O cheiro dela estava em toda parte, mesmo antes de vê-la. Doce, fresco, intenso, como uma flor silvestre recém-desabrochada.
Era... Humano. Algo que, normalmente, seria insignificante para mim. Mas aquele aroma despertou não apenas o meu lobo, mas um instinto primitivo que eu não sentia havia muito tempo. Não consegui ignorar, não queria ignorar.
Era cheiro humano, mas diferente. E essa diferença estava bagunçando todos os meus sentidos. Enquanto me encostava no carro de Draven que havia tentado acompanhar minha corrida animalesca até a fonte do meu desejo, cruzei os braços, observei a casa de sua família. A casa que deveria ser minha. Precisava ser minha. A névoa da manhã envolvia a propriedade, dançando como um véu protetor. E, naquele instante, eu senti que o poder da montanha estava mais forte do que nunca.
E então, ela espiou pela janela.
Quando a vi pela primeira vez, fiquei surpreso com o contraste entre seu cheiro capaz de dominar meus sentidos e ela. Era uma mulher jovem de curvas generosas, com um corpo que exalava feminilidade e fertilidade. Seus jeans abraçavam suas coxas cheias, e a blusa acentuava a curva suave de seus ombros e quadris largos. Seus cabelos castanhos emolduravam seu rosto, com bochechas coradas e lábios carnudos. Não era o tipo de mulher que passaria despercebida, a presença que carregava era hipnotizante.
E, naquele instante, a ideia de que ela era diferente de todas as outras se enraizou ainda mais em minha mente.— O que está acontecendo? — Draven resmungou atrás de mim.
— Não está sentindo?
— Sentindo o quê? Desespero por você ter saído de uma reunião importante, corrido pela floresta feito um bicho e chegado aqui mais rápido que meu carro?
A pele dela parecia macia e seu cheiro me deixava louco, parecia me convidar a atravessar o portão, mas havia um encanto naquele local que impedia qualquer lobo de se aproximar sem permissão.
— A presença dela, Draven.
— Que presença? Do que está falando? Entre no carro, vamos voltar para a reunião.
— Silêncio.
Escutei os pensamentos da velha Naomi Owens, embora com o passar dos anos ela tivesse se tornado muito boa em embaralhar as palavras de sua cabeça. Mas ela... eu não podia ouvi-la. Eu a sentia, como se seu corpo estivesse a um palmo e seu cheiro estivesse em minha língua sedenta, pronta para chupá-la até a última gota. No momento em que reparei em suas feições, percebi que ela parecia cansada, como se acabasse de sair de uma batalha contra os próprios pensamentos. Havia uma linha de preocupação em sua testa, mas seu queixo erguido e a maneira como olhava em volta demonstravam determinação.
Determinação suficiente para acender algo dentro de mim que eu mantinha enterrado há muito tempo. Um desejo de proteger... e de possuir.
— Quem é ela, Arturo? — Draven espiou pela janela.
— Ela é o meu destino.
Quando nossos olhos finalmente se encontraram através do vidro da janela, eu senti como se tivesse levado um golpe. Um calor se espalhou por meu peito, invadindo minhas veias, pulsando em cada parte do meu corpo. Não era algo que eu esperava. Não era algo que eu podia controlar.
Ela me olhou com surpresa, os lábios ligeiramente entreabertos, como se estivesse tentando entender o que eu estava fazendo ali. E eu estava parado, congelado por um momento, como um idiota. Um Alfa idiota. Porque aquele encontro, aquele simples olhar, tinha acabado de mudar tudo. Eu deveria virar as costas e ir embora. Deveria deixar Naomi lidar com ela e voltar para o que restava do meu dia, como se nada tivesse acontecido. Mas eu não conseguia me mover.
Não conseguia tirar os olhos dela.
Porque o meu lobo uivou tão alto dentro do meu coração que eu soube imediatamente que eu era dela, e ela precisava ser minha. Observei quando ela se afastou da janela, confusa, e senti uma pontada de... alívio? Ou seria medo? Sim, medo. Algo raro para mim.
Porque, pela primeira vez em anos, eu estava diante de algo que não podia controlar completamente. Ela era imprevisível, uma variável que poderia fazer com que o plano cuidadoso que eu havia elaborado desmoronasse. E isso me perturbava. Mas também me atraía.
A casa de Karen Esposito sempre teve uma aura peculiar, um magnetismo que influenciava as terras ao seu redor. Algo que podia mudar o equilíbrio do território, se caísse nas mãos erradas. Eu sabia que aquela mulher não fazia ideia do que estava guardado ali, ou da importância daquela propriedade para minha Alcateia. E, naquele momento, enquanto a observava através da vidraça, me dei conta de que teria que lidar com ela pessoalmente.
Não havia outra maneira. Ela semicerrou os olhos, como se quisesse me enxergar direito e eu fiz questão de manter o contato, deixando que ela sentisse a intensidade do meu olhar. Queria que soubesse que eu estava ali. Que eu a tinha notado. Seus olhos castanhos brilharam em hesitação, na vã tentativa de decifrar quem eu era e o que estava fazendo ali. Era fascinante. Ela era fascinante. E, naquele momento, algo mudou dentro de mim. Como se um alarme tivesse disparado. Como se a lua cheia olhasse para mim em todo seu esplendor e aguardasse minha entrega de corpo e alma para me tornar um só com sua natureza.
Ela estava chamando por mim.
A simples ideia era absurda, e ainda assim, eu sabia. Sabia que havia algo ali, algo que iria nos arrastar para um turbilhão de problemas. Algo que eu não podia, e não queria, evitar.
Soltei um longo suspiro, desfazendo a pose relaxada que eu mantinha. Endireitei-me e dei um passo em direção à casa, mas hesitei. Não era o momento. Ainda não. Eu precisava ser cuidadoso. Ela precisava ser cuidada. Ela era humana, afinal, frágil demais para a tempestade que eu estava prestes a trazer para sua vida. E, por mais que me incomodasse admitir, eu sentia um impulso irracional de puxá-la para minha tempestade.
— Entre no carro, Arturo, precisamos voltar.
— Nossos melhores lobos precisam ficar de olho nela — entrei no veículo —, coloque-os para patrulhar o território e me avisar sobre qualquer mudança.
— Por causa de uma humana qualquer?
— Ela não é uma humana qualquer — a olhei uma última vez, estava de lado conversando com Naomi — ela é minha.
A sensação de estar sozinha naquele lugar me abalava. Eu sabia que Naomi estava na cozinha preparando chá, mesmo assim, a casa parecia respirar ao meu redor, como se estivesse me cercando em um abraço fantasmagórico. Tomei um banho quente, vesti roupas limpas e confortáveis, mas a sensação de algo fora do lugar não desaparecia. Tinha algo nesse lugar.Algo que eu não conseguia entender, mas que parecia me chamar de maneira inquietante. Caminhei até a janela novamente, procurando por qualquer sinal daquele homem misterioso. Ele havia desaparecido, mas sua presença ainda pairava no ar, como um calor que se recusava a desaparecer.Era estranho.Eu podia jurar que senti o toque de sua respiração quando me olhou, uma onda de calor que atravessou a distância entre nós e se alojou sob minha pele. Um arrepio percorreu minha espinha, e meus lábios formigaram com a memória de um toque que nunca aconteceu. Como se ele estivesse ali, tão próximo que o espaço ao meu redor parecia ter encolhido.Qu
Segui o conselho de Kira e fui explorar a cidade.Port Angeles tinha um charme peculiar, suas ruas estreitas e prédios antigos pareciam ter sido arrancados de um livro de histórias, e a neblina que pairava no ar dava um toque quase mágico ao lugar. Após passar pela livraria-café, mercado e um dos restaurantes tradicionais da cidade comecei a compreender por que minha tia-avó havia amado este lugar.Mesmo assim, a inquietação não me deixava.Passei algumas horas perambulando, tentando absorver um pouco do que a cidade tinha a oferecer. Passei no cartório para assinar os papeis e assumir titularidade da casa, me aventurei em uma loja de antiguidades que parecia ter séculos de poeira acumulada e comprei alguns suprimentos em outro mercadinho.Tudo ali era diferente do que eu conhecia. Ainda assim, por mais que tentasse, a sensação de pertencimento que senti na casa não se repetia aqui. Era como se a cidade, de alguma forma, estivesse me testando.— Por que existe esse símbolo em quase to
As árvores ao lado da estrada passavam como vultos enquanto eu corria de volta para casa, em minha forma animal. Havia uma pressão em meu peito, como um incêndio que recusava a ser apagado. Quem ela pensava que era, me desafiando daquela maneira? Ela nem tinha ideia do que estava em jogo.Ainda assim, não consegui tirá-la da minha cabeça desde o momento em que a vi. E isso só piorava as coisas.“Eu vou decidir o que fazer com ela.” As palavras ecoaram na minha mente, irritantes como um zunido constante. Como se ela tivesse algum tipo de controle sobre a situação. Sobre mim.Não, eu não podia permitir isso. Eu precisava de controle, manter a ordem. Desde que assumi a liderança após a morte do meu pai, tudo o que fiz foi garantir a integridade da minha Alcateia e das nossas terras. Agora, com ela aqui, parecia que tudo estava prestes a ruir. Cheguei à porta de casa em um salto poderoso, os músculos das patas impulsionando meu corpo com força.O ar da noite cortava meus pulmões, um lembr
A noite tinha se instalado, trazendo consigo uma quietude que eu não conseguia encontrar em mim mesma. Após ligar para minha mãe e contar como havia sido o meu dia, preparei um chá de camomila, peguei um livro para ler, mas não consegui me concentrar, as palavras se misturaram, ficaram borradas e então cochilei.Minha mente retornou ao encontro de mais cedo.Arturo Pellegrini. Alto, poderoso, e incrivelmente irritante. E ao mesmo tempo... instigante.Meu corpo ainda carregava os resquícios da energia que ele trouxe consigo, um arrepio subindo pela espinha quando lembro da forma como me olhou. Senti um calafrio na espinha e acordei assustada.— Pare de pensar nisso, tire-o da sua cabeça e foque em resolver suas coisas e voltar para sua vida — me repreendi.Deixei o livro na poltrona, fui até a janela e encarei a floresta lá fora. A escuridão parecia densa, a neb
Eu podia sentir cada fibra do meu ser tensionada, como se estivesse conectada a tudo o que acontecia lá fora. A respiração ficou presa em minha garganta quando Arturo recuou, os flancos arfando, o sangue escorrendo por sua pelagem escura.— Não, não, não... —sussurrei, minhas mãos apertando a cortina até meus dedos ficarem brancos.Ele estava sendo empurrado para trás, para fora do portão, e algo nele parecia estar quebrando, como se cada passo fosse um fardo insuportável. Mas então ele parou. Ficou imóvel por um segundo que pareceu uma eternidade. Os lobos ao redor recuaram levemente, rosnando baixo, aguardando seu próximo movimento. A tensão no ar era sufocante, e eu podia sentir meu coração batendo tão forte que ecoava em meus ouvidos. E então, ele avançou.Com um rugido que parecia surgir das profundezas da terra, Arturo se lançou para frente, e o som de sua investida foi como o de uma onda se quebrando contra rochedos.Os lobos se dispersaram, tentan
Arturo dormia pesadamente diante da lareira, seus músculos tensos finalmente relaxando enquanto eu terminava de limpar a bagunça da noite. Olhei para ele, sentindo uma tempestade de emoções que não conseguia controlar. O ataque dos lobos tinha sido brutal, violento, e eu sabia que ele havia se ferido gravemente para me proteger.No entanto, eu não entendia nada do que estava acontecendo.— Por que esses lobos vieram atrás de mim?Eu me sentei no chão, encostada na parede, tentando organizar os pensamentos. Meus olhos continuavam a vagar em direção a Arturo, mesmo quando eu tentava olhar para qualquer outro lugar.Ele era tão... poderoso.Mesmo agora, com as roupas rasgadas e os ferimentos ainda visíveis em sua pele, a força que emanava dele era quase palpável. E era isso que me assustava. Eu sabia que deveria estar mais preocupada em sair daqui,
— A lua?Quis rir, mas a seriedade em seu rosto impediu o som de sair. Tudo dentro de mim gritava que aquilo era loucura. Mas então, um arrepio percorreu minha espinha, como se algo no ar ao nosso redor estivesse reagindo às palavras dele.— Quem é o seu povo?— Nós somos lobos e a lua é a fonte do nosso poder, nossa rainha. Minha cabeça girou. Nada disso fazia sentido.— E o que você é, Arturo?Ele se virou lentamente para me encarar, e quando seus olhos encontraram os meus, eu senti um arrepio percorrer minha espinha.— Eu sou parte disso. Sou o Alfa máximo da minha Alcateia, sou o guardião dessas terras. E você, Mirella, é a lua.A sala pareceu girar ao meu redor.As palavras dele atingiram meu peito como uma onda, deixando- me sem ar. Guardião? Eu era a lua? Eu não sabia se queria rir ou gritar. Isso era ridículo. Era impossível.E, no entanto, havia algo em seu tom, em seu olhar, que fazia tudo parecer... verdadeiro
Eu o encarei, esperando que ele recuasse. Mas Arturo não se mexeu. Ele se manteve ali, próximo a ponto do calor de seu corpo irradiar, como uma brasa prestes a incendiar tudo o que estivesse ao nosso redor.Minha respiração acelerou, e por mais que eu tentasse, não consegui desviar o olhar dos seus olhos prateados.Havia algo ali, algo que me puxava para ele como um ímã.O ar parecia se tornar mais denso, carregado de uma energia que fazia minha pele se arrepiar. Meu coração martelava em meus ouvidos, abafando todos os pensamentos racionais.“Não posso,” minha mente protestou, mas meu corpo se inclinou, se aproximando, quase sem perceber. Ele ergueu a mão, como se fosse me tocar, e todo o meu corpo se enrijeceu em antecipação. Eu prendi a respiração, meus lábios se entreabriram sem que eu me desse conta. O calor de sua palma se aproxim