O cheiro de ferro e suor impregnava o ar abafado. O frio do chão de pedra contrastava com o calor pegajoso do sangue que escorria lentamente da testa de Jade, deslizando por sua pele pálida. Os pulsos estavam amarrados com cordas ásperas que cravavam na carne, provocando uma dor surda e constante. Uma venda negra cobria seus olhos, mergulhando-a em uma escuridão opressora. Tudo o que restava era o som. Passos ecoando, o tilintar de lâminas afiadas e sorrisos abafados pelo rancor.
O coração dela batia com uma fúria descompassada, lutando para manter alguma sanidade. O gosto metálico na boca lembrava que já havia gritado demais. O silêncio, agora, era sua única arma. "Que fofa, ela ainda acha que vai conseguir escapar", disse uma voz feminina, cortando o ar como uma lâmina. Doce como veneno, carregada de escárnio. A venda foi arrancada de seu rosto com um puxão brusco. A luz crua da tocha atingiu seus olhos sensíveis, forçando Jade a piscar até a visão se ajustar. Quando finalmente enxergou, o choque a golpeou com mais força do que qualquer tortura física poderia. Helena. Ela estava ali, em pé, com um sorriso satisfeito curvando seus lábios perfeitos. Seus longos cabelos ruivos caíam como cascatas de fogo sobre seus ombros, e seus olhos cor de mel, penetrantes e frios, brilhavam com algo que Jade nunca havia visto antes: uma mistura de prazer e loucura. O rosto impecável estava maquiado como se fosse para um evento, não para uma cena de horror. "Surpresa?" Helena se aproximou, inclinando-se para sussurrar perto do ouvido de Jade. "Sempre foi você, não é? A favorita. A adorada. Mas veja só agora... quem está no controle?" Jade quis falar, mas a garganta seca e a dor pulsante não permitiram. Seus olhos buscaram uma saída, qualquer sinal de salvação, mas o que encontrou foi algo ainda pior. Julie, sua irmãzinha, estava ali, caída no chão frio, os olhos vítreos fixos no nada. O sangue formava uma poça ao redor de seu corpo frágil, tingindo a pedra de um vermelho cruel. Jade tentou gritar, mas só um soluço rouco escapou. "Oh, não chore agora, Jade", zombou Helena, segurando o rosto dela com uma mão fria e cruel. "Ela foi um lembrete de que tudo que você ama pode ser tirado de você... assim." “Des… graçada…” Jade sussurrou, sua voz rouca se desfazendo por um fio. O mundo de Jade desabou. O som do riso de Helena se misturava com o zumbido em seus ouvidos. Ela mal percebeu os homens sombrios ao lado da amiga traidora, seus olhares vazios e sorrisos lascivos. Eles a puxaram com brutalidade, arrastando-a como se fosse nada além de um fardo. O inferno continuou. Quando finalmente a largaram, Jade era apenas um eco do que havia sido. Não havia mais orgulho, nem forças. Só dor. E raiva. Helena se aproximou uma última vez, segurando uma adaga com um brilho prateado, refletindo o fogo das tochas e o desespero nos olhos de Jade. "Sabe o que é mais engraçado?" Helena sussurrou, inclinando-se para perto. "Ele nunca te amou. Viktor... ele te tolerava. Eu sou quem ele deveria ter escolhido." O golpe veio rápido. O metal frio rasgou o abdômen de Jade, e a dor foi tão intensa que ela não conseguiu gritar. O sangue quente jorrou, manchando o chão já saturado. Helena segurou seus cabelos ensanguentados, erguendo sua cabeça para que seus olhos se encontrassem uma última vez. "Agora você é só uma memória", murmurou Helena, deslizando a lâmina pelo pescoço de Jade com precisão, um sorriso psicótico estampado no rosto. O mundo começou a desaparecer. Ela não sabia quanto tempo havia se passado, mas escutou os saltos altos de Helena batendo freneticamente contra o chão, os passos tornando-se cada vez mais distantes, até sumirem por completo. O som ficou abafado, a luz se esvaiu e o único eco que permaneceu foi uma voz distante, desesperada, gritando seu nome: "JADE!" A voz de Viktor. E então... silêncio. ..... Não era o fim. Jade ofegou, o ar invadindo seus pulmões como uma lâmina afiada. Seus olhos se abriram abruptamente, fixos no teto escuro acima dela. O espaço era apertado, claustrofóbico. Madeira fria ao redor. Um caixão. Ela tentou se mover, mas o corpo estava rigido, dormente. Com esforço, virou a cabeça para o lado. Seus olhos antes azuis agora estavam negros como a própria noite, refletindo um vazio profundo e desconhecido. E lá estava ele. Viktor Morvane. Sentado em uma cadeira simples, com o rosto enterrado nas mãos, o corpo tenso e rígido. Ele ergueu o olhar lentamente, seus olhos cinzentos encontrando os dela com uma intensidade feroz. Não havia surpresa, apenas uma dor crua e uma fúria contida. Ele se levantou, aproximando-se do caixão sem dizer uma palavra. O silêncio entre eles era ensurdecedor, cheio de tudo o que nunca foi dito. Ele a observou por um longo momento, os olhos vazios, mas carregados de algo que Jade não conseguia entender. Então, ele falou: "Eles vão pagar por tudo. Todos eles." Sem esperar por uma resposta, ele se virou e saiu, a porta se fechando com um estrondo atrás dele, deixando Jade sozinha, envolta pelo cheiro levemente amadeirado e sangue seco. Confusão. Raiva. Dor. Um novo fogo queimando dentro dela. Ela não estava morta. E, de alguma forma, isso era só o começo.O tecido de veludo sob seu corpo parecia apertá-la, como se o próprio caixão estivesse tentando mantê-la presa. Ela piscou algumas vezes, sentindo uma estranha ardência nos olhos. O azul vívido que costumava refletir sua alma agora se dissolvia em um negro profundo, tão escuro quanto o vazio que sentia por dentro.O ar parecia mais denso, e cada respiração era pesada, misturada com o gosto metálico do sangue seco em seus lábios. Sua mente tropeçava entre flashes desconexos: o som de gritos dilacerantes, o riso cruel de Helena ecoando em seus ouvidos, o olhar de terror de Julie momentos antes de sua luz ser apagada.Julie.O nome pulsava em sua mente como uma ferida aberta. O rosto inocente da irmãzinha era o fio que puxava cada lembrança, cada fragmento da dor que havia experimentado. Lágrimas quentes ameaçaram escorrer, mas Jade as conteve com a mesma fúria que agora alimentava seu coração.Com um impulso determinado, ela levantou do caixão, que cedeu com um rangido macabro. O ambien
O silêncio da casa parecia gritar para Jade. Cada passo seu ecoava nas paredes imponentes, envoltas por um luxo que nunca lhe pareceu tão sufocante. O chão de mármore frio sob seus pés descalços não era nada comparado ao vazio que crescia dentro dela — um vazio faminto, insaciável. Era como se sua própria existência estivesse fora de sintonia com o mundo ao seu redor, como se ela fosse uma sombra, flutuando sem propósito. A angústia apertava seu peito com cada respiração, tornando o ar denso e pesado.Após a discussão com Viktor, Jade vagou pela mansão sem um rumo definido, sentindo-se uma estranha em uma vida que deveria ser sua. As paredes altas e as portas pesadas escondiam segredos que ela sabia que precisava desvendar. Estava perdida em pensamentos quando um homem alto e de postura rígida surgiu no corredor. Vestia um uniforme impecável, o olhar neutro, mas havia algo nele que fez o estômago de Jade revirar — um reconhecimento súbito, uma memória esquecida que se escondeu nas som
A água morna escorria pelo corpo de Jade, criando pequenos rios que deslizavam por sua pele pálida e fria. O calor parecia a única coisa capaz de fazer seu corpo lembrar que ainda existia, que ainda estava viva… ou algo próximo disso. Ela apoiou as mãos nas paredes de mármore do luxuoso banheiro, sentindo o contraste entre o frio da pedra e o calor da água. Seus pensamentos giravam em círculos, confusos e pesados, enquanto tentava processar tudo o que havia acabado de descobrir.Ela era um monstro agora.O reflexo dos olhos negros e profundos ainda estava gravado em sua mente, assim como a marca de mordida em seu ombro e as presas afiadas que mal conseguia acreditar serem suas. Viktor sabia disso o tempo todo. Sabia o que ela havia se tornado e nunca teve a decência de contar. Não. Ele a tratou como um fardo, um peso insignificante, escondendo verdades que pertenciam a ela.O sangue dela fervia mais do que a água quente ao redor.Jade desligou o chuveiro bruscamente, a água gotejando
A mente de Jade estava uma tempestade. A cada respiração, sua fome aumentava, mas não de comida comum. Algo dentro dela clamava por algo diferente, algo sombrio. Sentia a necessidade de saciar uma sede que não compreendia, como se estivesse sendo puxada para um abismo sem fim. A comida não a satisfazia, nem mesmo a água. Nada parecia preencher o vazio crescente dentro de si.Ela estava sentada à mesa do escritório de Viktor, seus pensamentos ainda em frangalhos. O cheiro amadeirado do lugar misturava-se com o aroma de Viktor, inebriante e provocante, e isso a fazia sentir uma atração que ela não entendia completamente. Cada pequeno gesto dele parecia fazer o mundo ao redor dela desaparecer, e ela odiava isso. A última coisa que queria era se sentir vulnerável diante dele, mas ali estava, sua mente cada vez mais confusa e seu corpo tremendo.Viktor estava em pé, do outro lado da mesa, observando-a em silêncio. Seus olhos profundos e penetrantes não a deixavam em paz. Ele estava tranqui
A mente de Jade era um redemoinho caótico. O peso da revelação ainda reverberava em seu peito, mas o que mais a consumia era a sede. Não uma sede comum, que poderia ser saciada com água. Era algo primordial, selvagem, que queimava em suas veias e apertava seu estômago vazio com garras invisíveis. O ar parecia denso, como se cada partícula fosse insuficiente para mantê-la estável.Ela tentava ignorar o desconforto, mas o cheiro que pairava no ar era uma armadilha cruel. O aroma amadeirado do escritório de Viktor se misturava ao perfume dele — um cheiro inebriante, quente, com notas de especiarias e algo mais… ferroso e doce. O sangue dele. Era como se cada batida do coração de Viktor ressoasse dentro dela, chamando-a, despertando um instinto que ela não conseguia controlar.Viktor estava em pé, encostado casualmente na lateral da mesa, observando-a com seus olhos sombrios e enigmáticos. Não havia um traço de surpresa em sua expressão, apenas uma calma inquietante. Talvez ele soubesse o
O mundo parecia em silêncio absoluto quando Jade abriu os olhos. A sede ainda queimava em sua garganta, mas estava estranhamente controlada, como se sua mente tivesse encontrado um frágil equilíbrio entre o desespero e o autocontrole. O quarto estava mergulhado em uma penumbra suave, as cortinas pesadas bloqueando a maior parte da luz do lado de fora. O ar carregava um leve perfume amadeirado que ela já reconhecia: Viktor.Antes que pudesse se levantar, ouviu passos do lado de fora da porta, leves, mas inconfundíveis. Seu coração — sim, ainda pulsante — deu um salto confuso. Ela sabia quem era antes mesmo da batida suave ecoar na madeira."Entra", murmurou, sua voz rouca pelo cansaço e pela sede.A porta se abriu sem resistência, e Viktor entrou. Seus olhos cinzentos analisaram cada detalhe dela com uma intensidade que a fez se encolher ligeiramente, não por medo, mas por algo que não sabia nomear. Um pensamento fugaz passou por sua mente: ela tinha certeza de que havia trancado a por
O silêncio reinava na mansão, quebrado apenas pelos passos suaves de Viktor enquanto ele carregava Jade nos braços. Seus dedos estavam firmes, mas não a machucavam, e seu olhar era indecifrável. Jade, ainda abalada, se deixou levar sem resistência. Seu corpo parecia mais leve do que nunca, mas a sede em sua garganta continuava a arder, mesmo que menos intensa do que antes.A sensação era estranha. Sua mente estava lúcida, mas seu corpo reagia como se tivesse sido moldado para algo completamente novo. Cada som parecia mais nítido, cada textura mais intensa. Ela podia ouvir o leve farfalhar das folhas do lado de fora, o tique-taque do relógio na parede e até mesmo a respiração controlada de Viktor. Tudo parecia mais próximo, mais vívido.Quando Viktor a colocou delicadamente sobre o sofá espaçoso da sala, Jade afundou no tecido macio, sentindo o contraste entre o conforto do momento e a turbulência que carregava dentro de si. Seu olhar vagou pelo ambiente, como se precisasse confirmar q
Viktor riu baixo, um som rouco, carregado de algo indecifrável, enquanto seus dedos longos deslizavam suavemente pela mão de Jade, que ainda repousava ao redor de seu corpo. Seus olhos estreitaram levemente antes que ele a soltasse com um gesto quase preguiçoso, como se não quisesse afastá-la, mas também não pudesse mantê-la ali.Então, ele se virou para encará-la de frente, seu sorriso singelo tentando mascarar qualquer resquício de peso na conversa."Você se preocupa demais."Jade observou o rosto dele com atenção, notando os detalhes que normalmente ignoraria. O brilho sutil nos olhos âmbar, a forma como seu maxilar se contraía levemente quando ele tentava esconder algo. Ele era um homem que carregava segredos, disso ela já sabia. Mas havia algo mais profundo ali, algo que ele não queria que ninguém enxergasse.Ela fingiu não perceber sua tentativa de disfarçar. Permitiu que ele a guiasse de volta ao sofá, onde se sentou ao lado dele, o calor de seus corpos quase se tocando.Por um