Paris — Quatro anos antes.
Caminho pelo Jardim do Luxemburgo com meu livro em mãos e aproveito o calor dos raios solares em meu rosto. O clima agradável do verão permitiu que muita gente saísse de casa e enchesse as ruas de cores e vida.Sorrio ao ver todas as pessoas felizes, desde senhoras a bebês, e me sinto bem por estar de volta a essa minha casa. O ar parisiense repõe minhas energias há algum tempo esgotadas pela rotina um tanto quanto agitada da majestosa Londres.— Angel? — ouço uma voz masculina e procuro pelo dono.Quando o vejo, sou tomada por surpresa. Não esperava mesmo encontrá-lo aqui.— Gabriel? — sorrio ao me aproximar dele. Só depois que o cumprimento com dois beijos na bochecha, o que o deixa sem graça, lembro-me de que nós dois somos ingleses e me afundo em vergonha — Desculpe. Mania muito francesa, não é? Sinto muito. Às vezes é mais forte do que eu.— Você está muito francesa para uma inglesa — ele brinca ao avaliar minha roupa. Talvez seja o lenço em meu pescoço, talvez não. — Só falta a boina. Se eu não conhecesse, com certeza diria que você é uma nativa.— Eu não fico muito bem de boina — dou de ombros, mas Gabriel continua sorrindo. — Mas o que você está fazendo aqui em Paris? Passeando? — coloco meus óculos escuros na cabeça.— Ah, não — ele enfia as mãos nos bolsos do jeans — Vou fazer um show aqui amanhã.— Sério? Que ótimo! — sorrio. — E você já conheceu a cidade?— Eu e os caras da banda demos uma volta, tiramos umas fotos pelos pontos turísticos... — seu sorriso é divertido. — Eu estava procurando um lugar para comer alguma coisa, na verdade.— Bom, eu estou indo comer crepe. Quer me acompanhar?Protejo meus olhos com as mãos para poder enxergar o seu olhar caramelizado pela luz do sol. Um sorriso me é oferecido.— Claro.— Então vamos. É logo ali — aponto para frente com a cabeça e começamos a caminhar.O trajeto até a crêperie não é longo, mas o fazemos sem pressa. Conversamos sobre sua estadia na cidade. Conto que cresci nessa região e só voltei a morar na Inglaterra por volta dos doze anos, embora viajasse para lá muitas vezes ao ano.— Aqui tem os melhores crepes do mundo e outros docinhos — digo ao entrarmos na loja e aponto para o balcão com todos os tipos de macarons possíveis e imagináveis, de diversas cores e recheios. — Já experimentou macarons?— Meu Deus — seu queixo cai pela quantidade inimaginável dos doces em exposição. — Não, mas vou ter que provar.— Vai, sim — concordo, rindo pela sua expressão.O horário de pico já passou e o local está bem tranqüilo. Espero que ninguém atrapalhe Gabriel comendo. Propositalmente, escolho uma mesa ao fundo estabelecimento e escolhemos por crepes doces cheios de chocolate e sorvete.Quando o garçom nos dá as costas, Gabriel sorri e diz:— É engraçado ouvir seu sotaque francês.— Por quê? — arqueio uma sobrancelha, mas estou sorrindo.— Não sei — ele dá de ombros. — Num momento, você está falando comigo em inglês e eu entendo cada palavra. No outro, começa a fazer biquinhos e enfatizar os erres, então não entendo mais nada.— Você se acostuma, mas, se eu começar a falar com muito sotaque enquanto conversamos, é só me chamar a atenção que eu corrijo — prometo.Enquanto os crepes não chegam, continuamos a conversar como se já nos conhecêssemos há um bom tempo. Aponto para o outro lado da rua, indicando a Academia de Dança em que pratiquei balé quando mais nova, e Gabriel ri quando conto que fugia das aulas em que treinávamos ficar na ponta dos pés. Infelizmente, minha mãe sempre me encontrava e me obrigava a voltar.Arrepio-me de prazer quando levo a massa cheia de chocolate derretido à minha boca e vejo Gabriel ter a mesma reação.— Esse é, sem dúvidas, o melhor crepe da história.— Eu disse — sorrio, sentindo-me vitoriosa.— De agora em diante, eu aceito qualquer dica sua! — ele contempla o crepe no prato.Fico olhando para o seu sorriso por um tempo e sou motivada a sorrir também. Gabriel é uma pessoa muito agradável. Percebi isso desde o dia que nos conhecemos no noivado da minha melhor amiga há uns meses. Desde então, todas as vezes que conversamos eu me senti estranhamente à vontade ao seu lado.Ele é uma boa pessoa. Tenho certeza disso quando fixa seu olhar no meu e me mostra o sorriso mais verdadeiro que alguém um dia já me direcionou....
Rio ao ouvi-lo tentar pronunciar algumas palavras em francês.— Ok. Tente com o meu nome do meio: Victorine.Gabriel tenta e se enrola na pronúncia.— Isso, sim, é engraçado — brinco. — Um dia você conseguirá. Não se preocupe.Paro de andar quando chegamos a um marco no chão, mas duvido que ele tenha percebido outra coisa que não seja a enorme Notre Dame e posso perceber que está impressionado com o tamanho da catedral. Já está escuro, mas prometi que o traria a mais um lugar.— Obrigado pelo encorajamento, mas não sei se posso acreditar nesse caso... — Biel finge estar decepcionado, porém sorri depois. Balanço a cabeça e olho para o chão, mudando de assunto em seguida.— Estamos no Point Zéro, o marco zero de Paris — explico. — Daqui se calcula a distância entre Paris e as outras cidades francesas. Existem muitas lendas e superstições envolvendo esse lugar — Gabriel olha para o círculo no chão com uma rosa dos ventos gravada ao meio. — Uma delas diz que, se você fizer um pedido pisando dentro do marco, ele se realiza. Tente — encorajo e ele pisa na rosa dos ventos.Incerto do que fazer, Biel fecha os olhos e só volta a abri-los segundos mais tarde.— Só isso? — ele pergunta e eu assinto. Olho para o céu estrelado e sinto a brisa leve me atingir. — Você não vai pedir?Olho para o marco e respiro fundo.— Eu não acredito em superstições, mas posso fazer um esforço por você — digo, posicionando-me bem onde Biel estava.Fecho os olhos, mordo o lábio e penso no que gostaria de pedir.Não peço algo ou alguém. Peço um o quê: um sentimento.O percurso até minha casa nunca pareceu tão próximo. Não sei se pela companhia agradável e por não pararmos de falar por nenhum segundo ou por andarmos um pouco mais rápido.— Obrigado, Angel. Eu gostei de conhecer a cidade. Ela é bem... Romântica — Biel enfia a mão nos bolsos e sorri de canto assim que chegamos a nosso ponto de despedida. Rio do adjetivo escolhido para descrever Paris e me sento no terceiro degrau da pequena escada de acesso à casa.— Não há de quê — dou duas leves batidas no chão, convidando-o a se sentar ao meu lado enquanto espera seu motorista chegar. — Você ainda tem o meu número? — pergunto assim que ele se senta.— Sim.— Caso você precise de mais alguma ajuda enquanto está aqui, fique à vontade para me ligar — aviso, observando-o olhar para o céu. Biel assente.Não consigo pensar em mais nada para dizer e caímos no silêncio. Ficamos sentados, apenas olhando para as estrelas, sua mão quase tocando a minha e não me atrevo a movê-la.
— Mad? — ele me chama e viro o meu rosto para encará-lo.Antes que eu possa responder qualquer coisa, Gabriel me beija. Antes que possa entender o que aconteceu, ele já caminha até um carro preto parado em frente à minha coisa, desejando-me uma boa noite antes de ir.Só consigo sorrir em resposta, sem entender o que se passa em minha cabeça. Entro em casa e não consigo esconder minha felicidade. Afinal, essa é a Cidade do Amor, não é? O que pode dar errado?Londres — Atualmente.A claridade atravessa as cortinas do quarto do meu namorado e me viro para observá-lo dormir. Biel dorme tranquilamente e não tento acordá-lo. Sinto a felicidade correr pelo meu corpo ao perceber quão próximos estamos por dividir o travesseiro.Fico deitada ali por algum tempo, apenas olhando para o seu rosto, pensando em como parece certo estar com ele ao meu lado, até que seu braço envolve minha cintura e Gabriel aproxima mais nossos corpos.— Bom dia, princesa — ele limpa a garganta, tentando se livrar da rouquidão presente em sua voz.— Bom dia, amor — respondo com um sorriso no rosto.— Dormiu bem?— Muito, e você? — brinco com o seu cabelo.— Não consigo me lembrar de ter dormido tão bem nos últimos meses — só deixo de sorrir quando Biel pressiona seus lábios contra os meus e já posso começar o dia....
Destranco a porta de casa e, assim que entramos, vejo Cristina correr na direção do meu namorado.— Biel! — ela sorri largamente e espera até que ele se agache para abraçá-la.— Tudo bem, Cris? — ela assente.— E você?— Muito bem também — Gabriel sorri para a garotinha.— Você vai jantar aqui, Biel? O papai disse que você pode comer com a gente — a curiosidade brilha nos olhos da minha irmã.Gabriel olha para mim com um sorriso e depois volta a encarar Cris.— Você quer que eu fique? Eu só fico se você quiser — ele pisca para ela.— Quero. A mamãe está fazendo lasanha...— Então eu vou jantar com vocês — Gabriel se levanta e minha irmã sai saltitante pela casa.Sigo para a cozinha com Biel atrás de mim e vejo minha mãe mexendo o molho de tomate.— Vamos ter visita? Não acredito que você está cozinhando! — rio e minha mãe revira os olhos.— Vamos, então tente não me fazer passar vergonha — ela devolve a cutucada, mas não me abalo. — Olá, Gabriel.— Oi, Viviana — ele sorri e acena, porém mamãe não se dá ao trabalho de sorrir de volta.Reviro os olhos para a verdade: não importa o que Gabriel faça, minha mãe nunca será capaz de gostar dele por um motivo ridículo.— Meu pai está aqui? — pergunto, sentando-me em um dos balcões.— Não. Hoje ele foi para o escritório, mas, pelo horário, já deve estar voltando — mamãe verifica o relógio. — Não demore para se arrumar. Ok? O sócio do seu pai e a família dele estarão aqui hoje e você precisa passar uma boa impressão. Acho que você conhece o filho dele, Guilherme Leto.— Posso dizer que a Junia conhece melhor que eu... — dou de ombro e seguro a mão do meu namorado.— Imaginei — ela pega uma forma no armário. — De qualquer forma, é importante. Não tente fazer nada que vá envergonhar seu pai, por favor, e desça da&iacut
O clima fica um pouco tenso depois dessa pequena troca de farpas. Meu pai quase precisou de um milagre para que as pessoas voltassem a conversar naturalmente. No final, acho graça de tudo isso. Guilherme não tem com quem competir, Leonora não precisa fazer uma propaganda tão exagerada sobre o filho, não há a necessidade de mamãe jogar na cara que acha que esse seja uma melhor opção que meu namorado, mas força meu pai tornar a situação menos vergonhosa. Contudo aproveito a primeira deixa — Viviana indo colocar Cristina na cama quando a pequena começa a bocejar sem parar — para pedir licença e sair da mesa com Gabriel.Gen e Guilherme nos acompanham discretamente à medida que nos levantamos das cadeiras. Minha irmã segura meu braço antes de eu alcançar a escada para o segundo andar da casa:— Achei que a mamãe enfiaria o garfo
Solto as mãos de Henrique para me distanciar um pouco e me abano.— Ai, ainda estou um pouco zonza — consto ao fazer uma careta.— É o efeito do coração partido... — Henrique provoca.— Vou esfregar na sua cara que, mesmo sofrendo, vou sair maravilhosa dessa situação — jogo meu cabelo completamente úmido de suor e ele dá risada. Henrique é meu parceiro há um bom tempo. Sempre temos alguma piadinha para provocar o outro.— Cuidado, hein, Madelinne... — Rachel avisa, mas tem um sorriso nos lábios. — Vamos. De novo! — ela volta a ordenar depois de espirrar água em nós dois....— Amor da minha vida, o que aconteceu com você? — pergunto, olhando diretamente para seus olhos castanhos. Gabriel não olha para mim.Cruzo os braços e solto uma p
Fico paralisada ao mesmo tempo em que agarro os pulsos de Gabriel com toda a minha força. A sensação de pânico me faz querer chorar. Por isso me agarro ao meu namorado.— Calma. Respire — ele diz calmamente, ao me aconchega em seu peito. Ouço seus batimentos cardíacos tranquilos e agarro sua cintura. Dou um grunhido ao escutar mais um estrondoso trovão. — Shh... — Biel acaricia minha cabeça.Tento me concentrar no som do coração do meu namorado e ignorar a chuva que bate forte contra o telhado.Não tenho medo de chuva, até porque Londres e Paris devem ser os lugares mais chuvosos da face da Terra. O problema é que aceito uma inofensiva garoa fina numa boa, ao passo que odeio ter que ouvir trovões e olhar os raios iluminando o quarto escuro. Já perdi as contas de quantas vezes corri para a cama dos meus pais, desde pequena, quando os trov&otil
Não como nada no café da manhã. Só minha vitamina já consegue embrulhar meu estômago. Gen também não fala muito e decide me ignorar completamente, enquanto conversa com a mamãe. Cris é a única que sorri o tempo todo, principalmente porque Peyton assou fornadas de cookies por causa do aniversário de Junia e a garotinha não parou de comer até agora.– Ok, o que aconteceu com vocês duas? – mamãe pergunta diretamente para mim depois que Gen sai da mesa.Penso muito bem no que responder antes de abrir a boca e encaro a ruiva à minha frente. Não cabe a mim contar o motivo da briga.– A gente só discutiu. Vai ficar tudo bem.Saio da sala de jantar e subo para o meu quarto, pronta para pegar minha bolsa e ir para a Academia dar aula de dança para crianças....Passo p
– Angel de Oliveira – ele vai fazer. Biel tira uma caixinha do bolso. Ele vai. Meu coração quase explode no peito de tão acelerado. Senhor, ajude-me! – Eu sei que você prefere que nossos melhores momentos aconteçam quando estamos só nós dois. Por isso achei que agora seria o melhor momento – calor. Estou com muito calor. – Desculpe não poder ajoelhar, mas... Você aceita ser a futura senhora O'Connor?Incrédula, fico olhando para aqueles olhos castanhos boquiaberta, procurando algum sinal de brincadeira ou qualquer coisa do gênero. O anel dentro da caixinha preta é lindo, todo cravejado. Sinto a maçã-do-amor revirar na minha barriga, então minha ficha cai. Preciso responder alguma coisa. Em vez disso, começo a rir de desespero.– Claro que quero, Gabriel! Não me assuste mais, pelo amor de Deus! – percebo que estou trem
— Angel, eu estou tentando ajudar — ela tenta tocar meu ombro, mas recuo novamente por pura raiva.— Pare! — grito. — Não preciso da sua ajuda. Eu sei o que estou fazendo!— Quando você estiver chorando por não ter alternativas, me agradecerá por ter avisado.— Eu não vou deixar o Gabriel! Vamos nos casar e ninguém vai impedir — as lágrimas que tentei segurar escorrem quentes pela minha bochecha. — Qual o problema em ficar feliz por mim uma única vez?— Nenhum! Mas eu sei do que estou falando, Angel! Eu não vou poder protegê-la da verdade para sempre! — minha mãe continua dura, mas sei que está tentando se conter para não desabar aqui mesmo. — O que você decidir agora vai mudar a minha vida também.Essas palavras chegam aos meus ouvidos como se fossem um tapa da realidade. Eu nunca ouvi
Enquanto passo pelo corredor para chegar ao meu quarto, ouço a voz de minha mãe atravessando a porta:— E você acha que eu quero que minhas filhas passem por isso?!— Fale baixo, Viviana! — papai a repreende e não ouço mais nada.Tenho vontade de invadir o quarto e mandá-los ficar quietos. Gostaria de saber que raio de segredo é esse que eles estão escondendo, mas, nesse momento, não posso fazer dessa briga minha prioridade.Entro de uma vez no meu quarto e já ligo para Gabriel.— Você não está bem, né, princesa? — ele questiona depois que eu o cumprimento.— As coisas aqui em casa não estão bem desde... — solto todo o ar preso em meus pulmões e agarro meu travesseiro.— Desde que noivamos — Biel completa. Prendo a respiração.Sei que ele sabe que essa é