Clara sempre foi uma presença intrigante na vida de Laura. Amigas desde os tempos da faculdade, suas personalidades contrastantes haviam criado uma amizade improvável. Clara era o espírito livre, ousada e destemida, enquanto Laura representava estabilidade, doçura e um otimismo que cativava todos ao seu redor. Mas, por trás do sorriso encantador de Clara, havia um vazio que nem mesmo suas aventuras e conquistas podiam preencher.
Na manhã seguinte à festa, Clara sentava-se em frente ao espelho em seu apartamento, relembrando os acontecimentos da noite anterior. O jeito como Gabriel ria de suas piadas, a proximidade ocasional quando ele se inclinava para ouvi-la em meio ao barulho da música, tudo isso alimentava um desejo que ela há muito tempo tentava sufocar. Clara não desejava apenas Gabriel; ela desejava aquilo que ele representava: estabilidade, segurança e o tipo de amor que ela nunca conheceu. Enquanto Clara revivia mentalmente cada detalhe, Laura estava em casa preparando o café da manhã para Gabriel. A cozinha cheirava a café fresco e pão torrado, e o sol que entrava pela janela iluminava o ambiente com uma luz acolhedora. Laura tentava ignorar a inquietação que sentira durante a festa. Afinal, Clara era sua amiga, e Gabriel a amava. Não havia razão para suspeitar de algo mais. Gabriel entrou na cozinha com um sorriso despreocupado, pegando uma xícara de café e beijando Laura na testa. — Bom dia, meu amor. Dormiu bem? Laura hesitou antes de responder, observando o marido enquanto ele se servia de torradas. Ela queria perguntar sobre Clara, sobre os olhares e toques sutis, mas temia parecer insegura ou controladora. Afinal, Gabriel nunca lhe dera motivos para duvidar de sua fidelidade. — Dormi, sim. E você? — respondeu finalmente, decidindo não tocar no assunto. — Como uma pedra. Ontem foi incrível. Obrigado por tudo, Laura. — Ele sorriu, e a sinceridade em seus olhos quase apagou suas preocupações. Enquanto isso, Clara decidiu visitar Laura naquela manhã. Era algo comum entre elas; encontros casuais para conversar e tomar café. Quando chegou, trazia consigo um bolo de chocolate que havia comprado na padaria local, um gesto que Laura considerou atencioso. — Espero não estar atrapalhando — disse Clara, entrando na casa de Laura com seu habitual sorriso confiante. — De forma alguma! — respondeu Laura, tentando esquecer os pensamentos incômodos que a assombraram durante a festa. — Estava mesmo precisando de uma companhia. As duas se sentaram na sala de estar, e a conversa fluiu com a naturalidade de sempre. Clara falava sobre seu trabalho, suas últimas viagens e suas observações sobre a festa. Mas, a cada comentário aparentemente inocente, ela plantava pequenas sementes de dúvida na mente de Laura. — Gabriel parecia tão feliz ontem, não é? — começou Clara, mexendo lentamente em sua xícara de chá. — Ele tem um jeito tão carismático. Não me admira que as pessoas sejam atraídas por ele. Laura riu, mas sentiu um leve desconforto. — Ele tem essa facilidade com as pessoas, sim. É uma das coisas que mais amo nele. — Deve ser difícil, às vezes, ter que dividir esse brilho com todo mundo, não é? — Clara comentou casualmente, mas seus olhos observavam atentamente a reação de Laura. A conversa continuou, mas aquelas palavras ficaram na mente de Laura, reverberando como um eco silencioso. Clara sabia exatamente o que estava fazendo. Cada comentário era cuidadosamente calculado para parecer inofensivo, mas carregava uma carga emocional que deixava Laura inquieta. Dias se passaram, e Clara começou a se aproximar mais de Gabriel. Ela aparecia frequentemente em momentos em que sabia que Laura estaria ocupada ou ausente. Usava pretextos simples, como pedir ajuda com algo relacionado ao trabalho ou buscar conselhos para situações hipotéticas. Gabriel, com seu caráter amigável e despreocupado, não via mal algum nisso. Para ele, Clara era apenas uma amiga próxima de sua esposa. Certa tarde, enquanto Laura estava em uma reunião de trabalho, Clara apareceu na casa do casal com uma garrafa de vinho e um sorriso provocador. — Eu estava passando por aqui e pensei: por que não parar para ver como você está? — disse Clara, entrando sem esperar um convite formal. Gabriel hesitou por um momento, mas acabou cedendo à espontaneidade de Clara. Eles se sentaram no jardim, conversando enquanto o sol se punha. Clara sabia como conduzir uma conversa, como prender a atenção de Gabriel. Sua risada era encantadora, seu olhar, penetrante. Mesmo sem perceber, Gabriel começou a baixar a guarda, permitindo que Clara entrasse em um espaço emocional que ele reservava apenas para Laura. — Laura tem sorte de ter você — disse Clara em determinado momento, sua voz carregada de uma doçura que escondia sua verdadeira intenção. — Você é tudo o que alguém poderia desejar. Gabriel sorriu, desconfortável com o elogio. — E eu tenho sorte de ter Laura. Ela é incrível. Clara inclinou-se ligeiramente para frente, segurando o olhar de Gabriel por um instante mais longo do que o necessário. — Sim, ela é. Mas, às vezes, acho que ela não percebe o quão especial você é. Aquela frase pairou no ar, deixando Gabriel sem palavras. Ele mudou de assunto rapidamente, tentando dissipar a tensão que não sabia de onde vinha. Clara, por outro lado, sorria internamente. Ela sabia que havia dado mais um passo em direção ao seu objetivo. Quando Laura chegou em casa naquela noite, encontrou Gabriel mais introspectivo do que o normal. Ele tentou agir como se tudo estivesse bem, mas Laura sentiu que algo estava diferente. Ela perguntou sobre seu dia, mas Gabriel evitou mencionar a visita de Clara, achando que não valia a pena causar preocupação. Aos poucos, a presença de Clara começou a criar fissuras na confiança de Laura e Gabriel. E enquanto Clara se aproximava cada vez mais de Gabriel, Laura lutava para ignorar as sombras que pareciam crescer ao seu redor. Clara sabia que era apenas uma questão de tempo até que as sementes que plantara começassem a dar frutos. E quando isso acontecesse, ela estaria pronta para colher o que tanto desejava.O céu de Serenità estava pintado com tons de laranja e rosa, prenunciando o cair da tarde. A cidade parecia perpetuamente mergulhada em uma tranquilidade de sonhos, mas, no apartamento de Clara, o contraste era evidente. Sentada em sua poltrona de veludo vinho, ela observava a paisagem pela janela enquanto girava lentamente uma taça de vinho tinto na mão. Seus pensamentos não eram serenos como o cenário; pelo contrário, estavam tomados por uma tempestade de intenções que se desenrolava com precisão. Gabriel. O nome ecoava em sua mente como uma melodia obsessiva, um chamado ao mesmo tempo doce e corrosivo. Clara não queria apenas Gabriel. Queria o que ele representava: a estabilidade, a atenção, o carinho que ela nunca acreditou que Laura merecesse. Por anos, assistiu à felicidade do casal de longe, ruminando ressentimentos que cresciam como ervas daninhas. Agora, estava decidida a agir. Não seria mais espectadora da perfeição alheia. No dia seguinte, Clara apareceu inesperadamente n
A noite caía sobre Serenità, trazendo consigo um silêncio que parecia amplificar os pensamentos inquietos de Gabriel. Ele estava em seu escritório, a luz suave do abajur criando um contraste com a escuridão do quarto. Os projetos à sua frente não prendiam mais sua atenção. Em sua mente, Clara surgia como uma sombra constante. As conversas recentes, os encontros ocasionais, os olhares que duravam mais do que deveriam – tudo isso começava a formar um peso que ele não sabia como carregar.Ao mesmo tempo, Laura estava em casa, sentada no sofá com um livro aberto no colo, mas incapaz de ler uma única linha. Seus pensamentos estavam fixos em Gabriel. Desde a festa de aniversário, algo parecia errado, um distanciamento sutil, mas perceptível. O vazio deixado por sua ausência nas noites de trabalho era preenchido pelas palavras de Clara, que ecoavam em sua mente como uma advertência velada.Clara, por outro lado, estava em seu apartamento, planejando cada movimento com precisão. Ela sabia que
O silêncio pairava pesado na casa de Laura e Gabriel, como se as paredes absorvessem a tensão que os envolvia. Desde a revelação da traição, o casal vivia sob o mesmo teto, mas era como se um abismo os separasse. Gabriel tentava encontrar formas de se redimir, mas Laura permanecia fechada, protegendo-se da dor que ainda pulsava dentro dela.Laura havia se mudado para o quarto de hóspedes. O espaço pequeno e neutro contrastava com a intimidade do quarto principal, onde tantas memórias felizes haviam sido construídas. Agora, aquele espaço parecia um santuário que ela não podia mais habitar. Ela se agarrava a pequenos rituais para manter a sanidade: preparar chá todas as noites, organizar gavetas que antes ignorava, ler livros que a distraíam momentaneamente da dor.Gabriel, por outro lado, vagava pela casa como uma sombra. Ele passava horas no escritório, olhando para a tela do computador sem realmente trabalhar. O arrependimento era um peso que o sufocava, mas ele não sabia como expres
Laura olhava pela janela do pequeno quarto na casa de Ana, observando a chuva deslizar pelo vidro. A tempestade parecia ecoar o turbilhão de sentimentos que a assolava desde o momento em que saíra de casa. As memórias do que antes fora um lar feliz agora se tornavam um peso insuportável, assombrando cada pensamento. A casa que compartilhara com Gabriel parecia um cemitério de sonhos, e cada detalhe que antes trazia alegria agora era um lembrete cruel de sua dor.Ana, sempre atenta, entrou no quarto com duas xícaras de chá. “Pensei que isso poderia ajudar,” disse ela suavemente, colocando a xícara ao lado de Laura. Embora a presença da amiga fosse reconfortante, Laura sentia que uma parte essencial de si mesma estava perdida.As noites eram as piores. Laura passava horas revivendo os momentos felizes que tivera com Gabriel: as risadas, os planos para o futuro, os pequenos gestos de carinho que antes pareciam tão naturais. Agora, tudo parecia uma mentira. Mais do que a traição, o que a
Gabriel caminhava lentamente pelas ruas do bairro onde ele e Laura haviam construído tantos sonhos juntos. As folhas das árvores, agora tingidas de tons outonais, caíam suavemente no chão, como um reflexo silencioso do caos em sua mente. Ele não sabia como chegara àquele ponto, mas a culpa que carregava era insuportável. Cada passo parecia ecoar em sua consciência, um lembrete constante de suas falhas.Desde que Laura partira, Gabriel sentia como se estivesse vivendo em um limbo. O vazio deixado por sua ausência era maior do que ele imaginava possível. Não era apenas a falta de sua presença física, mas também a perda de sua risada, do calor de sua voz, e até mesmo das pequenas discussões sobre coisas triviais. Ele sentia falta de tudo — de Laura e, principalmente, de quem ele era quando estava com ela.Naquela manhã, Gabriel acordara cedo, como fazia todos os dias desde a separação. Não conseguia mais dormir até tarde; a insônia e os pensamentos incessantes o arrancavam do sono antes
Naquela manhã, Laura sentia o peso de um mundo que parecia desabar sobre seus ombros. As evidências sobre Clara estavam todas ali, dispersas em sua mente como peças de um quebra-cabeça que ela precisava montar. Gabriel estava distante, mas, pela primeira vez em semanas, ela sentia uma centelha de determinação em seu coração. Sentada no sofá da sala, o silêncio era interrompido apenas pelo leve estalar do relógio na parede. Era hora de agir.— Preciso entender o que realmente aconteceu — murmurou para si mesma, enquanto relia as mensagens e lembrava das atitudes que antes pareciam inocentes, mas agora carregavam um novo significado.A busca pela verdade a levou a vasculhar memórias, mensagens antigas no celular e até mesmo áudios esquecidos. Foi então que ela encontrou algo que parecia pequeno, mas era revelador: uma troca de mensagens entre Clara e Gabriel, repleta de ambiguidades. A frase "Ela nunca saberá" ecoou em sua mente como um alerta.Horas depois, decidiu ligar para Clara, co
O peso do confronto com Clara ainda pairava sobre Laura, mas de uma forma estranhamente libertadora. Pela primeira vez em semanas, ela sentia que tinha o controle de sua vida novamente. A dor da traição ainda era uma presença constante, mas algo havia mudado: agora havia uma trilha, ainda que incerta, para seguir em frente.Gabriel parecia perceber isso também. Desde a noite em que Laura voltou do confronto com Clara, ele demonstrava mais esforço em reparar os danos causados. Pequenos gestos, como preparar o café da manhã ou oferecer ajuda com as tarefas diárias, tornaram-se frequentes. Contudo, Laura sabia que gestos cotidianos não seriam suficientes. Ela precisava de algo mais, algo que provasse que Gabriel estava realmente comprometido em reconquistar sua confiança.Naquela manhã, enquanto Laura organizava alguns papéis em seu escritório em casa, Gabriel entrou, hesitante, com um envelope em mãos.— Laura, posso falar com você?Ela olhou para ele, colocando os papéis de lado.— Cla
O peso do confronto com Clara ainda pairava sobre Laura, mas de uma forma estranhamente libertadora. Pela primeira vez em semanas, ela sentia que tinha o controle de sua vida novamente. A dor da traição ainda era uma presença constante, mas algo havia mudado: agora havia uma trilha, ainda que incerta, para seguir em frente. Gabriel parecia perceber isso também. Desde a noite em que Laura voltou do confronto com Clara, ele demonstrava mais esforço em reparar os danos causados. Pequenos gestos, como preparar o café da manhã ou oferecer ajuda com as tarefas diárias, tornaram-se frequentes. Contudo, Laura sabia que gestos cotidianos não seriam suficientes. Ela precisava de algo mais, algo que provasse que Gabriel estava realmente comprometido em reconquistar sua confiança. Naquela manhã, enquanto Laura organizava alguns papéis em seu escritório em casa, Gabriel entrou, hesitante, com um envelope em mãos. — Laura, posso falar com você? Ela olhou para ele, colocando os papéis de lado.