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3- MIRELLA ESPOSITO

A carta repousava em cima da impressora, como se desafiasse minha capacidade de ignorá-la. Enquanto eu me acomodava na cadeira para mais um dia de trabalho, minha cabeça não conseguia se concentrar nos tecidos do século XVIII, apenas na propriedade na encosta da montanha em Port Angeles. Kira e eu passamos um tempo pesquisando tudo sobre e tentando entrar em contato com alguma autoridade da cidade, sem sucesso.

Tudo isso era o tipo de coisa que eu via em filmes, não na minha vida monótona e presa a um escritório abafado, cercada por documentos esquecidos e projetos que ninguém se importava em ler. Kira olhou para mim, ansiosa. Eu sabia que ela queria que eu dissesse algo sobre o assunto, qualquer coisa que mostrasse que eu tinha um plano ou pelo menos uma ideia do que fazer a seguir.

Mas a verdade era que eu não tinha.

Essa notícia havia caído como um raio em um dia já chuvoso, e minha mente se recusava a processá-la completamente.

— O que decidiu?

— Nada, ainda, mas falei com a minha mãe.

— E o que ela disse?

— Que minha avó saiu de lá há muito tempo e construímos nossa família aqui. Ela me pediu para não ir para Port Angeles, mas também disse que a casa é valiosa.

— Valiosa quanto?

— Valiosa a ponto de pagar minha dívida estudantil e me garantir um bom início de vida por aqui.

Os olhos de Kira brilharam. E eu senti um formigamento.

— Não é como se eu pudesse simplesmente largar tudo e correr para o outro lado do país, né?

Kira fez aquele som com a boca, aquele “tsss” que indicava que ela estava prestes a dizer algo irritantemente sensato.

— Vamos lá, Mirella. Seja honesta. O que você tem a perder? Este emprego? Este... escritório encantador cheio de artigos sobre toalha de mesa?

Eu ri, apesar de mim mesma.

— Você é habilidosa, criativa, todos os nossos professores viam tanto potencial em você!

— Não decepcionei, acho. Estou trabalhando em um dos jornais mais importantes do país.

— Que sequer aproveita todo o seu talento. Ela tinha razão.

O emprego não era exatamente algo que eu desejava manter para sempre, e aquele escritório, tão cheio de papéis quanto de decepções, era um lembrete constante de que meu potencial estava sendo desperdiçado.

Eu sabia que não era apenas sobre o emprego, mas sobre a vida que eu estava levando. Uma vida que tinha se transformado numa sequência sem fim de “bom o suficiente”, mas que nunca parecia ser realmente o que eu queria.

— Em quantos anos de trabalho aqui você consegue pagar sua dívida?

— Uns... 10 anos.

Dizer aquilo em voz alta me assustou.

— E vender essa propriedade resolveria seus problemas financeiros?

— Se ela for tão valiosa quanto minha mãe disse, eu poderia ficar pelo menos uns 10 anos sem trabalhar.

Kira bateu a palma da mão na mesa, como se já estivesse decidido. Ela estava certa. E essa carta... esse presente inesperado poderia ser a solução. Se eu vendesse a propriedade, poderia pagar a dívida estudantil que pairava sobre mim como um fantasma, e até ter algum tempo e dinheiro para encontrar um jornal bom que realmente valorizasse o meu trabalho.

— Ok, vamos entrar em contato com essa Naomi. — Finalmente disse, endireitando-me na cadeira. — O que pode dar errado? No mínimo vira uma história estranha para contar no futuro.

Kira sorriu como se já tivesse vencido a discussão.

— É assim que se fala! Mãos à obra!

Liguei o computador e digitei "Naomi Owens Port Angeles" na barra de pesquisa. Várias páginas surgiram, a maioria sem relação alguma com o que eu procurava. No entanto, depois de alguns minutos de filtragem, finalmente encontramos algo: um artigo antigo sobre propriedades históricas em Port Angeles.

E lá estava, um nome que chamou minha atenção: "Esposito Estate". Ao lado, uma menção rápida a Naomi Owens como a cuidadora e secretária pessoal da minha tia-avó, Karen Esposito.

— Achei algo! — exclamei, apontando para a tela. — Preciso entrar em contato com o editor dessa matéria.

— Deixa comigo, eu consigo. — Kira correu para sua mesa. Alguns longos minutos e ligações depois, ela me chamou.

— Ótimas notícias!

— O que foi? Conseguiu o contato da Naomi?

— Mais do que isso. O editor do artigo disse que a casa é uma propriedade histórica, provavelmente deve haver mais do que um pedaço de terra para vender.

— Tipo o quê?

— Fica na encosta da montanha, ele disse que tem uma lenda urbana de que há uma passagem da casa para o coração da montanha, cheia de pedras preciosas.

As palavras de Kira martelaram na minha cabeça. Eu odiava admitir, mas a ideia de explorar algo diferente, algo com um toque de mistério, começava a mexer comigo. Talvez eu precisasse mesmo sair do meu ambiente sufocante e dar uma chance ao desconhecido.

— E melhor ainda!

— Fala! — Sacodi as mãos, ansiosa.

— O governo e um milionário local já tentaram comprar o lugar por 5 milhões, mas sua tia recusou. Até gente de fora da cidade foi lá oferecer valores absurdos, mas ela não quis.

— Absurdos tipo quanto?

— 10 milhões. — Kira se inclinou sobre minha mesa e depositou o número de Naomi diante de mim. — Parabéns, amiga, você nunca mais vai precisar trabalhar na sua vida!

— Isso é sério?

— Foi o que ele disse.

— Vou ligar para ela. — Digitei o número em meu celular. — Se isso for verdade, vou pegar um avião amanhã mesmo para esse lugar.

— E o emprego?

— O emprego que se dane!

— Essa é a minha garota.

O telefone tocou várias vezes antes que uma voz atenciosa e profissional atendesse do outro lado.

— Escritório da propriedade Esposito, Naomi Owens falando.

Engoli em seco, repentinamente nervosa, mas forcei minha voz a sair firme.

— Oi, aqui é Mirella Esposito. Recebi a sua carta... sobre a propriedade da minha tia-avó em Port Angeles.

— Ah, senhorita Esposito! — A voz de Naomi mudou instantaneamente, tornando-se calorosa. — Estou tão feliz que tenha entrado em contato. Karen falava muito sobre você. Estou certa de que há muitas coisas que você precisa saber, e que só poderão ser explicadas pessoalmente. Eu já deixei tudo preparado para a sua chegada.

Minhas sobrancelhas se ergueram.

Minha tia-avó falava muito de mim? Naomi estava preparada? O que isso significava? Eu estava apenas ligando para obter mais informações, mas Naomi parecia estar um passo à frente, esperando que eu fizesse mais do que apenas um telefonema.

— Certo... — Hesitei, trocando um olhar com Kira, que assentia vigorosamente, encorajando-me. — Bom, então acho que vou precisar ir até Port Angeles.

— Excelente! — Naomi parecia genuinamente satisfeita. — Vou passar o endereço e se me fornecer os seus dados e um e-mail, também enviarei sua passagem. Tenho certeza de que esta viagem será esclarecedora para você, senhorita Esposito.

— Sim. Naomi, é verdade que tem muita gente interessada em comprar a propriedade?

— Sim, sua tia-avó vivia expulsando-os daqui. — Riu.

— E o lugar é tão valioso assim?

— As coisas têm o valor que colocamos nelas. O que posso dizer é que quem deseja comprar, oferece valores altos. Demais detalhes só trataremos pessoalmente.

— Ok, muito obrigada, Naomi.

Desliguei o telefone, sentindo uma mistura de nervosismo e empolgação. Olhei para Kira, que já tinha um sorriso vitorioso estampado no rosto.

— Você vai mesmo? — Ela me cutucou, rindo.

— Acho que sim.

— Até que enfim vou ver a minha amiga se aventurar fora da capital!

— Mas tem algo estranho. — Franzi a testa. — Se era algo tão importante assim? 

— Não sei, amiga. Mais uma coisa para perguntar a ela. Kira se levantou e me deu um abraço apertado.

— Eu vou sentir sua falta, mas você precisa disso. Promete me ligar sempre?

— Prometo.

Olhei para minha mesa, para as pilhas de papéis e artigos tediosos, e sorri. A ideia de me livrar da rotina sufocante que eu tinha me enterrado agora parecia libertadora. E pensar que eu solucionaria o problema das minhas finanças em um estalar de dedos me dava uma satisfação como há muito não sentia.

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