Maeve
Eu sabia que aquela manhã mudaria tudo. O peso da decisão já apertava meu peito quando bati na porta do escritório de Ricardo. Ouvi sua voz abafada me chamar e entrei, tentando manter a calma. — Maeve, sente-se — ele disse, sem desviar os olhos dos documentos sobre sua mesa. Me acomodei na cadeira de couro, sentindo a tensão crescer. Ricardo finalmente levantou o olhar, suas sobrancelhas arqueadas em uma expressão de impaciência. Eu sabia que ele não esperava que algo assim viesse de mim. — O que é agora? — Ele fechou a pasta à sua frente, cruzando os braços. Respirei fundo, forçando as palavras a saírem firmes. — Eu estou pedindo demissão, Ricardo. O silêncio que se seguiu foi sufocante. Ele me encarou, surpreso, como se estivesse tentando entender o que eu havia acabado de dizer. — Demissão? — Ele repetiu, a palavra soando como um desafio. — E qual é o motivo dessa decisão repentina? Minha voz vacilou, mas continuei. — Minha avó está muito doente, e as contas do hospital são... insuportáveis. Eu preciso de mais tempo para cuidar dela, e, sinceramente, não posso mais continuar aqui sob essas circunstâncias. Ricardo levantou-se e caminhou até a janela, olhando a vista da cidade como se estivesse ponderando o que eu disse. Quando ele se virou, seus olhos tinham um brilho calculista. — Bom, isso é inconveniente, Maeve. — Ele passou a mão pelo cabelo. — Mas eu tenho uma proposta para você. Meu estômago revirou. Eu sabia que o que quer que ele estivesse prestes a sugerir não seria simples. — Preciso de uma noiva. — Ele disse com um meio sorriso. — Minha mãe está esperando ansiosa para comemorar a compra da minha nova loja... e conhecer minha noiva. O problema é que eu não tenho uma. Quero que você finja ser minha noiva por duas semanas. Em troca, vou cobrir todas as despesas médicas da sua avó, e ainda te ofereço um bom bônus. Fiquei sem palavras por alguns segundos. A proposta era tentadora, mas absurda. Sabia que o dinheiro resolveria muitos dos meus problemas, mas à que preço? — Você só tem duas opções, Maeve — ele disse com frieza. — Ou aceita, ou está fora. Meu corpo gelou. Ele sabia que eu já estava saindo, mas ouvir aquilo como uma ameaça doeu mais do que eu esperava. — Então, me considere oficialmente demitida, Ricardo. Não vou fazer isso. Dei as costas e saí do escritório com o coração pesado. No caminho para fora, comecei a recolher minhas coisas, sentindo um vazio se formar. Anos de trabalho, dedicação, sacrifícios... e ali estava eu, deixando tudo para trás. O aperto no peito era quase insuportável. Foi quando encontrei Gustavo no saguão do prédio. Seu semblante sério me fez entender que ele já sabia da minha situação com a minha avó, mas havia algo mais em seu olhar. — Maeve, precisamos conversar — ele disse, direto. — Sobre sua avó. Engoli em seco, seguindo-o até o hospital. Sabia que as notícias não seriam boas. Já no hospital, Gustavo se aproximou de mim com uma expressão preocupada e profissional, assumindo seu papel de médico. — Maeve, o estado da sua avó se agravou. Fizemos exames mais detalhados, e os resultados não são bons. Ela está com insuficiência cardíaca congestiva avançada, o que significa que o coração dela não está bombeando sangue de forma eficiente. Isso está causando acúmulo de líquidos nos pulmões, o que explica a dificuldade respiratória que ela está enfrentando. Além disso, o comprometimento renal também está piorando devido à baixa perfusão. Ela vai precisar de medicações específicas para melhorar a função cardíaca e renal, além de oxigenoterapia constante e, possivelmente, uma cirurgia de reparação de válvula cardíaca. Esses tratamentos são caros e prolongados. Eu sei que a situação é delicada financeiramente, mas não podemos esperar muito tempo para iniciar as intervenções necessárias. Minha cabeça girou enquanto Gustavo explicava os detalhes médicos. Não tinha ideia de como pagaria por tudo isso. Minhas mãos tremiam. — Obrigada, Gustavo. Vou... pensar em algo — respondi, com a voz quase sumindo. Ricardo Horas depois, estava sentado no bar de um hotel, encarando meu copo de uísque e remoendo o fracasso do meu plano. Eu achava que Maeve era a escolha perfeita. Alguém discreta, com problemas financeiros e sem uma rede social extensa. Mas ela simplesmente me recusou. O bar estava quase vazio, exceto por Gustavo, que havia chegado mais cedo. Ele se aproximou da mesa, olhando para mim como quem já sabia o que tinha acontecido. — Ela recusou, não foi? — ele perguntou, sentando-se ao meu lado. — Claro que sim. Eu fiz a proposta, disse que pagaria as contas médicas da avó dela e... nada. Simplesmente se demitiu. — Suspirei, passando a mão pelo rosto. — Agora, o que eu faço? Minha mãe está esperando para comemorar e conhecer minha "noiva". Gustavo franziu o cenho, como se ponderasse por um momento. — Ricardo, você sabe da gravidade da situação da avó de Maeve, certo? A coisa é bem séria. Levantei o olhar, intrigado. — Séria como? — A avó dela está com insuficiência cardíaca avançada e problemas renais. O tratamento é caro, e ela não pode esperar muito. Os medicamentos são específicos e não são cobertos pelos planos de saúde comuns. Além disso, pode ser necessária uma cirurgia para reparar as válvulas cardíacas. Isso, sem falar na oxigenoterapia e cuidados paliativos. Maeve está no limite. Ela provavelmente está tentando segurar tudo sozinha, mas não vai durar muito assim. A informação bateu em mim como um soco. Maeve estava mais desesperada do que eu imaginava. Uma ideia começou a se formar em minha mente. Talvez ela ainda fosse reconsiderar. — Então, ela está sem saída — murmurei, mais para mim do que para Gustavo. Ele me encarou, entendendo onde eu queria chegar. — Ricardo, você realmente acha que usar isso como uma vantagem é a melhor coisa a fazer? Ignorei o tom de advertência em sua voz. Isso era uma oportunidade de negócios, e Maeve sabia que eu estava oferecendo algo que poderia ajudá-la. Levantei-me, decidido. — Vou procurar Maeve de novo. Se ela souber o quanto precisa, pode reconsiderar. Mais tarde, naquela noite, fui até a casa de Maeve. Quando ela abriu a porta, parecia exausta e surpresa ao me ver ali. — O que você está fazendo aqui, Ricardo? Já não disse que não aceito sua proposta? Sorri, tentando não parecer tão frio como de costume. — Não vim para te pressionar. Pensei em te convidar para um drink. Conversarmos com calma. Talvez você mude de ideia. Ela hesitou, mas acabou aceitando. Nos encontramos em um pub discreto. Pela primeira vez, me esforcei para ser amigável. Entre algumas cervejas e conversas, deixei claro que minha oferta ainda estava de pé. — Pense nisso, Maeve. Isso pode resolver seus problemas. Você não precisa decidir agora, mas o tempo não está ao seu lado. Ela me olhou por um momento, em silêncio, antes de acenar com a cabeça. — Vou pensar. Te dou a resposta amanhã. A leve esperança em suas palavras me deixou satisfeito. Pela primeira vez, estava perto de conseguir o que precisava.MaeveA batida na porta me fez sentir um aperto no peito. Já sabia quem era. Quando abri, Ricardo estava lá, com seu habitual ar de confiança. Ele não disse nada por um momento, apenas me olhou como quem já sabia a resposta.— Então, Maeve, qual é a sua decisão? — Ele perguntou, direto, como sempre.Eu o encarei, lutando com os pensamentos que me mantinham acordada na noite anterior. Minha avó estava cada vez mais frágil, e as contas do hospital estavam muito além do que eu poderia pagar. Mas aceitar aquela proposta... era algo que não consegui decidir tão facilmente.— Ainda não sei, Ricardo. Isso é muita coisa para digerir — respondi, cruzando os braços.Ele entrou na sala sem esperar um convite, olhando ao redor, como se estivesse inspecionando o ambiente.— Olha, Maeve, eu sei que você tem muitas preocupações. Sua avó, o hospital... Mas eu já falei, essa é uma oportunidade que vai te ajudar muito. Estou falando de 200 mil dólares depositados diretamente na sua conta assim que o ac
MaeveO silêncio no carro era pesado enquanto Ricardo dirigia em direção à casa de sua mãe. Mesmo depois do acidente, ele insistiu que a viagem continuasse, e, por mais que eu quisesse protestar, sabia que ele estava certo. Não podíamos perder tempo, e a promessa de que estaríamos de volta para o aniversário da minha avó ainda ressoava na minha cabeça. Meu pé doía, mesmo imobilizado, e o desconforto da viagem apenas me lembrava do caos em que minha vida havia se tornado.Olhei de soslaio para Ricardo. Ele parecia tranquilo, focado na estrada, mas o silêncio entre nós era quase ensurdecedor. Algo estava diferente nele desde a visita ao hospital, como se o gesto da surpresa com minha avó tivesse quebrado uma barreira.— Você está quieta — ele disse, sem tirar os olhos da estrada.— Só estou pensando — respondi, suspirando em seguida. — Em tudo que está acontecendo. Minha avó, esse acordo...Ele assentiu lentamente, sem desviar o olhar.— Eu sei que não é fácil, Maeve. Mas você tomou a d
MaeveQuando entrei na sala, me senti imediatamente fora de lugar. O ambiente era imaculado, o luxo transbordava de cada canto: desde os móveis finos até os quadros pendurados nas paredes. E então, havia eu, com meu vestido simples, nada de grife, nada que chamasse a atenção. Meu pé imobilizado apenas tornava tudo ainda mais constrangedor. Eu podia sentir os olhos da mãe de Ricardo me analisando de cima a baixo, cada detalhe das minhas roupas.Ela sorriu, mas havia algo em seu olhar.— Então, Maeve... — sua voz era doce, mas carregada de curiosidade, como se estivesse esperando uma explicação para o que via. — Ricardo me contou sobre o acidente. Uma pena. Mas... devo dizer que estou surpresa. Não esperava que minha futura nora fosse... tão simples.Ricardo, ao meu lado, percebeu o tom imediatamente. Ele olhou para mim de soslaio, sem saber como eu reagiria.— Ah, eu... — comecei, sentindo o calor subir ao meu rosto. — Eu realmente não tive muito tempo para me arrumar adequadamente dep
MaeveEu não conseguia dormir. As palavras da mãe de Ricardo ecoavam na minha mente como um disco quebrado, repetindo sem parar. "Surpresa... refinada... sofisticada." Elas me rasgavam por dentro, expondo todas as inseguranças que eu já sabia que tinha. Talvez ela tivesse razão. Talvez eu realmente não pertencesse àquele mundo.Sentada na beira da cama, olhei para o meu pé enfaixado. O curativo agora parecia mais uma metáfora para minha vida. Eu estava remendada, tentando seguir em frente, mas me sentia prestes a desmoronar a qualquer momento. As lembranças da minha avó no hospital também não ajudavam.O silêncio no quarto era sufocante, e eu sabia que, a qualquer momento, as lágrimas viriam. Minha avó, aquela que sempre esteve ao meu lado, agora estava em uma cama de hospital, frágil e doente. E eu? Estava aqui, fingindo ser algo que não era para garantir que ela pudesse ter pelo menos um pouco mais de tempo.Antes que pudesse me afundar ainda mais nos meus pensamentos, ouvi uma leve
MaeveA manhã seguinte chegou como um peso inevitável. As palavras de Ricardo, sua sinceridade incomum na noite anterior, deixaram uma marca em mim. Eu ainda não sabia o que pensar, mas sabia que havia algo se movendo sob a superfície dessa farsa. E eu não sabia se queria ou podia lidar com isso.Ricardo havia saído cedo para lidar com algum assunto de trabalho, e eu fiquei no quarto, pensando no jantar que a mãe dele mencionara na ligação. Seria um evento grande, algo que eu nunca havia experimentado. Um baile de máscaras em uma mansão. Pelo que ouvi, as expectativas estavam nas alturas, e eu teria que cumprir meu papel impecavelmente.Enquanto estava perdida em pensamentos, alguém bateu na porta. Uma das empregadas entrou, carregando uma caixa grande e preta, com um laço dourado no topo.— Isso chegou para a senhorita Maeve — ela disse com um sorriso discreto antes de deixar a caixa ao lado da cama.Fiquei olhando para a caixa por alguns segundos, hesitante. Sabia que era algo de Ri
MaeveA tensão no quarto era palpável. Depois das palavras de Ricardo, algo mudou entre nós, uma linha invisível que separava o profissional do pessoal. Eu não sabia o que era, mas podia sentir o peso disso no ar.Eu observava enquanto ele se afastava para atender o telefonema da mãe. Ele parecia sempre tão seguro de si, tão impenetrável. Mas agora, havia algo diferente em seus olhos. Uma vulnerabilidade que ele não mostrava a ninguém. Pelo menos, não a mim.Quando ele desligou o telefone e voltou seu olhar para mim, senti meu coração acelerar. Era como se o Ricardo que eu conhecia estivesse se desfazendo diante de mim, revelando um homem que eu mal começava a entender.— Então, o que fazemos agora? — perguntei, tentando manter minha voz estável, mas falhando miseravelmente.Ele respirou fundo, caminhando até mim com passos lentos. Parecia que cada movimento seu carregava uma intenção que eu não conseguia decifrar. Ele se aproximou, parando a poucos centímetros de mim. O calor que ema
RicardoEu nunca fui o tipo de homem que se deixa levar por impulsos. Sempre fui calculista, controlado. Mas, ao sair daquele quarto, depois daquele beijo, me senti despedaçado. Maeve havia conseguido, de alguma forma, fazer com que eu perdesse o controle. E eu odiava isso tanto quanto desejava mais.Fechei a porta atrás de mim e me encostei na parede do corredor, tentando regular minha respiração. O gosto dela ainda estava nos meus lábios, e a sensação de sua pele macia ainda queimava em minhas mãos. Mas eu sabia que aquilo não era apenas sobre desejo. Havia algo mais profundo ali, algo que eu não queria admitir. Não ainda.Peguei meu celular e disquei o número de Gustavo. Precisava de uma distração, alguém com quem pudesse conversar e tentar colocar a cabeça no lugar. O telefone chamou uma vez antes de ele atender.— Ricardo, e aí? Como estão as coisas com a sua "noiva"? — O tom zombeteiro de Gustavo não ajudava.— Não tenho tempo para piadas agora, Gustavo — rosnei, passando a mão
MaeveA manhã seguinte veio como um soco. Quando abri os olhos, a luz suave do sol já filtrava pelas cortinas. A sensação do beijo de Ricardo ainda pairava no ar, como uma névoa que não conseguia dissipar. A cama ao meu lado estava vazia, e uma parte de mim sentiu um vazio maior do que eu gostaria de admitir.Sentei-me lentamente, tentando organizar meus pensamentos. O que aquilo significava? O beijo, as palavras não ditas, a tensão que parecia engolir tudo ao nosso redor? Eu não sabia como lidar com os sentimentos confusos que borbulhavam dentro de mim.— Bom dia. — A voz de Ricardo me tirou de meus pensamentos.Ele estava parado à porta, com uma bandeja de café da manhã nas mãos, parecendo surpreendentemente relaxado. Ele me olhou com aquele sorriso meio de lado, o tipo de sorriso que sempre me desarmava.— Café? — Ele colocou a bandeja na pequena mesa ao lado da cama e me olhou intensamente.A tensão ainda estava lá, latente no fundo, mas diferente do que eu esperava. Ricardo parec