Esther, mesmo sem querer, percebeu algo diferente no tom de Marcelo. Aquela frase que ele havia dito de forma aparentemente casual trazia consigo um traço de frieza, quase como se houvesse uma ponta de desilusão. Talvez fosse apenas coisa da sua cabeça. Esther não conseguia evitar, era um hábito seu tentar decifrar as emoções de Marcelo, analisando cada palavra sua em busca de algum indício de seu estado de espírito. Ela se importava demais com suas oscilações de humor, com suas alegrias e tristezas.Mas não deveria se preocupar tanto assim.Ao entrarem na casa da família Costa, Esther notou que o ambiente já estava repleto de pessoas. Havia cerca de uma dúzia de convidados, todos bem-vestidos. Alguns trajavam ternos elegantes, enquanto outros vestiam uniformes militares, exalando uma aura de autoridade e respeito. Sandro usava um traje tradicional, que já mostrava sinais de idade, como se tivesse sido cuidadosamente preservado ao longo dos anos. Não era novo, mas carregava um ar de d
Ela nunca tinha ouvido Marcelo falar sobre isso.Mas talvez fosse algo natural entre eles, afinal, o que tinham era um acordo, onde a principal regra era não interferir demais na vida do outro. Ele, certamente, não se sentiria à vontade em abrir completamente seu coração e revelar todos os seus segredos.Esther afastou o olhar, tentando não pensar muito no assunto.De repente, a voz de alguém, tentando amenizar a tensão, soou ao seu lado:— Sandro, todos nós entendemos o que você quis dizer, não estamos aqui para criar intrigas. Mas o fato é que as coisas estão aí, à vista de todos. O Francisco só estava defendendo o seu ponto de vista, mostrando a sua preocupação. Afinal, você é o mais velho aqui e, pelo visto, também ficou sabendo disso há pouco tempo. Dá até a impressão de que o Marcelo não está te dando o devido valor.Esther percebeu que os presentes pareciam não querer deixar Marcelo em paz. Todos pareciam querer pressioná-lo, testá-lo de alguma forma.Ela olhou novamente para Ma
— Esther, este brinde é para você. — Enquanto falava, Francisco estendeu uma taça de vinho em direção a Esther.Marcelo, sem perder tempo, envolveu-a pelos ombros com um braço, enquanto pegava a taça da mão de Francisco com o outro.— Ela é alérgica a álcool, bebo por ela.Com um movimento ágil, Marcelo ergueu a taça e a esvaziou de uma só vez, sem pestanejar.Os outros presentes, ao verem isso, começaram a fazer piadas, rindo e provocando:— Nossa, olha só o Marcelo! Antes, lá no quartel, ele era conhecido por aguentar qualquer tranco, enfrentava tudo e todos, era o exemplo de um verdadeiro durão. Agora, por causa da esposa, olha só como mudou! — Disse um deles, entre risos. — É aquele típico durão de coração mole, que se derrete todo por ela!— Pois é, não é? — Concordou outro, também sorrindo.— Marcelo, já que você nos trouxe aqui para conhecê-la, quando é que vai rolar uma cerimônia de casamento de verdade? Aposto que ainda não fizeram a festa, não é? Olha, faço questão de dar um
Liliane caminhou diretamente até Marcelo, como se nada mais importasse ao seu redor.— Na última vez, lá na tia Michele, mal tivemos tempo de conversar direito, e você já foi embora. Dessa vez, você vai ficar mais alguns dias, né?Sem cerimônia, ela entrelaçou o braço no de Marcelo, deixando Esther para trás como se fosse um detalhe insignificante.Durante o evento na festa de Michele, Liliane não havia sido tão ousada. Naquele momento, ela ainda não sabia quem era Esther para Marcelo, e além disso, havia prometido à Michele que testaria Marcelo, para ver se ele ainda nutria algum sentimento por ela. Liliane sempre viu Marcelo como um irmão mais velho, e estava disposta a ajudá-lo quando necessário.Agora que Marcelo tinha uma esposa, ela sabia que deveria tratá-la com respeito, como se fosse uma cunhada. Mas, por algum motivo, Liliane não conseguia cair nas graças de Esther. A jovem havia escutado rumores de amigos que Esther era uma mulher complicada, que usava sua posição no trabalh
Liliane imediatamente se aninhou nos braços de Sandro, buscando consolo como uma criança assustada. Sandro, por sua vez, segurou delicadamente o rosto dela, examinando o pequeno corte. Era apenas um arranhão superficial, longe de ser algo que pudesse causar uma cicatriz permanente.— É só um cortezinho, Lili, não vai acontecer nada de grave. Não precisa chorar na frente de tanta gente. — A voz de Sandro era firme, mas ao mesmo tempo tentava tranquilizar a neta.— Vovô. — Liliane fungou, sua voz carregada de angústia. — Você precisa fazer justiça por mim.Antes que Sandro pudesse responder, Francisco, que estava observando a cena de perto, se adiantou:— A Lili se machucou! Sandro, desde que ela era pequena, você sempre protegeu ela de qualquer sofrimento. Quem ousar prejudicar ela, vai ter que se ver comigo primeiro!Esther sentiu o impacto das palavras de Francisco. Ele era um homem grande e imponente, e só de imaginar um confronto físico, ela sabia que não teria a menor chance. Seu
Esther não sentiu necessidade de prolongar a discussão. Sandro estava certo, machucar alguém pode até ser fácil, mas lidar com as consequências, nem sempre era simples.— Desculpa, Esther. — Liliane finalmente pediu desculpas, sua voz baixa e carregada de uma certa relutância.— Tudo bem, te perdoo. — Esther respondeu com generosidade, seu tom suave e acolhedor, demonstrando uma maturidade que não precisava se apegar a ressentimentos.Sandro, que observava a cena com atenção, ficou satisfeito com o desfecho. Ele balançou a cabeça em aprovação e, com uma voz paternal, disse:— Reconhecer o erro já é um bom começo. O que me preocupa é quando alguém nem sequer se dá conta do que fez de errado. Só assim você pode ser uma pessoa de respeito. E não se esqueça, Liliane, não quero ver você fazendo isso de novo.— Eu entendi, vovô. Daqui para frente, vou me esforçar para me dar bem com todos. — Liliane respondeu com uma doçura repentina, como se quisesse apagar qualquer vestígio de tensão.Ela
Marcelo se aproximou, juntando-se a ela para sentir a brisa suave da noite. Ele falou em um tom calmo:— Já me acostumei. Não vejo mais razão para tentar mudar, afinal, sempre acaba sendo a mesma coisa.A mesma coisa? Esther ficou intrigada, questionando o que ele realmente queria dizer com aquilo. Ela achava que conhecia Marcelo o suficiente, mas agora percebia que ele ainda guardava muitos segredos. Olhando para o perfil dele, ela perguntou:— Eles costumavam te tratar assim também? Sempre te deixavam de lado?Era difícil para ela entender. Essas pessoas eram claramente mais velhas que Marcelo, então por que excluíam ele? Todos mimavam tanto Liliane, por que não podiam ser um pouco mais generosos com Marcelo? Ele deve ter sido muito jovem quando entrou para o exército...— Eles te isolavam mesmo? — Esther continuou, sua curiosidade se transformando em uma leve tristeza.— Não se preocupe, não vamos precisar vê-los com frequência daqui para frente. — Marcelo respondeu, ainda sem olhar
— Lili, muito obrigada! Eu não esperava que você fosse tão boa comigo. — A voz do outro lado da linha agradeceu sinceramente. — Sinto muito que você tenha passado por isso por minha causa.— Não precisa agradecer. — Liliane respondeu com firmeza. — Quem te fez mal, fez mal a mim também. E, como sua amiga, é meu dever te defender. Não vou deixar que pessoas ruins saiam impunes.— Eu só estava desabafando, mas você levou isso tão a sério. Você não tem ideia do quanto me sinto tocada por isso. É realmente bom ter você como amiga. — A pessoa do outro lado da linha parecia profundamente comovida.Liliane sempre foi assim. Ela colocava o coração em tudo o que fazia, especialmente em suas amizades. Desde pequena, ela havia sido protegida por todos ao seu redor, sempre mimada e cuidada, sem nunca precisar enfrentar grandes dificuldades. O lado sombrio das pessoas, as armadilhas da vida, ela pouco conhecia. E por isso, quando ouvia que uma amiga havia sido maltratada, sua primeira reação era de