- Você não vai se encontrar com seus amigos hoje? - perguntei ao passarmos pela rua onde normalmente os amigos dele apareciam.
- Não. - ele respondeu - Eu disse que não precisavam me esperar, então já devem ter ido.
- Ah... - resmunguei.
Andamos em silêncio por mais um momento.
- Soube que você tirou dez na prova de matemática de novo, gênia. - ele comentou de repente.
- Não é para tanto... - respondi sem graça.
- Ta falando sério? Com as suas notas você consegue uma bolsa na faculdade facinho. - ele elogiou - Já sabe o que vai fazer?
- Na verdade não faço ideia. E você?
- Acho que quero ser policial igual ao meu pai. Ou talvez me aliste no exército. Afinal, as garotas gostam de homens em uniformes. - ele brincou e eu revirei os olhos.
- Não sei se você ficaria bem em um. - debochei.
- Ah, qual é? - ele falou - Eu ficaria um gato num uniforme do exército.
Nós dois rimos e eu revirei os olhos.
- E você deveria fazer um curso de fotografia. - Felipe sugeriu.
- E matar seus pais do coração? - perguntei - Com as minhas notas era de se esperar que eu fizesse algo mais difícil do que fotografia.
- Fotografia não é nada fácil - ele argumentou - E você gosta. Meus pais não iam se importar.
- Ah, tá. - eu ri.
- Tabom. - ele concordou - Eles iriam surtar no começo, mas depois iriam te apoiar, como sempre fazem.
Senti uma pontada de inveja na última frase, mas decidi ignorar para não estragar aquele momento de paz.
Chegamos na escola e cada um foi para a sua sala.
Nós dois estávamos no último ano escolar, porém estudávamos em salas diferentes, assim como Matheus também. Afinal havia cinco salas do último ano naquela escola.
No fim das aulas encontrei Matheus me esperando na porta, como sempre fazia, mas ao sair vi Felipe se aproximando.
- Vamos? - ele perguntou, pegando a minha mochila mais uma vez.
Mateus o encarou e eu soltei um suspiro, achando que teríamos mais uma briga, mas ao invés disso Felipe apenas foi andando na nossa frente, nos dando um certo espaço.
Saímos da escola em silêncio, estranhando toda aquela situação.
- Alice, o que você acha de contar para os seus tios sobre nós dois? - sugeriu Mateus assim que saímos da escola.
- Contar para eles?
- É... eu estava pensando em... falar com eles. Dizer que estamos namorando.
- E estamos?
Mateus franziu a testa.
Ele parecia ofendido, mas essa não havia sido a minha intenção.
- Eu... não quis... - tentei consertar - Eu só fiz essa pergunta porque não estamos exatamente namorando... Não oficialmente.
Felipe, que estava andando um pouco mais a frente, balançou a cabeça e começou a rir baixinho.
- Eu sei que não estamos namorando. O que eu estou dizendo é que eu quero namorar com você. - explicou Mateus.
- Ah... - falei constrangida.
Eu queria sim namorar com Mateus, afinal ele era um cara legal, e apresenta-lo oficialmente como namorado facilitaria a minha vida, pois eu não precisaria me preocupar que eles descobrissem nada. O problema era que meus tios eram super protetores comigo e eu tinha medo de que não aceitassem o namoro.
- Então... ?
- Eu quero. Sim. Mas meus tios...
- Eles não devem ser tão ruins assim.
- Não. Eles não são ruins, eles só são preocupados demais. - expliquei.
Parei no meio da calçada e o puxei pelo braço, fazendo-o olhar para mim.
- Se você quiser, então eu quero, mas se eles não aprovarem...
- Eles vão aprovar. - disse ele confiante.
Respirei fundo e sorri. Mateus me segurou pela cintura, me trazendo mais para perto.
- Vamos logo Alice. Está ficando tarde. - gritou Felipe, do outro lado da rua.
Revirei os olhos e contei até dez mentalmente.
- Tchau. - me despedi.
- Por que tchau? Eu vou com você.
- Hoje?
- Por que não?
Pensei bem e cheguei a conclusão de que realmente era o dia perfeito. Minha tia estava em casa e meu tio ia chegar mais cedo então ele logo estaria em casa também.
- Certo. - concordei.
Felipe fez careta o resto do caminho por causa disso.
...
Assim que abri a porta da cozinha vi minha tia preparando o almoço, e o cheiro estava delicioso.
- Vocês demoraram... - começou ela, antes de perceber a presença de Mateus ao meu lado.
Felipe deu de ombros e foi se sentar no sofá da sala.
- Tia, esse é Mateus... meu namorado.
Minha tia ergueu as sobrancelhas, mas sorriu logo depois.
- Olá... Mateus.
- Mateus, essa é minha tia Patrícia.
- É um prazer. - cumprimentou ele, extremamente educado.
Guiei Mateus até a sala, onde nos sentamos em um dos sofás.
Eu estava muito nervosa, pois era a primeira vez que eu aparecia em casa com um menino.
Mas meu coração quase parou mesmo foi quando eu ouvi a porta da cozinha se abrindo mais uma vez. Era meu tio.
Ouvi minha tia conversando baixinho com ele e depois ouvi seus passos raivosos.
Mateus logo se levantou, indo em direção ao meu tio quando ele apareceu.
- Olá, senhor. Meu nome é Mateus. Peço desculpas por aparecer assim na sua casa sem avisar, mas...
- É você que quer namorar minha sobrinha? - perguntou meu tio, com aquela voz grave e postura firme que ele sempre tinha.
- Sim, senhor.
- Meu nome é Marcelo, garoto.
- Certo, Marcelo. É um prazer conhece-lo, senhor.
Mateus sorriu sem graça e eu resolvi intervir, mas minha tia foi mais rápida.
- Seja educado, meu amor. Nossa sobrinha o trouxe aqui para apresenta-lo. Não vai querer que ele tenha uma ideia errada sobre nós.
- Não. Eu estou passando exatamente a ideia que quero passar. - insinuou meu tio - Estou de olho em você, garoto.
Ele então deu as costas e saiu.
Mateus deu um assovio e voltou a se sentar.
- Isso foi...
- Estranho? - completei.
- Fácil. - disse ele com um sorriso brincalhão.
Revirei os olhos e sorri.
Mateus se aproximou de mim para me dar um beijo, mas Felipe pigarreou.
- Se está incomodado, saia daqui. - sugeri.
Ouvi ele bufar e sair da sala, mas não olhei.
Mateus me puxou e me deu um beijo de tirar o fôlego.
Depois que eu apresentei Mateus aos meus tios tudo melhorou e eu estava muito feliz.Nós íamos para a escola juntos, voltávamos juntos e passávamos os fins de semana juntos.Mas eu nunca poderia imaginar o quanto tudo isso ia mudar logo.Um dia, depois da aula, eu convidei Mateus para passar a tarde na minha casa.Meus tios estavam trabalhando, então só seríamos eu, ele e meu primo Felipe - infelizmente.Felipe foi direto para o quarto, com uma cara emburrada, enquanto eu e Mateus ficamos na sala.Liguei a TV e coloquei um filme para nós dois assistirmos, me aconchegado ao lado
Eu fiquei horas no hospital, esperando para poder ver meu primo. Meus tios estavam preocupadíssimos, mas eu sabia que ele ficaria bem. Dois dos homens que haviam invadido a nossa casa também foram levados para o hospital, mas seriam presos assim que se recuperassem e o outro estava morto. Dei meu depoimento aos policiais e tive medo de que eu seria presa também, ou no mínimo julgada, mas Marcelo me garantiu que eu não precisava me preocupar, pois eu havia apenas me defendido e tudo já estava resolvido. Quando os médicos finalmente nos deixaram entrar para vê-lo fiquei surpresa que ele parecesse ainda melhor do que eu esperava. Felipe estava sentado na maca, e apesar de estar com o cabelo todo bagunçado, ele me parecia ótimo, apenas com o ombro enfaixado. Tive vontade de socá-lo por ele ter sido tão descuidado, mas no fundo eu estava grata, afinal ele salvou a minha vida. Meus tios o abraçaram e eu ri da careta de dor que ele fe
Assim que Felipe voltou do hospital nós começamos a nossa viagem.Pegamos um avião para a cidade de Ônix, que ficava em um país quase vizinho do nosso.Felipe se sentou ao meu lado no avião, e meus tios na frente.Eu tinha muitas perguntas a fazer, mas decidi deixa-las para depois da viagem, afinal não poderíamos conversar ali no avião.- Você está bem? - perguntei a Felipe.- Sim. Eu não gosto muito de voar, mas...- Eu estava me referindo ao seu ombro.- Ah... - ele riu.- Você tem medo de avião? - zombei.- Não. Não é medo. Eu só... não gosto de altura.Ri dele e voltei a minha atenção para a janela.Eu nunca havia voado de avião, pelo menos não que eu me lembrasse, mas eu estava tranquila.Assim que começamos a sentir o tremor da deco
Quando consegui pegar no sono já era quase de manhã.Acordei com batidas na minha porta, levantei lentamente para ver quem era e me surpreendi ao ver Felipe parado em frente ao meu quarto.- O que foi? - perguntei ainda meio dormindo.- Nada... Eu só queria ver se você estava bem. Já é tarde e você não saiu do quarto o dia todo.- Eu estou bem. Só fui dormir tarde ontem, só isso.Olhei bem para ele e só então percebi que aquilo parecia estranho. Felipe nunca havia se importado tanto comigo.- Por que está tão preocupado?
Nos próximos dias que se passaram eu evitei Felipe o máximo que consegui, pois não estava pronta para encará-lo depois do que aconteceu e também não tive coragem de falar com Mateus, nem sobre Felipe, nem sobre eu ser a herdeira de Solares. Eram assuntos que eu estava guardando para um momento adequado, assim como o possível término de namoro, afinal eu não achava que poderíamos continuar namorando, não depois de tudo o que eu havia descoberto sobre mim. Mateus tinha a vida dele e eu logo seria uma princesa de um reino distante. Não teria como dar certo, ou teria?Um dia, porém, enquanto eu estava sentada no meu quarto, rabiscando um papel qualquer, sem escrever nada de importante, ouvi meu celular tocando. Era Mateus mais uma vez, a segunda vez naquele dia.
Mais tarde, quando meus tios chegaram das compras que haviam feito, nós nos sentamos para almoçar. Eu não pretendia falar nada sobre Mateus, mas o que eu não esperava era que Felipe fosse me fazer falar. - Pai, você não vai adivinhar quem veio nos fazer uma visita hoje. - disse ele de repente. Eu o encarei numa pergunta silenciosa do por que ele estava dizendo aquilo, enquanto meu tio nos olhava, esperando uma resposta. - Mateus veio me visitar. - respondi com um suspiro - Ele disse que ia se mudar para a cidade. - Você disse à ele o nosso endereço? - É claro que disse, ele é... ele era o meu namorado.
Minha tia estava fazendo o jantar, enquanto Felipe e eu estávamos sentados à mesa, olhando um para o outro.Sorri envergonhada e baixei os olhos para a minha mão, sentindo um misto de euforia, nervosismo, medo e vergonha, tudo misturado.Foi quando meu tio entrou na cozinha sério, fazendo toda a atmosfera do ambiente mudar e me tirando das minhas fantasias irreais.- Precisamos conversar sobre uma coisa. - anunciou.Ele se sentou numa cadeira à minha frente e respirou fundo.- Eu sei que estamos nos adaptando à mudança ainda, mas...- Tio, eu não quero me mudar de novo. - interrompi.- Espera eu terminar. - pediu ele - Você já vai fazer dezoito anos daqui duas semanas, então acho que... já podemos voltar para casa.- Você quer dizer...- Sim, o castelo. - ele confirmou - Eu estava pensando sobre o assunto e acho que não seria
No dia seguinte eu estava na cozinha, fazendo um brigadeiro caseiro para me acalmar.Minha tia nunca havia se preocupado em me ensinar a cozinhar, e agora eu sabia o por que, mas eu gostava muito de fazer doces quando eu estava chateada, sem ela saber, é claro. Fazê-los, e principalmente comê-los, me acalmava mais do que qualquer outra coisa e eu precisava aproveitar que meus tios haviam saído mais uma vez.Ouvi a campainha tocar, desliguei o fogo e fui até a janela para ver quem era.- Quem está aí? - perguntou Felipe atrás de mim, me dando um susto.- É o Mateus. - respondi.Ele ficou sério de repente e foi em direção a porta.- O que você vai fazer? - perguntei, segurando-o pelo braço.- Vou fazer ele ir embora.- Não. Eu falo com ele.Abri a porta e fui até o portão antes que Felipe dissesse ou fizesse