Augusto encara Gloria antes de responder sua pergunta:
— Não. Se algo acontecer ao mercado externo, quero estar preparado. Vamos usar os entremeios dos pés e começar a produzir feijão, soja e outras culturas que ainda estou pesquisando. Se o café passar a não valer mais nada, derrubo todos os pés e planto cana de açúcar. Temos tudo para nos transformarmos em uma usina.
— E quanto à indústria? Você não tem em mente entrar no ramo automobilístico como deseja Ângelo, ou mesmo na indústria têxtil?
— Na têxtil, sim. Mas vamos devagar. Com dinheiro na mão é mais fácil pensar num negócio sem correr grandes riscos. Por enquanto está tudo bem. Vou passar no banco mais tarde e, a propósito Glória, distraia Ângelo. Não o quero aqui enquanto o José ensaca os grã
TO velho molha os lábios, antes de responder a Augusto:— Gostaria de convidá-lo a tomar parte no nosso corpo político. Em março do ano que vem, como bem sabe, será nomeado o sucessor do Presidente Washington Luiz, e esperamos que ele chegue a assumir o cargo.— E por que não chegaria a assumir? Nunca tivemos problemas com os sucessores, até que eu saiba.— Parece que os mineiros estão divididos quanto à indicação do Presidente. O nome de Júlio Prestes de Albuquerque foi o escolhido, frente ao do mineiro Antônio Carlos Ribeiro de Andrada. Há três meses, em março, demos um banquete em Ribeirão Preto para selar a indicação e dar-lhe apoio. Convidei seu pai, porém ele não quis comparecer — sorriu afetuosamente — Continuando, essa preferência ao nome de Júlio Prestes deixou
Os olhos de Augusto encontram os de Mercedes por sobre o jornal e ela lhe sorri ruborizada. Conhecia-a desde a infância. Não se sentia totalmente estranho à ela, mas havia Glória. Uma mulher só, que ganhara o seu respeito conquistando seu espaço num mundo masculino. Adorava vê-la colocar Ângelo em seu lugar, distribuindo ordens aos empregados e tendo o respeito deles. Lembrava-lhe um pouco a mãe. Firme em suas decisões e ardente em sua paixão. Pôde sentir quando seus lábios se encontraram. Quase perdera a cabeça ao ter seu corpo molhado nas mãos. Nunca sentira tão pressionado quanto agora. Um homem de quase trinta e três anos perdendo-se nas teias femininas e nos imbróglios do Coronel Medeiros.— Fiquei feliz por nos acompanhar, Augusto. Sei como é difícil deixar os negócios e ser arrastado para a Capital para servir de guia para
— Eu... Não... Acredito. — disse, pausadamente — O que acontece com esses dois irmãos? Esse Augusto está mostrando as garrinhas agora. Como pôde se envolver com outra mulher? Ele não amava Glória?— Veja bem, Marina, nem sempre as coisas são o que parecem.— O que quer dizer? Pra mim está tudo muito claro. Ele é homem e, como todo homem, não presta. Quer ter as duas nas mãos. Estou morrendo de raiva.— Ele não vai ter ninguém, Marina! — Disse, acabrunhado. Ela me olhou, e seus olhos se abaixaram envergonhados.— Às vezes me esqueço da realidade. Mas é que não consigo deixar de me envolver com a estória. É tão real! Tão triste e ao mesmo tempo bizarra! Estou pensando apenas no sofrimento dessas garotas, quando deveria pensar em todos eles.— Vo
Aquele dia amanhecera feito pesadelo para uns e cheio de alegria para outros. Logo mais a noite celebrariam o aniversário de Dona Afonsina. A casa da fazenda encontrava-se em plena arrumação desde as primeiras horas do dia. Toalhas sendo passadas e arejadas, vasos repletos de flores esperavam por seus lugares nos cantos da sala de jantar e, à mesa, taças sendo preparadas para descansarem ao lado das porcelanas francesas. O aroma rescendia a assados e doces finos, supervisionados por Mercedes, enquanto os tachos fervilhavam na vaporosa cozinha.Ela, apesar da tristeza pela mãe, resolvera só pensar na alegria de comandar a noite e receber os convidados como a futura dona daquela casa. Faria de tudo para alegrar a vida daquelas pessoas, principalmente da aniversariante. Ângelo passeava pelos cômodos com passadas largas, em mangas de camisa arregaçadas, seguindo ordens da futura cunhada. Deixara-se levar pe
Como é possível um coração doer tanto? — pensava Glória, enquanto avaliava as travessas sobre a mesa impecável. Augusto fugia dela. Às vezes o pegava observando-a. Como queria que ele confessasse logo que a amava. Aquele beijo no rio fora o único que trocaram e ela pôde sentir o quão forte era o amor que guardava dentro de si, a sete chaves. Por que esconder? O que o impedia de ser feliz? Dona Helena sempre deixou claro que patrões ricos jamais se casavam com empregadas. Sabia que a família dele não a aprovava, contudo, não se importava. Seu amor seria mais que isso se ele a escolhesse. O fato de Mercedes ainda não tê-lo conquistado lhe dava esperanças. Ela tinha sondado Ângelo e ele havia dito que não sabia de nada. Parece que a viagem tinha sido estritamente profissional. Havia uma chance nessa noite de se encontrarem a
Pedro Henrique estacionava os primeiros carros que chegavam à fazenda ao cair da noite. A casa estava totalmente iluminada e enfeitada com arranjos florais. A orquestra tocava uma música suave, que ele não conhecia, quando Aldora chega, uniformizada, para dar um recado da mãe.— Mamãe disse para você ir comer alguma coisa assim que o último carro chegar, e depois ficar de olho nos convidados, não os deixando se esgueirar furtivamente por aí.— Isso vale para você, Aldora. Não quero que pense que pode dar um jeito de ir atrás daquele almofadinha.— Não tenho ideia do que está falando.— Pois fique avisada. Se ele tentar alguma coisa com você, já sabe.— Olha para mim, Rico! Vestida desse jeito, com tantas mulheres maravilhosas lá dentro, acredita que ele tentaria algo comigo?— Eu já vi
Ângelo se encontrava com algumas taças de champanhe e vinho correndo no sangue. Cercado por moçoilas da alta sociedade, sorria e jogava charme, dançando com todas, sem se importar com os olhares raivosos das velhas senhoras matronas. Dona Afonsina era toda orgulho pelo belo Anjo que havia posto na terra. Mas ele não estava realmente ligando para nenhuma delas. Seu olhar era sempre atraído pelo olhar opressor de Aldora, que servia bandejas recheadas de bebidas e, a cada vez que o servia, parecia feri-lo com uma lâmina afiada. Como ele gostava de vê-la soltando fogo pelas ventas. Tudo o que queria era levá-la para a noite enluarada e sorver aqueles lábios ferinos até que ela se rendesse. Contudo, pressentia que a gata selvagem estava aprontando alguma coisa. Sua boca sorria cinicamente contrariando o olhar apertado com que o encarava. Adoraria saber o que se passava naquela ca
Marina interrompeu a leitura, erguendo-se do sofá e andando de um lado para outro. Parecia um cão farejando o rastro de uma presa qualquer. E como estava linda! — O que foi? — Perguntei, deitando os papéis na mesa de centro e esticando as pernas. — Nunca pensei que ele pudesse ser acusado de traição! Vender os grãos antes da quebra da Bolsa de Valores deve ter deixado todos os fazendeiros furiosos com ele. Sem dizer do futuro sogro. Isso poderia levar alguns deles a tramar a violência daquela última noite, em 31 de maio? — Realmente não sei, Marina. Existem muitos pontos que levam àquele desfecho. Temos ainda mais um pouquinho de leitura antes de confabularmos sobre essa noite. Vem, sente-se ao meu lado — pedi, estendendo a mão para ela, que me olha relutante, cedendo logo em seguida. O Coronel Medeiros tomava uma taça atrás da outra, preocupado com o andar das coisas. No dia seguinte, ou dali a alguns dias, poderia se tornar um homem p