Protegida nos braços do homem por quem — agora sabia — estava perdidamente apaixonada, Gisele refletia. Tentava buscar em sua mente algum resquício de arrependimento pelo que tinha acabado de acontecer, mas estava tão em êxtase, que mal conseguia esconder. E não queria. Fazia tempo demais que não sorria daquela forma tão plena, que se sentia uma boba, uma adolescente. Tanto que começou a gargalhar sem nenhum motivo.
Rodrigo, que estivera com os olhos fechados até então, abriu-os e estreitou os braços ao redor dela, também sorrindo e sendo contagiada.
— Do que está rindo? — ele indagou curioso.
&nbs
Rodrigo dirigia em silêncio, com os dedos firmemente presos ao volante. Segurava-o com tanta força que os nós de seus dedos chegavam a ficar brancos. Gisele, ao seu lado, também estava calada, preocupada. Era como se aquela estrada à frente fosse um corredor da morte, a julgar pela morbidez de suas expressões. A cada quilômetro que avançavam, Rodrigo dava uma olhada nela, quase com a esperança de que mudasse de ideia e pedisse, assustada, que ele desse meia volta e retornasse para Valença, para a fazenda onde ele sabia que poderia mantê-la segura. A partir do momento que cruzassem a entrada para o Rio de Janeiro, não poderia prometer mais nada. O tempo, inclusive, combinava com seus humores. O dia estava cinzento, cheio de nuve
Ainda um pouco desorientado, Rodrigo começou a abrir os olhos. A dor lancinante em sua nuca manifestou-se como uma punhalada, deixando-o zonzo por mais alguns segundos. Tanto que precisou se deitar novamente no chão, incapaz de se levantar. Não conseguiu se lembrar de muita coisa nos primeiros minutos depois de recuperar a consciência, mas aos poucos sua memória começou a retornar. Flashes de pessoas mascaradas partindo para cima dele invadiam sua mente, e ele logo compreendeu o que tinha acontecido. Então, um único pensamento sobrepujou todos os outros: Gisele. Ainda não se sentia completamente estável para se levantar, mas o fez, mesmo cambaleante, e subiu as escadas de dois em dois degraus. Abr
Um gosto amargo na boca, uma dor lancinante na nuca e uma estranha sensação de não conseguir se mexer. Gisele sentia as pálpebras pesadas, o corpo dolorido deitado sobre algo concreto e duro que — definitivamente — não era a sua cama. Estava confusa também. Não fazia ideia do que tinha acontecido ou onde estava, só sabia que temia abrir os olhos. As memórias começaram a retornar à sua mente de forma perigosa. Não pareciam dispostas a lhe dar trégua ou suavizar as notícias. Antes mesmo de precisar olhar ao seu redor, já sabia que tinha sido sequestrada. Estava com tornozelos atados e com os punhos presos às costas. O gosto amargo na língua provinha de um pano que a amordaçava e que não parecia dos mais limpos.&nbs
Rodrigo podia jurar que iria furar o chão de tanto que andava de um lado para o outro na sala de espera do hospital. Queria notícias, mas apenas Célia e o marido puderam subir para o andar da Unidade de Terapia Intensiva. Ele tivera que ficar no andar da recepção, em companhia de Rodolfo, o que era um pouco constrangedor. Este, na verdade, estava um pouco mais calmo, embora também parecesse preocupado, mantendo a mão na cabeça, com uma expressão sofrida no rosto. Um médico surgiu, e Rodrigo praticamente pulou em cima dele, mas não se tratava do mesmo que estava operando Gisele. Ainda não havia nenhuma novidade. — Rodrigo, por favor, se controle. Isso não vai ajudar Gisele em nada.&
Os saltos do sapato Loubotin batiam no piso de porcelanato do restaurante conforme ela andava. O som, ao qual ela sequer prestaria atenção em qualquer outro momento, parecia tão irritante quanto o zumbido de uma abelha instalada bem dentro do ouvido. Não que isso fizesse diferença, afinal, ela já estava irritada o suficiente. Tinha acabado de saltar de seu carro e naquele exato instante caminhava em direção a mesma mesa de sempre: a redonda, para seis lugares, na varanda do estabelecimento. Não que precisassem de espaço, mas Célia Loureiro queria ter controle sobre tudo e gostava de ter mais coisas do que realmente necessitava. Até mesmo cadeiras em uma mesa estúpida de um restaurante.&n
Como um leão enjaulado, ele caminhava de um lado para o outro, marchando sobre o piso impecavelmente limpo que cheirava a limão. Rodrigo não gostava de esperas. Não gostava de portas fechadas, muito menos de cochichos e olhares cúmplices onde não participava do segredo. Odiava ser deixado de lado ou enganado. Principalmente porque, sendo um homem justo, dificilmente enganava a alguém. Seu pai sempre dizia que esperava demais das pessoas, que nem todos os seres humanos pensavam da mesma forma, que cada criatura tinha uma alma diferente, que agia conforme sua própria índole. Muitas vezes, o bom e velho Chico Baroni resmungava reclamando que Deus poderia ter colocado um filho com um pouco menos de caráter em sua vida, pois el
Era quase meio-dia quando Gisele acordou com o barulho da campainha tocando. Exatamente como prometera, Rodolfo passara a madrugada inteira disposto a várias rodadas de sexo, das formas mais criativas possíveis, e agora ela estava um caco. Assim que conseguiu abrir os olhos, pesados e grudados do rímel da noite anterior, que ela esquecera de tirar, percebeu que seu noivo não estava mais do seu lado na cama. Estava sozinha. Sobre o travesseiro, havia um bilhete avisando que ele tivera que ir ao escritório para resolver um problema urgente, mas que estaria de volta para o jantar. Pedia que ela estivesse pronta, pois a levaria em seu restaurante favorito. Era sempre assim que ele resolvia suas ausências. Naquele sábado em particular, eles tinham combinado de resolver juntos algumas últimas decisões da festa de casamento, mas, pelo visto, ela teria que
Seu pai diria que estava louco. E só poderia estar mesmo levando aquela garota consigo, para ficar instalada em sua fazenda. Provavelmente a tinha salvado; a julgar pela violência com que tinham tentado arrombar a porta, com certeza não queriam apenas sentar, tomar um café e conversar. Queriam pegá-la, talvez para chantagear Rodolfo. Pediriam dinheiro? Talvez. Poderiam até não fazer mal à moça, mas ele não acreditava muito nisso. Diante desse cenário, como poderia ficar de braços cruzados? Se Rodolfo estava com problemas, impossibilitado de ajudar, era seu dever proteger a mulher que ele deixara para trás. Era isso que um homem honrado faria. Até porque não era a primeira vez que agia dessa forma. Estava cansado de limpar as merdas que