TANK: Aos pés da Flor sem dono
TANK: Aos pés da Flor sem dono
Por: Catherine Hécate
O primeiro olhar

Um raio de sol entrava por uma pequena fresta aberta da janela, a casa de madeira era escura e o cheiro estranho, mas o brilho que entrava potente a encantou. Partículas de poeira dançavam na luz enquanto o corpo de Dállia se movia com o impulso do corpo velho sobre o dela.

Os sons eram estranhos, bizarros, mas ela se focou na luz, no tímido raio solar e na poeira dançante. Já estava acostumada com a dor, a maioria das vezes nem incomodava mais.

Foi virada de bruços sobre a mesa, a toalha branca ficou enrolada sob o seu corpo, os movimentos continuaram, firmes, violentos e acompanhados daqueles ruídos animalescos.

E foi exatamente nesse minuto que tudo mudou.

Quando Dállia foi virada sobre a mesa ela lamentou que não pudesse mais olhar para a luz e foi na escuridão que seus olhos cruzaram com os de Tank pela primeira vez.

Ele estava ali, parado, olhando para ela como se visse um animal ser abatido. Uma mistura de desprezo e pena que a fez fechar os olhos, segurou mais firme na borda da mesa o coração acelerou, não por estar ali, aprisionada a um mundo que ela desconhecia, mas pelo que sentiu com a força daqueles olhos.

A camisa aberta, uma tatuagem que ela não conseguiu identificar e uma cicatriz que o deixava ainda mais bonito.

Abriu os olhos quando o grunhido mais forte soou atrás dela e o peso se afastou.

Mas Tank, também já não estava lá.

— Guarda as suas coisas e prepara o almoço.

Russo ordenou antes que ela conseguisse apoiar o peso do corpo nos próprios braços. Desceu da mesa, retirou a toalha que havia ficado amassada e molhada com os líquidos que saíram dele, levou o tecido até a lavanderia enquanto arrumava a própria roupa no corpo.

Estava casada há três horas e uma missão, descobrir onde ficavam as panelas, preparar o almoço perfeito. O marido voltaria com fome e ela conhecia o preço da desobediência.

Tinha acabado de ser vendida pelo primeiro marido.

Deu risada de si mesma, já estava no segundo casamento.

— Devo ser uma péssima esposa.

Pensou ironizando a situação, ainda era muito jovem quando foi vendida para o seu pior pesadelo, mas depois dele, vieram outros até que por fim, terminou como objeto de uso particular.

Ela gostava disso, ser um objeto de uso particular é muito melhor do que ser oferecida ao coletivo. E isso Dállia podia garantir.

Abaixou-se para procurar panelas e sentiu o líquido viscoso escorrer. Aquela era sempre a pior parte. Detestava a sensação.

Respirou fundo tentando ignorar as reclamações do próprio corpo e de repente foi chutada para o meio da sala.

O impacto da sola do pé de Russo em seu braço a fez gritar, mas quando caiu chorando e ergueu os olhos, Tank estava lá outra vez.

Os olhos sem nenhum sentimento, a camisa de botões agora estava fechada e ao seu lado uma menina linda com os cabelos sedosos e um vestido rosado que a fazia parecer saída de um conto de fadas. Imaginou que aquela fosse Amara e o homem ao seu lado devia ser Theodoro.

Russo falou dos filhos quando ainda estavam no carro, ela se lembrava dos nomes, mas talvez por não conseguir pensar direito achou que ainda fossem crianças.

— Vai cuidar dos meus filhos, o Theodoro é um garoto difícil, ninguém entra no quarto dele. Pega as roupas do cesto e deixa em cima da mesa que ele se vira. A minha Amara estuda o dia inteiro, então precisa de tudo arrumado para quando ela chegar.

Dállia havia apenas balançado a cabeça concordando com as ordens, não existia espaço para discordar, na verdade estava confirmando que tinha entendido.

Mas enquanto o marido a erguia do chão pelo braço, tudo o que ela conseguia ver era o quanto os irmãos eram bonitos.

— Essa é a nova mãe de vocês!

Olhou para Tank, como se o fato de ele não ser uma criança desse a ela alguma esperança. Não queria fugir, nem ser mandada embora, já havia entendido que em nenhum lugar o destino seria melhor com ela.

Algumas pessoas não têm direitos, não são humanas o bastante para isso, ainda assim, pensou que talvez Tank dissesse ao pai que não aceitaria que Russo a tratasse daquela forma, ou apenas que exigisse que ele a levasse para o quarto.

Não aconteceu, Tank virou as costas para o pai e para ela sem responder uma única palavra, o braço em torno das costas da irmã, a camisa com a manga levemente erguida permitiu que ela pudesse ler a frase que estava ali.

O inferno me aguarda, você me mantém Amara

Naquele momento ela não entendeu o que Tank queria dizer com aquilo, mas cada gesto dele deixava claro que o amor que sentia pela irmã era maior do que o que tinha por si mesmo. E isso, não precisava estar escrito na pele dele, seria óbvio para qualquer pessoa.

Sentiu inveja de Amara, a menina tinha algo que ela jamais teria. Uma família.

Enquanto Tank seria capaz de morrer pela irmã, Dállia nunca teve ninguém que quisesse viver por ela.

Ainda se lembrava de como se tornou o que era, do dia em que perdeu a sua humanidade.

Perdeu não! O dia em que a sua humanidade foi vendida.

A tia disse que um moço a levaria para passear e que ela deveria ser educada e obediente. Para uma criança de dez anos que nunca tinha sido levada para passear. Aquilo parecia um sonho! E por algumas horas, Dállia se divertiu, andou de mãos dadas com aquele senhor no shopping, agradeceu pelas roupas que ele comprou.

Tomaram sorvete e ele a deixou brincar no parquinho do shopping.

Foi a primeira vez! As luzes eram tão bonitas, as músicas, amou a piscina de bolinhas.

Aquela foi a primeira vez que se divertiu, e a primeira que um homem se divertiu com ela

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