Emily Woody
No silêncio da noite, despertei de repente. O calor à minha frente me fez gelar por dentro. Meu nariz encostou em algo, ou melhor, em alguém. Um corpo quente. Ele se mexeu com um gemido rouco, e um aroma profundamente masculino invadiu meus sentidos. Deus! O que eu fiz?
Virei-me devagar, sentindo o coração acelerar. Os olhos piscavam, tentando se adaptar à luz fraca que atravessava as cortinas do quarto. Cama macia. Lençol de... seda? Meu Deus. Tudo era diferente.
O ar se tornou pesado. Um suspiro trêmulo escapou dos meus lábios enquanto olhava ao redor. Meu olhar pousou na figura ao meu lado. Um homem dormia profundamente, de costas para mim. Seu ombro largo e nu estava exposto, e o tecido fino de sua cueca branca mal escondia o contorno perfeito de seu corpo. As pernas fortes, cobertas por pelos, indicavam poder. Meu Deus, o que aconteceu aqui?
A respiração falhava enquanto eu apalpava meu próprio corpo. Calcinha e sutiã de renda branca. Será que... Fizemos sexo? Não... isso não faz sentido. Se fosse o caso, eu estaria sem roupa, e... sangraria. Virgens sangram, não é? Meu coração batia descompassado.
As lembranças voltavam em flashes embaralhados. A festa de Raquel. Vodca atrás de vodca. Risos. Ele. O homem ao meu lado. Conversávamos no balcão. Um sorriso, um olhar mais demorado... Eu me insinuei para ele?
Não importa o que aconteceu, eu precisava sair dali. A vergonha era insuportável. Com cuidado, escorreguei as pernas para fora da cama, pegando meu vestido e me trancando no banheiro. Troquei-me apressada, ignorando o reflexo no espelho. Quando saí, movi-me com passos leves, o carpete abafando os ruídos. Peguei minha bolsa e sandálias e saí da suíte luxuosa.
O amanhecer tingia o céu quando entrei no táxi. Um suspiro escapou. Em casa, no conforto do meu banheiro, tomei um banho quente, tentando lavar a noite passada do corpo e da alma.
Deus, o que deu em mim? Dizem que o álcool revela aquilo que escondemos, mas... isso não pode ser verdade. Eu não sou assim. Não era. Aquilo foi pela dor, pela humilhação de Henrique. Lembrei-me da traição, do sorriso cínico dele, da falsidade de Zoe. O peito apertava, mas eu respirei fundo. Chega. Chega de sofrer.
Vesti um robe branco e sentei-me na cama, ainda tentando organizar os pensamentos. Foi quando minha mãe apareceu à porta, um olhar curioso no rosto.
—Emily? —a voz dela era suave, mas carregada de preocupação. —Por que não ficou na casa de Letícia? Chegou cedo, não acha?
Forcei um sorriso, tentando soar casual.
—Ah, o irmãozinho dela é muito chato. Resolvi voltar pra casa. Estou cansada.
Ela se aproximou, sentando-se ao meu lado. —E como você está? —a pergunta era sobre Henrique, claro.
Pensei em mentir, mas acabei respondendo com sinceridade. —Estou bem, mãe. De verdade. Ele... ele foi riscado do meu coração. Não vou mais sofrer por ele.
Ela sorriu, satisfeita. —Eu sabia. Sabe, filha, acho que você nunca amou Henrique de verdade.
A frase me pegou de surpresa. Fiquei encarando-a, confusa.
—Como assim? Eu amava, sim! Quando ele voltava de viagem, eu ficava... sei lá, parecia um cachorrinho abanando o rabo!
—Isso não é amor, Emily. Você gostava dele porque era confortável, divertido. Mas amor? Se fosse, vocês já estariam falando de casamento.
Abri a boca para rebater, mas as palavras dela começaram a fazer sentido. Henrique nunca foi prioridade para mim, e talvez eu também não tenha sido para ele.
—O que você sentiu foi mágoa pela traição. Mas, no fundo, Zoe te machucou mais do que ele. E quer saber? Ela te fez um favor. Foi o empurrão que você precisava para enxergar quem ele realmente era.
Revirei os olhos, tentando encerrar a conversa. —Tá bom, mãe, sem lições de moral, por favor.
Ela riu e apertou minha mão. —Só vou dizer mais uma coisa: quando você realmente amar alguém, saberá. Não vai se contentar com beijinhos e amassos. Vai querer tudo. E, provavelmente, já estará tomando anticoncepcional.
Corei na hora, o rosto queimando com suas palavras. De repente, o pensamento voltou para o homem da noite passada. O beijo dele. Meu coração disparou. Foi bom porque eu estava bêbada ou porque ele realmente era especial?
A dúvida ecoava em minha mente, mas uma coisa era certa: essa noite seria lembrada, mesmo que eu quisesse esquecer.
— Sua tia gostou tanto da ceia de Natal. Ela nem acreditou quando contei que encomendei tudo! — diz minha mãe, rindo enquanto tenta mudar de assunto.Desvio meus pensamentos daqueles olhos negros que ainda me assombram e respondo, meio automática:— Estava tudo uma delícia.— Filha, por que você não vai conosco para a casa da sua tia no Ano Novo? Ela quer retribuir. Vai ficar chato você não ir.Suspiro, já esperando essa conversa.— Mãe, já falamos sobre isso. Não fica chato nada! Além disso, enfrentar horas de viagem, pegar trânsito, para ficar só dois dias lá? Nem pensar. E, lembre-se, dia quatro eu volto a trabalhar. Minhas férias já acabaram.Ela hesita, como se não quisesse insistir, mas consigo ver a preocupação no olhar dela.— Não sei se terei coragem de ir e deixar você sozinha aqui.Fungo discretamente, tentando não revirar os olhos. Sei que ela quer ir. Sempre gostou de estar com a família, e eu não a culpo por isso. De repente, a imagem de Kayra surge na minha mente. Minha
Consegui dormir um pouco e me levanto por volta das dez. Na sala, encontro papai lendo o jornal no sofá de dois lugares. Inclino-me para beijá-lo no rosto.— Bom dia. Como foi a festa?Desvio o olhar e me jogo no outro sofá.— Foi boa.Ele franze a testa, desconfiado.— Hum, esse "foi boa" não me convenceu.Sorrio para ele, tentando mudar de assunto.— Mamãe falou com o senhor sobre o Ano Novo?— Falou. Você tem certeza que vai ficar bem?Reviro os olhos, rindo.— Pai, se tem um lugar onde vou estar bem, é na casa da Kayra. Ela segue costumes super rígidos. Para você ter uma ideia, para ela namorar, o rapaz precisa ser aprovado pelo pai e pelo irmão. Então estarei segura com eles.Meu pai ri, aprovando.— Eles é que estão certos! Se tivéssemos feito isso, você não teria quebrado a cara com aquele idiota do Henrique.Minha expressão muda. O nome dele ainda é uma ferida. Ninguém gosta de ser traída, mesmo por um idiota.— Nem vem com essa conversa! Deus me livre o senhor ter que aprovar
Hampstead é um bairro de sonhos. As ruas largas e arborizadas são um convite ao encanto, com mansões majestosas que parecem competir entre si em beleza. Cada detalhe do lugar exala sofisticação e um ar quase intocável. Uma pontada de insegurança me atravessa: será que vou me sentir confortável em um ambiente tão elegante?Respirei fundo. Preparei minha mala com antecedência, escolhendo cuidadosamente minhas melhores roupas. Mamãe fez questão de me levar às compras, ajudando-me a escolher um vestido longo de cetim branco especialmente para a festa de Ano Novo. Para completar, ela insistiu em emprestar suas joias de família, um conjunto de colar e brincos de ouro com delicadas esmeraldas incrustadas. Quero causar uma boa impressão e, acima de tudo, não parecer deslocada.Ao me aproximar da mansão, o segurança verifica minha identidade com atenção antes de abrir os portões. Quando o carro avança pelo caminho de paralelepípedos, me pego admirando a propriedade. Magnífica seria uma descriç
Ômer surge na porta, sua presença carregada de um magnetismo inegável. Ele lança um olhar intenso na minha direção, o tipo de olhar que parece enxergar mais do que deveria.—Falando mal de mim? —pergunta, o tom descontraído, mas os olhos atentos.—Não, claro que não. Só falando bem —responde Kayra, sorrindo de maneira inocente.—Ah, não sei não —ele retruca com uma leve provocação.Sem cerimônia, Ômer se senta ao lado de Kayra, mas seus olhos continuam fixos em mim, me examinando com uma curiosidade desarmante.—Vocês se conheceram aonde? —ele pergunta, casual, mas atento.—Fazemos universidade juntas, mesmo curso e mesma turma —respondo, tentando manter a compostura.Ele pega um salgado da mesa e o morde lentamente, ainda sem desviar o olhar.—Você só estuda?—Sou bancária —respondo, tentando manter a conversa neutra.—Que banco?—No Royal.Os olhos dele se estreitam ligeiramente, como se algo se encaixasse em sua mente.—Por isso você não me é estranha. Eu tenho conta lá. Acho que t
Respiro fundo, afastando os pensamentos. Não posso me dar ao luxo de parecer vulnerável agora.—Mais alguma coisa? —pergunto, voltando ao tom prático.—Não, senhor.—Então está dispensada. Vá para casa e aproveite a virada do ano com sua família. Ah, e feliz ano novo.Ela sorri, surpresa com minha atitude.—Obrigada. E o senhor? Vai para casa também?— Não é de se admirar que o Réveillon neste hotel é uma das festas mais bem faladas....Eu sorrio me sentindo muito bem com isso. Tem que ser mesmo, eu praticamente respiro trabalho. —Sim, é verdade.—Então Feliz ano novo para o senhor.O escritório está silencioso agora, e o eco das palavras da minha secretária ainda ressoa na minha mente. "Feliz ano novo para o senhor." Ela saiu, mas sua despedida me deixa pensativo. Olho para a parede à minha frente, mas o que vejo é outra coisa. Memórias invadem, imagens que não consigo apagar.Hoje cedo, andando pelo hotel, observei algo que me desestabilizou. De trás de um aparador no restaurante,
Quando volto, respiro fundo e tento me recompor. Ainda assim, basta um pensamento sobre a cena para o riso quase escapar novamente.Depois do almoço, nos reunimos na sala, e eu, incapaz de me conter, comento sobre o episódio da faca. Kayra, com o humor que só ela tem, explica que é uma superstição turca. “Nunca se deve entregar uma faca diretamente para outra pessoa. O certo é colocá-la na mesa, e a outra pessoa a pega. Se for entregue diretamente, a pessoa deve cuspir nela para evitar brigas futuras.”Rimos juntas, mas logo nossa atenção é desviada pelo movimento na casa. Homens uniformizados entram carregando enormes buquês de flores do campo.— Deus! Essas flores custam uma fortuna nessa época do ano! — digo, com os olhos arregalados.— Tudo isso é para os preparativos do Ano Novo? — pergunto, sentindo uma ansiedade crescente. Quantas pessoas estarão nesta festa?— Sim, mas não se preocupe. Está tudo sob controle. Elma, nossa governanta, organiza tudo todos os anos. Que tal descansa
Restaram-me duas alternativas: ou ele era um homem decente, que não quis se aproveitar de mim naquele estado, ou simplesmente não me achou atraente.Deus! Que loucura.Sinto uma mistura de culpa e vazio. Culpa por desejar tanto alguém que mal conheço, e vazio porque o cara era... perfeito. Lindo de um jeito quase perigoso. Era exatamente o tipo de homem pelo qual eu me entregaria sem hesitar.Minha mãe sempre dizia: “Filha, controle-se! Nada de passar dos beijinhos e amassos.” Mas sejamos sinceros: com ele? Isso seria um desafio colossal. Claro, como a boa garota certinha que sou, eu o conheceria antes, talvez por dez encontros inteiros, mantendo tudo no limite.Dez encontros. Pimba!O pensamento faz meu corpo esquentar. É como se pegasse fogo só de lembrar daquele estranho.A memória vem viva na minha mente: que bumbum! Que pernas firmes, ombros largos e aquele sorriso... Ah, aquele sorriso! Ele poderia derreter a pessoa mais racional do mundo.Dez encontros mesmo? Rio, sabendo que s
Ofego enquanto ele caminha lentamente na minha direção, cada passo dele ressoando no chão como o eco de um destino iminente. Sinto-me pequena, como uma presa encurralada diante de um predador implacável. Não, ele não é um urso... É um leão, imponente, de olhos cravados na caça, com presas afiadas prontas para dilacerar.Ele para à minha frente, tão próximo que sinto o calor de sua presença avassaladora. Seu rosto sério e respiração pesada me atingem como uma onda, e o silêncio entre nós é sufocante, tão denso que parece roubar o ar dos meus pulmões. Meu coração, já disparado, tropeça em desespero quando ele avança um passo, aproximando-se como quem tem o controle absoluto da situação. Instintivamente, recuo, minhas costas se chocando contra a porta.O sorriso que surge em seus lábios não é acolhedor; é frio, predatório. Seus olhos, gélidos e fixos nos meus, carregam uma intensidade que me faz estremecer. Ele inclina o rosto, invadindo o espaço que restava entre nós. Meu coração dá um