Maeve
A batida na porta me fez sentir um aperto no peito. Já sabia quem era. Quando abri, Ricardo estava lá, com seu habitual ar de confiança. Ele não disse nada por um momento, apenas me olhou como quem já sabia a resposta. — Então, Maeve, qual é a sua decisão? — Ele perguntou, direto, como sempre. Eu o encarei, lutando com os pensamentos que me mantinham acordada na noite anterior. Minha avó estava cada vez mais frágil, e as contas do hospital estavam muito além do que eu poderia pagar. Mas aceitar aquela proposta... era algo que não consegui decidir tão facilmente. — Ainda não sei, Ricardo. Isso é muita coisa para digerir — respondi, cruzando os braços. Ele entrou na sala sem esperar um convite, olhando ao redor, como se estivesse inspecionando o ambiente. — Olha, Maeve, eu sei que você tem muitas preocupações. Sua avó, o hospital... Mas eu já falei, essa é uma oportunidade que vai te ajudar muito. Estou falando de 200 mil dólares depositados diretamente na sua conta assim que o acordo for concluído. Isso vai cobrir todos os custos médicos dela e mais. — Ele deu um passo à frente, os olhos fixos nos meus. — E eu posso garantir que ela terá o melhor cuidado. Meu coração acelerou. O valor era algo inimaginável para mim. Com isso, eu poderia não só pagar o hospital como também garantir que minha avó tivesse conforto em seus últimos dias. Mas havia um porém. — E se... eu aceitar, como vai funcionar? E o dinheiro, você realmente vai transferir? Ricardo não hesitou. — Assim que o acordo estiver selado, o dinheiro será depositado. 200 mil, direto na sua conta. E eu já dei ordem para que o hospital seja pago. Não se preocupe, sua avó já está sendo cuidada como se fosse a minha própria família. A última frase me atingiu com força. Ele já havia custeado o hospital? Antes mesmo de eu aceitar o acordo? Aquilo me fez sentir ainda mais pressionada. Não havia volta. — Você já pagou o hospital? — perguntei, incrédula. — Claro. Quando me comprometo com algo, não deixo nada pela metade. E, sinceramente, não posso deixar sua avó em uma situação precária enquanto você pensa sobre o acordo. Ela merece o melhor tratamento, e eu garanto isso a você. Suspirei, sem saber o que dizer. Ricardo parecia decidido a resolver tudo à sua maneira. Eu estava sendo empurrada para uma situação em que não tinha escolha. — Tudo bem, eu aceito. Mas preciso que entenda que isso não é fácil para mim. Ele assentiu, satisfeito. — Sei que não é fácil, mas você vai ver que é a melhor decisão que poderia tomar. Vou te buscar em algumas horas. E não se preocupe, voltaremos a tempo para o aniversário da sua avó. (...) Mais tarde, eu estava pronta para a viagem. Ricardo já me esperava no carro, e eu tentava acalmar os pensamentos. Tudo parecia estar fora do meu controle. Ao descer as escadas do prédio, senti meu pé escorregar no último degrau. Foi rápido, e a dor me atingiu com uma intensidade que me fez gritar. — Droga! — gritei, vendo meu pé torcido em um ângulo estranho. A dor era excruciante. Em questão de segundos, Ricardo apareceu ao meu lado. — Maeve, o que aconteceu?! — Ele se ajoelhou ao meu lado, seus olhos arregalados. — Acho que quebrei o pé... — respondi, tentando controlar o choro. Ele não hesitou. Puxou o celular e rapidamente chamou uma ambulância. Eu mal conseguia respirar de tanta dor. Ricardo Enquanto a ambulância levava Maeve para o hospital, fiquei ao lado dela, assistindo impotente. Tínhamos uma viagem importante, e agora tudo parecia ter ido por água abaixo. Assim que chegamos ao hospital, lembrei-me do que havia prometido. Tudo estava sob controle em relação à sua avó, mas agora Maeve estava imobilizada. Minha mãe ligou assim que me sentei na sala de espera. — Ricardo, querido, onde estão vocês? Já está tudo pronto para o jantar. Não vejo a hora de conhecer sua noiva — disse ela, empolgada como sempre. Eu suspirei, sentindo o peso da situação. — Mãe, tivemos um imprevisto. Maeve sofreu um acidente e estamos no hospital. — No hospital? Oh, meu Deus! Ela está bem? — Ela quebrou o pé. Estamos esperando os exames, mas está tudo sob controle. Vamos chegar mais tarde do que o planejado. Houve uma breve pausa antes de minha mãe responder. — Bem, o importante é que ela esteja bem. Mantenha-me informada, querido. Desliguei o telefone e voltei minha atenção para Maeve, que estava deitada no quarto do hospital. Seu pé estava imobilizado, e ela parecia derrotada. — Me desculpe por isso, Ricardo — ela murmurou, olhando para mim com um olhar cansado. — Não foi culpa sua. Só quero que você fique bem — respondi, tentando soar mais calmo do que realmente estava. Foi quando Gustavo entrou no quarto, segurando seu telefone. — Maeve, você vai ficar bem. O pé está imobilizado corretamente, mas vai precisar de um bom tempo de repouso. Nada de esforços pelos próximos dias, ok? Maeve assentiu, ainda com os olhos tristes. Eu estava frustrado com tudo, mas sabia que ela não precisava de mais pressão. — Ricardo, tenho uma surpresa para Maeve — disse Gustavo, com um sorriso. Ele ativou a chamada de vídeo no celular, e, para minha surpresa, a tela mostrou minha mãe, ao lado da avó de Maeve, sorrindo largamente. Havia balões e um bolo pequeno ao fundo. — Feliz aniversário, minha querida! — minha mãe disse, animada. A emoção tomou conta de Maeve, que começou a chorar. A avó dela estava radiante, e ver aquilo mexeu comigo mais do que eu esperava. Gustavo havia organizado tudo para que Maeve não perdesse aquele momento especial, e pela primeira vez, senti algo diferente ao vê-la. — Obrigada, Ricardo. Obrigada por tudo — Maeve disse, a voz trêmula, os olhos ainda cheios de lágrimas. Eu sorri, sentindo-me tocado pela situação. Não era algo que eu esperava sentir, mas estava ali. Quando a chamada terminou, Maeve me olhou. — Parece que vamos ter que lidar com as perguntas da sua mãe agora, não é? — Sim, mas não se preocupe. Vamos dar um jeito nisso. Eu olhei para ela e, pela primeira vez, tudo parecia mais do que apenas um acordo.MaeveO silêncio no carro era pesado enquanto Ricardo dirigia em direção à casa de sua mãe. Mesmo depois do acidente, ele insistiu que a viagem continuasse, e, por mais que eu quisesse protestar, sabia que ele estava certo. Não podíamos perder tempo, e a promessa de que estaríamos de volta para o aniversário da minha avó ainda ressoava na minha cabeça. Meu pé doía, mesmo imobilizado, e o desconforto da viagem apenas me lembrava do caos em que minha vida havia se tornado.Olhei de soslaio para Ricardo. Ele parecia tranquilo, focado na estrada, mas o silêncio entre nós era quase ensurdecedor. Algo estava diferente nele desde a visita ao hospital, como se o gesto da surpresa com minha avó tivesse quebrado uma barreira.— Você está quieta — ele disse, sem tirar os olhos da estrada.— Só estou pensando — respondi, suspirando em seguida. — Em tudo que está acontecendo. Minha avó, esse acordo...Ele assentiu lentamente, sem desviar o olhar.— Eu sei que não é fácil, Maeve. Mas você tomou a d
MaeveQuando entrei na sala, me senti imediatamente fora de lugar. O ambiente era imaculado, o luxo transbordava de cada canto: desde os móveis finos até os quadros pendurados nas paredes. E então, havia eu, com meu vestido simples, nada de grife, nada que chamasse a atenção. Meu pé imobilizado apenas tornava tudo ainda mais constrangedor. Eu podia sentir os olhos da mãe de Ricardo me analisando de cima a baixo, cada detalhe das minhas roupas.Ela sorriu, mas havia algo em seu olhar.— Então, Maeve... — sua voz era doce, mas carregada de curiosidade, como se estivesse esperando uma explicação para o que via. — Ricardo me contou sobre o acidente. Uma pena. Mas... devo dizer que estou surpresa. Não esperava que minha futura nora fosse... tão simples.Ricardo, ao meu lado, percebeu o tom imediatamente. Ele olhou para mim de soslaio, sem saber como eu reagiria.— Ah, eu... — comecei, sentindo o calor subir ao meu rosto. — Eu realmente não tive muito tempo para me arrumar adequadamente dep
MaeveEu não conseguia dormir. As palavras da mãe de Ricardo ecoavam na minha mente como um disco quebrado, repetindo sem parar. "Surpresa... refinada... sofisticada." Elas me rasgavam por dentro, expondo todas as inseguranças que eu já sabia que tinha. Talvez ela tivesse razão. Talvez eu realmente não pertencesse àquele mundo.Sentada na beira da cama, olhei para o meu pé enfaixado. O curativo agora parecia mais uma metáfora para minha vida. Eu estava remendada, tentando seguir em frente, mas me sentia prestes a desmoronar a qualquer momento. As lembranças da minha avó no hospital também não ajudavam.O silêncio no quarto era sufocante, e eu sabia que, a qualquer momento, as lágrimas viriam. Minha avó, aquela que sempre esteve ao meu lado, agora estava em uma cama de hospital, frágil e doente. E eu? Estava aqui, fingindo ser algo que não era para garantir que ela pudesse ter pelo menos um pouco mais de tempo.Antes que pudesse me afundar ainda mais nos meus pensamentos, ouvi uma leve
MaeveA manhã seguinte chegou como um peso inevitável. As palavras de Ricardo, sua sinceridade incomum na noite anterior, deixaram uma marca em mim. Eu ainda não sabia o que pensar, mas sabia que havia algo se movendo sob a superfície dessa farsa. E eu não sabia se queria ou podia lidar com isso.Ricardo havia saído cedo para lidar com algum assunto de trabalho, e eu fiquei no quarto, pensando no jantar que a mãe dele mencionara na ligação. Seria um evento grande, algo que eu nunca havia experimentado. Um baile de máscaras em uma mansão. Pelo que ouvi, as expectativas estavam nas alturas, e eu teria que cumprir meu papel impecavelmente.Enquanto estava perdida em pensamentos, alguém bateu na porta. Uma das empregadas entrou, carregando uma caixa grande e preta, com um laço dourado no topo.— Isso chegou para a senhorita Maeve — ela disse com um sorriso discreto antes de deixar a caixa ao lado da cama.Fiquei olhando para a caixa por alguns segundos, hesitante. Sabia que era algo de Ri
MaeveA tensão no quarto era palpável. Depois das palavras de Ricardo, algo mudou entre nós, uma linha invisível que separava o profissional do pessoal. Eu não sabia o que era, mas podia sentir o peso disso no ar.Eu observava enquanto ele se afastava para atender o telefonema da mãe. Ele parecia sempre tão seguro de si, tão impenetrável. Mas agora, havia algo diferente em seus olhos. Uma vulnerabilidade que ele não mostrava a ninguém. Pelo menos, não a mim.Quando ele desligou o telefone e voltou seu olhar para mim, senti meu coração acelerar. Era como se o Ricardo que eu conhecia estivesse se desfazendo diante de mim, revelando um homem que eu mal começava a entender.— Então, o que fazemos agora? — perguntei, tentando manter minha voz estável, mas falhando miseravelmente.Ele respirou fundo, caminhando até mim com passos lentos. Parecia que cada movimento seu carregava uma intenção que eu não conseguia decifrar. Ele se aproximou, parando a poucos centímetros de mim. O calor que ema
RicardoEu nunca fui o tipo de homem que se deixa levar por impulsos. Sempre fui calculista, controlado. Mas, ao sair daquele quarto, depois daquele beijo, me senti despedaçado. Maeve havia conseguido, de alguma forma, fazer com que eu perdesse o controle. E eu odiava isso tanto quanto desejava mais.Fechei a porta atrás de mim e me encostei na parede do corredor, tentando regular minha respiração. O gosto dela ainda estava nos meus lábios, e a sensação de sua pele macia ainda queimava em minhas mãos. Mas eu sabia que aquilo não era apenas sobre desejo. Havia algo mais profundo ali, algo que eu não queria admitir. Não ainda.Peguei meu celular e disquei o número de Gustavo. Precisava de uma distração, alguém com quem pudesse conversar e tentar colocar a cabeça no lugar. O telefone chamou uma vez antes de ele atender.— Ricardo, e aí? Como estão as coisas com a sua "noiva"? — O tom zombeteiro de Gustavo não ajudava.— Não tenho tempo para piadas agora, Gustavo — rosnei, passando a mão
MaeveA manhã seguinte veio como um soco. Quando abri os olhos, a luz suave do sol já filtrava pelas cortinas. A sensação do beijo de Ricardo ainda pairava no ar, como uma névoa que não conseguia dissipar. A cama ao meu lado estava vazia, e uma parte de mim sentiu um vazio maior do que eu gostaria de admitir.Sentei-me lentamente, tentando organizar meus pensamentos. O que aquilo significava? O beijo, as palavras não ditas, a tensão que parecia engolir tudo ao nosso redor? Eu não sabia como lidar com os sentimentos confusos que borbulhavam dentro de mim.— Bom dia. — A voz de Ricardo me tirou de meus pensamentos.Ele estava parado à porta, com uma bandeja de café da manhã nas mãos, parecendo surpreendentemente relaxado. Ele me olhou com aquele sorriso meio de lado, o tipo de sorriso que sempre me desarmava.— Café? — Ele colocou a bandeja na pequena mesa ao lado da cama e me olhou intensamente.A tensão ainda estava lá, latente no fundo, mas diferente do que eu esperava. Ricardo parec
MaeveEu estava diante do espelho, tentando encontrar alguma confiança no reflexo que me encarava. Era a segunda vez que eu veria a mãe de Ricardo, e, da última vez, eu tinha sido pega de surpresa. Agora, eu estava pronta para o julgamento inevitável.Mas pronta mesmo?— Maeve, você está bem? — Ricardo entrou no quarto, ajeitando a gravata, e me olhou de cima a baixo, com uma mistura de admiração e preocupação.— Eu estou... — murmurei, enquanto terminava de ajeitar o vestido. — Pelo menos, espero estar.Ricardo deu um passo à frente, seus olhos escaneando cada detalhe do meu visual. Seus dedos deslizaram pelo meu braço, causando um arrepio.— Você está linda — ele disse suavemente. — Minha mãe vai adorar.Revirei os olhos.— Ah, claro. Ela vai adorar julgar meu cabelo e dizer que o corte não combina com a "noiva de um Kurtz". — Tentei sorrir, mas sabia que aquilo estava me corroendo por dentro. Eu sabia que seria uma noite difícil, e ter que encarar a mãe de Ricardo de novo... bom, i