CAPÍTULO 04
Theodoro Almeida O percurso foi rápido, porém a minha cabeça dava voltas, pensando naquela mulher. Eu deveria ter ido antes atrás dela, mas não fui, e acabei atordoado com os seus modos. . Assim que cheguei no quartel, alguns sargentos e soldados bateram continência, mas o meu interesse era no soldado Messias, eu sabia que ficar afastado, traria problemas. — O que aconteceu? — perguntei antes de abrir a porta da enfermaria. — O tenente Soares o fez pagar muitas flexões, ele não comeu nada, porque o tenente disse que não iria tomar o café enquanto não terminasse quinhentas, e ele não aguentou. — Não acredito! O que ele fez? — Acusação de revolta, porque tentou ajudar outro soldado. — eu sabia o que aquele babaca do outro tenente havia feito, se aproveitado que eu não estava, para descontar a sua inveja no jovem rapaz que ele sabe que eu trouxe pra cá e era do orfanato. Entrei no local e fiquei ainda mais revoltado quando vi que o rapaz ainda estava desmaiado, então fui diretamente até a sala do Coronel, abrir uma reclamação e isso levou muito tempo. O pior é saber que o outro tenente está aqui há mais tempo que eu, e essa não é uma acusação considerada grave, pode demorar para ser atendida. Fiz questão de voltar no quarto do soldado. — Acorde, soldado! — falei mais firme e o rapaz abriu os olhos depressa, tentando bater continência deitado. — Senhor, perdão! Eu juro que vou me esforçar mais... — fiquei olhando seu jeito apavorado, tentando se explicar e se manter sentado. — Tentou ajudar outro soldado, Messias? — Sim, senhor! Ele não iria conseguir, o tenente Soares garantiria que não conseguisse, se é que me entende, senhor! — Certo. É melhor continuar com os olhos fechados, hoje. Amanhã estarei aqui, as cinco te quero em pé, soldado! — Sim, senhor. — bateu continência deitado e imediatamente fez o que eu havia dito. Tirei o Messias do orfanato que cresci, prometi a ele e o dono do local que o ajudaria aqui dentro, e pretendo cumprir. Após ver o rapaz e deixar as coisas encaminhadas, resolvi voltar para o hotel, tinha uma pendência para resolver com aquela prostituta. Avistei o tenente de longe e o encarei firme, se o encontrasse na rua, quebraria a cara dele de igual para igual, mas aqui dentro não posso, poderia ser preso. . Mal estacionei o carro, subi apressado, dessa vez peguei o elevador aberto, então entrei. Eu havia marcado mentalmente o número do quarto, precisava saber quem era aquela mulher. Bati na porta, mas ninguém abriu, comecei a ficar impaciente, passei a mão no rosto, me afastei e bati mais forte. Até que o serviço de quarto apareceu e abriu a porta normalmente. — O senhor precisa de alguma coisa? — uma moça perguntou. — Quero falar com a hóspede desse quarto! — Ah, o quarto está vazio. A hóspede fez check-out, eu só vim fazer a limpeza! — começou a empurrar o carrinho. — Isso não é verdade... como assim, simplesmente saiu? Como deixaram que saísse? — entrei no quarto e a moça veio logo atrás. — O senhor não pode entrar aqui sem que tenha feito check-in nesse quarto, senhor! — olhei em volta, não havia nada pessoal, mas meus olhos fixaram num lençol caído no chão e era o mesmo que eu havia visto antes, no outro quarto, com marca aparente de sangue, eu sabia muito bem que aquele era o sobre-lençol do quarto em que eu estive com ela. “O que isso, significava?“ “Não seria possível que aquela mulher fosse virgem, seria?“ — Não... estou ficando louco mesmo, aquela era uma prostituta. Ergui o lençol o segurando na minha mão e lembranças quentes atingiram a minha mente... aquela mulher era muito apertada, impossível não seria. — Senhor... senhor... — olhei para a mulher e num olhar mais pesado soltei o lençol e saí do quarto. . Encostei a porta, fui imediatamente tomar um banho, a minha mente estava conturbada e o meu corpo quente. De repente, flashes da noite passada tomaram conta da minha cabeça... merda! Ouvi um barulho na porta, estava saindo do chuveiro, alguém havia entrado, seria ela? Abri a porta do banheiro e... Porra! Essa prostituta não é aquela, onde diabos ela foi? — Minha chefe me enviou como compensação pelo mal-entendido. Você queria uma mulher e... — tinha um sorriso no rosto, tirou um sobretudo de couro preto, o jogando no chão com pressa. Usava botas pretas passando do joelho, e um espartilho de couro sem calcinha. Ela apoiou a bota sobre a cama, ficando com as pernas mais abertas e a sua mão veio direto para o meu pau. “Mas que porra era aquela?“ — QUERO VOCÊ FORA DAQUI! — olhei para a porta com vontade de chutar. — QUE MERDA DE PORTA É ESSA QUE QUALQUER UM ENTRA? — Mas... — irritado, juntei o sobretudo do chão e joguei sobre ela, mas me assustei com um barulho ensurdecedor que veio do nada, que em questão de segundos me deixou fora de mim. Coloquei as duas mãos nos ouvidos, aquilo era horrível, me deixou paralisado, e ao mesmo tempo com muita dor na cabeça. A dor era insuportável, que quando vi, já estava no chão, pois havia escorregado pela parede e involuntariamente comecei a me rastejar no piso, tentando me esconder, era como se eu ainda estivesse na guerra, e o local tivesse sido invadido. Não sei quanto tempo fiquei ali, só sei que acordei com dores no corpo, de tanto tentar se esconder em algum lugar do chão. Haviam dois homens na minha frente, e a mulher da limpeza, tentava me fazer beber água, enquanto eu apertava o pescoço de um terceiro, que segurava o pescoço com as mãos. — O que aconteceu? — perguntei, preocupado, soltando aquele homem, e observando a quantidade de água que havia derramado no chão. — Uma mulher nos chamou, porque ficou muito assustada, disse que o senhor estava tendo uma convulsão, bem no momento em que o alarme de incêndio foi acionado. Eles se afastaram de mim. — Alarme de incêndio? — Sim. — tentei esconder o rosto quando percebi que outra vez eu havia tido um surto por um simples barulho, “aquilo não iria acabar nunca?“ — E, onde está a mulher? — Ela saiu do prédio, devido ao alarme, e olha que foi apenas um disparo por problemas técnicos, pois não houve incêndio de fato. — Saiam do meu quarto! — falei alto, olhando para a janela. — Mas, o senhor está... — SAIAM IMEDIATAMENTE! SAIAM TODOS, SAIAM TODOS! — gritei alto, fazendo com que me deixassem em paz, e só parei quando os vi saindo e fechando a porta. Era melhor esquecer aquela e todas as mulheres da face da terra, nenhuma conseguiria conviver comigo, devo ter sonhado com aquilo da noite passada, ninguém jamais me ajudou num surto desses, outra ilusão da minha mente confusa...CAPÍTULO 05 Valéria Muniz Era um barulho do alarme de incêndio, aquilo não poderia estar acontecendo comigo, por Deus... como eu sairia sozinha por aqui? Sem conhecer nada? E sem a ajuda de um guia, como encontrei quando cheguei e consegui resolver tantas coisas? Meu corpo ficou tenso, enquanto aquele barulho me assustava. Fui batendo nas prateleiras, senti produtos caírem em cima de mim, mas me esforcei para conseguir sair. Quando cheguei na porta, quase chorei de emoção, não queria morrer bem agora que estava tão perto da minha liberdade, não era justo. Com os ouvidos super em alerta, e sentindo o ambiente mais quente, eu parei em frente a porta do quarto, tentando ser racional e não me desesperar. Pessoas falavam ao mesmo tempo, contei quatro passos da porta para frente e fui andando, mas parei quando percebi que tantas pessoas batiam e encostavam em mim, o que me deixou desesperada, sem saber o que fazer. “Eu queria tanto ver, queria saber o que estava acontecendo!“
CAPÍTULO 06 Valéria Muniz — Calma, aqui está a sua bengala. Por que ficou tão nervosa? — o rapaz perguntou com uma voz suave. — Eu preciso sair desse hotel. Meu irmão está atrás de mim, ele não pode me encontrar, me ajude moço, por favor! — procurei pelas mãos dele, ele segurou. — Meu nome é Rafael, pode me chamar assim. Eu te ajudo a se manter escondida aqui, se esse homem pode te causar mal... — Não, eu preciso ir, ele sempre me encontra, preciso ir. — comecei a andar naquele corredor pequeno e com cheiro ruim, procurando as minhas coisas, apalpando tudo, com medo de encostar no que não devia, peguei a minha pequena bolsa. — Olhe, eu não tenho muito dinheiro, mas posso te pagar para que me ajude a encontrar um quarto em uma pensão mais barata. — Fui tentando sair, e ele me ajudou. — Você está muito nervosa... olha, espera até o final do dia, não posso ir com você, agora. É só ficar lá dentro, posso te trazer uns pães e também almoço, não se apavore. Meu coração estava d
CAPÍTULO 07 Valéria Muniz A pior parte quando não se consegue ver, é saber que você está sozinha, não há ninguém por você. Se você cair, terá que se levantar, se não encontrar o seu caminho, terá que depender de estranhos, correndo riscos que você nunca saberá ao certo a profundidade deles e, sobretudo, se sentir numa escuridão interna, sabendo que ninguém poderá te encontrar lá dentro, porque você não tem ninguém. É exatamente assim que me sinto... numa completa escuridão. Se sempre foi assim? Não, já tive uma vida coberta de luz, mas se apagou. Assim o meu coração dói, segurando na porta de um carro estranho, onde o vidro está totalmente aberto, mas me sinto presa, implorando internamente para que ainda existam pessoas boas, e me deem apenas uma chance, de provar que não sou inútil por ser cega. O silêncio me mata a cada segundo, “mamãe, me sinto tão perdida!“ “Você me disse que sempre estaria comigo, mas onde está? Eu não consigo te ver!“ . — Você disse que sabe cuidar d
CAPÍTULO 08 Valéria Muniz Momentos seguintes, na casa de Anelise: Eu concordei com tudo o que ela dizia, só queria um trabalho e também fugir de Aaron. Ela me deixou conhecer um bebezinho muito cheiroso, de apenas cinco meses, que se chamava Samuel, e na mesma hora me acalmei com um anjinho daqueles, “ela confiou em mim”. — Olha, filho, a sua babá chegou! — se aproximou de mim, e senti ela com o bebê, me entregando. — Nossa, ele é tão quietinho! Não estranhou. — Como sabe que ele está acordado? Samuel é bem silencioso. — ajeitei o pequeno nos meus braços, e ouvi pequenos resmungos. — Através dos sons, movimentos corporais, mesmo que poucos, consigo identificar. — encostei o bebê perto de mim, gosto de sentir a respiração, a temperatura, me sinto mais confiante. — Puxa... — ela se expressou mostrando que estava impressionada com algo. Naquele dia, ela me mostrou toda a casa, tudo que o bebê usaria, e como funcionava. Dona Anelise me deu um quart
CAPÍTULO 09 Theodoro Almeida [Mensagem de texto de Anelise] — Você está bem? Não consegui te achar por esses dias, você vem no meu casamento, não é? — fiquei olhando para o celular e pensando que poderia ter sido eu o escolhido para se casar com ela, mas não disse nada. Respirei fundo, comecei a digitar uma mensagem, mas apaguei, pensei melhor e comecei novamente, eu não gostaria de ferir o coração da minha doce Ane. — Vou sim, estou muito bem, porém cheio de trabalho! — digitei, enviei e depois joguei o celular sobre o criado. “Era hoje... o dia em que eu precisaria enterrar esse sentimento que tenho por ela, esquecer que um dia já a amei, e pensar nela apenas como uma amiga. Sem muita cerimônia, olhei o único traje social que tinha no armário. Não era dos mais novos, então decidi ir fardado para Curitiba. Levarei o soldado Messias, mesmo que meu coração seja outra vez esmagado, não será a primeira vez, então eu aguentarei. . Enquanto Anelise casava com Vicente, tentei
CAPÍTULO 10 Valéria Muniz As palavras daquele homem eram dolorosas demais pra mim. Aguentei firme a cada insulto, não deixaria que ele me fizesse abaixar a cabeça, como meus irmãos sempre fizeram, eu o responderia à altura e precisaria esquecê-lo o quanto antes. Vi seu vulto a alguns passos. — Você é muito atrevida, sabia? — ouvi e senti a aproximação dele, estava muito perto de mim. — Se é cega... como sabe que estou fardado, para tentar me diminuir? — Uma pessoa cega sabe identificar muitas coisas, através do som, cheiro e percepções que seres humanos “perfeitos” não são capazes, sabia? — essas palavras doeram em mim, porque já estou tão cansada de julgamentos, por isso não gosto que fiquem me ensinando as coisas que já sei, me esforço para aprender rápido. — Olha, eu não quis ser indelicado, sei perfeitamente sobre isso que acabou de dizer, eu só estou perguntando como sabia que estou fardado? Você consegue ver algumas coisas com os óculos? — me virei para o outro lado,
CAPÍTULO 11 Theodoro Almeida Eu tive dúvidas em certo ponto da conversa, se aquela mulher realmente era uma acompanhante sexual. Iria perguntar novamente, mas depois de falar que era do hotel e não negar nada, não havia dúvidas... Aquele sangue que vi no lençol não significava nada do que eu pudesse estar imaginando. Foi bom reencontrar a Ane, sinto que agora consegui que ocupe um espaço diferente na minha vida, serei apenas o tio do filho dela. Com tantas pessoas não vi para onde a Valéria foi. Queria ter conversado com ela sobre ter me ajudado naquela noite, mas só a vi quando saiu com Samuel, Ane e Vicente... pelo visto conseguiu a confiança deles. Acabei voltando para o hotel, mostrei a cidade para o Messias, e depois voltamos para Guarapuava. Dias depois... . Desde aquele dia, fiquei inquieto. Principalmente depois que descobri que Valéria trabalha na casa da Ane... então, quando recebi uma notificação, não resisti: — “Venha comer o bolo de mêsversário do Samuel,
CAPÍTULO 12 Valéria Muniz “Cadê a minha bengala? Cadê a bengala?“ Me agarrando nas paredes, fui procurando por ela. O pior é que com esse tenente me agarrando e me beijando, deixei de contar os passos, tenho dúvidas de onde estou, “por Deus, que ninguém tenha visto isso, nem o beijo”. Onde estou? — Val? — era a voz da dona Anelise. — Aqui senhora, peço desculpas, mas acho que me perdi pelo movimento da casa. — Ah, estamos na frente do banheiro do corredor, fique tranquila! — segurou na minha mão. — Ah, obrigada... me dê alguns minutos e estará tudo como antes. — Olha, se caso esqueceu, eu posso te explicar novamente... — De maneira nenhuma, já me lembrei de tudo, volto logo! — entrei apressada no banheiro, fechei a porta e escorreguei no chão, encostada nela. Meu corpo tremia inteiro, aquele tenente me causas muitas coisas, isso não pode voltar a acontecer... Em silêncio comecei a ouvir uma conversa do lado de fora, era dona Anelise e... “ele”. — Também se perde