Jhulietta DuarteA manhã da feira de ciências chegou com uma energia palpável. Ethan estava radiante, vestindo uma camisa xadrez e calças jeans, seus olhos brilhando de entusiasmo. Eu, por outro lado, sentia um misto de nervosismo e orgulho. Havia dedicado os últimos dias a ajudá-lo com o projeto do vulcão em miniatura, e agora era hora de ver o resultado do nosso trabalho.Chegamos à escola e o ginásio estava fervilhando de crianças, pais e professores. Os trabalhos estavam expostos em diversas mesas, cada um mais criativo que o outro. Ethan localizou sua mesa e, com cuidado, colocou o vulcão no centro. A cratera, pintada com tons de vermelho e laranja, parecia quase real.Enquanto Ethan ajustava os últimos detalhes, peguei meu celular e comecei a fotografá-lo. Ele sorria, concentrado, e cada clique capturava um pouco da sua alegria. Tirei diversas fotos, de diferentes ângulos, e então me lembrei de Nicolas. Achei que ele gostaria de ver o filho naquele momento especial. Sem hesitar,
Nicolas Santorini A notícia que Jhulietta me dera sobre meu filho querer retornar à escola me animou profundamente. Ethan se recusava a ir desde o incidente com a mãe e o bullying e mesmo minhas ameaças veladas não surtiam efeito. Era dilacerante ver meu filho naquela situação, isolado do mundo, preso a uma dor que eu, em grande parte, havia causado. A perspectiva de vê-lo retomar a vida social, aprender, interagir com outras crianças, era como um bálsamo para minha alma atormentada. Gostaria de ter me sentado e conversado com Jhulietta sobre isso, expressar minha gratidão de forma mais eloquente, mas ela se retirou da cozinha rapidamente, deixando-me sozinho com meus pensamentos. Quando terminei meu lanche, fui até o quarto de Ethan e o observei dormir tranquilamente. Na cabeceira da cama, repousava sua medalha, o símbolo tangível de sua conquista na feira de ciências. Passei a mão delicadamente pela superfície fria do metal, um sorriso involuntário brotando em meus lábios. Meu f
Ethan SantoriniRespirei fundo, segurando a alça da mochila com força. A escola parecia enorme de novo, como se eu tivesse me esquecido do tamanho dela. Agradeci a tia Jujubinha e ao meu pai pelo apoio e entrei. O corredor estava cheio de alunos, conversando e rindo. Senti um frio na barriga, mas me forcei a continuar andando.Cheguei na minha sala e a professora, Dona Clotilde, me viu e abriu um sorriso.— Ethan! Que bom te ver de volta! Sente-se, por favor.A sala toda olhou para mim. Senti minhas bochechas corarem, mas fui até uma carteira vazia perto da janela e me sentei. Um menino de óculos redondos e uma menina numa cadeira de rodas me olharam com um sorriso.— Que bom que você voltou, Ethan! — disse o menino.— Sentimos sua falta! — completou a menina.— Obrigado — respondi, timidamente.A aula começou e, apesar de algumas matérias estarem um pouco atrasadas, consegui acompanhar a maior parte. A tia Jujubinha tinha me ajudado muito. Quando o sinal tocou para o lanche, Aurélia,
Jhulietta DuarteUm mês havia se passado, e eu estava feliz por Ethan estar se adaptando bem à escola novamente. Apesar de algumas crianças zombarem dele ocasionalmente, ele tem lidado de forma admirável. Sua amizade com Viollet, Aurélia e Emanuel tem sido positiva. Sempre que os pais permitem, os três vêm passar o dia com ele. Por vezes, tento deixá-los a sós para fazerem coisas de crianças, mas Ethie faz questão que eu esteja por perto.Minha relação com Nicolas, por outro lado, continua estagnada. Não sinto mais o desprezo que sentia no início, mas nossa interação se limita a conversas esporádicas na cozinha, nosso local de encontro quase que oficial.Hoje, Ethan pediu para visitar os avós, e Nicolas sugeriu que eu o levasse. Ao chegar, fui recebida por Gina, a governanta da casa, a quem Ethan chama carinhosamente de "tia Gina". A casa era grandiosa, e fiquei imaginando Nicolas correndo por ali na infância, explorando cada canto.Depois que minha mãe foi assassinada, nunca tive um
A madrugada parecia mais longa do que o habitual. O relógio na cabeceira marcava 3h20, mas o tempo parecia congelado. Minhas mãos tremiam enquanto passava os dedos pelos lençóis úmidos de suor. O pesadelo ainda pulsava em minha mente, como uma cicatriz recém-aberta. As lembranças dos gritos da minha mãe, do cheiro metálico do sangue e do olhar frio do meu pai estavam tão nítidas que era como se tudo estivesse acontecendo novamente.Engoli em seco, tentando afastar as imagens, mas a sombra escura do passado continuava a pairar. Levantei-me da cama com cuidado para não fazer barulho. A casa estava silenciosa, exceto pelo som baixo do vento lá fora. Eu precisava de ar, de espaço. Peguei meu casaco no cabideiro e desci as escadas.Caminhei até a área da piscina. O reflexo da lua na água parecia uma miragem distante, mas ainda assim reconfortante. Sentei-me no chão frio, abraçando os joelhos, e deixei as lágrimas caírem livremente. Chorava por tudo: pela dor que nunca desapareceu, pela cri
Nicolas Santorini.Eu ainda sentia o gosto do beijo de Jhulietta quando voltei para dentro de casa naquela madrugada. Ela tinha uma leveza que me fazia querer parar o tempo, como se o mundo inteiro pudesse esperar enquanto estávamos juntos. Mas, ao mesmo tempo, havia um peso nela, algo que ela carregava sozinha e que eu mal conseguia decifrar.Na manhã seguinte, acordei cedo, como de costume. O cheiro de café fresco já preenchia o ambiente quando desci para a cozinha. Ethan estava sentado à mesa, com os olhos brilhando e uma animação contagiante.— Olha quem acordou animado outra vez! — comentei, pegando uma xícara de café.— Bom dia, papai! Hoje, depois da escola, tem jogo de futebol. Você vai, né? — ele perguntou com um sorriso de orelha a orelha.Hesitei. A verdade é que eu tinha uma reunião importante marcada para a tarde, algo que não podia adiar. Respirei fundo antes de responder.— Filho, hoje eu tenho uma reunião importante, mas, se der, eu vou. Prometo tentar.O sorriso de Et
O som do despertador ecoou pela casa, mas eu já estava acordado. A conversa com Ethan na noite anterior não saía da minha cabeça. *"Já estou acostumado."* Essas palavras estavam cravadas em mim como um lembrete do quanto eu tinha falhado. Não era isso que eu queria para ele, para nós. Levantei-me, determinado a mudar. A vida não vinha com manual, mas eu sabia que precisava tentar ser um pai melhor, mais presente. Ethan merecia isso. Desci para tomar café, e ele já estava à mesa, quieto, distraído com os próprios pensamentos. Puxei a cadeira e me sentei. — Bom dia, campeão — cumprimentei, tentando soar leve. — Bom dia, pai — respondeu ele, sem sorrir. Ele ainda estava chateado com minha ausência no jogo. Dona Neuza me serviu os ovos e se retirou, deixando-nos a sós. — Filho, podemos conversar um pouco? — perguntei. Ele me olhou com curiosidade, mas assentiu. — Sobre o que? — Sobre ontem. Sei que não fui ao jogo, e isso te chateou. — Não precisa pedir desculpas de no
Jhulietta Duarte A brisa noturna era suave, trazendo consigo o cheiro do mar que parecia abraçar o resort. Nicolas e eu caminhávamos lado a lado por uma trilha pavimentada que levava até a praia. O silêncio entre nós não era desconfortável, mas sim tranquilo, quase cúmplice. À nossa frente, as luzes do resort se mesclavam com as estrelas acima, criando um cenário quase mágico. Decidi quebrar o silêncio, minha curiosidade me impulsionando. — Quantos resorts sua família tem mesmo? — perguntei, olhando para ele de soslaio. Ele deu um meio sorriso, aquele tipo de sorriso que sempre parecia carregado de mistério e segurança. — Dezesseis, no total — respondeu casualmente, como se fosse algo comum. Arregalei os olhos, surpresa. — Dezesseis? Isso é muita coisa, Nicolas! Ele riu baixinho, balançando a cabeça. — Na verdade, não. Além dos resorts, temos vinte hotéis espalhados pelo Brasil. Parei de andar por um momento, processando a informação. — Vinte hotéis e dezesseis re