03

A semana passou de forma lenta. Edgar e Bernard estão de partida para a guerra, foram convocados novamente para as intensas batalhas no reino do Norte. Meus irmãos são soldados desde que se tornaram com idade suficiente, por este motivo, quase não ficam conosco, o que nos causa grande sofrimento, somos uma família bastante unida, e mesmo papai se mostrando firme, sei o quanto ele sofre em todas as vezes com a partida deles. Eduard é o único que largou a carreira militar, por se tratar do primogênito, tem responsabilidades para auxiliar papai com os negócios por aqui.

Sinto o abraço aconchegante de Edgar e na sequência um beijo no topo da minha cabeça. Ele tem um leve cheiro de tinta, certamente esteve pintando. Ele me contou que estava trabalhando em um quadro, eu sempre soube quando ele estava se entregando a sua grande paixão, as telas. Desejaria muito que meu irmão pudesse viver do realmente gosta.

— Na próxima vez serei eu quem a desafiarei, Lena!

Reviro os olhos fingindo que ele não está a minha altura.

— Estarei esperando ansiosa, irmãozinho!

Eduard, pigarreia numa sequência aleatória. E papai nos interrompe, alguma coisa me diz que meu irmão mais velho, sabe bem o que ele tem dizer.

— Infelizmente não será possível, Edgar. Acredito que o desafio entre Helena e Bernard tenha sido o último de sua irmã. Se eu não me apressar em casá-la, poderá ser ainda mais difícil. 

Todos os presentes encaram a papai surpresos, menos Eduard, pois, certamente ele já sabia desta decisão, e é notório que está de acordo em tudo quando afirma:

— Sinto muito, Lena, mas está claro que uma mulher que maneja espadas assusta seus pretendentes. 

Bernard pergunta me olhando de canto:

— Alexandre desistiu do noivado, meu pai? 

Meu irmão sabe o quanto me sinto desanimada com essa questão do casamento. É gentil que esteja me ajudando, então se torna inevitável que eu não me sinta esperançosa com a possibilidade de ter perdido mais um pretendente, quase não disfarço um sorriso que insiste em brotar em meus lábios. Entretanto papai é objetivo quando concluí:

— Não, felizmente não. Pelo ao contrário, Alexandre deseja se casar o mais breve possível. Mesmo com os imprevistos de ontem — papai pigarreia com o embaraço ao citar meu desmaio por causa do espartilho apertado. — o cavalheiro não desistiu. Entretanto, temo que a Sra. Rosene o faça desistir. Ela me fez... Digamos que algumas objeções. Tivemos uma longa conversa, e decidimos que Helena deverá ocupar o seu lugar, como uma verdadeira dama. 

— Papai... — me manifesto, mas ele ergue as mãos ordenando silêncio.

De todos os ensinamentos que a filha de um militar possa adquirir em sua vida um dos mais rígidos é o direito de se calar quando ordenado, então não abro a boca nem por mais um instante.

Edgar e Bernard me encaram com compaixão, certamente se compadecem do meu tormento.

As palavras de papai me perturbam, sinto um imenso vazio dentro de mim imaginando tal possibilidade, a de nunca mais treinar.

Ainda estou em transe quando Bernard se aproxima, ainda não havíamos nos despedido, meu irmão me abraça delicadamente com todo seu afeto, e agora depois da notícia de papai, a dor da despedida parece ainda maior dentro de mim. Bernard sempre foi meu porto seguro, o único que me compreende, até me ensinou boa parte do que sei. Meu irmão teve um treinamento impecável, e ao contrário de Edgar, Bernard ama o que faz, esperou ansiosamente que chegasse o seu tempo de se alistar no exército, se tornando um excelente combatente.

A voz doce do meu irmão soa em meus ouvidos em um sussurro:

— Tenho orgulho da guerreira que você se tornou, Lena. Mamãe  também teria. Apesar de que iria preferir lhe ver bordando que usando uma arco e flecha.— certamente tenta fazer com que eu me sinta melhor.

O encaro com um nó atravessado em minha garganta. Meu irmão beija o dorso de minhas mãos e se afasta devagar. Quando já está por detrás de papai o vejo movimentar os lábios de forma que não sai nenhum som, o interpreto de imediato:

"Você tem Um Coração Valente"

É inevitável não sorrir, entretanto, me vejo em num conflito interno, ser valente não é o suficiente para mudar meu destino.

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