mais servir aos outros. Quero ser servida para variar,” Nicole se queixa e eu solto somente uma risada curta.

“Sou o coordenador desse evento, me chamo Malik. Por favor, não me envergonhem. Porque se vocês me envergonharem, eu precisarei descontar do salário de vocês como punição, entenderam?” Malik declara com a voz firme e grossa, seus olhos castanhos são frios e assustadores.

Toda a equipe de garçonetes e garçons concordam de forma automática. A cozinha do palácio possuía o triplo do tamanho da cozinha do meu trabalho oficial, a organização e a harmonia dos funcionários me deixam impressionada com tanta eficiente.

“Você!” Malik aponta na minha direção e eu fico paralisada no lugar. “Você vai ficar encarregada de sempre servir o rei e a rainha. Leve essa bandeja de bebidas. Seja cordial e sempre olhe para o chão, nunca olhe diretamente para eles. Entendido?”

“Sim, senhor” respondo com a voz tremula. Eu pego a bandeja e equilíbrio acima da minha cabeça, como de costume.

Assim que saio da cozinha e entro no salão, sou invadida com a beleza surreal do local. A decoração é refinada, elegante e magnifica. Noto pelo são pontos de magia sendo utilizada, como projeções de animais coloridos andando no ar. Caminho com calma em direção à mesa comprida onde se encontra o rei Caelum e a rainha Seraphina.

O casal está radiante. O rei, um homem já com trinta e cinco anos, possui uma barba bem cheia loira, que possui tons mais claros que o cabelo loiro escuro penteado para trás e bem volumoso. Em sua cabeça uma coroa dourada se mescla com os seus cabelos. A beleza do rei é como a de um deus grego esculpido em mármore, mesmo de longe é possível notar os ombros largos e imponência dele.

A rainha Seraphina não fica para trás com a beleza divina de uma feiticeira. Os cabelos são curtos, um pouco abaixo das orelhas que carregam lindos brincos de rubis, que combinam com a cor do cabelo ruivo acobreado dela. Os olhos dourados faíscam com ternura e graça. A palidez do seu rosto faz um enorme contraste com o vestido escuro que ela usa.

Assim que eu me aproximo, mantenho meus olhos abaixados como fui instruída. Falo de forma polida sobre o que há na bandeja e ofereço para os dois. O rei aceita a bebida e eu logo serviço a taça em cima da mesa, assim que termino de colocar a bandeja de volta na posição correta, meu corpo gela ao ouvir a voz da rainha.

“Traga outra funcionária. Essa é uma desengonçada, péssima. Retira ela da minha vista e de meu marido, imediatamente!” Seraphina declara com a voz carregada de desprezo.

Balbucio um pedido de desculpa sem entender o que fiz de errado e sumo da vista dos dois.

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