Chamou, mas quando Olívia a olhou, um mundo de memórias invadiu sua mente. Pedir ajuda? Que ingenuidade! Pedir ajuda é o meio mais rápido para piorar o próprio sofrimento, já havia experimentado isso, conhecia as regras do mundo, para Dállia, só havia dois tipos de pessoas do mundo, as que se divertiam com o sofrimento alheio e, as que, além de assistir, gostavam de tirar proveito da fraqueza. Não podia expor Tank ainda mais. Tentou correr, fugir, mas a sandália que estava usando estourou o fecho no segundo passo. A dor do tornozelo torcendo se espalhou pela perna em uma onda de choque a fez gemer. Segurou a perna, tentou se levantar, mas já era tarde. Olívia estava ali. — Você está bem?— Estou, tudo bem, desculpa eu confundi você com outra pessoa.Os olhos vermelhos a entregaram muito antes de tentar se justificar. O medo a consumia, não podia confiar. E se isso ao invés de ajudar, terminasse de condenar a única pessoa no mundo que nunca a feriu?Se descobrissem, se soubessem q
Dállia sentia como se o olhar de Olívia tentasse decifrar seus pensamentos, desmascarar seus verdadeiros motivos. Mas Olívia não podia entender. Ninguém podia. Ela tinha apenas uma certeza, salvar Tank. A qualquer custo e como alguém poderia compreender aquilo?Foi então que Olívia disse algo que fez Dállia ter ainda mais certeza de que não estava sendo compreendida. — Você acha que ele te enxerga e que, mesmo sendo a pior coisa do mundo, ainda é o melhor que você merece.Olívia tinha certeza de que o desespero de Dállia não era o desespero de uma madrasta, imaginou que Tank também a forçava, talvez pai e filho dividissem a mulher, estava tão acostumada com a perversidade humana que pensou que o olhar triste de Dállia fosse resultado disso, de quem aceita o pior dos destinos e ainda é grata por ele. Já Dállia ouviu achando que Olívia era extremamente alienada, Tank nunca foi a pior coisa. Ele era sua salvação, sua luz em meio à escuridão. Como era possível que aquelas pessoas conv
Dállia sabia o que estava fazendo, perguntou arrumando a postura, cruzou a perna direita sobre a outra fazendo a saia justa subir ainda mais. Tinha aprendido com o primeiro dono. Muitas vezes foi obrigada a ser enfeite de mesa. Era assim que ele a chamava. O dono dela, também era o dono do morro e costumava fazer noites de jogatina na laje do sobrado em que morava. Os convidados eram os chefões do tráfico, os cabeças que comandavam a área, acompanhados de seus seguranças armados, esses eram conhecidos como frentes. Além deles, circulavam os vapor, os responsáveis por vender a mercadoria na ponta, e os fogueteiros, sempre atentos para avisar sobre a chegada da polícia. O ambiente era regado a ostentação, bebidas caras e olhares afiados, onde cada palavra dita poderia custar caro.Ela? Dállia era o enfeite de mesa. Estava ali para enfeitar e qualquer um podia colocar a mão. Era isso que o primeiro marido dizia. — Podem pegar, usar à vontade, até tirar pedaço, mas sem levar para casa
O rapaz normalmente fazia tudo antes do pai chegar e se trancava no quarto com a irmã, mas naquele dia, ele havia se atrasado, esqueceu da hora jogando futebol com os outros rapazes do condomínio e acabou precisando lavar os vestidos de Amara durante a noite.Russo chegou e não gostou de ver o filho ali, fazendo uma tarefa que ele julgava ser exclusivamente feminina. Agarrou Tank pela camiseta e puxou com força, a gola marcou o pescoço do rapaz, o tecido rasgou, já era velho, ganhada de um dos colegas.Mas quando se levantou Russo o acertou com um soco o garoto caiu e bateu a cabeça na quina de uma espécie de balcão que havia na cozinha para guardar louças. A pancada foi tão forte que a dor se espalhou, ficou um tempo perdido entre a consciência do sangue quente que escorria entre seus dedos e a escuridão que tentava tomá-lo. Foi o grito de Amara que o despertou, o choro infantil e indefeso que chamava seu nome.— DODÔ! DODÔ!Era assim que Amara o chamava, nem se lembrava do porque, j
Um raio de sol entrava por uma pequena fresta aberta da janela, a casa de madeira era escura e o cheiro estranho, mas o brilho que entrava potente a encantou. Partículas de poeira dançavam na luz enquanto o corpo de Dállia se movia com o impulso do corpo velho sobre o dela.Os sons eram estranhos, bizarros, mas ela se focou na luz, no tímido raio solar e na poeira dançante. Já estava acostumada com a dor, a maioria das vezes nem incomodava mais.Foi virada de bruços sobre a mesa, a toalha branca ficou enrolada sob o seu corpo, os movimentos continuaram, firmes, violentos e acompanhados daqueles ruídos animalescos.E foi exatamente nesse minuto que tudo mudou.Quando Dállia foi virada sobre a mesa ela lamentou que não pudesse mais olhar para a luz e foi na escuridão que seus olhos cruzaram com os de Tank pela primeira vez.Ele estava ali, parado, olhando para ela como se visse um animal ser abatido. Uma mistura de desprezo e pena que a fez fechar os olhos, segurou mais firme na borda d
Ele era diferente, não se parecia em nada com os homens da comunidade em que Dállia vivia antes de ser vendida ao marido. Tank parecia rústico e ao mesmo tempo os olhos traziam uma força diferente, dilacerante, algo que a atraia.Mas os dias passaram e ele nem sequer a olhou, nem mesmo uma única vez. Tank passava por ela como se ninguém existisse, somente ele e Amara.De certa forma, havia beleza naquele desprezo, era como se Tank e a irmã pudessem viver em um mundo próprio, algo só deles, onde as risadas e as músicas se espalhavam pela casa de um jeito que Dállia achava lindo.Em uma manhã, depois que o marido saiu para o trabalho, ela se aproximou devagar do quarto de Amara, a música estava alta e os irmãos conversavam animados enquanto comiam algo que Tank havia comprado.Eles não comiam nada que ela cozinhasse, não importava o quanto Dállia se esforçasse para agradar, Tank sempre passava em algum lugar e trazia marmitas que dividia com a irmã. Se esforçou para ouvir o que falavam.
Tank voltou para casa após o treino ser cancelado, detestava todas as vezes que isso acontecia, mas Dylan não era um soldado comum, tinha manias estranhas, não avisava quando faltaria e vivia correndo atrás da mulher como um cachorrinho abandonado.Ninguém achava Zoey bonita o bastante para receber tanta atenção, mas jamais alguém ousou falar isso, ao menos não para o chefe de treinamento. Seria como pedir para passar uma longa temporada no centro médico e talvez, nem voltar.Abriu a porta com um humor péssimo, odiava aquela casa e tudo o que ligava ao pai. Russo nunca foi um pai amoroso, mas as coisas tinham piorado muito desde que a mãe de Tank faleceu.Respirou fundo e entrou, teria ido direto para o quarto se a música que vinha do quarto da irmã não tivesse chamado a sua atenção.— Amara, droga! Faltou à aulaReclamou apenas em pensamento, não quis chamar atenção da irmã, achou que a pegaria em flagrante. Precisava que ao menos Amara tivesse um futuro, que alguém daquela família f
Um amor impossível, os dois sabiam, não podiam continuar. Russo era um homem da máfia, um homem marcado por dores que o transformaram, temido pela sua capacidade de matar sem sentir, odiado por todos, até mesmo pelos filhos.Ela tentou falar, mas ele a segurou mais forte, mais perto, subiu a mão pelas costas de Dállia, ela tremeu.Tremeu porque nunca havia sentido nada parecido, nem mesmo teve chance de conhecer o amor.Antes aprendeu sobre dor, crueldade, submissão.Mulheres como ela não podiam amar, como aprender sobre algo que nunca viu?O rapaz deslizou a mão, que antes segurava o rosto dela, gostou da textura da pele.Uma mulher podia ser tão suave?Aproveitou com carícias lentas. Cuidadoso, quase como se tivesse medo de machucá-la.Os olhos acompanharam a mão, deslizou o polegar pelo pescoço delicado, desenhou os ossos da clavícula exposta pelo vestido. Aquela visão parecia incendiar sua alma.Segurou a coxa da menina e ergueu a perna de Dállia a fazendo enlaçar sua cintura. Pre