Lucy virou as costas, saiu passando pela porta pisando duro e seguiu pelo corredor em direção à saída do hospital, sendo seguida em passos largos por Nice. Betão permaneceu no mesmo lugar e ouviu Gabriel em uma chupanga como se fosse um animal feroz ferido.
– Merda, merda, merda, droga seria melhor não ter se esforçado tanto e ter morrido lá!
O silêncio que se instalou foi estarrecedor, Betão resolveu entrar no quarto para ver o que estava acontecendo, e viu Gabriel quase sentado na cama, com o travesseiro nas costas, encostado à cabeceira da cama, o enorme cabelo em total desalinho, as lágrimas escorrendo pelo rosto umedecendo a espessa barba. Betão o cumprimentou:
– Oi, e aí, tudo bem?
Chegando à portaria do hospital, ela se identificou e forneceu o nome de seu filho, solicitando o direito de visitá-lo. Depois que a recepcionista anotou seus dados, forneceu-lhe um cartão de visita para ser fixado no peito e lhe orientou como chegar ao quarto. Terminado o elevador ela entrou em um longo corredor, virou à direita e à esquerda, perguntou a algumas enfermeiras que passavam e foi novamente orientada até que chegou a um amplo quarto onde estava uma única cama e Gabriel deitado sobre ela. Mara correu até seu filho e o abraçou, por um longo tempo se ouvia apenas o soluço, e via-se ela enxugando as lágrimas, por várias vezes, ela ficava apenas olhando para o rosto de Gabriel até que a emoção foi passando. Ela comentou sobre o cabelo comprido e a espessa barba, mas ele prometeu que assim que pudesse se livraria dos dois. Conversaram por um longo tempo até que alguém apareceu avisando que a visita estava terminando. Depo
Mara terminou a vista a Gabriel percebendo que ele estava bem melhor, e com toda certeza ele iria para casa logo, o que encheu seu coração de alegria. Como de costume deixouo necessário, despediu-se e seguiu pelo corredor em direção à portaria do hospital, cumprimentando guardas, enfermeiras, as recepcionistas. Depois de alguns quarteirões, alcançou o ponto de ônibus, não esperou muito e já apareceu o circular com destino ao bairro Novo Horizonte. Ela embarcou, e, depois de passar a catraca e pagar a passagem ao cobrador, escolheu um assento à janela, e desligou-se do mundo. Seus pensamentos eram lembranças dos últimos dias, o prazer de ter seu filho são e salvo de volta. Depois de uns quarenta minutos no circular em movimento, mais parecendo um barco sendo balançado pelas ondas do mar, o ponto de descida de Mara se aproximava. Ela
Alfredo deu um passo, ainda com o olhar no chão:– Gabriel, me desculpe por tê-los abandonado, eu fui a São Paulo procurar emprego, além de não conseguir o trabalho eu fui roubado, fiquei sem dinheiro e documentos, acabei ficando na rua como mendigo, sem poder voltar. Eu sei que fui totalmente errado, só gostaria que você me perdoasse.Alfredo mal conseguiu terminar as palavras e começou a chorar, as lágrimas lhe escorrendo pelo rosto.Gabriel tomou a palavra:– Não precisa se desculpar, pelo que vejo você não foi culpado, foi um acidente! Mara retirou uma caneca de alumínio de uma das quatro bocas de seu belo fogão branco, derramando-a o restante da água que nela fervia sobre o pó de café que estava no coador sobre o bule na pia de granito da cozinha. Ficou olhando até que toda a água filtrou, deixando apenas uma borra de pó de café úmido dentro do coador. Tirou o coador de cima do bule, despejou o café em uma garrafa térmica até enchê-la e fechou-a com tampa. Ainda do bule, despejou um pouco em um copo de vidro e começou lentamente a degustá-lo em pequenos goles, olhando pelo vitrô aberto da cozinha, vendo apenas o muro que separava a edícula alugada da casa dos proprietários à frente, seus pensamentos iam muito, mas muito além daquele pequeno espaço físico entre ela e o muro. Não havia pressa; era manhã ensolarada de domingo, era seu abençoado dia de folga, uma merecida folga depois de uma semana cansatiCapitulo 1
Mara bebeu o último gole de café em meio a esses pensamentos, lavou o copo e depositou-o sobre o escorredor de louças. Pegou outro copo limpo, abriu novamente a garrafa térmica e mais uma vez derramou café no copo. Então abriu o armário, alcançou a lata de leite em pó instantâneo e o açúcar, colocou uma colher de cada um dentro do copo com café e mexeu com a mesma colher até a mistura ficar homogênea; apossou-se de um pãozinho, abrindo-o com uma faca de serra e passando margarina com a mesma faca nas duas partes do pão. Esticou o braço, alcançando a sanduicheira, abrindo-a e acomodando-as duas partes do pão lá dentro, fechando-a e introduzindo o plugue na tomada acendendo uma luz vermelha na parte de cima da sanduicheira.Ficou aguardando aquecer o pão, ouvindo alguns estalinhos, até que uma luz ve
Mara ajudou a mãe com as tarefas caseira, agora havia um misto de alegria no seu coração, e a canseira pelas noites passadas às claras chegou; então ela foi dormir cedo, não viu seu pai chegar. A noite passou em um segundo, ela apenas acordou quando o despertador começou a tocar, arrumou-se e seguiu para a escola. Quando chegou, suas amigas estavam em um grupo do lado de fora a esperando; mal ela se aproximara e elas a rodearam com dezenas de perguntas. Mara as respondeu com sinceridade, mas a maioria não acreditou, pensavam que ela estava blefando, a maioria dos moços já iam perguntando se elas tinham namorado; se queriam ficar e estas coisas, agora este moço parecia demais equilibrado, procurando fazer amizade,falando de si sem perguntar nada, estava muito estranho. Quando soou a sirene após a ultima aula, Mara seguiu suasamigas como de costume. Atravessava o pátio quando alguém disse:
Mara não dormiu, pensando em Alfredo, em como poderia avisá-lo de sua ausência na escola; por fim chegou à conclusão que não tinha outra saída, principalmente porque ela sairia bem cedo, viajaria no mesmo circular com sua mãe e seu pai. O jeito era esperar que Alfredo, ao perceber sua falta, apenas esperasse a sua volta à escola no dia seguinte. Caso ele viesse à sua casa, ela tentaria explicar para a mãe que eram apenas amigos do mesmo grupo de trabalho escolares. Mesmo assim o sono não veio, até que sua mãe a chamou na porta do quarto, dizendo que se levantasse e se aprontasse para saírem.Ainda estava muito escuro, ao ponto de não se ver outra pessoa. Próximo na calçada, seu pai co
Saíram do hospital em direção ao ponto de ônibus de volta para casa, em silêncio, elas pareciam que estavam indo ao velório de um parente próximo. Mara estava chocada, não acreditava; o circular passava rua por rua, praça por praça, cada vez se aproximando mais de casa. Por um lado, Mara estava alegre, desejava muito ver Alfredo. Depois de uma viagem longa chegaram, já estava entardecendo, a terra deixava escapar os últimos raios solares vermelhos alaranjados no poente, semelhante a um animal feroz que vai engolindo um pássaro e ficam faltando apenas as últimas penas das asas.Elas entraram em casa, Mara foi direto ao seu quarto, ela não sentia fome; além do mais, teriam que conversar com seu pai, o que não era tarefa fácil. Ela preferiu deixar para sua mãe, que tinha um jeitinho especial para essa