Abro os olhos devagar os sentindo arderem com a claridade do sol no meu rosto, tento levantar e a cabeça dói. Enche a cara, toma um porre de novo, idiota.
Jogo novamente a cabeça no travesseiro, o corpo sobre colchão e gemo de dor segurando a cabeça com as mãos como se isso fosse ajudar a minha cabeça a parar de doer. — Que merda… ah… — Resmungo em um gemido de dor não conseguindo nem ao menos abrir os olhos. Tento levantar da cama devagar e quando olho para o criado mudo ao lado da cama, vejo um copo de água com uma cartela de remédios em cima dando aquele ar carinhoso. Ergui uma sobrancelha, fiquei confusa e sem entender, mas apenas tiro o comprimido da cartela e o engulo com auxílio da água esperando que minha dor passe. Checo a hora em meu relógio de ponteiros em cima do criado mudo vendo que já está bem tarde, não é hábito meu acordar assim tão tarde. Piso com os pés quentes no chão gelado e caminho escadas abaixo sentindo cheiro de panquecas vindo da cozinha. Meu estômago ronca com o cheirinho doce quando consigo imaginar o sabor da massa quentinha com mel e minha boca enche de água. — Jenifer! Por que não me acordou? Eu tenho consulta hoje com o médico! — Dou passos mais ligeiros até à cozinha sentindo meu corpo estremecer pelo susto ao ver um homem desconhecido de costas para mim cozinhando no meu fogão, meu corpo reage admirando as costas largas e definidas marcando na camisa azul escuro. — Mas que porra… — Murmuro sem entender perdendo o combustível e parando de andar aos poucos ao final da escada. Olho para baixo e me vejo com as mesmas roupas que estava vestida quando saí ontem com a Jenifer, diminuo um pouco mais a nossa distância e me aproximo devagar como se ele fosse uma bomba relógio prestes a explodir na minha cara. Então aquele homem se vira para mim e meu corpo paralisa ao ver que se tratava daquele médico que me atendeu no hospital. Dou alguns passos para trás, me segurando em algo atrás de mim e o encaro assustada. — O que porra você está fazendo aqui? Como entrou, eu não sei, mas vai embora agora. — Ordeno apontando para a porta sentindo meu corpo estremecendo com o pavor de se sentir indefesa dessa forma com esse homem que tem três vezes o meu tamanho na minha casa, e que não está demonstrando nenhum interesse em ir embora, ao contrário, apenas sorri e volta a fazer as panquecas normalmente como se eu não estivesse falando nada. — Não me ouviu!? — Gritei para ver se assim ele me ouvia e via que eu estava falando sério. — Não se preocupe em perder a hora da sua consulta, afinal… o médico está na sua casa e eu posso te dar uma carona, garota. — Brincou rindo pelo nariz. — Onde está a Jenifer? O que aconteceu? Como você veio parar aqui? — Disparei diversas perguntas no peito dele. — A Jenifer é a amiga que levou você para aquela boate ontem a noite? — Ethan puxou uma das cadeiras da mesa enquanto colocava um prato de panquecas e ao lado mel sobre a madeira. — Ela mesma, por que? — Eu ainda estava na defensiva. — Você bebeu muito, e eu trouxe você para casa. Essa garota muito responsável, nem sequer notou sua ausência e até agora não mandou mensagem ou ligou para saber como você estava. — Ironizou comendo como se estivesse em casa e como se fosse o meu pai me dando bronca, isso me faz enrugar a testa confusa mas não falo nada sobre. — Tudo bem, não somos amigas próximas. Mas por que dormiu aqui? — Dei de ombros ainda de pé em frente à mesa. Ethan me olhou por uns segundos com o cenho franzido elegantemente e dei passos para trás colocando as mãos na cabeça. — Ai, meu Deus! — Rodei de um lado para o outro desesperada colocando as mãos na cabeça. — A gente não… não? — Virei novamente de frente para ele e intercalei a direção do meu indicador dele para mim em um gesto. — Calma… você não lembra? — Ele sorriu com os olhos e riu irônico consigo mesmo. — Ai, Deus. Deveria lembrar, quase quebramos aquela cama. O olhei com um frio no estômago, colocando a mão na cintura sem saber mais o que dizer ou como agir boquiaberta. Só pode ser brincadeira, eu não transei com o médico que estava me consultando, não… — Eu tenho namorado. E isso não era para ter acontecido, inclusive eu estava bêbada. — Balancei a cabeça negativamente ainda andando de um lado para o outro refletindo sobre as minhas atitudes. Eu dizer que tinha namorado era algo muito idiota, não sei mais se eu tinha. Tenho? Tenho sim, nenhum dos dois comunicou um para o outro sobre o término. Ethan começou a rir, riu enquanto eu o encarava com desprezo e indiferença. — Qual é a graça? — Que namorado deixa a namorada sair sozinha, ainda mais para uma boate de solteiros. — Comentou com o tom repreendedor e mandão. Acho que por ser mais velho ele se acha no direito de repreender as minhas atitudes e o que eu escolho para a minha vida. — É porque brigamos, e além disso, você não tem nada haver com isso. — O cortei. — Que animal o seu namorado é no jogo do bicho. — Murmurou em deboche. — Não vai comer? Era estranho, eu não conseguia agir normalmente. Só de pensar que transei adoidado com esse homem, e não lembro de nada me causa um misto de emoções que eu não sei decifrar. Mas olhando assim para o rosto dele com muita atenção, eu sinto. Ele não é assim, ele não se aproveita de garotas bêbadas. Dá para ver nos olhos dele o quanto ele é respeitoso. Principalmente, porque não foi embora pela manhã. Ele ficou, e ainda cozinhou. Um aproveitador não faria isso. — O que foi? — Ele questionou depois de segundos que estávamos nos encarando. — Você não me tocou, não é? Só está tirando uma com a minha cara, eu até estou vestida com a mesma roupa sem falta de nenhuma peça além dos saltos. — Puxei a cadeira e sentei para comer com ele já mais tranquila. Provável que ele me reconheceu e me trouxe para casa depois de eu ter feito muita besteira, é só um homem cuidadoso e super protetor. Não tem porquê se sentir ameaçada. — Eu poderia ser um estuprador discreto, você está de saia. Era só subir um pouquinho. — Piscou para mim com um sorriso descarado e me fez estreitar os olhos com o linguajar. “Era só subir um pouquinho”, é uma suposição. É, ele não me tocou. Afinal, por que ainda desconfiei que tivesse? Ele não parece ser um tarado, e nem tem necessidade disso. Ele sendo um médico muito renomado, loiro e de olhos azuis que pode ter quem quiser iria fazer algo assim? Outros talvez, há muitas pessoas ruins no mundo, mas não é o caso do Ethan, eu consigo ver nos olhos dele. — Não estou dolorida. — Retruquei um argumento colocando uma panqueca em um prato para mim e derramo mel sobre ela. — Não tenho cara de ser soca fofo? — Brincou e ficou me encarando, estreitei os olhos e depois de milissegundos percebi que ele estava flertando comigo, isso explicava o assunto tão sexual. Ele deveria estar constrangido com a minha queixa, deveria estar tentando de todas as formas se explicar e provar que não é um assediador. Mas está seguindo com o assunto sem temor, provavelmente ele sente que tem alguma chance ou que tem intimidade suficiente para isso. Isso me faz pensar que eu o beijei ou que tentei algo a mais, ou que fiz os dois. — É, tem razão. Tem mesmo. — Brinquei para cortar as asinhas dele enquanto tentava ficar séria com a cara que ele fez, mas era impossível. — Desculpa, mas você mereceu. — Me chateou você ter acreditado por tanto tempo que fodi você enquanto estava bêbada. — Resmungou levantando da mesa, indo até à pia. — Que linguajar. — Mordi a bochecha. — É o linguajar de babacas que se aproveitam de garotas indefesas. Levantei e caminhei atrás dele até à pia, coloquei meu prato lá quando acabei de comer e ri vendo ele me olhar curioso, então sorri de canto quando ele não estava vendo. — Fala logo, o que está querendo? — Questionei apoiando as costas na pia ao seu lado, o olhando enquanto ele mexia os pratos da pia para caber o dele e os preparava para lavar. Depois de alguns segundos ele me olha e meu corpo inteiro estremece com aquele mar de olhos. Literalmente, o olho dele é de um azul tão vivo que me hipnotiza. — Como? — Ethan me olha e questiona com o tom de voz mais baixo. — Ninguém faz uma gentileza assim atoa, o que você esperava em troca? — Segurei seu antebraço e Ethan olhou firme para a minha mão tocando a sua pele e me aproximo falando mais pertinho dele. — Mas o Senhor não é assim, não é, Doutor? Até porque, a nossa diferença de idade é considerável, porém… não se sinta culpado. Sou maior de idade. — Estava falando com aquele tom de voz de garota oferecida dos filmes tentando seduzir um homem rico e mais velho, mas esse personagem não combina comigo, porém… tinha que fazer isso, precisava que ele sentisse algo por mim, por mais que eu estivesse rindo muito por dentro, ser oferecida não faz parte da minha ética. Ele era bem maior que eu, os braços fortes e o tronco robusto que deixava a camisa colada em seu corpo, e que o faziam ficar tão ameaçador assim em minha frente. Ele é um homem feito, é evidente, é bem mais velho do que eu. Também é direto ao ponto, não esconde o olhar e nem o que sente, eu o vejo. Pode não falar por a boca, mas os olhos entregam tudo, o traem covardemente. Homens mais velhos com esse ar de maduro são tão mais atraentes, que chego a ficar com peso na consciência. Mas não é tão ruim para mim, se tivéssemos algo, seria ele quem se sentiria mais culpado, afinal, é o mais velho. — Ainda existem pessoas boas que fazem as coisas sem esperar nada em troca. — Me cortou voltando a lavar a louça e franzi o cenho admirada com a quase rejeição, me fazendo notar que ele é uma pessoa com princípios. — Ótimo, eu odiaria que tivesse um sociopata no mesmo ambiente que eu. — Retruquei sem olhá-lo mais nos olhos, depois caminho em direção às escadas, mas antes de subir olho para trás dando uma olhada nele. — Vou subir para me arrumar, se a ideia de irmos juntos ainda estiver de pé, eu aceito. Meu carro quebrou, por isso que fui com aquela idiota para aquela boate ontem. — Falei em um tom mais elevado para que ele pudesse ouvir a longa distância, e depois subi para o quarto.Sempre achei interessante o fato de como as coisas se encaixam, de como tudo é tão planejado e tão divino. Homens são grandes, rudes, fortes e indelicados, e se atraem por mulheres pequenas, fofas, sentimentais, delicadas, fracas - sem machismo - tão frágeis, e isso me encanta. As mulheres ficam tão pequenas e tão vulneráveis nos braços de um homem, pensando por um lado mais animal, isso soa até poético. É algo até desafiador sentir tanta vontade de apertar, segurar, tocar uma mulher com força e ser obrigado a se controlar para não machucá-la. Uma relação entre um homem e uma mulher é muito mais carnal do que podemos imaginar, eles se encaixam não só sexualmente. Tudo é extremamente planejado e projetado para um ser a completude do outro. — Sammy! — A chamei enquanto batia na porta do quarto, pois era ela quem estava reclamando que ia se atrasar, mas agora é ela quem está nos atrasando. Hipócrita. — Calma, Doutor Gunnar! — Gritou de dentro do quarto. — Calma? Vamos chegar atrasa
Entro no hospital caminhando diretamente para a fila de espera para se consultar com o Doutor, que por acaso e nem tão acaso assim, ontem estava esfregando aquele corpinho no meu e até me deu uma carona. Cruzo as pernas enquanto sentada na cadeira e esperava com os outros pacientes, vez ou outra dava uma olhada no resultado do meu exame de sangue para passar o tempo mas não é de se admirar que não funcionava muito. — Bom dia. — Ouço aquela voz grave, intrigantemente jovial e tão marcante. Ethan consegue ser um adulto, com essência de um jovem mas com comportamentos de adulto(com exceções as vezes). Ele estava vestindo um jaleco agora, o cabelo bem penteado e o cheiro masculino amadeirado era perceptível a longa distância. Os pacientes respondem ao seu “bom dia”, como sou a última da fila de assentos, ele passa por mim por último. Seu olhar se encontra com o meu, ele sorri com os olhos, e estica um lado da bochecha em um quase sorriso de canto me deixando com um frio na barriga e c
O vento batia no meu rosto enquanto dirigia, mas eu era capaz de sentir nada. Estava vazia, como se tivesse perdido a minha essência. Me sentindo suja, uma fraude. Meu pai sentiria vergonha de mim, sentiria nojo por a minha dúvida. Eu só estou confusa, é só isso, não é como se eu estivesse desonrando a vontade dele. É só que… seria melhor se eu não ficasse pensando nisso. O que estava acontecendo comigo? Onde estava a garota determinada que iniciou essa missão? Precisava encontrar respostas. E rápido. Antes que tudo se despedaçasse e eu acabasse acabando com tudo aquilo que construí para mim. Enquanto dirigia, minha mente divagava. Me lembrava de um dia quente de verão no parque, celebrando o meu aniversário de 8 anos com o meu pai. Já havia se passado um tempo desde que minha mãe havia nos deixado. O vazio ainda era insuportável, mas independente do que sentimos, a vida continua e o relógio não para de girar. Meu pai tentava preencher o espaço, mas a dor era palpável, eu não q
Existem duas vidas no corpo de um homem, e cada uma dessas vidas se dominam por si só. Uma dessas vidas domina a cintura para cima, e a outra da cintura para baixo, então é difícil controlar o incontrolável. Essa parte da cintura para baixo pensa por si só e quando coloca alguém na cabeça, não consegue mais tirar. Entende? Minha cintura para baixo quer a Sammy sem ligar para o resto, e a minha cintura para cima não quer querer, apesar de também querer intensamente. Cerro os punhos tentando ao máximo me controlar, mas afinal de contas, eu sou o médico. Eu que mando no meu próprio trabalho, e principalmente, pelo currículo impecável que entreguei, teoricamente eu sou um diamante dentro desse hospital. Tranco meu consultório, saio de fininho na ponta do pé indo até o estacionamento. Dou partida no carro e canto pneu pela estrada. Coincidentemente, o tempo achou um ótimo momento para cair uma tempestade de alagar as ruas, mas isso não parece nada para mim. Homens não pensam com a cab
O cansaço vem. Só consigo apertar os lençóis entre os dedos e respirar, por estar tão fraca que não consigo mais nem sequer gemer. Ethan beija meu rosto enquanto geme rouco, se movimentando contra mim com desespero enquanto segura o meu pescoço com uma força precisa. A cama range, dá saltos para cima e nos impulsiona a ficar dando pulinhos em cima dela. Cama de molas é ótima para quando estamos sozinhos em casa, porque é impossível conter barulho com uma dessa. Também acredito que o Ethan aprecia o fato de estarmos sozinhos. Respiração pesada, e gemidos chorosos. Gemidos abafados por nossas bocas que roçam, olhares sôfregos e o suor escorre dos nossos corpos nus roçando cada centímetro um no outro com facilidade por causa da umidade. Ethan me olha com aquele olhar escuro, cheio de mistério e ao mesmo tempo neutro. Mas chega a ser invocado, porque é como se conversássemos pelo olhar. Conexão via bluetooth e direta por cabo USB, se é que me entende. É incrível essa sensação,
Talvez eu estivesse enlouquecendo por passar tanto tempo sozinho, preciso de alguém para compartilhar a vida. Me sentindo exausto desse trabalho de médico, fico impaciente e o desânimo não vai embora. Aperto o botão da caneta um milhão de vezes ouvindo o barulhinho dela enquanto dezenas de pacientes esperam lá fora, mas meu ânimo não está me ajudando para começar a atendê-los. Tento me controlar, não sair enlouquecendo por qualquer coisa e principalmente por causa de uma garota. Vim para cá há pouco tempo, não imaginava que as mulheres latinas fossem tão marcantes, porque sinto que não há mais nada na vida além daquela garota. Por que eu vim para cá? Bom… no meu último estilo de vida em outro lugar bem longe daqui, fui meio que obrigado a fugir para cá, sabe? Quer saber o motivo? Vamos lá. Eu dirigia pelas ruas chuvosas até em casa, estacionei o carro e subi as escadas indo até o meu quarto. Passei pelo Bille, um idiota que cuida do irmão doente que precisa de ajuda, até mesm
Ouço meu celular tocar, o pego na mão, dou uma olhada na tela e mordo o lábio em desespero ao ver que se tratava de uma ligação de Eric. Apesar de tudo, eu era obrigada a atender. — Fala. — Fui direto ao ponto sem muita simpatia. — Podemos nos ver? — Seu tom de voz saiu tão oprimido como o de um cachorro que caiu da mudança. — Não, estou de saída. Não sei que horas vou chegar, e não posso remarcar. — Respirei fundo respondendo com um tom bem forçado enquanto estralava a língua e passava batom. — Ah, tudo bem. — O tom de voz dele demonstrou que não estava nada bem. — Só… fiquei com saudades. — Tchau, Eric. — Me despedi rudemente e desliguei. — Quanta paciência eu tive todos esses anos. — Falei comigo mesma e as lembranças vem até mim sem serem convidadas, começo a sentir saudade do meu pai e lembro de Karl. — O Karl veio visitar você, está treinando tiro ao alvo. Está liberada, senhorita Hernandez. — A inspetora avisou firmemente e então saiu. — Obrigada, senhora. — Abaixe
Na volta do hospital, resolvo dirigir até à casa da Sammy. Eu estou sendo muito grudento, não é? É, eu sei. Mas não consigo me controlar, nem sequer consigo ficar longe, eu não conseguiria me distanciar. Algo de estranho me incomodou assim que cheguei em frente à casa dela, as luzes estavam apagadas e olhando para a garagem, o carro dela não estava lá. De repente, uma raiva e uma indignação por ela ter saído assim no meio da noite passa a me incomodar, sinto que devo protegê-la, que ela é frágil demais e que há centenas de homens por aí querendo fazer mal a ela, isso vai me corroendo por dentro. De repente, começo a imaginar cenários de coisas que ela poderia estar passando, homens babando e olhando para ela com maldade enquanto pensam em sequestrá-la. Puxei o celular do bolso, disquei o número dela e liguei, ouvi chamar e chamar mas não tive uma resposta dela. Acelerei o carro e dirigi em direção aquela boate que a segui daquela última vez. Estava rezando para que ela estivesse