Capítulo Cinco

Ellie Miller

"— Quem é você? — me assustei na hora, e me viro para trás.

— Oi, sou Lizzie, uma plincesa e  tenho cinco aninhos  — eu falo sorrindo, mas logo fecho a boca ao me lembrar que o meu dente da frente tinha caído. — Você é um plíncipe também?

O garoto a minha frente acha graça. Era um garoto muito bonito.

— E o que faz aqui Lizzie?

— Eu vim acompanhar o meu papai, ele veio falar com o senhor desse plédio.

— Então eu acho que o seu papai e o meu estão tratando de negócios. O que acha de brincarmos enquanto eles conversam?

— Sim! — falo muito animada. — Qual o seu nome?

— Então Lizzie............

Sua voz saia como um pequeno sussurro.

Lizzie"

Acordo assustada.

Lizzie.

Deve ter uns 7 anos que ninguém me chama mais assim. Minha família me chamava de Lizzie até os meus 5 anos, mas depois disso meu pai falou que eu tinha que amadurecer.

Uma criança de 5 anos amadurecer. Bem fácil. 

Não que eu me lembre de algo nessa idade, não tenho essa memória boa, mas porque nos anos seguintes era o que ele mais repetia, que a partir daquela idade eu já deveria amadurecer e ver como realmente era a vida. Cresci com isso.

Só uma pessoa depois disso me chamava assim, e hoje sequer me lembro dela. Ou evito lembrar.

Olho pela janela do meu quarto e vejo que está chovendo. Hoje não iria a empresa, recebi folga, mas iria aproveitar para adiantar as publicações da próxima semana. Eu amava tanto o meu trabalho, foi  primeiro contato com a profissão que escolhi.

Após fazer um café, me sento no sofá, de frente para a varanda e observo a chuva cair. Uma nostalgia me b**e.

Eu gostava de dias de chuva quando morava em Los Angeles me lembro que eu corria por ela como se não houvesse amanhã.

Uma das únicas lembranças felizes que tenho de lá são dos dias de chuva. Mas umas piores lembranças também, um bom equilíbrio para a vida.

Na verdade, nunca senti que pertencia aquele lugar, sempre me pareceu que eu simplesmente existia, como se estivesse vagando em um sonho, um pesadelo.

Solto um longo suspiro.

Evito tanto pensar, mas se torna impossível, como se minha mente quisesse me torturar, como se eu já não tivesse sofrido o suficiente, então as lembranças querem fazer o trabalho sujo e doloroso. Porque parece que uma vai puxando a outra.

Alguém b**e na minha porta e me levanto para atender.

— Oi Ellie. — era Carla, minha vizinha, e trazia no colo a coisa de 5 meses mais fofa desse mundo, abro um sorriso no mesmo momento.— Você vai sair?

Balanço a cabeça em negativa.

— Você poderia ficar com a Hope enquanto levo Helena no hospital?

— Claro! Está tudo bem? — pergunto já pegando Hope para meu colo e a bolsa.

— Desde ontem a noite não passa uma febre persistente. — suspira com o semblante preocupado

— Deveria ter me chamado, teria ajudado de alguma forma. Louise vem também?

— Está na faculdade, tinha prova, passou a noite em claro comigo. — fala e solta um longo suspiro — Sei que também está cansada,  mas eu pedi aos céus hoje que você estivesse aqui, muito obrigada Ellie, muito obrigada mesmo.

Vai saindo, mas parece se lembrar de algo e volta.

— Se tudo correr bem, amanhã  faremos o aniversário de Helena, é só a família, e você faz parte dela.

— Você quer mesmo me fazer chorar? — falo sinceramente.

Ela me dá um sorriso.

— Não falte, e qualquer coisa me ligue.

Concordo e ela volta correndo para seu apartamento, entro e fecho a porta.

Eu amava crianças, e amava Hope, Helena e Louise. Hope era uma bebezinha ruiva, assim como suas irmãs e mãe, elas moravam só, então Carla se virava em vinte e sempre que eu podia dava uma mãozinha.

Eu as considerava como irmãs, Louise era a mais velha das filhas, esforçada, carinhosa, eu me via muito nela quando era mais jovem, apesar da pouca diferença de idade, ela tinha 20 anos.

Helena era a do meio, tinha 12 anos, mas a esperteza de um adulto, ficava abismada com a inteligência. E tinha Hope, meu xodó.

Carla perdeu o marido quando estava grávida de poucos meses de Hope, nem ela, nem o marido  tinham outra pessoa da família vivos. Ela tinha 38 anos, mas quem a olhasse via como uma bela mulher de 30 anos, senão menos.

Sempre que viaja a trabalho, geralmente aos finais de semana, deixava as meninas aos meus cuidados. E eu me sentia como se realmente elas fossem minha família, porque eram unidas mais que tudo, e era assim que eu imaginava uma família, que apesar das desavenças, estavam sempre unidas.

Infelizmente minha família biológica não era assim. Na verdade era bem diferente, lá a palavra dinheiro valia mais que amor ou qualquer outra coisa. É claro que eu sei que o dinheiro é necessário, mas isso não é motivo para a falta de carinho e afeto da família. Mas lá, você pagava com a vida para eles ganharem mais e mais dinheiro.

Nos primeiros meses que cheguei, me senti perdida, mas voltar para lá não era uma opção. Então fui em frente, enfrentando todos os desafios e obstáculos. Até chegar onde estou.

Escuto um resmungo.

Dou um sorriso ao voltar os olhos para Hope, e mais mil lembranças me atingem.

Hope.

Hope significava esperança, para mim era como ter esperança em dias sombrios. Como ser a minha esperança nos meus dias sombrios.

Minha salvação.

Este seria o nome da filha se ela estivesse viva.

Dou outro sorriso para ela.

— Coisa mais linda de tia!

Escuto sua risada gostosa.

Apesar dos pesares, acho que finalmente estava me encontrando em algum lugar.

Talvez agora, me permitiria ser pelo menos um pouco mais feliz.

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