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Kelly 

Um dia perfeito, sem atrasos, sem correria, sem estresses... A não ser pelo itinerário que está me deixando meio que perdida aqui. Seguindo o mapa da faculdade, que mais parece um labirinto, entro no terceiro corredor movimentado de alunos e agora eu só preciso descobrir qual a sala que devo entrar. Abro o mapa mais uma vez e enquanto ando em linha reta, procuro pela sala azul, no bloco B, e quando ergo a cabeça a encontro bem no meio do corredor. Satisfeita, dou dois passos na direção da sala e tento sem sucesso guardar o mapa no meu bolso traseiro, e para a minha infelicidade, alguns cadernos caem no chão.

— Merda! — xingo impaciente e me agacho para arrumá-los junto aos outros materiais. Logo encaro um belo par de sapatos lustrosos parados bem na minha frente. Penso em olhar quem quer que seja, mas antes que eu consiga fazer tal coisa, um líquido escuro e quente molha os meus cadernos, que ainda estão espalhados pelo chão. Meu sangue ferve imediatamente. — Mas, que merda você fez? — rosno praticamente aos gritos e irritada finalmente olho a cara da jamanta que fez o maldito estrago. Encontro uma bela cabeleira loira, adornando um par de olhos azuis que me encaram assustados, porém, admirados com alguma coisa. Sei lá, o cara parece um imbecil, atrapalhado e bobo! Rolo os olhos internamente. — Idiota! — ralho, pegando os cadernos agora danificados e me levanto em busca de um banheiro para tentar arrumar toda essa bagunça. Primeiro dia de aula, merda, eu fiz tudo tão direitinho! Agora para piorar serei taxada de a aluna que só chega atrasada e tudo por causa daquele imbecil, estúpido e idiota! Quase dez minutos depois, corro para a sala de aula. Os corredores agora estão completamente vazios e chego perto da porta da tal sala azul B, consigo escutar a voz grave do professor. Droga, espero que ele não me barre na porta logo no primeiro dia! Alcanço a porta que ainda está aberta e estanco bem na entrada quando vejo o imbecil que molhou os meus cadernos em pé, escrevendo algo no quadro.  Merda, merda, merda, ele é o meu professor! Eu xinguei o meu professor? Mil vezes merda! Antes de falar qualquer coisa, eu limpo a minha garganta e encontro coragem para falar:

— Com licença! — Me forço a dizer. O loiro e alto... bem alto mesmo, diga-se passagem, se vira para me olhar. Lindos olhos azuis! Penso. São meigos e tranquilos... Que merda estou fazendo? Respiro fundo e continuo a falar: — Será que eu posso? — Aponto para dentro da sala. Ele continua me olhando e aquele maldito olhar bobo estava ali me encarando como se eu fosse uma fruta deliciosa.

Idiota!

— Pode. — Ele finalmente responde, usando um tom firme até demais. “Ok, vou relevar!” Puxo a respiração mais uma vez e assinto, adentrando a sala de aula. — Da próxima vez tente chegar no horário. — O infeliz comenta. Ah, não deu mais para segurar, então soltei uma resposta à altura do que acabou de falar.

— Eu teria, se um destrambelhado não tivesse derramado café nos meus cadernos! — Uso o mesmo tom que acabou de falar comigo. E, merda, é impressão minha ou o meu professor acabou de corar? Ele corou, é sério? O observei puxar uma respiração e sem dizer mais nada, ele foi para sua mesa e abriu um livro grosso.

— Abram os seus livros na página 37, vamos ver a origem de alguns alimentos. — A pergunta que me veio à cabeça de imediato foi, quem precisa saber a origem dos alimentos? Pelo amor de Deus, quem em sã consciência não sabe de onde veio a pizza? Ou picles? Ou a macarronada? Segui para a segunda cadeira no canto da parede, bem perto da janela e abro o único livro que trouxe comigo. Sim, seguindo o itinerário.

****

Após três aulas seguidas com o professor Adrien, saio da sala direto para uma lanchonete dentro do campus mesmo e me peço um delicioso pedaço de torta de limão e uma xícara de chá. Enquanto repasso os últimos traços da aula sobre a origem dos alimentos, releio sete tópicos interessantes que me chamaram a atenção e que eu não havia atentado para isso antes. O livro compara a alimentação em três fases da história; alimentação na pré-história e na idade antiga, depois na antiguidade clássica e na idade média e por fim na idade contemporânea. Uma mudança radical entre um tempo e o outro. A garçonete traz o meu pedido e o põe na mesa; uma porção de batatas fritas e um refrigerante, o meu chá e a torta que havia pedido. Encaro a jovem de pele branca e de bochechas rosadas, que me olha com um sorriso.

— Desculpe, eu não pedi essas batatas e o refrigerante!

— Eu sei, o moço ali pagou pra você. — Inclino um pouco a cabeça para ver o tal rapaz por trás da garota, bem acomodado na outra mesa e o meu professor ergue a sua latinha em um brinde. Reviro os olhos.

— Pode levar de volta, por favor? — peço. Seu sorriso gracioso desaparece instantaneamente.

— Mas,

— Só leve isso daqui! — A corto ríspida.

— Claro, senhorita! — Ela força um sorriso e põe os pedidos de volta em sua bandeja, deixando apenas o que lhe pedi, e eu volto a me concentrar no meu livro. Aonde foi mesmo que parei? Me pergunto, e no segundo seguinte, sinto alguém esbarrar forte contra a minha mesa, fazendo a xícara virar e derramar o líquido amarelado e quente pelo tecido perolado. “Mas o quê?” Ergo a cabeça e encaro o meu professor com um olhar espantado, olhando o estrago que acabara de fazer na toalha da mesa.

— Seu idio...

— Tá, eu já sei! — disse me interrompendo. — Eu sou mesmo um idiota, um destrambelhado e um imbecil, mas você é uma menina muito mal educada! — Ergo ainda mais a minha cabeça, empinando o meu queixo e demostro toda a minha irritação.

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