Quando estou a caminho da entrada de nossa residência, logo no pátio principal sou recebida por vários olhares intrigantes, certamente os servos avisaram a papai que eu estava a caminho e com um desconhecido em meu cavalo. Papai, meus irmãos e o General Adrian saem a porta de entrada completamente aturdidos com o que veem. General Adrian levanta imediatamente sua espada a fim de me defender, ele é um grande amigo da família, me viu nascer e crescer é aceitável seu comportamento. Afinal além de eu estar carregando um homem, minha aparência também não é das melhores, meus cabelos estão despenteados, minhas roupas sujas de sangue. Uma cena bastante intrigante.
— Srta. Helena! Não se preocupe, não vamos permitir que esse homem lhe faça mal! — Adrian grita se colocando à frente desembainhando sua espada. Sinto vontade de rir, se a situação não fosse tão séria. — Não, este cavalheiro não vai me fazer nenhum mal. — Helena! — Papai grita meu nome desesperado com a situação e confuso. Desço do cavalo num salto, e todos estão extremamente desconfiados do meu acompanhante, na verdade principalmente Eduard que está estarrecido olhando para mim e para o capitão e se manifesta imediatamente: — O que você fez com ela seu maldito? — Meu irmão grita com a voz esganiçada. Por mais que Eduard seja bem exigente ao meu respeito, sei o quanto tem apreço por mim, ele me ama, não esperava menos dele. — Acalme-se, eu já disse, ele não me fez nenhum mal, fui eu quem o salvei! Falo estendo a mão ajudando o capítao a descer do cavalo. Ele ainda se esforça e finalmente consegue espaço para falar: — Sou Capitão James Winston, de Molavid. Então ao se apresentar, o clima muda consideravelmente. — Papai, este homem estava a frente da tropa de resgate de Bernard! — falo num tom bastante animado ainda o ajudando. Afinal fazia semanas que não tínhamos nenhuma notícia. — Ajudem-no ele está ferido! — eu ordeno, então Edgar e um servo se aproximam para o ajudar. O restante ainda parece desconfiado. Papai se aproxima me encarando com um semblante nada bom, suas sobrancelhas grossas e grisalhas estão levemente arqueadas. — Helena, você perdeu o juízo? Esse homem pode estar mentindo! — Não papai, eu tenho certeza de que o capitão diz a verdade. Eduard se manifesta novamente: — Helena, você não deveria estar com Lady Carllyne? — Foi tudo uma desculpa, eu precisei ir ao encontro do capitão James, havia o deixado na colcheia, no lado norte, eu o encontrei ontem, desacordado, ferido e febril na praia. Eduard respira fundo com indignação por minhas atitudes. — Mas você é muito ingênua, Helena, você tem noção do perigo que correu? James que está com seu corpo apoiado em um servo se ergue fazendo um nítido esforço para ficar de pé sozinho. — Me desculpe por me intrometer, mas sua irmã, a senhorita Helena, sabe se cuidar muito bem. Ela lutou bravamente contra dois homens do exército de Naor. E acabou com os dois, sozinha. Fico emudecida com o elogio do capitão James, talvez até um tanto rubra, acho até que ele esteja exagerando. — Helena! — Papai fala num tom aliviado por me ver bem ao imaginar o grande risco que corri. — Estou bem, papai. Agora escutem o capitão James, ele tem informações importantes sobre Bernard — grito em desespero. Papai e meus irmãos se entreolham com uma esperança crescente de boas notícias. De alguma forma sei que confiam em mim. — Levem-no o capitão, ordene que lhe providenciam alimento, banho e roupas limpas — papai ordena ao criado. — Sou Theodoro Lewis, Capitão — fala estendendo a mão a James. — Prazer General, fui encarregado pelo Marechal Hector Carvalhães. Noto nos olhos de meu pai o quanto está agradecido. Suspiro aliviada que tudo tenha terminado. Me sinto esperançosa que consigam encontrar a tripulação e assim teremos meu irmão de volta e o capitão James poderá voltar para sua cidade. Enquanto as servas me ajudam com o banho, elas não param de me fazer perguntas sobre minha aventura, não me surpreendo pois já estou acostumada com os mexericos entre a criadagem. Ainda estou na banheira e a Sra. Benect me auxilia com os cabelos, outra serva não para de sorrir ao falar sobre o capitão de Molavid, todas sempre se animam com os visitantes. Confesso que já vi uma delas aos amassos com Bernard no celeiro, foi a primeira vez que vi um homem e uma mulher completamente nus. Quando contei a Catherine ela me disse que era isso que os casais faziam quando se casavam, apesar de estranho, achei um tanto curioso. — A Senhorita perdeu o juízo. E se ele fosse um homem mau?— uma serva fala mesmo depois de tudo que relatei. — Eu adoraria me encontrar com um homem mau, feito ele, forte e bonito! — outra exclama e logo a Sra. Benect lhe dá um tapa nos braços enquanto ela esfrega minhas costas. Sorrio achando engraçado, embora não seja nada adequado. — Se comporte, Anabele — Sra. Benect a repreende. Conto detalhes sobre a luta com os dois homens e logo estão todas atentas sobre minha aventura. Após meu banho me deito para descansar, o capitão está em repouso e não desce para o jantar. Edgar foi junto de Adrian a cidade levar as informações aos superiores. Ele ficou bastante animado depois que soube notícias do nosso irmão. Quando retorno do jantar seguindo para meus aposentos sigo pelo corredor principal da casa, próximo do meu quarto vejo um servo sair com uma bandeja do quarto em que o capitão está hospedado, noto que a porta está entreaberta e consigo avistar a figura masculina deitada confortavelmente em uma cama grande. Me sinto inquieta e desejo muito saber como ele está, me aproximo, dou leves batidas, e aguardo mais ansiosa do que deveria. Talvez porque sei o quanto não é nada adequado entrar no quarto de um cavalheiro desacompanhada. Certamente acreditando se tratar de algum criado, a voz do capitão soa autorizando a entrada. — Entre. Abro a porta lentamente, o capitão não me olha no primeiro momento, mas logo se vira para mim, vejo que ele me analisa da cabeça aos pés, fico tímida com sua análise e olho para o chão disfarçando minha inquietação, então noto em seu tom de voz que ele está surpreso em me ver. — Srta. Helena...? — Oi. Queria saber como o senhor está — pergunto timidamente. Mesmo tentando não encará-lo, é quase impossível, e consigo percebe como ele parece outro homem depois dos cuidados, sua pele morena está limpa o deixando num tom mais bronzeado, diferente dos homens daqui, tão brancos e pálidos. Sua barba foi aparada e ele está com o maxilar completamente liso, destacando a boca de lábios grossos e vermelhos. Usa uma espécie de bata de linho em mangas longas, com amarrações no peito que o deixam bem vestido. — Estou, bem. Muito bem, senhorita. Graças aos cuidados tão gentis de sua família. Tento desviar o olhar novamente, ver ele assim, bem e tão apresentável faz com que minhas pernas paralisem, não consigo se quer sair do lugar feito uma tola. Finalmente falo com minha voz absurdamente trêmula: — Fi-co fe-liz. Então, de repente nossos olhos se encontram, e ficam fixos um no outro por tempo demais, um momento curto mas que pareceu uma eternidade, vejo um brilho em suas íris levemente verdes. Há um silêncio torturante e quando penso que ele irá se recompor o capitão sorri, seus dentes brancos e perfeitos causam em mim um tremor. A forma que ele me analisa também me deixa perturbada, talvez ele apenas esteja grato eu por tê-lo salvado. Ouço um pigarro, então me viro e vejo Edgar parado a porta nos observando, noto que fui pega, meu rosto queima como se tivesse feito algo muito errado, entretanto, ao menos consigo voltar a me mover. Sinto alívio enorme me invadir por ser Edgar, se fosse papai ou Eduard eu estaria encrencada. Mas como se meus temores se tornassem reais, de repente a voz de Eduard também invade o quarto, fico mais tensa. — Helena, o que você faz aqui? Antes que eu diga qualquer palavra, Edgar me ajuda. — Lena, está comigo. Estávamos indo... — ele se perde. — ... Edgar estava me conduzindo aos meus aposentos — eu lhe ajudo. Edgar completa: — Sim, isto. E no caminho decidi ver como o capitão James estava. Eduard se convence facilmente e eu respiro aliviada. Olho de canto para Edgar, agradecida. Eduard entra no quarto e se aproxima da cama do capitão passando por mim. — E como você está meu caro amigo, capitão James? O capitão nos encara constrangido em meio a situação, como se também sentisse que estivesse feito algo muito errado, porém, apoia a mentira. — Estou muito bem... Estava dizendo isso aos dois... que estou me sentindo bem melhor. Edgar entrelaça seus braços nos meus me convidando para nos retirarmos. — Então... Vamos, Helena? Faço uma mesura cordial a todos e saio com meu irmão me esforçando para tirar os olhos do nosso hóspede na cama, logo estamos ao lado de fora, entretanto meu coração ainda insiste em me desobedecer quando me esforço para aquietá-lo.Depois da minha ida ao quarto do capitão na noite de ontem, não o vi mais. Há uma grande correria pela casa devido ao jantar que papai está organizando para Alexandre e todos os Trover. Infelizmente não tenho mais como fugir desse compromisso.Sra. Benect e as outras servas terminam meu penteado, confesso que está deslumbrante. Fizeram uma trança e a rodearam como se fosse uma tiara deixando o restante solto, e colocaram flores em tons azuis e brancas como meu vestido. Desta vez Catherine surge na porta, para certificar que não irão apertar exageradamente o espartilho novamente, ela havia prometido a papai que ajudaria com isso. As meninas terminam de fechar o vestido de mangas levemente bufantes nos ombros e o restante longas. Minha cunhada aprova o que vê e sorri ao me entregar as jóias para usá-las.Quando chego ao alto da escada, tudo se repete como no último jantar, lá embaixo, todos os olhares se voltam para mim. Papai vem ao meu encontro e faz uma mesura, na sequência beija o
Enquanto o capitão James me leva para fora, observo o quanto estamos ainda próximos, é estranho, o carinho que há entre nós, é como se o capitão pertencesse a minha família, e mesmo sabendo que não é nada certo estar assim com ele, de alguma forma o capitão consegue me acalentar.Quando chegamos a entrada da casa, percebo que aquelas pessoas ainda estão lá, só então me recordo que fazem parte do grupo do capitão James. Quando o veem, eles se aproximam animados.O capitão James fala se direcionado a mim:— Gostaria que conhecesse meus soldados — fala com certa alegria, e compreendo, pois seu pessoal está vivo, e ainda trouxeram o corpo de Bernard de volta.Fungo e seco o rosto.— Sim, eu adoraria.Dois deles vem a frente, um loiro de cabelos longos e alto, e um mais baixo de cabelos cacheados também claros, parece ter minha idade.Todos fazem uma continência militar para o Capitão.— Capitão James! — o loiro e alto se manifesta — fizemos o que conseguimos, mas infelizmente, o soldado
— Capitão James?Mas que diabos ele tinha que vir até mim?Quando Eros já está quase parado, o capitão se aproxima me alcançando, temendo meus próprios sentimentos, evito encará-lo. Desço do meu cavalo e o deixo bem ali, seguindo para próximo da mata indo em direção a cachoeira e ouvindo o som da água se quebrando veementemente contra as rochas.— Srta. Helena! — ele me chama novamente.O ignoro adentrando a mata seguindo uma familiar trilha. Ele segue-me.— Vá embora! — Ordeno.Passo por debaixo de um galho baixo e logo estou na entrada da queda d'água, no mesmo lugar onde estávamos treinando com o arco dias antes.Quando noto que ele ainda está atrás de mim, suspiro aborrecida.Dou alguns passos para trás, mas estou perto demais da cachoeira, então paro. Minha respiração está rápida, e na medida que ele chega perto, meu coração quase para.— Está tudo bem com a Senhorita? Vi você sair apressada, fiquei preocupado.— O senhor não devia ter vindo — falo quase em lágrimas.— Me perdoe,
Todos os acontecimentos até aqui, narrados pela versão do James.James WinstonDepois que cai ao mar precisei nadar por longas horas, apesar da dor física causada pelo ferimento de espada consegui finalmente chegar a orla da praia, mas confesso que todo meu esforço físico me deixou exausto e acabei perdendo os sentidos, já era dia quando tive alguns relances em minha mente, vi a imagem de um anjo bem diante dos meus olhos, eu nunca tinha visto um ser celestial antes, talvez seja um sinal de que esteja morrendo. Não consigo me mover, estou fraco e tudo dói. Entretanto a paz que sinto ao lado deste ser é incrivelmente tranquilizadora. Apago novamente guardando os traços femininos e perfeitos em minha memória, se estou morrendo é uma imagem perfeita pra se guardar.Acordo sentindo um conforto, o ambiente está aquecido, abro os olhos devagar e vejo que estou deitado em uma espécie de colcheia abandonada. A luz de uma fogueira ilumina o ambiente. Levo a mão ao meu ferimento e noto um tecid
Helena Lewis — General Theodoro e toda sua família, quero agradecê-los, pela hospedagem — ouço o capitão James falar a papai à mesa durante o jantar.Depois do acontecido na cachoeira ele tem me desprezado completamente, não me olha, nem se quer fala comigo. Talvez seja melhor assim, isto só prova que realmente o nosso beijo não significou nada para ele.— Somos nós quem agradecemos, Capitão James, afinal você e seu grupo me permitiram enterrar meu filho — papai fala com emoção em sua voz.Minha família está toda à mesa, além dos soldados do capitão. É impossível não ficarmos entristecidos quando falamos de Bernard.O capitão James continua:— A guerra não acabou. Ainda teremos um confronto com os Trontianos. Quando chegarmos em Molavid, eu garanto que organizarei uma tropa e invadiremos Tronte, prometo vingar a morte de seu filho, General. Será com minhas próprias mãos que enfiarei uma espada no peito do general Arthur Saint, foi ele quem lançou a espada sobre Bernard. Com a espada
Depois de lavar o rosto várias vezes na tentativa fracassada de me livrar do contato do capitão James, ainda sinto seu cheiro cravado em minha pele, algo semelhante a almíscar, o que demonstra o quanto errado isso é, ao mesmo tempo inebriante, envolvente e enlouquecedor. Me visto preparando-me para dormir urgentemente, desejando me aquietar em repouso. Entretanto, é completamente inútil, estou aturdida demais e o sono desaparece, além do mais, a ideia de fugir e tentar embarcar escondido está fervilhando em minha mente, sei que parece algo insano, porém, não tenho outras alternativas, esta é minha única chance.São tantas emoções com tudo o que está acontecendo em minha vida que fico completamente perturbada. Me levanto da cama jogando os lençóis para o canto e caminho pelo quarto de um lado para o outro refletindo sobre o fato de uma possível fuga, analiso todas as possibilidades de sucesso e fracasso, caso eu seja descoberta acabarei tendo que passar muito tempo ao lado do capitão J
Não é nada fácil viajar com tão pouco espaço, ainda mais tendo seu corpo espremido e sacolejado por várias vezes. Uma fresta no baú, me ajuda a respirar, mesmo assim, me sinto com um enorme mal estar por várias vezes, além da angústia que carrego no peito por estar deixando minha vida para trás.Após algumas horas, paramos a viagem, acredito que chegamos à marina, noto por causa do cheiro de peixe e tabaco. Não consigo ouvir o que se passa ao lado de fora, são muitos sons ao mesmo tempo, mas acredito que estão fazendo o carregamento para o navio. Me ajeito um pouco mais, pelo menos consigo esticar as pernas, para acabar com o formigamento. Minhas costas também doem, mas sei que preciso me esforçar ao máximo, afinal suportei algumas horas, posso aguentar mais, quando tiver toda certeza de que já estamos em alto mar, e o compartimento de carga do navio estiver vazio, talvez eu saia. Provavelmente pelo excesso de calor e pouco oxigênio minha pressão cai e acabo cochilando, não sei ao ce
Helena Os olhares sobre mim são muitos na sala do convés para onde o capitão James me trouxe, há curiosos espiando pelas escotilhas, acham engraçado ver a filha do General viajando escondido e usando apenas trajes debaixo, confesso que estou morta de vergonha pelos meus modos, não é nada decoroso que tantos homens me vejam assim. Porém tenho assuntos mais importantes nesse momento. A Senhorita Harley me analisa, parece um tanto insatisfeita com minha presença, sua expressão é dura e pesada sobre mim, provavelmente por eu ter atrapalhado seu momento íntimo com o capitão. E quanto ao mesmo, capitão James? Ah, esse parece mais ter visto o diabo.— Você perdeu o juízo, Senhorita Helena? — ele grita enfurecido. — embarcar em um navio escondido, e sem estar vestida adequadamente, sua família deve estar em desespero!Ele fala caminhando por todo lado.Magnus e Melin também estão presentes, ficam parados analisando a situação pensativos. Melin é o único que parece contente com a minha presen