O elevador da presidência se abre. Senhor Souza caminha rodeado de assessores rumo à sala de reuniões. O diálogo com Jorge começa:
— Onde está Suellen? Quero que ela seja mais participativa nestas reuniões.
Jorge Mascarenhas tranquiliza senhor Souza, enquanto observa alguns relatórios:
— Suellen tinha compromissos inadiáveis, mas estou ciente de qualquer informação que for necessária. Nós vibramos com muita sinergia.
Senhor Souza retruca:
— Nossa sinergia precisa vibrar é com os russos. Os cossacos estão irredutíveis. As coisas estão ficando confusas em Angola.
Naquela manhã no Centro Empresarial o destino dos projetos da sucursal do grupo Souza em Angola serão definidos. O satélite AngolaSat1 feito pelos russos não gerou o resultado esperado. A disputa pelas telecomunicações do país estão em jogo novamente. O grupo Souza já perdeu a concorrência do cabeamento em fribra ótica no Atlântico para a Índia. Outra derrota será um golpe fatal para a sucursal do grupo em Angola. Senhor Souza conduz a reunião com pulso de ferro.
Roberto, diretor de tecnologia explana a situação:
— Pois bem senhores, a condição imposta pela companhia Russa para a produção do novo satélite AngolaSat2 é que, como não haverá ônus aos angolanos, os contratos e seus custos precisaram ser revistos. Por sua vez, os fornecedores indianos se mostraram irredutíveis na negociação de qualquer termo ou transferência de tecnologia, o que abriu margem para que a corporação Souza assumisse o protagonismo do empreendimento. A proposta já está para análise do Embaixador e dos executivos Russos em Angola. O caminho para nós está aberto, senhores.
Jorge toma a palavra:
— Obrigado, Roberto, suas ponderações quanto aos riscos tecnológicos e custos que serão despendidos em Angola está muito precisa. Senhores, nós temos uma ótima oportunidade para ampliar nossos horizontes. A África se tornou um mercado altamente favorável para investimentos em tecnologia e telecomunicações e Angola é nossa porta de entrada principal. É um país cuja economia se destaca no cenário africano e mundial.
Senhor Souza interrompe:
— Jorge! Eu quero esse contrato nem que tenhamos que atravessar o oceano em uma canoa. Eu não vou admitir outro fracasso, como aconteceu com o cabeamento em fibra ótica do Atlântico. Coisa que até hoje não entendo como aconteceu. O acordo político estava todo concluído.
Jorge controna a situação e explica:
— O ambiente politico naquele país é conturbado Senhor Souza. As lideranças políticas são imprevisíveis. Mudam de rumo a toda momento, mas isso não vai acontecer novamente. Apesar de que, de maneira objetiva, os custos oferecidos por nós não foram o esperado pelo governo. Quanto aos questionamentos técnicos dos russos, nossa sucursal em Angola agora possui os melhores profissionais daquele país. O próprio Presidente de Angola interveio na escolha. Recebi a informação de que o Diretor de Tecnologia de Informação é jovem e notável. A coordenação do projeto do satélite está a cargo dele, e não temos dúvida que os Russos irão aprovar. O maior problema com os Russos ainda é insistirem na presença pessoal do senhor em Angola, à frente das discussões e negociações políticas. Eles não abrem mão disso. Eu me coloco à disposição para ficar lá, se o senhor quiser.
Senhor Souza coloca as mãos cruzadas sobre a mesa e pondera:
— Não, Jorge. Os Russos são tradicionais e ortodoxos. Você ainda não se casou com Suellen. Eu entendo de negócios, mas estou velho. E não tenho intimidade com toda essa tecnologia moderna. Vou mandar Suellen assumir a sucursal em Angola. Além de satisfazer os Russos com a presença da minha filha, será uma boa experiência para ela.
Jorge olha empolgado:
— Perfeito, senhor Souza. Ótima solução. Será bom eu e Suellen observarmos o desenvolvimento dos projetos de perto, no outro lado do Atlântico.
Senhor Souza olha com ar de desaprovação:
— Eu disse que Suellen assumirá. Você não vai a lugar nenhum! Preciso de você aqui comigo.
Jorge recua com expressão de submissão e obediência: — Sim senhor. É uma ótima idéia, de qualquer forma.
A reunião termina e Jorge envia uma mensagem no celular para Suellen:
J: Oi meu bem. Parabéns!
S: Oi Jorge, Parabéns por quê?
J: Você foi promovida meu docinho.
S: Promovida onde?
J: Na empresa querida. Acabei de sair da reunião da diretoria.
S: Affff Jorge, resolvem as coisas e não me consultam? Promoção de quê?
J: Foi decisão direta de seu pai. Você vai ser a Presidente da sucursal em Angola. Olha que beleza docinho - de gerente departamental para Presidente de sucursal. Carreira meteórica!
S:Puta que pariu Jorge. Você tá de brincadeira? Ficaram loucos de vez??? O que é que eu vou fazer na África? Treinar para disputar Maratona? Meu Deus você só pode estar de brincadeira! Eu tenho uma vida social aqui, sabia disso?????? O que é que eu vou fazer naquele fim de mundo???? Affff Vou falar com meu pai. ATé
Suelen Souza está surtada. No Pub de Elite, ela desabafa com Edilene Fortuna.— Amiga, você não pode acreditar no que estou passando.— Eu imagino. África? Valha-me Deus.— Meu pai que mande o Jorge naquele fim de mundo. Sou muito nova para ser engolida por um tigre.— Minha nossa Suellen, o que vai ser dessa cidade com você do outro lado do oceano? Eu não tenho medo do seu pai. Vou subir a #ficaSuellen agora, no Instagram.— Obrigada, amiga, você me apoia sempre que preciso.Rose vê Suellen no bar, sai da pista de dança e chega assustada.— Amiga, que babado é esse que você vai embora prá África? Nossa, você terá que levar um contâiner de creme rinse, porque aquele semi-árido vai jud
Suellen prepara as malas. Está triste por ter que deixar a cidade. Ela olha pela janela do quarto de sua cobertura e admira as luzes da cidade de Fortaleza. Uma melancolia profunda lhe traz recordações e uma angústia doída aperta seu peito. Ela sabe que não pode permitir que sua vida social comprometa os interesses da empresa. Mas também sabe que será difícil suportar a ausência de suas amigas e da badalação. Suellen liga o Tablet e a imagem de Edilene aparece:— Olá amigas lindas e maravilhosas. Eu sou Edilene Fortuna e se você está assistindo esta live é porque faz parte do Canal “VIP Lindas e Maravilhosas”. Aquelas que tudo podem no canal mais quente de Fortaleza.Suellen suspira e solta um sorriso triste, por não estar na balada. Mesmo não tendo partido, se sente consumida pela saudade. Com um olhar de desânimo el
A limusine preta da presidência do Grupo Souza entra pelo estacionamento VIP da ala internacional do aeroporto de Fortaleza. O motorista circula o veículo e abre a porta traseira. Suellen Souza desce imponente, remexe os cabelos, se alinha no modelito Jean Verseni, e segue rumo ao saguão do aeroporto. Logo atrás o carregador se esforça para conduzir as malas empilhadas no carrinho de carga. Ao celular ela conversa com Rose:S: Sim amiga, sentirei muitas saudades. Não me espere para o Natal nem o revellion. Acredito que ficarei até depois do final do ano naquele lugar, sem conseguir retornar.R: Querida, torço por você e aguardamos ansiosas sua volta. Mande sempre notícias. Não esqueça as recomendações que lhe dei. O semi-árido resseca demais o cabelo.S: Tudo bem amiga, obrigado pelas dicas que você me deu. Preciso desligar, vou enco
Suellen está incomodada durante o voo. O garoto sentado ao seu lado fica insistentemente cutucando seu braço. Irritada, ela olha para a mãe do menino, fazendo uma expressão de que aquilo está incomodando. A senhora com vestes muçulmanas olha para a criança e sorri para Suellen, fazendo uma expressão de admiração. Suellen responde com um sorriso ameno e pensa consigo, ironicamente: “As crianças são lindas”. Suellen tenta olhar com paciência para o garoto, mas ela sabe que seu forte não é a simpatia por crianças. É filha única. Nunca teve primos ou sobrinhos, e não planeja ter filhos tão cedo.O celular de Suellen vibra. Ela recebe uma mensagem de Morrison.M: Bom dia, Senhora Suellen Souza. Aqui é o Morrison. Eu terei a honra em buscá-la no Aeroporto de M’banza Kongo. Já está tudo em orde
O calor escaldante faz a testa de Jason suar. Ele se abriga à sombra de uma Mulembra e admira tranquilo a paisagem. A comunidade está chegando no pátio da ONG AME -AngolaMaisEsperança, onde Mutaba Quituno é o presidente. Ele arruma o microfone, ajeita mais algumas cadeiras e pede para as crianças pararem de correr e se sentar. Ele acena a Jason:— Está tudo bem aí, senhor Jason? Começaremos em um instante.Jason acena sinalizando que está tudo em ordem.As pessoas idosas e os adultos humildemente trajados começam a se sentar sob a tenda armada no páteo da ONG. Mutaba liga o microfone, que emite um som estridente.— Alô, alô. Amigos, hoje temos a honra de receber o senhor Jason Fields, que é diretor de tecnologia de uma grande empresa em Luanda, nossa capital. E se alguém de vocês ainda não sabe, o senhor Jason é o n
“Cerca de 95% dos angolanos são africanos bantu, pertencentes a uma diversidade de etnias. Entre estas, a mais importante é a dos ovimbundu, que representam mais de um terço da população, seguidos dos ambundu, com cerca de um quarto, e os bakongo com mais de 10%”...Suellen está há algum tempo sentada no saguão do aeroporto em M’Banza-Kongo. Ela lê alguns panfletos turísticos sobre Angola, enquanto aguarda o carregador trazer suas malas.O carregador retorna, devolve o comprovante das malas e fica olhando para Suellen.Suellen não entende e pergunta:— Onde estão as minhas malas?O carregador responde, com um sotaque português diferente, mas compreensível:— Suas malas não estão no desembarque, senhora.Suellen joga os folhetos turísticos de volta na mesinha, pega os comprovantes e caminha
O aeroporto de M’Banza-Kongo vai ficando para trás. Suellen se distrai olhando as largas avenidas da cidade. Os carros trafegam para todos os lados de forma desordenada, assim como as pessoas. Há muitos comércios ambulantes pelas calçadas. Em um terreno grande muitos garotos jogam futebol e as pessoas trajam roupas muito diferentes do que Suellen costuma ver e usar nos shoppings centers e nas rodas sociais de Fortaleza. Enquanto Suellen admira a paisagem, Jason repara na bela mulher em que sua nova chefe se traduz. Suellen se sente observada e retoma atenção ao trajeto. Jason aponta para uma antiga construção, que lembra um velho templo.— A senhora está vendo aquela construção?Suellen ajeita os óculos escuros e observa:— O que era aquilo?Jason diminui a velocidade do Jipe e começa a explicar para Suellen o que aquele local representa. Ele vai m
O solavanco do Jipe faz Suellen acordar. Ela tenta se encontrar e lembrar onde está. Olha em volta, ainda vê a mesma paisagem que, ao cair da tarde, faz com que o amarelo da savana ferva em vermelho, como se o fogo estivesse consumindo o horizonte. Ela admira aquele retrato e pergunta:— Onde estamos, Jason? Estamos chegando em Luanda?— Você dormiu bastante. Estamos chegando em N’Zeto, metade do caminho. Daqui a pouco vai anoitecer. Acho melhor pararmos em um hotel, para você tomar um bom banho e descansar. Amanhã cedo vou fazer algumas entregas e finalmente partimos a Luanda.— Estou tão cansada que não tenho como discordar de você.— Sim, você precisa descansar para finalmente chegar em Angola.Suellen se curva e olha Jason, tentando compreender:— O que você quer dizer com finalmente chegar em Angola?Jason sorri:— Voc