Depois de terminar de falar, lembrei daquilo que queria perguntar para ele desde ontem:— Ontem, aqueles caras não voltaram a te incomodar, né?Ao dizer isso, olhei automaticamente para as mãos e o rosto dele, aliviada ao ver que não havia machucados.— Não. — George pareceu perceber minha preocupação. — Mesmo que tivessem voltado, eles não são páreo pra mim.Tomei o último gole do caldo verde e perguntei:— E o acidente de carro do seu pai, você descobriu alguma coisa? Encontrou alguém envolvido a ponto de quererem te ameaçar assim?George me encarou e respondeu:— Eles têm medo de que eu descubra a verdade sobre a morte do chefe do meu pai.Ele falava em partes, me obrigando a continuar perguntando:— O chefe do seu pai era algum figurão? A morte dele impactou os interesses de alguém?— Ele morreu há mais de dez anos, então hoje já não existe nenhum interesse direto. Eles têm medo de que o filho do chefe ainda guarde rancor. — A resposta de George fez um aperto surgir em minha gargan
Isso era doença grave de quem falava antes de pensar. Assim que as palavras saíram, percebi o quanto foram inadequadas e fiquei pensando em como contornar a situação. Para minha surpresa, George respondeu simplesmente:— Claro.Ele concordou? Não fez nenhuma cerimônia? Nem uma tentativa de recusar para manter a pose de machão?Mesmo que ele não rejeitasse a ideia de se “entregar” como garantia, pelo menos recusaria o empréstimo, certo? Mas dessa vez, George não fez isso.Pelo visto, ele precisava mesmo do dinheiro. E queria realmente ajudar a irmã. Esse pensamento me fez sentir uma pontada de compaixão por ele, um homem tão forte e orgulhoso.Essa sensação me pegou desprevenida, e logo tentei disfarçar com uma tosse leve.— Sua irmã já foi a um médico? Se tiver os exames, me mande uma cópia. Talvez eu possa encontrar alguém para ajudar a analisar o caso.— Pode deixar. — Ele concordou, sem hesitar.Sem mais o que dizer, me levantei.— Obrigada por hoje. Eu vou indo.Ele me encarou.—
Ainda estava escuro quando acordei de novo. Tomei um banho rápido e vi a mensagem do George, me lembrando de pegar o café da manhã na porta. Ele não perguntou por que eu não comi o café que ele havia preparado antes e, mesmo assim, continuava a fazer isso para mim. Para não desprezar sua gentileza, comi o café da manhã e fui para a empresa.Cheguei cedo, antes de todos. Aproveitei para organizar o plano do dia e revisar o desempenho recente de cada um da equipe. Quando terminei, ainda faltava um tempo para o expediente começar.Decidi então pegar o celular e dar uma olhada no Instagram. Embora fosse uma maneira de matar o tempo, eu só seguia poucos amigos, e vendo as atualizações deles, podia saber como estavam, mesmo sem ligar ou falar diretamente.Pedro postou uma foto anunciando que participaria de um campeonato de sinuca. Já a Luana, que trabalhava como obstetra, postou uma imagem do bebê que acabara de ajudar a trazer ao mundo. Ela registrava cada nascimento que conduzia, e hoje
Assim que enviei a mensagem, o telefone de Pedro tocou quase instantaneamente.— O que foi? Está tentando te seduzir? — Pedro era direto, como sempre.Eu ri imediatamente. — Eu até queria que ele tentasse, mas nunca nem vi a cara dele, como é que ele ia fazer isso?— Nunca viu a cara dele? Então você me pediu para investigar só por curiosidade? — Pedro parecia surpreso. — Você acha que eu não tenho nada melhor pra fazer?Ele tinha acabado de postar que ia participar de um campeonato de sinuca; devia estar cheio de coisas pra resolver. Percebi que talvez tivesse sido um pouco impulsiva. — Olha, se você estiver ocupado, esquece. Era só curiosidade, não é nada urgente.— Ah, tá me provocando, é? — Pedro fingiu irritação.Ri de novo. — Não, sério, é só curiosidade. Se puder, ótimo; se não der, sem problemas.— Claro que eu posso. Pra todo mundo eu não tenho tempo, mas pra você, sempre. Vou ver isso pra você. — Pedro concordou.Mas ele não desligou logo em seguida. Eu sabia que ele queri
Onde mais eu poderia buscar as lembranças deles?— Carolina. — Na entrada do corredor, alguém me chamou.Era a dona do apartamento da frente. Ela certamente veio por causa da notícia da demolição.— Carolina, vão demolir aqui. Que pena, né? — A dona soltou um suspiro raro de melancolia.Eu não sabia o que dizer, apenas fiquei ali com uma expressão entristecida. Ela continuou:— Acabei de gastar um dinheirão para reformar o imóvel. Mal aluguei faz um mês, e agora já tenho que pedir pro inquilino sair. Que prejuízo!— Carolina, tentei ligar para o rapaz que alugou o apartamento, mas ele não atendeu. Se você encontrá-lo hoje, peça pra ele me retornar e avise que vai ter que se preparar para a mudança. É melhor ele já ir ajeitando as coisas. — Ela me pediu com uma pontinha de preocupação.— Pode deixar. — Respondi.— Muito obrigada, Carolina. — A dona foi bem educada, mas logo começou a fofocar. — Você já conheceu o rapaz que aluga meu apartamento, né? Ele é um gato, né?Eu ri de leve e di
Grupo Furtado, Felipe Furtado.Fosse o nome da empresa ou a assinatura com aquele ar inconfundível de Felipe, eu os conhecia bem demais. Afinal, esse grupo era o maior parceiro de negócios do Grupo Martins, e a amizade entre João e Felipe era de longa data.Mas por que meu pai teria um contrato com o Grupo Furtado de dez anos atrás? Pelo que eu sabia, naquela época ele não trabalhava para o Grupo Martins. Então, o que ele fazia com esse contrato?Olhei novamente o documento. Tratava-se de um acordo para desenvolvimento de energia renovável, algo que agora já estava sob o Grupo Martins, uma operação madura e lucrativa. Tecnicamente, o contrato deveria ser parte do Grupo Martins, mas o estranho era que não havia assinatura de João ali.Coloquei o contrato de lado e abri o caderno de anotações do meu pai. Era um diário de trabalho, com planos e alguns símbolos químicos que eu não conseguia entender. Fui folheando até a última página, onde li cinco palavras: [Que o acordo seja próspero.] E
Mas eu precisava entender a morte do meu pai.Depois de pensar bastante, decidi procurar Miguel. Só precisava de um bom motivo para isso.Enquanto ponderava, recebi uma ligação de Cátia. Ela já começou o telefone furiosa:— Esse moleque do Sebastião está tentando matar a mim e ao seu tio de raiva! Se ele realmente se envolver com aquela mulher, juro que nós dois morremos de desgosto.Não fiquei surpresa com a reação dela, então tentei acalmá-la:— Tia, não fiquem tão nervosos. Em questões de casamento, nem sempre os pais têm a última palavra.— Não temos mesmo, senão ele não teria chegado tão longe com você. Mas se ele acha que vai colocar uma viúva dentro da nossa casa, ele está sonhando! — Afirmou Cátia com convicção.No fundo, eu estava cheia de amargura e também não sabia como consolá-la. Na verdade, nem queria. Sebastião e Lídia me traíram, por que eu deveria defendê-los? Não era santa para sair perdoando assim.Eu já estava sendo até boazinha demais em não esfregar a verdade na c
— Tio... — Minha voz saiu trêmula, quase num sussurro, de tão surpresa que eu estava.— Carol. — João se esforçou para sorrir ao me chamar.— Seu cabelo... — Estendi a mão, querendo tocar seus cabelos.Ele parou por um instante, sem entender. — O que tem meu cabelo? Tá bagunçado?Naquele momento, as lágrimas simplesmente começaram a cair dos meus olhos.Ao me ver chorar, ele ficou ainda mais surpreso. — O que foi? Por que tá chorando? Foi sua tia que disse alguma coisa? Não liga pra ela, você sabe como ela adora falar besteira.João ainda não parecia ter notado que seu cabelo estava praticamente todo branco. Há poucos dias eu o tinha visto, e ele ainda estava com os cabelos negros. Agora, embora não fosse completamente branco, uns oitenta por cento dos fios tinham perdido a cor. Era como se ele tivesse envelhecido anos em uma única noite.Fiquei sem palavras, especialmente porque ele ainda nem tinha percebido.Aproximei-me e o abracei, enquanto as lágrimas desciam em silêncio pelo me