IV. Sussurros da noite

O quarto estava imerso na penumbra quando Serena acordou de sobressalto, o coração disparado como se tivesse corrido quilômetros. Sua respiração estava irregular, e demorou alguns segundos para que percebesse onde estava: em sua cama, envolta pelo calor dos cobertores, sua casa ainda mergulhada no silêncio da madrugada.

Mas o sonho ainda pulsava em sua mente.

Ela se lembrava de estar na floresta, envolta por uma névoa densa que escondia as sombras ao seu redor. No meio da névoa, um par de olhos brilhantes a observava. Um lobo, majestoso e imponente, de pelagem escura como a noite. Ele não parecia ameaçador, mas sua presença era intensa, quase sufocante. Os olhos prateados perfuravam a escuridão, fixando-se nela com um reconhecimento silencioso. Serena queria se mover, correr ou ao menos falar, mas estava paralisada.

Então, ele avançou um passo, e tudo ao seu redor desapareceu.

O sonho ainda pairava sobre sua mente quando ela olhou o relógio ao lado da cama: 4h13 da manhã. Suspirando, passou a mão pelo rosto e tentou afastar a sensação estranha que ainda pesava sobre ela. "Foi só um sonho", repetiu para si mesma, mas a inquietação persistia.

Sem conseguir voltar a dormir, acabou se levantando antes do despertador tocar.

Serena sempre gostou de manhãs calmas. Depois de uma ducha quente, vestiu um suéter confortável e preparou seu café, o aroma forte preenchendo sua pequena cozinha. Seus movimentos eram automáticos enquanto torrava um pão e passava geleia por cima, sentindo-se, por alguns minutos, confortável em sua rotina.

Apesar do que acontecera no dia anterior, ela não queria se perder em paranoias. Seu instinto dizia para manter distância de Dominic, e ela planejava ouvir essa voz interior.

No caminho para o trabalho, Serena colocou os fones de ouvido e observou a cidade através da janela do ônibus. Pembrokeshire tinha um charme antigo, com ruas de paralelepípedo e cafés aconchegantes espalhados entre as construções históricas. Era um lugar tranquilo, e Serena sempre gostara disso.

Ao chegar ao escritório, cumprimentou os colegas com um sorriso sincero. Se havia algo que a definia além de sua desconfiança natural, era sua gentileza. Sempre fora alguém disposta a ajudar, a ouvir, a oferecer um ombro amigo. Mas, nos últimos dias, a tensão a deixara fechada. Agora, tentaria recuperar um pouco do seu normal.

— Dormiu melhor? — Laura perguntou, olhando-a de canto enquanto organizava algumas pranchetas sobre a mesa.

Serena hesitou por um segundo antes de responder:

— Mais ou menos... tive um sonho estranho.

Laura arqueou a sobrancelha, curiosa.

— Com o alfa misterioso?

— Não! — Serena respondeu rápido demais, e Laura riu.

— Então era o quê?

Serena bufou, mas acabou cedendo.

— Um lobo. Negro, com olhos prateados. Estava na floresta, só me observando.

Laura franziu o cenho.

— Bom... isso parece um aviso. Ou um presságio.

— Ou apenas um sonho aleatório — Serena rebateu, pegando sua caneca de café. — Nem tudo tem um significado místico.

Mas, no fundo, não tinha tanta certeza.

Laura era uma ômega de uma pequena matilha local, alguém que Serena conhecia há 2 anos, desde seu primeiro dia naquela escritório e que considerava uma amiga confiável. Dona de cabelos loiros volumosos que caíam em ondas suaves sobre os ombros e olhos cor de oliva sempre brilhando com curiosidade, ela tinha um jeito extrovertido e acolhedor que fazia qualquer um se sentir à vontade ao seu lado. Embora evitasse se envolver em assuntos complicados, Laura era observadora e já havia captado parte da conversa entre Serena e Dominic no dia anterior. Sua expressão carregava uma mistura de preocupação e diversão, como se quisesse apoiar a amiga, mas ao mesmo tempo não perdesse a chance de provocar um pouco.

O expediente transcorreu normalmente. Serena se sentiu grata por ter algo concreto em que se concentrar. Projetos, cálculos, revisões. Algo que fazia sentido, ao contrário das incertezas que pairavam sobre sua vida nos últimos dias.

Quando o dia terminou, Laura sugeriu que fossem a um bar próximo para relaxar, e Serena aceitou.

Era bom se sentir normal novamente.

O pub estava cheio, mas não lotado. A iluminação amarelada e a música suave criavam um ambiente agradável. Serena e os colegas se sentaram a uma mesa próxima à janela, pediram cervejas e começaram a conversar sobre coisas triviais: o chefe rabugento, clientes exigentes, viagens que gostariam de fazer.

Serena riu quando um dos colegas, Ethan, contou uma história desastrosa sobre como queimou uma torta de aniversário e quase incendiou a cozinha.

— Você não deveria nem ser autorizado a cozinhar! — Laura brincou.

— Eu já aprendi a lição, tá bom? Compro bolos prontos agora! — Ethan ergueu as mãos em rendição, e todos riram.

Serena se sentia bem. Pela primeira vez em dias, sua mente não estava cheia de perguntas sem resposta.

Já passava das onze quando ela decidiu ir embora. Se despediu dos amigos e saiu do pub, sentindo o ar frio da noite envolvê-la.

O caminho até sua casa não era longo, e a rua estava silenciosa àquela hora. Apenas o som distante das ondas e o farfalhar das árvores preenchiam o espaço.

Ela caminhava tranquilamente quando sentiu.

Aquela sensação.

A mesma que sentira na noite anterior.

Seu corpo enrijeceu, os instintos alertas.

Serena olhou discretamente ao redor. A rua parecia normal, mas algo estava errado. O ar estava carregado, como se ela estivesse sendo observada.

Engolindo em seco, apertou o passo.

Foi quando ouviu.

Um barulho sutil atrás dela, como se alguém—ou algo—se movesse entre as sombras.

Ela parou abruptamente e se virou, o coração martelando no peito.

Nada.

A rua estava vazia.

Tentou rir de si mesma, mas o som não saiu. Respirando fundo, forçou-se a continuar andando, repetindo mentalmente que era só paranoia.

Mas então, no limite da floresta, algo se mexeu.

Uma sombra, rápida demais para ser um animal comum.

Serena sentiu um arrepio percorrer sua espinha.

Sem pensar duas vezes, apertou ainda mais o passo, quase correndo até sua casa. Assim que trancou a porta atrás de si, encostou-se nela, tentando acalmar a respiração acelerada.

Seus olhos foram até a janela.

Nada.

Mas, dessa vez, ela tinha certeza: não era paranoia.

Havia algo—ou alguém—a seguindo.

E, pela primeira vez, Serena começou a se perguntar se Dominic estava certo.

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