Parte 1...
Júlio sabia que não deveria ter aceitado a proposta de Célia em deixar que Natália o ajudasse enquanto estava sozinho. Boa coisa não sairia daí.
— Só pra você saber, eu não te perdoei pela brincadeira do bolo - ela disse — E nem do assassinato da minha foca.
— Meu Deus! - ele riu — Faz tanto tempo. Você tinha o que? Uns treze anos quando foi visitar sua tia e eu fiz isso? E a foca era coisa de menina e você já tinha dezoito anos.
— Não interessa a idade - ela cruzou os braços — E você já era adulto quando matou minha foquinha de pelúcia afogada.
Ele deu uma risada gostosa. Tinha visto Natália a primeira vez quando ela estava visitando a tia e tinha ficado amiga da prima dele. Era uma menina linda, mas uma peste que vivia aprontando no prédio toda vez que aparecia.
Ele gostou dela de cara. Estava com doze anos e ele tinha dezenove. Natália vivia grudada com Marina e como ele aparecia muito na casa dos tios acabaram ficando amigos também e Célia era maravilhosa com ele e toda vez que aparecia ia até lá para vê-la também.
Só que agora a menina tinha crescido e estava uma gata com um corpo perfeito. Difícil não notar. Não era mais a magrela de antes que ele adorava encher o saco só para deixá-la irritada.
Natália agora estava com uma postura diferente, arrumada, altiva. Parecia uma mulher de negócios.
O cabelo muito preto estava preso em um rabo de cavalo com alguns fios delicados soltos na frente do rosto. A boca mostrava um batom vermelho que a deixava mais atraente com lábios bem delineados. Os olhos eram de um azul quase roxo e com o sol ela os fechava um pouco, lhe dando um ar sensual.
Nossa, ele sabia que tinha errado ao aceitar. Agora teria dias de sufoco pela frente. Ela sempre fora uma linda menina e agora era uma linda mulher.
Só que ele não queria e nem devia se deixar levar por mais um rostinho bonito. Já tinha feito isso e se dera mal.
Estava usando um conjuntinho de terno e calça claro com saltos altos finos. Delicado brincos nas orelhas e um relógio chique no pulso.
— Se eu pedir desculpas pelo passado, serve?
— Depende - ela empinou o nariz — Vai ser de verdade ou só porque precisa de ajuda?
— De verdade - ele sorriu com a mão no coração — E também porque preciso de ajuda.
— Ok. Pelo menos você é honesto.
Ele riu com a postura defensiva dela.
— Por acaso pretende brigar comigo durante o tempo em que estiver aqui? - cruzou os braços.
— Isso vai depender de você - deu de ombro — E não pense que vou ser uma secretária que ouve desaforos do chefe. Se gritar comigo, eu grito de volta.
— Certo - assentiu com a cabeça. ela como sempre continua com a mesma personalidade forte de quando pequena — Espero não perder a calma.
— Acho bom... Pra você - completou.
Ele a levou até o escritório e mostrou a mesa que seria dela por duas semanas. Natália sentou fazendo um som de acomodação, mostrando que não estava tão feliz em estar ali.
— Parece que está com raiva - ele notou.
—_ Um pouco, mas não é nada com você - o olhou fazendo careta — Por enquanto.
— Ah, obrigado - sorriu — Posso ajudar?
— Não sobre isso, mas obrigada.
— Bem, agradeço por você estar aqui, eu precisava mesmo de ajuda.
O que ele não precisava era de uma distração como ela seria com certeza. Natália estava tão bonita e tinha ficado com um jeito diferente de quando mais nova que ele sentiu de imediato seu corpo reagir quando tocou sua mão na portaria.
— Pelo menos você não me chamou de palito de picolé - ela riu — Isso já é um avanço - mexeu na bolsa.
De modo algum ele poderia chamá-la assim agora. Natália estava com o corpo perfeito, com curvas como ele gostava. Nada a ver com a menina magrela de antes que corria pelo condomínio com sua prima.
— Não, agora você é só Natália - sorriu.
— Ótimo, trégua então?
— Com certeza. Como está Célia?
— Bem. Você nunca mais apareceu por lá.
— Verdade - mexeu no cabelo castanho — Mas infelizmente, tive muita coisa que ocupou meu tempo e acabei negligenciando algumas pessoas em minha vida.
— Acontece - ela abriu a gaveta — Eu também ando sem tempo. Você deu sorte que minha tia armou uma cilada pra mim e me fez vir até aqui.
— Obrigado - disse irônico.
— Quer que eu minta? - inclinou a cabeça.
— Não. Prefiro assim.
— Você deveria aparecer por lá e falar com a manipuladora da minha tia - sorriu — Ela vai gostar muito de te ver de novo.
— Acho que vou fazer isso sim - riu também — A Célia pelo jeito continua a mesma.
— Ah, sim e com todo gás. Espertinha que só ela.
— Isso não muda, que bom.
— E seus tios? Eu nuca mais os vi desde que se mudaram. Ainda vejo a Marina de vez em quando, mas desde que ela foi estudar fora que a gente só se fala de vez em quando.
— Eles estão bem. Que tal se a gente fizer uma troca? Eu vou ver a Célia e você vem comigo ver meus tios, eles vão gostar muito de te rever.
— Fechado - sorriu e ajeitou o notebook — Esse aqui fica comigo?
— Sim, é provisório também para não misturar as coisas, mas o de mesa tem mais informações.
Parte 2...— Tudo bem, deixa comigo que me viro - fez uma cara engraçada — Acho que ainda me recordo.— Não tem tanto tempo assim que deixou de ser secretária.— Não muito, mas me envolvi mais com minhas coisas pessoais da confeitaria e raramente mexo em computadores agora.— E como vai a confeitaria?— De vento em popa - sorriu orgulhosa — Você nunca esteve lá também.— Eu nem sei onde fica.Na verdade ele sabia, só não tinha dado atenção porque estava concentrado em sua própria vida e no casamento que infelizmente acabou antes do que ele imaginava.Passou boa parte do tempo tentando organizar a vida após a separação e isso o tirou do ritmo com relação às pessoas. Apesar de não ter sofrido, ficou muito decepcionado com o final e isso o deixou devagar.— Então posso te levar lá depois.— Combinado.Não sabia se era o certo. Natália estava tão diferente que ele sentiu um formigamento gostoso nos dedos. Isso indicava problema. Para ele.Já bastava o erro do passado. Não deveria se senti
Parte 3...Só que se acabasse se envolvendo com Natália, depois teria a tia dela e sua família o enchendo se por acaso ela fizesse alguma reclamação ou comentário ruim sobre seu comportamento. Isso era complicado.Houve um breve silêncio em que os dois ficaram apenas se olhando e se admirando em seus pensamentos.— Bom - ele quebrou o silêncio — Acho que já podemos começar.— Por mim tudo bem - se ajeitou na cadeira e pegou os óculos de dentro da bolsa — Pode ver se encontra outra secretária enquanto estou aqui.— Com pressa, quatro olhos? - provocou.Ela o olhou séria e depois aos poucos deixou o riso sair. Mexeu na armação colorida.— Não comece uma batalha, você vai perder a guerra dessa vez. Estou avisando logo - ergueu a mão.— Veremos - piscou o olho e saiu.Não tinha ideia do que o fez mexer com ela assim de novo. Talvez o velho hábito tivesse retornado ao ver que agora usava óculos e veio a vontade súbita de brincar provocando-a.— Sério Júlio - ela disse antes dele fechar a p
Parte 1...Júlio se recostou na cadeira e ficou observando Natália logo em frente. Ela estava concentrada lendo algo no notebook e estava de cabeça baixa. Seu cabelo escuro caía por seu rosto e cobria seus olhos. Lindos por sinal e ele tinha notado demais isso desde que ela chegara no escritório.Nesse pouco tempo em que ela estava ali, ele se sentiu frustrado. Não sabia bem o motivo, mas achou que talvez ela fosse ser mais solta com ele. Para fazer piadinhas era com ela mesma, parecia querer lhe dar o troco pelo passado, mas até que ele gostava. Além disso nada. Não lhe dava bola.Era muito organizada e rapidinho ajeitou as pendências que Marcela havia deixado. Realmente cumpriu o que disse e só levou uma xícara de café para ele e nada mais. Na hora do almoço teve que sair porque ela disse que não iria comprar nada para ele e realmente não foi.Ela estava diferente da Natália de anos atrás. Ele jamais iria achar que ela era tão organizada e competente assim. O escritório voltou a f
Parte 2...— Essa Odete é mais uma namorada?— Não. Amiga de Simone - Mexeu a cabeça — A que ligou antes. Com certeza queria me convencer a sair com ela de novo. Ando um pouco distante.— Ixi - fez careta — Está se metendo com coisa ruim assim? Tem que alguém o animar a sair? Ficou velho? - gargalhou.— Não - ele coçou o queixo — Talvez, nem sei. É só um caso que começou devagar e acabou rápido - a encarou — Vem cá, você é sempre ousada assim com seus chefes?— Quando trabalhava como secretária não, mas com você é divertido. É bom dar o troco.De verdade era divertido essa interação com Natália e não tinha porquê se preocupar com o que Odete e Simone diriam dele. Não dava mesmo importância às suas opiniões.Simone serviu para distraí-lo um tempo, mas acabou e os amigos dela eram todos fúteis como ela e não acrescentavam nada a ele. Logo estaria esquecida.— E faz tempo que eu sou a chefe - piscou o olho.— Mas ainda se lembra como é um escritório.— Claro que me lembro e até que o seu
Parte 3...— Não tire proveito - levantou o dedo.— Qual sua onda com essa Simone?Ele a encarou um instante. Estava falando solto com ela como se fossem amigos. Eram conhecidos, mas não tinham uma amizade de verdade, era muito mais nova do que ele, mas ainda assim se soltava. E o interessante é que nem com sua ex ele se soltou rápido dessa forma.— Não foi nada demais - estava se explicando, coisa que não fazia — Foi algo para curtir, passar o tempo.— Ah, tá... E ela sabia disso?— Se não sabe é porque quer se enganar. Eu nunca fiz promessas - disse seco.— Mas às vezes tem gente que precisa de mais dicas sabia? - ergueu as sobrancelhas de modo cínico.Ele era um que precisava de dicas. Se tivesse sido mais atento não teria nem mesmo se casado. Só perdeu tempo e dinheiro. Lívia só aproveitou de sua posição e o fez de passatempo, mas cobrou caro.Agora o que ele menos queria era se envolver e acabar se apaixonando de novo. Por isso estava só de curtição com Simone.— Isso aí não é pr
Parte 1...Júlio encheu a boca com a carne acebolada e o macarrão. Fazia tempo que não comia comida chinesa e quando Natália pediu, ele não recusou.A comida estava ótima, mas ele estava gostando mais da companhia, o que era até algo inusitado. A garota que antes ele irritava para se divertir agora o deixava intranquilo, meio sem jeito e cheio de imaginação.Ele encarava sua boca enquanto ela falava sobre a doceria.— Tem um cliente que vai literalmente todos os dias e compra a mesma coisa - encheu a boca de macarrão e cenoura.— Vai ver ele só gosta desse doce.— Não, eu já dei outros de amostra ele gostou de todos, mas diz que esse é especial. A mulher dele está grávida e só quer comer essa torta.— Nossa, deve ser uma delícia então.— Passa lá e eu te dou uma fatia pra provar.— Gosta do que faz Natália? - bebeu um pouco de vinho.— Amo - sorriu orgulhosa — Foi a melhor coisa que fiz. Trocar de profissão.— Pelo menos você sabe que está ajudando a uma mulher grávida - brincou.— As
Parte 2...— Eu sei...— Então a gente se vê na segunda-feira.— Natália - falou mais firme — Espera.— O que? - se voltou para ele.— Vou precisar de você esse fim de semana.Ela sentiu a perna ficar bamba. Como assim? Ele precisava dela? Em que sentido? Meu Deus!— Preciso de uma secretária sem falta.“Ah tá, só isso”.— Minha folga é fim de semana - foi saindo.— Espera - levantou — Tenho duas reuniões e preciso demais de você... Como secretária.— Iihh... Não vai dar - acenou.— Por favor, eu te pago hora extra.Ela parou. O salário estava ótimo para duas semanas apenas. Aumentar isso seria bom.— Depende.— Do que? - ergueu uma sobrancelha.— Essa hora extra vai ser normal, boa ou ótima?— Olha só, querendo tirar proveito de mim?— Claro, ué - riu segurando a bolsa — Você tem grana e precisa, precisa, precisa de mim - fez um biquinho.— Peste! - segurou o riso — Isso não é certo.— É sim, você é advogado, sabe como funciona.— Certo, pago hora extra dupla. Tá bem assim?— Está ót
Parte 3...Ela cruzou os braços e o encarou cerrando os olhos. Sentiu o calor retornar.— Olha aqui Júlio, se vier com gracinhas pra cima de mim você vai levar. Já digo logo.— Que gracinhas? - segurou o riso.— Sei lá - bateu as mãos na lateral do corpo — Eu me lembro bem das palhaçadas que você aprontava comigo quando eu era mais nova.— E quem disse que eu vou aprontar?— Júlio, Júlio...Ele deu uma risada. Natália era muito mais interessante do que ele recordava. Deveria ter prestado mais atenção a ela desde sempre.— Acredite, será apenas trabalho. Não vou aprontar nada contra você. — Se tentar vai levar - apontou — Já aviso.— Ok - abanou a mão — Vai logo pegar essas reservas por favor. Aqui está o nosso horário - entregou um papel com as anotações.— Credo, parece um hieróglifo.— Minha letra é perfeita - reclamou.— É sim. Uma perfeita... - calou-se. Ia dizer uma bosta, mas ficaria feio — Já vou - saiu da sala.Ela ficou um instante com o telefone na mão. Não deveria, mas est