CAPÍTULO 01 - VISÃO

O cheiro do sangue era tão forte que parecia palpável no ar, misturando-se aos gritos intensos que ecoavam por toda a alcateia. Rosnados seguidos de rugidos aumentavam a sensação de caos:

— Estamos sendo atacados! — Gritou alguém ao longe.

Olhei para minhas mãos, tocando meu rosto assustada. Puxei alguns fios de cabelo para frente e vi as pontas roxas. Uma visão que me deixou perplexa.

— Minha Deusa, eu estou enxergando? — Olhei ao redor, vendo vários lobos caídos. Era uma carnificina. Não muito longe, avistei meu pai se aproximando em sua forma de lobisomem. Ele tirou a mão do local ferido, onde deveria estar o coração, havia um enorme buraco. Ele se arrastou até ficar a centímetros do meu rosto, pousando sobre meu pescoço.

— Tudo isso é culpa sua, da maldição que você carrega! — Rosnando fraco, Hunter me encarava com extremo ódio. — Vou levá-la junto comigo.

Apertando com mais força, encarei a barriga do meu pai e vi uma mão atravessá-la próximo ao meu corpo. Algo em suas costas chamou minha atenção, tremi, arregalando os olhos ao ver um enorme lobisomem negro de olhos amarelos sorrir com deleite pela vitória.

— Quem é você? — Sussurrei, impactada com a cena à minha frente.

Tirando o braço das entranhas de Hunter, a fera puxou meu pai para trás, rasgando mais de sua carne e decapitando-o, jogando a cabeça sobre os ombros peludos, onde o vermelho se mesclava com os tons negros.

— Seu novo destino! — A voz empoderada carregava uma enorme pressão de poder, tremendo o chão ao nosso redor.

Um ruído chamou minha atenção. Ao me mexer, gemi de dor, percebendo que havia despertado de uma visão direto para meu pesadelo.

— Quem está aí? — Perguntei, com medo de ser atacada novamente.

— Shiuu, fale baixo Callie... Sou eu! — A voz masculina disse.

Farejei o ambiente, reconhecendo quem estava comigo. Era meu amigo, talvez o único que realmente se importava comigo, já que sofria nas mãos da nossa alcateia.

— Orion, é você? — Indaguei, precisando confirmar, estava muito fraca devido às lesões internas. Mesmo em minha forma lupina, não conseguia cicatrizar rapidamente devido ao pouco tempo entre uma tortura e outra.

— Sou eu, pequena... — Um soluço escapou, sentindo o aroma salgado pairando no ar enquanto ele suspirava. — Droga, o que fizeram com você?

— Ei, você está chorando? — Me esforcei para levantar, em vão, a dor era demasiada.

— Não se esforce, vou passar um creme de ervas em suas feridas e iodo... — Orion explicou.

— Não faça isso, vão descobrir que alguém me ajudou... Podem descobrir que você esteve aqui, sabem o que fariam com você? — Rosnei, contendo o grito que se entalava na garganta quando senti algo gelado encostar em uma das feridas. — Por favor, me deixe morrer e fuja deste lugar!

— Acha mesmo que um Ômega como eu sobreviveria como lobo errante? — Com a voz embargada de tristeza, Orion rosnou de volta. — Aqui é um inferno, mas ao menos tenho você para tornar meus dias melhores.

— Como consegue ser tão tolo? — Abaixei mais o focinho voltando a deitar. — Como pode ter empatia por uma loba amaldiçoada?

— Eu não escolhi nascer ômega, assim como você não escolheu nascer sem visão... Não somos amaldiçoados, apenas somos, injustiçados! — Ele continuou passando ervas em todas as minhas feridas e limpando partes do meu pelo de forma gentil. — Me perdoe por não ter forças o suficiente para salvá-la deste monstro.

— Aiii... — Gemi com a dor antes de prosseguir — Você é um ótimo amigo, Orion, mas quero que me prometa que nunca mais irá se arriscar a vir aqui cuidar de mim, entendeu?

Busquei em volta sentir sua presença fraca, suspirando, senti uma carícia em meus pelos.

— Não posso prometer isto... — Ele suspirou. — Eu não consigo saber que não está bem, você sabe que eu te....

— Ora, ora, o que temos aqui? Dois pombinhos? — Dante rosnava com repúdio. — Que cena mais patética, o que faz aqui ômega insignificante?

— Senhor... — Senti a vibração do corpo de Orion mudar, o calor de seu corpo curva-se. — Eu vim...

— Limpar minhas fezes, Dante... Apesar de ser um lixo, você sabe que Alfa detesta odores de sujeira. — Tomei a frente, farejando em sua direção. — A menos que meu digníssimo noivo se proponha a fazer isto.

— Que nojo! — Ele gritou, rugindo. — Chega a ser uma ofensa ter que me unir com uma criatura como você que me dá náuseas, só para tirar o fardo do nosso rei e poder assumir o trono.

— Dante, o que faz aqui? — O rugido estrondoso de meu pai eriçou meus pelos lupinos, o cheiro dos lobos a minha volta mudou para medo e pavor.

— Meu rei... — Dante disse, ouvi sua leve reverência. — Vim apenas verificar se minha futura prometida precisava ir ao hospital.

— E quem te deu permissão para isso? — Brandou o rei Lycan. — Até parece que gastarei recursos tecnológicos com esta criatura indesejável.

— Perdão, meu Alfa, isso não irá mais se repetir. — Dizia Dante com a voz embargada.

Orion fingia limpar os cantos da cela enquanto eu vivia acorrentada como um verdadeiro animal, dormindo sobre meus dejetos; privada de alimento e higiene básica. Apenas era banhada quando tinha mais um treinamento, onde eu seria a presa caçada pela minha alcateia, pois precisava estar com cheiro singelo para dificultar minha localização.

— Ômega, ela fede a sangue impuro... Jogue água nesta vira-lata antes que minha ira recaia sobre você! — Rugiu o Alfa saindo do local.

— Tiveram sorte dessa vez... — Ameaçou Dante, seus passos se afastando da cela.

— Droga, essa foi por pouco... — Disse Orion com a voz trêmula.

— Você brinca com a sorte, faça logo o que meu pai ordenou antes que sua paciência acabe e ele volte aqui para nos punir! — Engoli o nó em minha garganta, receando ser ainda mais ferida.

— Acabei de passar as pomadas de ervas em você, jogar água não fará efeito. — Explicou meu amigo.

— Isso não importa, sou loba, esta alcateia aceitando ou não. Logo estarei recuperada. — Suspirei, sabendo que até mesmo para o lobo mais forte, isso seria impossível sem tratamento médico adequado. — Ande, jogue logo a água.

— Mas está fria... — Balbuciou triste Orion.

— Orion, agora! — Rosnei enfurecida, não querendo que meu único amigo fosse torturado por minha culpa.

Orion me lavou, tentando ser cuidadoso, mas até o mais singelo toque me fazia contorcer de dor, grunhindo. A todo momento, o ômega se desculpava, e ao finalizar, chamei sua atenção.

— Preciso que me prometa uma coisa, é importante. — Mantive o tom firme, sentindo as mãos dele acariciarem meus pelos lupinos, os escovando com os dedos.

— Não vou deixar de cuidar de você... — Ele respondeu triste. — Não me importo com as torturas.

— Deveria, você não tem noção da dor... Morrer é uma benção! — Falei cabisbaixa. — Preciso que você saia da alcateia e fuja para o mais longe possível.

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