Depois de uma gandaia congruente, num período de estágio no hospital David Bernardino, Márcia e suas colegas saíram para relaxar.
"Viúvas Negras"— era esse o nome que se destacava na cabeceira da porta do espaço lúdico onde Márcia e suas amigas costumavam se apresentar. Não eram clientes, mas dançarinas, garotas que assumiam identidades fictícias para esconder suas vidas fora dali.
— Tenente Márcia, já reparaste como o ambiente mudou ultimamente? — comentou uma das amigas, cruzando os braços com desdém.
Márcia suspirou, observando a movimentação ao redor.
— Nem tanto. Continua a mesma coisa… homens casados, mais velhos, procurando algo passageiro. Nunca aparece alguém diferente, alguém que realmente queira ficar com uma de nós.
A outra soltou uma risada curta, quase cética. Ela era a mais prática do grupo, sempre reduzindo tudo à realidade nua e crua.
— Ah, Márcia… esperavas o quê? — disse, com um toque de ironia. — A maioria chega aqui cheio de dívidas, cansados da vida… No final, só querem esquecer os problemas por algumas horas.
— Nossa, Almirante Jurelma! Que discurso inspirador — retrucou Márcia, arqueando as sobrancelhas. — Esperas que eu bata palmas também?
A terceira amiga, mais sonhadora, que até então apenas ouvia, balançou a cabeça com um sorriso mordaz. Ela ainda acreditava, no fundo, que um dia poderia sair dali.
— Pois continuem esperando, minhas queridas — disse, brincando com a borda do copo em sua mão. — Mas não se iludam. Daqui ninguém sai com promessas de amor… só com marcas que nem sempre se apagam.
Márcia desviou o olhar, pensativa. Sabia que aquelas palavras carregavam mais do que cansaço ou cinismo—havia nelas uma verdade difícil de engolir.
…
Márcia havia chegado do interior de Benguela dois meses atrás para um programa de estágio profissional nos hospitais de Luanda. Chegou a capital com seus 19 anos, assustada, mas precisa e direta em seus objetivos. Sem casa própria e longe da família, perdeu seu pai tão cedo que a única solução era se mudar para Luanda por falta de condições e a procura de novas oportunidades, a cidade era implacável e a pressionava de todos os lados. Foi quando, numa tarde qualquer, ouviu algo que mudaria sua vida de uma simples residente para uma prostituta regrada.
No hospital Maria Pia, enquanto esperava na porta do consultório do médico-chefe, escutou vozes na sala ao lado. Ficou imóvel, segurando a respiração.
— Sabes, Margarida — disse uma voz feminina, satisfeita. — O meu bordel ganhou classe. Com o senhor Humberto lá, os ricaços do país passaram a frequentá-lo.
Márcia arqueou as sobrancelhas.
— Consegui novas modelos — continuou a mulher. — Algumas são daqui mesmo, deste hospital. Elas me trazem as pílulas e, em troca, ganham acesso ao espaço. Disse em um tom baixinho.
Um arrepio percorreu-lhe a espinha. Sem perceber, ela já estava envolvida.
Dois anos depois, já com 21 anos, Márcia vivia uma rotina dupla. Passava as noites no bordel de Dona Madalena, sempre vestindo a mesma lingerie vibrante, com o mesmo batom vermelho desenhando um sorriso que não lhe pertencia. Entre promessas vazias e risos embriagados, era sempre um novo nome a cada madrugada, um novo toque que não deixaria marca, mas que pesava sobre sua pele.
Até que, uma noite, o peso tornou-se insuportável.
O quarto estava imerso em uma penumbra avermelhada. O cheiro amargo de cigarro e vinho branco misturava-se ao perfume barato impregnado nos lençóis. Márcia ouvia sempre as mesmas palavras, promessas doces tingidas de machismo.
— Ouve, Márcia… tu és uma menina linda e talentosa. Não devias estar aqui.
Ela riu, sem humor.
— Nossa, senhor Humberto… és como um pai para mim. — Sua voz carregava uma ironia cruel. — Apesar Disso o senhor também se deita comigo. Então, por favor, poupe os conselhos e vamos acabar logo com isso.
“Senhor Humberto” és ministro da ação social, era um senhor muito poderoso e um dos senhores mais velhos que frequentava muito o bordel de dona Madalena, cheio de dinheiro, és namorado de dona Madalena e um dos problemas na vida de Márcia no bordel.
Então, ele se inclinou, o cheiro de álcool e suor enroscando-se em sua pele.
— Márcia… você é especial para mim. Mas isso não é um romance, eu pago para você me servir e se eu quiser opinar, eu opino.
Ela fechou os olhos por um instante. As palavras dele escorriam como um veneno doce, uma ilusão temporária antes do golpe inevitável.
— Acorda, menina. Eu te pago para me ajudar a atingir o prazer. Agora vira.
O ar tornou-se pesado. O gosto metálico do sangue espalhou-se por sua boca após um tapa seco. Sua garganta parecia aprisionar qualquer súplica antes mesmo de nascer.
— Cala a boca, menina. — O tom dele era frio, metódico. — Posso acabar com o seu estágio ou te colocar no auge. Agora vira… e grita daquele jeito que eu gosto.
Todo aquele cenário era bizarro para Márcia. No entanto, ela suportava. Pelo seu sonho.
A única fuga era a sala de Dona Bárbara. Médica, professora de educação sexual, psicóloga e conselheira no bordel. Uma mulher de idade avançada que, mesmo marcada pelas cicatrizes da vida, tornara-se uma mãe para as meninas.
— Senhora Bárbara… a senhora acha que existe um homem que levaria uma de nós a sério? — perguntou Márcia, certa noite.
Bárbara cruzou as mãos sobre o colo e sorriu.
— Por que essa pergunta, menina? Duvidas de quem és?
Márcia abaixou o olhar.
— Vivemos essa dualidade. Ora médicas, ora putas. Existe alguém que possa nos amar depois de tudo?
— Se realmente ele quiser, vai entender. Se não… deixa essa vida antes que ela te devore. Mas nunca esqueça, menina: tu és mais do que esse lugar.
Aquelas palavras ficaram na mente de Márcia. Ela passou a dedicar-se ainda mais ao estágio, lembrando-se do porquê de ter começado tudo aquilo.
Certa noite, no hospital, ao entrar no quarto de um paciente, sentiu um arrepio gelar sua espinha, sua primeira impressão com aquele que viera a ser o seu herói dentro do “bordel Viúvas Negras”.
— Ora, ora… Que surpresa, Márcia.
Era o senhor Humberto. O mesmo sorriso cínico, o mesmo cheiro de cigarro e álcool. Ele se aproximou, segurando seus braços.
— Você não vai gritar. Você nunca grita.
Antes que pudesse reagir, a porta abriu-se bruscamente.
— Desculpa incomodar alguém pode me ajudar?
— Sim eu posso. Disse Márcia assustada e sentindo o alivio de ser libertada daquela frustração.
— Mas que diabos está acontecendo aqui? O rapaz não viu outra porta para abrir? Márcia volta já aqui ele vai procurar por outro enfermeiro, vai garoto.
O rapaz mantive frio e cauteloso, estava a tentar ser respeitoso, falando com um jeito moderado para não cometer um erro. O rapaz ficou estático apenas ouvindo os gritos e berros do és ministro.
— O que está acontecendo aqui, há enfermeiras ou não neste hospital Helder. perguntou Edgar o deputado do partido no poder e irmão de Helder.
Márcia não tirava o olhar inocente e derretido do rapaz, afrouxou a bata, deixando uma abertura leve para os seios, no quarto os olhares congelaram, o silencio tomava conta deles.
— Humberto com o mais doloroso do respeito que tenho por te, por favor solte o braço da menina, eu preciso de ajuda, agora saia do Hospital, pelo que sei tu não és médico, e nem és mais ministro para fazer caridade.
A voz firme de Edgar cortou o ar. Humberto se afastou com um sorriso presunçoso.
— Estávamos apenas conversando, não é, querida?
— Saia daqui agora, antes que eu chame a segurança! — Helder equivocado ordenou.
Humberto ajeitou o terno e saiu, como se nada tivesse acontecido.
— Obrigado. Disse Márcia!
Duas dias depois, Márcia caminhava pelas ruas de Luanda. O letreiro néon piscava em tons vermelhos e dourados: "Viúvas Negras". Homens embriagados, risos forçados, mulheres de olhares vazios. O mesmo jogo de sempre.
Ela parou diante da entrada, respirou fundo e sorriu de canto.
Márcia queria se livrar do bordel, mas cada ausência sua era cobrada em olhares inquisitivos e perguntas cortantes de Madalena, como se a casa a puxasse de volta para suas garras.
Ainda assim, com os dólares acumulados nos meses em que se vendeu para desconhecidos, podia enfim respirar e sonhar. Embora o dinheiro fosse suficiente para uma década de vida confortável em Angola—ou até para cruzar o oceano e estudar medicina—havia algo que ele não comprava: o peso dos toques que nunca quis, o gosto amargo das noites vazias e a lembrança do único homem cujo olhar não a fazia sentir-se suja. Um amor nunca dito. Um desejo de recomeço misturado à dor de tudo o que ficou para trás.
Uma última noite, sombria e calma, desfez-se dos vestidos eróticos que circulavam entre os cantos do bordel “Viúvas Negras”. Garçons passavam de um lado para outro, servindo whisky e vinho, branco e tinto ao mesmo tempo.
A casa estava mais abarrotada que de costume. Mesas de apostas foram espalhadas pelos quatro cantos, com vista privilegiada para a pista de dança, onde se exibiam as meninas que trabalhavam no hospital “Maria Pia”.
Márcia pretendia se despedir do bordel onde tantas vezes se entregou, nua, indecisa, inocente, ao desejo de sobreviver nas ruas de Luanda. Naquela noite, usou uma vestimenta diferente da habitual, capaz de deixar qualquer um com vontade de deitar-se com ela. A lingerie exalava sensualidade: deslumbrante e provocante, mas ainda assim misteriosa. As joias sóbrias, embaçadas como as de uma viúva; o batom, vermelho; o perfume, com divina fragrância. Sob as luzes negras voltadas para si, despertava inveja entre as outras raparigas do bordel.
Nas mesas de jogos, na copa ou nos banheiros, o assunto era seu nome: “Tenente Márcia”, o figurino que sempre usava ali. Desfilava com elegância pelo salão, e em certo momento deu um abraço tentador ao senhor Gaspar, Ministro do Interior — respeitoso e atraente, o único que nunca se deitou com ela nas camas da casa.
Mas sua intenção era chamar atenção do rapaz mais jovem ao lado dele. Um rapaz de apenas 21 anos, calmo, respeitoso, atencioso e observador. Um verdadeiro "cochi-to Nerde", o mesmo rapaz cujo seu olhar não dispensava, quando o medo invadiu sua alma no quarto do hospital.
Helder Mateus carregava o peso de um sobrenome respeitado, moldado pela fé e tradição, mas a sombra do irmão poderoso o arrastava para mundos que não lhe pertenciam. Entre o brilho fugaz das luzes vermelhas e o cheiro adocicado do pecado, ele caminhava sem sede, sem fome, sem desejo — apenas seguindo os passos de quem lhe impunha um destino que não era seu.
Seu coração pertencia aos versos que escrevia, às tramas da moda que desenhava, à busca incessante por algo além do vazio que as noites lhe entregavam. Mas ali, entre a fumaça e os sorrisos treinados, ele ainda não sabia que um olhar mudaria tudo.
Naquela noite, cansado do trabalho e da rotina, Helder se deixou levar mais uma vez, como quem cede ao inevitável, esperando apenas mais um encontro sem rostos, sem nomes, sem história. Mas então viu Márcia.
Havia algo nela que não pertencia àquele lugar—um mistério costurado na pele, uma tristeza guardada nos olhos, um desafio no jeito que não se deixava possuir completamente. Pela primeira vez, ele sentiu que não era o único deslocado ali.
Sem perceber, algo dentro dele se moveu, como se o destino tivesse acabado de escrever um novo verso em uma página ainda sem final.
O rapaz, bem-apresentado, vestia camisa de mangas curtas azul bebê, calça social cinza e um divinal Sebago. Entre as mãos, segurava um daqueles copos caros de Dona Madalena, saboreando um coquetel sem álcool.
Helder não desviava o olhar de Márcia, fascinado por sua presença delicada e misteriosa, enquanto todos ao redor, entre sorrisos ávidos e olhares predatórios, ansiavam por possuí-la sob a penumbra do bordel.
Percebendo o desejo crescente da clientela, Dona Madalena, com sua astúcia de negociante, colocou Márcia sobre a mesa de apostas, transformando-a no prêmio da noite — o vencedor teria direito a passar a madrugada inteira com ela.
Márcia, dividida entre o destino imposto e o desejo secreto, ajoelhou-se no palco, dedos deslizando pelo chão frio, dançando entre os ferros do bordel. Com os olhos semicerrados, murmurou orações ao Deus dos desejos, pedindo para que, pela última vez no bordel, se deitasse com um homem de sua idade.
Seu pedido foi atendido. O jovem que a observava apostou cada moeda do bolso, exceto o suficiente para beber mais um drink. Jogava com inteligência, dominava o sistema, e quando a última aposta foi lançada, a sorte deslizou pelo feltro da mesa até suas mãos.
O silêncio tomou o salão antes da explosão de murmúrios. Senhor Humberto, vermelho de raiva, cerrou os punhos e abandonou o local, seguido de sua guarda.
Márcia, sentindo o peso do destino se dissolver nos ombros, desceu da pista e correu em direção ao jovem, coração disparado. Em um impulso de gratidão e libertação, lançou-se nos braços dele, selando a felicidade em um beijo apaixonado, envolta em um abraço forte e quase desesperado.
Ficaram colados aos beijos…
A mesma menina que, dois anos atrás, havia deixado Benguela rumo a Luanda em busca de melhores condições de vida, de terminar o seu estágio de Medicina e, enfim, poder trabalhar como médica como sempre quis, para poder salvar todas as vidas que sofrem pelos mesmos problemas de saúde que matou seu pai.Lá estava ela diferente, depois do beijo. O cheiro do perfume do jovem, que inalava bem perto das suas narinas, a fez sentir sua vida com mais perplexidade, deixando as cargas amargas que viveu durante dois anos no bordel. E o jovem também se perdeu no perfume que ela usava, só queriam ficar parados se beijando sem se importar com o que estava ao seu redor.Após aquelas conversas que pareciam doces ao entrarem pelos seus ouvidos nos corredores do hospital — mas que, no fundo, eram amargas, já não tinham espaços na vida dela.Pela primeira vez, Márcia sentiu-se jovem de novo.O beijo, repartido entre seus lábios colados, davam a certeza que aquela vida carregada de humiliação estava preste
Passaram-se um ano e seis meses desde o misterioso desaparecimento de Márcia, a jovem que despertara em Helder uma paixão intensa e incontrolável. Ele havia se entregado a ela sem reservas, corpo e alma ardendo em um desejo que não se apagou sequer com o amanhecer.Mas quando o sol nasceu naquela manhã, Márcia já não estava. Nenhum bilhete, nenhuma explicação, apenas o vazio e as promessas sussurradas que agora ecoavam em sua mente como uma melodia inacabada.Desde então, Helder vagava por Luanda, arrastado por um misto de esperança e desespero, procurando por ela em cada esquina, em cada sombra, em cada olhar desconhecido.Mas a cidade grande parecia zombar de sua dor, engolindo qualquer vestígio de Márcia sem deixar rastros. O tempo passou, e o que antes era determinação se transformou em exaustão. Será que tudo não passara de uma ilusão? Uma noite intensa e nada mais?Naquela tarde, obrigado pelas ordens irritantes do irmão mais velho, ele seguiu rumo ao distrito urbano da Samba par
Num belo dia, dentro do carro, a sensação gelada do ar-condicionado contrastava com o calor abrasador que dominava a cidade. O trânsito caótico e o engarrafamento incessante tornavam a viagem exaustiva. Depois de enfrentar o trajeto desgastante, Márcia estacionou numa esquina, em frente ao IMS da Maianga, e seguiu a pé pelos corredores do hospital Jorgina Machel (Maria Pia).Até aquele momento, tudo corria bem. O dia estava tranquilo, sem frustrações na Ala de Geriatria. As conversas das novas estagiárias ecoavam pelos corredores, despertando a curiosidade das enfermeiras e de algumas médicas que ali passavam.Márcia respirou fundo, apreciando a calma rara daquele dia. Sentia-se leve, até que seu telemóvel vibrou, trazendo-a de volta à realidade. Uma mensagem de Roger, seu namorado. "Desculpa pela discussão de madrugada."Roger Lopes… Jovem de personalidade forte, ciumento, mas também delicado. Formado em Administração Pública, trabalhava como contabilista financeiro num dos hotéis da
O dia começou já com clima diferente em torno de mistérios e perguntas que apareceram nos momentos errados, sons de pássaros cantando, no cume das arvores que repousavam sobre a varanda do quarto de Helder.Os vidros fixados entre os vãos da porta corrida, não disfarçavam as luzes que invadiam o quarto pela manhã, e um conjunto de cores brilhando sobre o rosto de Márcia que foi traída ao anoitecer pelo calor deitando o chão os lençóis da cama.Ao som barulhento do alarme, Márcia desperta do sono, já despida e sem cueca, tomou um susto entre alma e o corpo, quando percebe que o Helder está dormindo ao seu lado, reagindo com duvidas no seu interior e questionando-se, se por ventura haveria rolado algo, entre eles na noite passada.Márcia apanha o lençol se forra ao mesmo tempo com a mão no rosto, julgando-se.— O que será que eu fiz, Meu Deus! – murmurou entre suspiros aflitos.Admirou uma tantas vezes, seu coração tomou conta da sua mente, quando desesperadamente percebe que o Roger hav
Márcia gozava de um leve sono, já com o sorriso no canto do rosto, como quem teve uma boa noite de sossego, de repente sem animo foi acordada pelo barulho desagradável provocado pelo Roger quando se preparava para ir ao trabalho.Roger ajeitou as cortinas do Quarto de um lado para outro permitindo que a luz do sol e o ar fresco entrassem ao quarto, num tom provocador quando o clima ainda estava fresco.Márcia se escondia debaixo dos lençóis de um jeito como se não tivesse pressa para se levantar da cama, mas de forma desesperada levantou-se, espreguiçando os braços e bochechando de forma serena.Levantou-se da cama, puxando a camisola, que deitava um cheiro de suor acumulado, mas não era assim tão ativo como o perfume que circulava entre os cantos do quarto, nocivo e esbelto. Márcia entrou para o banheiro, de frente ao espelho, escovou os dentes, soltou o cabelo no ritmo da canção que tocava.Sem pressa desceu as escadas, lendo as mensagens que foram enviadas durante a noite, enquanto
O relógio marcava 7:30 da Manhã. O quarto parecia vazio, envolta um silêncio quase palpável tendia se mover sobre o espaço, mas lá vinha o barulho do balão de soro, as gotas pingando lentamente e o ruído da máquina do oxigénio era constante.Entre as laterais do quarto, lá estava Márcia no meio, forrada na cama com um pano branco, a sua cabeça repousava em uma almofada aconchegante, as luzes brancas acesas dificultando a sua visão.Ao seu lado esquerdo havia um armário que sobre ela repousava um vaso com buquê de flores girassol, os aromas espalhados pelo quarto junto com o cheiro áspero do perfume da acompanhante no quarto coligavam de tal forma que era impossível não se apaixonar. No meio daquela energia abstrata, Márcia abriu os olhos, o seu espelhar perdido e estranho deu de cara com um rosto simpático e familiar, naquele instante seu sentido dorido voltou ao lugar levando a se acomodar como se estivesse em sua própria casa.E de repente soou aquela voz baixa bem próximo do seu ou
A manhã fria estava prestes a começar, carregada de energia, enquanto as luzes dos semáforos piscavam incessantemente. O trânsito, caótico como sempre, tornava a travessia ainda mais difícil. Em um piscar de olhos, todos ativaram os para-brisas. A chuva começou a cair com brutalidade, tornando a circulação quase impossível.No pulso de Márcia, o relógio marcava 8h. O clima tornou-se insuportável; a temperatura mudara drasticamente. O que antes era um frio sutil no estômago transformou-se em um calor sufocante. Somente aqueles com o ventilador do carro funcionando corretamente escapariam do desconforto.O transito não facilitava a travessia, Márcia ficava cada vez mais irritada diante aquele cenário que não queria se fechar perante o seu olhar. Passava a mão na cabeça e tornava a voltar no volante. Márcia abriu os olhos e vendo uma oportunidade para sair daquele obstáculo, um automobilista fez uma travessia incorreta deixando Márcia fecha em contramão.A sua irritação fluiu despertando
Chegou mais cedo a sexta-feira santa. O dia começando como sempre, cheio de esperança e harmonia. Uma divina sintonia que combinava com a paz que se movia sobre o quintal de Márcia. O zelador da casa ao lado limpando a piscina por descuido, o senhor tropeçou no jardineiro e acabaram jorrando água no quintal de Márcia.A água jorrava sem parar, se espalhando por todo canto como se fossem gotas de um pequeno sereno causando aqueles ruídos minuciosos, que sem querer despertaram Márcia do sono.Ainda tonta, Márcia abriu os olhos, o quarto estava escuro, mas mesmo assim aquela luzinha vindo de fora atravessava a janela, passando entre as aberturas das cortinas mal fechadas.— Que horas são? Ai, Cadê o relógio e os meus óculos. Perguntou-se a si mesma com uma voz baixa e delicada para não acordar quem já não estava na cama.Olhou a sua volta tentando encontrar um abrigo nos braços de quem passou noite consigo, mas não encontrou nada, apenas sentiu o vazio no colchão, palpando a mão, além do