A noite caía sobre Serenità, trazendo consigo um silêncio que parecia amplificar os pensamentos inquietos de Gabriel. Ele estava em seu escritório, a luz suave do abajur criando um contraste com a escuridão do quarto. Os projetos à sua frente não prendiam mais sua atenção. Em sua mente, Clara surgia como uma sombra constante. As conversas recentes, os encontros ocasionais, os olhares que duravam mais do que deveriam – tudo isso começava a formar um peso que ele não sabia como carregar.
Ao mesmo tempo, Laura estava em casa, sentada no sofá com um livro aberto no colo, mas incapaz de ler uma única linha. Seus pensamentos estavam fixos em Gabriel. Desde a festa de aniversário, algo parecia errado, um distanciamento sutil, mas perceptível. O vazio deixado por sua ausência nas noites de trabalho era preenchido pelas palavras de Clara, que ecoavam em sua mente como uma advertência velada. Clara, por outro lado, estava em seu apartamento, planejando cada movimento com precisão. Ela sabia que a dúvida já havia sido plantada nos corações de ambos e que agora era apenas uma questão de tempo até que Gabriel cedesse ao que ela considerava inevitável. Enquanto ajustava seu vestido preto e passava um batom vermelho nos lábios, ela enviou uma mensagem simples, mas cheia de insinuações. — Preciso falar com você. Pode passar aqui? Gabriel leu a mensagem e hesitou. Sabia que deveria ignorá-la, mas a insistência de Clara e o turbilhão de emoções que sentia o fizeram responder. — Está bem. Chego em 20 minutos. O caminho até o apartamento de Clara parecia mais longo do que o habitual. A cada esquina, Gabriel lutava contra a vontade de dar meia-volta. Não sabia por que estava indo. Talvez fosse para esclarecer as coisas, talvez para colocar um ponto final naquela confusão. Quando chegou, Clara já estava esperando por ele, parada na porta. — Entre, por favor. — Sua voz era doce, quase inocente. O apartamento estava iluminado por velas, um ambiente cuidadosamente planejado para parecer casual, mas que exalava sedução. Clara ofereceu uma taça de vinho a Gabriel e o conduziu até o sofá. — Espero que não se importe com o vinho — disse, sentando-se ao lado dele. — Precisava relaxar depois de um dia tão cansativo. Gabriel aceitou a taça, mas manteve certa distância. — O que você queria falar? Clara suspirou, fingindo vulnerabilidade. — Eu só queria agradecer por tudo, Gabriel. Você tem sido tão atencioso comigo, tão presente. Não sei como estaria lidando com tudo sem você. Gabriel balançou a cabeça, desconfortável com o tom dela. — Clara, acho que você está interpretando as coisas de maneira errada. Só estou tentando ser um amigo. Ela se aproximou um pouco mais, colocando a mão suavemente sobre o braço dele. — Eu sei. E é exatamente isso que me faz admirar tanto você. Gabriel tentou se afastar, mas o toque de Clara parecia prendê-lo. — Clara, eu sou casado. Ela inclinou a cabeça, como se estivesse avaliando-o, e depois sorriu, um sorriso que misturava tristeza e desejo. — Casado, mas infeliz. Eu vejo isso, Gabriel. Vejo como você está distante, como sente falta de algo. As palavras dela atingiram Gabriel como um golpe. Ele sabia que ela estava errada, mas ao mesmo tempo não podia negar que algo em sua relação com Laura havia mudado. O silêncio, as dúvidas, o peso do cotidiano – tudo isso o fazia questionar. — Você está enganada. Eu amo Laura — disse, mas sua voz não tinha a firmeza que esperava. Clara aproveitou a hesitação e inclinou-se mais perto. O perfume que usava era doce, intoxicante, e a proximidade fez com que Gabriel se sentisse vulnerável. — Então por que você está aqui? Gabriel não tinha uma resposta. A verdade era que nem ele sabia. Antes que pudesse reagir, Clara se aproximou ainda mais, tocando levemente o rosto dele. — Você merece ser feliz, Gabriel. O beijo aconteceu antes que ele pudesse impedir. Foi breve, mas carregado de uma intensidade que o fez esquecer de tudo por um instante. Quando Clara se afastou, Gabriel parecia acordar de um transe. Ele levantou-se abruptamente, derrubando a taça de vinho no processo. — Eu... eu preciso ir. Clara não tentou impedi-lo. Apenas o observou sair, um sorriso satisfeito nos lábios. Sabia que havia quebrado algo dentro dele e, por consequência, dentro do relacionamento com Laura. Gabriel dirigiu de volta para casa em um estado de confusão total. Sua mente era uma mistura de culpa, raiva e vergonha. Não conseguia acreditar no que havia acontecido, e pior, não sabia como lidar com isso. Quando chegou em casa, encontrou Laura já na cama, mas claramente acordada. — Você demorou — disse ela, sem olhar para ele. Gabriel hesitou antes de responder. — Tive muito trabalho no escritório. Laura não respondeu. Apenas virou-se para o outro lado, mas as lágrimas que escorriam silenciosamente por seu rosto denunciavam que ela sabia que algo estava errado. Nos dias seguintes, a tensão entre eles se tornou quase palpável. Gabriel evitava Laura, consumido pela culpa, enquanto ela se distanciava cada vez mais, afogada em inseguranças e suposições. Clara, por sua vez, não se deu por satisfeita. Continuou enviando mensagens a Gabriel, tentando atraí-lo novamente, enquanto insinuava para Laura que ele estava escondendo algo. Foi numa manhã de sábado que Laura finalmente confrontou Gabriel. Estavam na cozinha, o silêncio entre eles quebrado apenas pelo som da cafeteira. — Gabriel, preciso perguntar algo — disse ela, com a voz trêmula. Ele olhou para ela, já sentindo o estômago se revirar. — O que foi? — Você está me traindo? A pergunta pairou no ar como uma sentença. Gabriel não sabia o que responder. Se negasse, estaria mentindo. Se confessasse, sabia que poderia perder Laura para sempre. — Eu... — começou, mas foi interrompido pelo toque do celular de Laura. Era uma mensagem de Clara. — Talvez você deva ler isso — disse Laura, entregando-lhe o aparelho. A mensagem de Clara era clara e direta: — Espero que você tenha tido coragem de contar tudo a Laura. Ela merece saber a verdade. Gabriel sentiu o chão desaparecer sob seus pés. Tudo estava desmoronando, e ele sabia que a culpa era dele. — Laura, me escute... — Não! — gritou ela, levantando-se. — Você realmente fez isso? Depois de tudo o que construímos, depois de tudo o que passamos juntos, você jogou tudo fora por ela? Gabriel tentou se aproximar, mas Laura recuou. Suas lágrimas agora eram de dor e raiva, um reflexo do coração partido que ela não sabia como consertar. — Foi um erro — disse ele, desesperado. — Eu não sei o que aconteceu. Foi só um momento de fraqueza. — Fraqueza? — repetiu ela, incrédula. — Você destruiu nosso casamento por fraqueza? Laura saiu da cozinha, deixando Gabriel sozinho com sua culpa. Ele sabia que, independentemente do que dissesse ou fizesse, o dano estava feito. E Clara, do outro lado da cidade, comemorava silenciosamente sua vitória. O que antes era um amor aparentemente inabalável agora estava despedaçado, e ela havia conseguido exatamente o que queria. No entanto, o que Clara não sabia era que Laura não era do tipo que se rendia facilmente. Embora estivesse ferida, algo dentro dela começava a se mover. A suspeita que antes havia apenas tocado a superfície agora mergulhava mais fundo, em busca de respostas. Ela não sabia ainda, mas aquela traição não seria o fim de sua história com Gabriel – apenas o começo de algo muito maior.O silêncio pairava pesado na casa de Laura e Gabriel, como se as paredes absorvessem a tensão que os envolvia. Desde a revelação da traição, o casal vivia sob o mesmo teto, mas era como se um abismo os separasse. Gabriel tentava encontrar formas de se redimir, mas Laura permanecia fechada, protegendo-se da dor que ainda pulsava dentro dela.Laura havia se mudado para o quarto de hóspedes. O espaço pequeno e neutro contrastava com a intimidade do quarto principal, onde tantas memórias felizes haviam sido construídas. Agora, aquele espaço parecia um santuário que ela não podia mais habitar. Ela se agarrava a pequenos rituais para manter a sanidade: preparar chá todas as noites, organizar gavetas que antes ignorava, ler livros que a distraíam momentaneamente da dor.Gabriel, por outro lado, vagava pela casa como uma sombra. Ele passava horas no escritório, olhando para a tela do computador sem realmente trabalhar. O arrependimento era um peso que o sufocava, mas ele não sabia como expres
Laura olhava pela janela do pequeno quarto na casa de Ana, observando a chuva deslizar pelo vidro. A tempestade parecia ecoar o turbilhão de sentimentos que a assolava desde o momento em que saíra de casa. As memórias do que antes fora um lar feliz agora se tornavam um peso insuportável, assombrando cada pensamento. A casa que compartilhara com Gabriel parecia um cemitério de sonhos, e cada detalhe que antes trazia alegria agora era um lembrete cruel de sua dor.Ana, sempre atenta, entrou no quarto com duas xícaras de chá. “Pensei que isso poderia ajudar,” disse ela suavemente, colocando a xícara ao lado de Laura. Embora a presença da amiga fosse reconfortante, Laura sentia que uma parte essencial de si mesma estava perdida.As noites eram as piores. Laura passava horas revivendo os momentos felizes que tivera com Gabriel: as risadas, os planos para o futuro, os pequenos gestos de carinho que antes pareciam tão naturais. Agora, tudo parecia uma mentira. Mais do que a traição, o que a
Gabriel caminhava lentamente pelas ruas do bairro onde ele e Laura haviam construído tantos sonhos juntos. As folhas das árvores, agora tingidas de tons outonais, caíam suavemente no chão, como um reflexo silencioso do caos em sua mente. Ele não sabia como chegara àquele ponto, mas a culpa que carregava era insuportável. Cada passo parecia ecoar em sua consciência, um lembrete constante de suas falhas.Desde que Laura partira, Gabriel sentia como se estivesse vivendo em um limbo. O vazio deixado por sua ausência era maior do que ele imaginava possível. Não era apenas a falta de sua presença física, mas também a perda de sua risada, do calor de sua voz, e até mesmo das pequenas discussões sobre coisas triviais. Ele sentia falta de tudo — de Laura e, principalmente, de quem ele era quando estava com ela.Naquela manhã, Gabriel acordara cedo, como fazia todos os dias desde a separação. Não conseguia mais dormir até tarde; a insônia e os pensamentos incessantes o arrancavam do sono antes
Naquela manhã, Laura sentia o peso de um mundo que parecia desabar sobre seus ombros. As evidências sobre Clara estavam todas ali, dispersas em sua mente como peças de um quebra-cabeça que ela precisava montar. Gabriel estava distante, mas, pela primeira vez em semanas, ela sentia uma centelha de determinação em seu coração. Sentada no sofá da sala, o silêncio era interrompido apenas pelo leve estalar do relógio na parede. Era hora de agir.— Preciso entender o que realmente aconteceu — murmurou para si mesma, enquanto relia as mensagens e lembrava das atitudes que antes pareciam inocentes, mas agora carregavam um novo significado.A busca pela verdade a levou a vasculhar memórias, mensagens antigas no celular e até mesmo áudios esquecidos. Foi então que ela encontrou algo que parecia pequeno, mas era revelador: uma troca de mensagens entre Clara e Gabriel, repleta de ambiguidades. A frase "Ela nunca saberá" ecoou em sua mente como um alerta.Horas depois, decidiu ligar para Clara, co
O peso do confronto com Clara ainda pairava sobre Laura, mas de uma forma estranhamente libertadora. Pela primeira vez em semanas, ela sentia que tinha o controle de sua vida novamente. A dor da traição ainda era uma presença constante, mas algo havia mudado: agora havia uma trilha, ainda que incerta, para seguir em frente.Gabriel parecia perceber isso também. Desde a noite em que Laura voltou do confronto com Clara, ele demonstrava mais esforço em reparar os danos causados. Pequenos gestos, como preparar o café da manhã ou oferecer ajuda com as tarefas diárias, tornaram-se frequentes. Contudo, Laura sabia que gestos cotidianos não seriam suficientes. Ela precisava de algo mais, algo que provasse que Gabriel estava realmente comprometido em reconquistar sua confiança.Naquela manhã, enquanto Laura organizava alguns papéis em seu escritório em casa, Gabriel entrou, hesitante, com um envelope em mãos.— Laura, posso falar com você?Ela olhou para ele, colocando os papéis de lado.— Cla
O peso do confronto com Clara ainda pairava sobre Laura, mas de uma forma estranhamente libertadora. Pela primeira vez em semanas, ela sentia que tinha o controle de sua vida novamente. A dor da traição ainda era uma presença constante, mas algo havia mudado: agora havia uma trilha, ainda que incerta, para seguir em frente. Gabriel parecia perceber isso também. Desde a noite em que Laura voltou do confronto com Clara, ele demonstrava mais esforço em reparar os danos causados. Pequenos gestos, como preparar o café da manhã ou oferecer ajuda com as tarefas diárias, tornaram-se frequentes. Contudo, Laura sabia que gestos cotidianos não seriam suficientes. Ela precisava de algo mais, algo que provasse que Gabriel estava realmente comprometido em reconquistar sua confiança. Naquela manhã, enquanto Laura organizava alguns papéis em seu escritório em casa, Gabriel entrou, hesitante, com um envelope em mãos. — Laura, posso falar com você? Ela olhou para ele, colocando os papéis de lado.
A viagem ao litoral havia deixado Laura e Gabriel em um terreno emocionalmente frágil, mas promissor. Eles haviam compartilhado momentos de honestidade e reconexão, mas a mensagem de Clara, vista por Laura na última noite, pairava como uma sombra sobre seus pensamentos.De volta à cidade, o silêncio entre eles era mais pesado do que nunca. Gabriel parecia alheio à tensão crescente de Laura, mas ela não conseguia ignorar a sensação de que Clara ainda exercia alguma influência sobre ele.No dia seguinte ao retorno, enquanto Gabriel estava no trabalho, Laura decidiu agir. Pegou seu celular e, com hesitação, abriu a última mensagem de Clara que Gabriel havia recebido."Espero que tenha pensado bem. Nosso encontro ainda está de pé. Amanhã, às 20h, no mesmo lugar."Laura sentiu um nó no estômago ao ler as palavras. Sem saber se Gabriel havia respondido ou se planejava ir, ela decidiu que não podia esperar por mais mentiras. Dessa vez, ela seria a responsável por confrontar Clara e pôr um fi
Serenità era mais do que uma cidade pequena e charmosa; era um santuário de histórias que pareciam ter saído de um romance. Com suas ruas de paralelepípedo ladeadas por flores coloridas, os cafés aconchegantes e os jardins que exalavam o perfume suave de rosas e jasmim, o lugar parecia existir para acolher amores e sonhos. Naquele final de tarde, a brisa suave trazia consigo uma promessa de celebração. Laura, uma mulher de 28 anos, estava no jardim de sua casa, finalizando os preparativos para a festa surpresa de Gabriel, seu marido. Cada detalhe tinha sido cuidadosamente pensado: as luzes penduradas nos galhos das árvores, as mesas decoradas com toalhas de linho branco e arranjos florais feitos por ela mesma, e as velas dispostas em lanternas de vidro, que piscavam suavemente enquanto o crepúsculo se aproximava. Ela acreditava que o amor estava nos detalhes, e queria que Gabriel sentisse isso em cada canto daquela noite. Enquanto ajustava os últimos toques, Laura olhou para o relóg